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WhatsApp elege mas não governa

Outros Poderes explicam a Bolsonaro que preferem sua parte em dinheiro

José Roberto de Toledo | 08 nov 2018_20h46
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Foi antes de assumir que o governo Bolsonaro tomou sua primeira bola por entre as pernas. Como um goleiro vazado, viu, impotente, o Congresso aprovar o aumento dos salários dos ministros do Supremo Tribunal Federal e, assim, comprometer o já comprometido orçamento de 2019. Para evitar um 7 x 1, terá que rapidamente nomear operadores com autonomia de decisão na Câmara e no Senado. Implica sair do núcleo familiar e que fala “Bolsomito” para expandir o círculo do poder aos políticos tradicionais que a retórica bolsonarista fingiu combater durante a campanha eleitoral. Se elege, o WhatsApp não governa. Ainda.

Jair Bolsonaro improvisou afagos aos congressistas durante sua visita de meio da semana ao que chamou de “um dos centros do poder”. Alisou com palavras o Legislativo e o Judiciário. “Obrigado, mas preferimos nossa parte em dinheiro”, foi a resposta silenciosa dos interlocutores, ao aprovarem em seguida o reajuste salarial dos magistrados, com efeito cascata sobre todo o funcionalismo. O gol sofrido custará bilhões em gastos adicionais aos combalidos caixas da União e dos estados. Preço da inexperiência? Só se o goleiro aprender a fechar as pernas diante dos atacantes. Por onde passa um gol passa uma goleada.

Sem operadores experimentados em ouvir e negociar as demandas de deputados e senadores, o presidencialismo de cooptação não funciona. Embora tenha sonhado brevemente com uma democracia direta, o governo Bolsonaro percebeu que vai precisar, sim, cooptar sua base de apoio. A nomeação de uma deputada para ministra da Agricultura é sinal disso. Entrou pela cota da bancada ruralista – o que sugere que o novo governo prefere privilegiar grupos lobistas parlamentares em detrimento de partidos e blocos partidários. A ver no que vai dar.

Seja como for, está cada vez mais claro que apenas um ministro centralizando tudo, como Onyx Lorenzoni, é atalho para o desastre legislativo. Serve de propaganda sobre o pretenso enxugamento da máquina pública, mas para nada além disso. Se e quando decidir aprovar alguma reforma da Previdência – para ficar em um exemplo que o mercado financeiro considera vital –, Bolsonaro precisará de dez a quinze deputados experientes fazendo pesquisa qualitativa no plenário, anotando pedidos e fechando acordos que só são feitos ao pé do ouvido. Montar um grupo de zap “Melhor Jair se acostumando” não vai resolver.

O mesmo problema se repete na economia. Um outsider megalômano tampouco dá conta de tudo o que precisa ser feito. Bastou o atual presidente do Banco Central titubear sobre o convite para permanecer no cargo por mais dois anos para a Bovespa realizar lucros, ou seja, cair. Falta realizar que o otimismo galopante das semanas antes da eleição era galopante porque quadrúpede.

Mais espertos são os militares. Dividem para governar. Aos outros e a si próprios. Já tomaram Defesa, C&T, Infraestrutura, e o Gabinete de Segurança Institucional. O GSI ficou com o general Heleno, que, sabiamente, trocou uma supervisão simbólica das três Forças – Exército, Marinha e Aeronáutica – por um gabinete no Palácio do Planalto. Estará dentro do centro do poder, com acesso aos ouvidos do comandante em chefe e às bocas de virtualmente todos os comandados. Em tempos que a turma lembra com saudades, o ocupante da mesma cadeira fazia reuniões diárias com o presidente e acabou por sucedê-lo. Quem sabe Heleno não se transforma no Figueiredo de Bolsonaro?

O favorito ao posto de sucessor, porém, é Sergio Moro. Na entrevista em que expôs seu plano à imprensa, o futuro ministro da Justiça se apresentou como o poder moderador do novo governo. Aquele que, junto com Paulo Guedes, daria ares civilizatórios à gestão fardada. A independência que fez questão de sinalizar ainda está por ser testada, todavia, no primeiro confronto com as ideias do novo chefe. Mesmo em caso de colisão e fuga do governo, Moro seguirá posicionado como presidenciável.

Antes, também ele precisará aprender a conversar com os parlamentares. Não mais como inquisidor, mas como pedinte. Não há como atingir as metas que se impôs sem negociar votos para aprovar as propostas de combate à corrupção e crime organizado. Será didático seu primeiro encontro sem toga com Valdemar Costa Neto, dono do PR, ou com Roberto Jefferson, do PTB – para citar só dois veteranos da conversação política desinteressada.

A normalização de Bolsonaro se dará à margem da guerra cultural deflagrada pela implantação do “Escola Sem Partido” em cada sala de aula. Enquanto a sociedade se divide e se fragmenta, o MDB morde – aprovando o aumento dos ministros do Supremo – e assopra Bolsonaro, com Renan Calheiros sinalizando com apoio em 2019. Pais, alunos e professores se desentenderão por todo o Brasil enquanto neófitos e safos se entendem em Brasília.

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