O primeiro esboço de Em Busca do Tempo Perdido
O manuscrito reproduzido nessas páginas cobre uma folha de papel que já estava rasgada neste estranho formato quando Proust a usou, para deixar nela a primeiríssima versão do começo de seu romance.
Talvez a frase inicial de qualquer romance que um maior número de franceses saiba de cor seja “Longtemps je me suis couché de bonne heure” ("Por muito tempo me deitei cedo," numa tradução literal nada literária).
Essa é a primeira frase de de Marcel Proust, talvez, ao lado de Ulysses, de James Joyce, o mais famoso monumento literário do século XX.
Proust não é um autor fácil e muitos leitores desistem após as primeiras páginas. Não sabem o que estão perdendo. Sua prosa é talvez uma das experiências de leitura mais estimulantes e ricas que se possa ter. Com isso, de tão marcante, a ideia trazida nos primeiros parágrafos ficou na mente de muitos, mesmo aqueles que não foram adiante no romance. Proust conta nessas linhas como, ao adormecer segurando um livro, passa a sonhar com o assunto do livro e, logo ao despertar, vive ainda por instantes o assunto que estava lendo.
O primeiro volume do romance, intitulado Ao lado de Swann, no qual figuram esses famosos parágrafos iniciais, foi traduzido inicialmente para o português por Mario Quintana. Teve, cinquenta anos depois, uma nova tradução de Fernando Py e, no momento, Mario Sergio Conti está empreendendo uma terceira.
O manuscrito reproduzido nessas páginas cobre uma folha de papel que já estava rasgada neste estranho formato quando Proust a usou, para deixar nela a primeiríssima versão do começo de seu romance.
Este é, portanto, o primeiríssimo esboço dos primeiros parágrafos do livro, com importantes variantes com relação ao texto impresso, como era comum para Proust, que corrigia e recorrigia até o último minuto, e era considerado o terror dos tipógrafos. O desenvolvimento da ideia é bastante semelhante, mas é aqui um jornal, e não um livro, que o narrador solta ao adormecer. Mas o que chama a atenção é a ausência da frase inicial. O então começo: "Pendant bien des années…" certamente não teria impactado a memória dos leitores da mesma forma, e só mais tarde Proust escolheu a abertura brilhante que todos conhecem.
Este pequeno, mas significativo, manuscrito pertenceu a prestigiosas coleções europeias, e teria certamente sido exigido pela Biblioteca Nacional da França, caso houvesse sido leiloada há dez anos em Paris e não na Alemanha, onde foi adquirido por seu atual detentor.
Leia Mais
Assine nossa newsletter
Email inválido!
Toda sexta-feira enviaremos uma seleção de conteúdos em destaque na piauí