minha conta a revista fazer logout faça seu login assinaturas a revista
piauí jogos

    O Lobo atrás da porta

questões cinematográficas

A Bela da Penha

Em O Lobo atrás da porta, Fernando Coimbra, autor do roteiro e diretor, atualiza fato ocorrido em 1960, conhecido na época como o crime da Fera da Penha.

Para uma versão que nunca realizou, em novembro de 1964 Paulo César Saraceni chega a filmar a Festa da Penha. No ano seguinte, o documentarista e montador britânico Rex Endsleigh adapta e dirige Crime de amor, baseado na peça Fera da Penha, de Edgard da Rocha Miranda. Radicado no Brasil desde 1950, Endsleigh veio trabalhar na Vera Cruz, trazido por Alberto Cavalcanti.

| 22 set 2014_18h35
A+ A- A

Em , Fernando Coimbra, autor do roteiro e diretor, atualiza fato ocorrido em 1960, conhecido na época como o crime da Fera da Penha.

Para uma versão que nunca realizou, em novembro de 1964 Paulo César Saraceni chega a filmar a Festa da Penha. No ano seguinte, o documentarista e montador britânico Rex Endsleigh adapta e dirige Crime de amor, baseado na peça Fera da Penha, de Edgard da Rocha Miranda. Radicado no Brasil desde 1950, Endsleigh veio trabalhar na Vera Cruz, trazido por Alberto Cavalcanti. Nas décadas seguintes, o caso inspirou programas de televisão e foi incluído em livros sobre crimes de grande repercussão.

Passadas cinco décadas, a partir do “fato em si do crime”, nas suas próprias palavras, Coimbra declarou ter se dado “a liberdade” de contar a história que queria. Disse não considerar que sua versão “é a história” da chamada Fera da Penha, porque estaria “mentindo”. Para ele, “cada um tem a sua verdade naquela história”, o que soa algo bizarro considerando-se que a ré foi julgada e condenada duas vezes pelo II Tribunal do Júri.

Além do mais, a discutível tese de Coimbra – segundo a qual as diferentes versões do “fato em si do crime” são equiparáveis à “verdade” de cada um –, não corresponde ao que é visto em . No filme, a tragédia resulta das mentiras nas quais se baseia a relação dos amantes – Bernardo (Milhem Cortaz), fiscal de um empresa de ônibus, e Rosa (Leandra Leal), operadora de telemarketing desempregada. Mas suas respectivas versões dos fatos não têm grandes divergências. Deixando de lado as variações iniciais, termina por prevalecer como factual o relato de Rosa feito ao delegado de polícia.

Lembrando que o depoimento de Rosa é dado depois dela ser ameaçada em termos brutais (“Aqui dentro o pau come. […] eu posso fazer contigo o que eu quiser pra tu me dizer o que eu quero ouvir. Posso quebrar teus dentes, os dedos da tua mão, ninguém vai reclamar. […] as pessoas vão bater aqui na porta pedindo para te linchar etc.”), resulta particularmente estranho que seja aceito como “verdadeiro” em . Mais interessante teria sido sustentar até o final o valor relativo dos diferentes pontos de vista, como Coimbra indicou ter pretendido ao dizer que “cada um tem a sua verdade naquela história”.

Quando a crise tem início, Bernardo diz à sua mulher Sylvia (Fabiula Nascimento) que “o mal vem de cada lugar que a gente nunca imagina”. Além de servir de premissa para o filme, a frase pode ser uma pista para explicar a feliz, embora improvável, escolha de Leandra Leal para o papel da Bela da Penha. A aparente inocência da personagem, aliada à beleza da excelente atriz, resultam desconcertante, contrariando a explicação fácil de que Rosa é uma fera.

O elenco de , em seu conjunto, está à altura da atriz principal. As cores densas da fotografia e a decupagem em planos longos, com pouca subdivisão interna da ação, somadas à ambientação em locações reais na Zona Norte do Rio, asseguram a veracidade da encenação. E a trilha sonora (música, sons ambientes e ruídos) cria atmosfera adequada ao desfecho trágico.

Menos satisfatório é mesmo apenas o tom objetivo da longa rememoração feita por Rosa, que dura dois terços do filme sem hesitações e incertezas.

Assine nossa newsletter

Toda sexta-feira enviaremos uma seleção de conteúdos em destaque na piauí