A derradeira missiva de Maximiliano I

No decorrer de sua vida, um homem culto do século XIX escrevia milhares de cartas, da mesma forma como podemos trocar hoje centenas ou milhares de e-mails por ano. Um homem com muitas atividades, como o grande escritor francês Victor Hugo, escrevia todo dia dezenas de bilhetes do tipo: “posso jantar”, “não posso jantar”, “empreste-me um livro”, “devolva-me o livro”, “consiga um lugar para o teatro”, “para a ópera”, “encontre-me a tal hora” etc., questões que hoje resolvemos geralmente por telefone ou pela internet.

Príncipes e reis, além das cartas pessoais, tinham também nessa época o peso de uma importante correspondência oficial. Felizmente, para eles geralmente só era preciso assinar, pois os textos das cartas, decretos e nomeações eram preparados por assistentes e secretários. Somente para outros príncipes ou reis o protocolo exigia que fossem endereçadas cartas de próprio punho.

O arquiduque Fernando Maximiliano ? irmão mais moço do imperador da Áustria Francisco José ? não escapava à obrigação da pesada correspondência que cabia a um príncipe do século XIX. No seu caso, a tarefa aumentou consideravelmente quando se tornou, em 1864, o imperador Maximiliano I do México, imposto ao país pelas potências européias e, sobretudo, pelo Imperador Napoleão III da França.

Maximiliano reinou por apenas três anos, até ser derrotado pelas forças do general de origem indígena Benito Juárez, que o fuzilou ? juntamente com dois generais mexicanos que lhe haviam permanecido fiéis ?, no dia 19 de junho de 1867, para grande indignação dos países da Europa. A execução do Imperador Maximiliano foi um dos eventos mais marcantes dos anos 1860 e inspirou inclusive um quadro célebre de Édouard Manet.

Ainda que Maximiliano tenha assinado inúmeros papéis nos seus trinta e cinco anos de vida, poucas cartas como a aqui reproduzida foram tão significativas para ele. Poucas cartas também têm uma relação tão imediata com um evento capital para aquele que a escreve quanto esta simples folha de papel barato, na qual Maximiliano escreveu uma de suas últimas missivas, endereçada aos generais mexicanos presos com ele na fortaleza de Queretaro.

Informado de sua condenação à morte dias antes, e sabendo que a sentença poderia ser executada a qualquer momento (o que de fato ocorreria menos de 48 horas mais tarde), Maximiliano resolve agradecer em poucas linhas a dedicação e lealdade dos generais mexicanos sob seu antigo comando, e cuja sentença havia sido igual à sua:

Nestes momentos solenes lhes dirijo as presentes linhas como uma mostra de minha gratidão pela lealdade com que me serviram, assim como do sincero apreço que lhes professa o seu muito afeiçoado,

Maximiliano

Esta preciosa carta é marcada pela dignidade de um homem que enxergava o fim de uma aventura que lhe havia sido imposta pelo interesse da França ? e que viu chegarem seus últimos momentos com grande serenidade e coragem. Ela foi conservada como relíquia pelos descendentes de um dos destinatários por mais de cem anos e ressurgiu em leilão nos Estados Unidos em 1983, quando atingiu um valor recorde, ao ser comprada por uma instituição privada. Esta instituição foi extinta em 2009 ? como ocorre às vezes nos Estados Unidos com museus e bibliotecas que perdem seus sustentadores ? e a carta voltou ao mercado para ser adquirida por seu atual detentor.