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    Tradutor Sergio Flaksman faleceu de Covid aos 73 anos Foto: Reprodução/Companhia das Letras

despedida

A falta que Sergio Flaksman fará à piauí

O tradutor morreu nesta terça-feira, no Rio

Da Redação | 14 dez 2022_18h28
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O carioca Sergio Flaksman foi um excepcional tradutor do inglês. Um dos maiores que já tivemos. A mudança de patamar das traduções no país e a profissionalização do ofício nas últimas décadas têm nele uma das figuras centrais. Flaksman estava internado com Covid no Hospital Samaritano, em Botafogo, no Rio de Janeiro, e morreu nesta terça, aos 73 anos.

Antes de se consagrar como tradutor, ele chefiou a redação do prestigioso Dicionário Histórico-biográfico do Centro de Pesquisa e Documentação (CPDOC), da Fundação Getulio Vargas. Foi Flaksman quem formou a primeira equipe de redatores do dicionário e definiu padrões e normas de confecção dos verbetes. Trabalhou ainda como diretor-adjunto da editora Record até 1986. Depois começou a colaborar com a Companhia das Letras. 

Era já um veterano quando a piauí o chamou, na época de sua fundação, em 2006. Foi um dos mais assíduos e entusiasmados colaboradores que passaram pela revista nestes dezesseis anos. Não há exagero em dizer que sua expertise ajudou a definir o padrão das traduções que publicamos.

Flaksman era um tipo aceso, que gostava de conversar. Costumava telefonar para Raquel Zangrandi, produtora-executiva da piauí, antes do prazo que havia sido combinado para entregar seus trabalhos. Sempre eloquente, dizia que a tradução estava pronta, mas que deixaria o texto “dormir” para rever no dia seguinte, ou nos dias seguintes, antes de enviá-lo à redação. O texto vinha invariavelmente coalhado de anotações e comentários, que nos alertavam para cascas de banana e expressões que “não viajavam bem” do inglês para o português. Flaksman tinha gosto em explicar suas soluções.

Em seu extenso currículo de obras traduzidas estão Lolita, de Vladimir Nabokov, A Sangue Frio, de Truman Capote, Liberdade e As Correções, de Jonathan Franzen, A Informação, de Martin Amis, a trilogia Sexus, Plexus e Nexus, de Henry Miller, e Dias na Birmânia, de George Orwell, entre muitos outros.

Nem sempre era fácil encontrá-lo disponível para os textos mais curtos da piauí. “Dessa vez não vai dar, me liga mês que vem”, ou, com sorte, “te quebro um galho, mas não abusa”, são respostas que Zangrandi ouviu dele mais de uma vez.

Logo no começo da piauí, ele contestou o modo como a revista apresentava o crédito do tradutor, somente na página de colaboradores. Defendia que o lugar certo para o nome do tradutor era acima do corpo do texto, logo abaixo do nome do autor. Contestou, esperneou, mas sua posição não prevaleceu. Em suas visitas à redação, não perdia a ocasião para relembrar aos editores aquele ponto de honra. Era leitor da piauí e, quando gostava de um texto ou reportagem, tinha prazer de dizer isso diretamente ao seu autor. 

O Brasil também era assunto incontornável de suas visitas. A ascensão política de Jair Bolsonaro o escandalizava, e voltar sempre a esse absurdo era uma forma de catarse que vivemos algumas vezes com ele, nas rodinhas improvisadas de conversas em pé, ao lado dos computadores.

Mesmo que breves e circunstanciais, suas idas à redação da piauí faziam bem ao ambiente e nos alegravam. Ele animava o pedaço com seu entusiasmo e suas rabugices. Era um luxo a mais que sua figura nos proporcionava. Com ele na tradução, sabíamos que não iríamos passar vergonha. Por aqui, Sergio vai fazer falta. Muita falta mesmo.

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