Mais uma vez, Ciro Gomes tenta se desvencilhar da imagem de truculento durante uma campanha presidencial. Mais comedido que seus gestos e falas nas entrevistas recentes, só mesmo o conteúdo de seus canais oficiais na mídia social, repletos de sorrisos e beijos em crianças. O eleitor militante e acostumado à faceta explosiva do candidato não foi esquecido, porém. Para ele, existem páginas auxiliares no Facebook em que Ciro “humilha”, “detona” e “destrói” jornalistas críticos e adversários.
A tática lembra Antônio Carlos Magalhães, que alternou beijos e xingamentos a Ciro. Ante o apelido aplicado pelos adversários, de “Toninho Malvadeza”, o ex-governador da Bahia inventou para si o “Toninho Ternura”. No caso do presidenciável do PDT são “Ciro Sincero” e Ciro Gomes oficial. A resultante é uma inversão do slogan consagrado pelos guevaristas: há que amaciar, mas sem perder a dureza jamais.
É necessário alimentar a militância, pois é quem faz a diferença nas mídias sociais. “Ciro Sincero” é a página de apoiadores de Ciro que mais cresce no Facebook, com 214,5 mil seguidores nesta quarta-feira. Nela só aparece o lado combativo do candidato, em posts nos quais classifica ministros de Temer como “uma vergonha” e a política atual como “apodrecida”. No mesmo dia em que sua página no Facebook apontava Carinhoso como uma de suas músicas preferidas, a página “sincera” falava que o único assessor em quem o presidente Michel Temer confia é “Satã” e em “um acordo entre o PCC e o governo de São Paulo”.
A diferença de popularidade é evidente: um vídeo postado na página oficial do presidenciável soma, em média, 2,4 milhões de visualizações. Na Ciro Sincero, o número é quase dez vezes maior: 23,8 milhões.
Há seis meses a “Ciro Sincero” era pequena diante de outras páginas de entusiastas pela candidatura do pedetista. Enquanto “Ciro Gomes vem aí” e “Time Ciro Gomes” tinham mais de 400 mil seguidores, a “Ciro Sincero” aparecia em sexto lugar, com pouco mais de 100 mil seguidores. A partir de março, no entanto, a página se tornou um gigante em interações. Acumulou 1,17 milhão de curtidas, comentários e compartilhamentos no último mês e superou a “Time Ciro Gomes”, que era líder há três meses, com 933 mil interações, segundo um levantamento por meio da ferramenta CrowdTangle. A página oficial do candidato está na quinta posição.
“Ciro Sincero”, na verdade, são quatro: Juninho, Felipe, Adalberto e Elza. Eles dizem não receber nada para produzir os 26 posts que publicam por dia, em média. Sob a gestão dos quatro – baseados em São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Pernambuco, cada um numa cidade –, a “Ciro Sincero” acumulou nos últimos seis meses quatro vezes mais interações que a página oficial do presidenciável.
Um dos administradores da página, Josafá de Oliveira Júnior, mais conhecido como Juninho Oliveira, é formado em publicidade, com pós-graduação em marketing e ciências políticas. Aos 28 anos, Oliveira trabalha como designer freelancer e diz gastar, em média, quatro horas por dia administrando três páginas que apoiam a candidatura do pedetista – além da “Ciro Sincero”, a “Ciro Gomes Presidente” e a “Progressista”. O esforço dedicado ao candidato tem como objetivo, segundo ele, difundir o pensamento de Ciro Gomes. “A recompensa é que ele seja eleito”, afirmou à piauí. Oliveira conta que os membros da equipe têm autonomia para postar o que quiserem, como as alfinetadas a partidos rivais e textos em que Temer é chamado de “rato”, por exemplo, ou que o candidato vai “enfrentar a quadrilha que domina” o país.
Ciro depende desta imagem combativa. Ao longo dos anos, o interesse pelo nome do presidenciável aumenta sempre que é acompanhado por algum episódio explosivo. No Google, o maior volume de buscas por Ciro Gomes foi em 10 de abril deste ano, depois do bate-boca com Arthur do Val, do canal no YouTube “Mamãe, falei”, ligado ao MBL. Durante um evento em Porto Alegre, o presidenciável deu um tapa na nuca (ou “pescotapa”) no youtuber e a busca por seu nome explodiu. Nesse mesmo dia, a sequência de termos mais procurada foi “Ciro Gomes Tapa”. Já em 29 de maio, seu segundo pico de buscas veio após a sabatina no Roda Viva, da TV Cultura. Além de “Ciro Gomes Roda Viva”, as associações de palavras mais buscadas foram “Ciro Gomes biografia” e “Ciro Gomes processos”.
Uma questão judicial causou o terceiro maior volume de buscas pelo presidenciável no começo deste ano. A partir de uma delação premiada, o codinome “Sardinha”, que aparece em uma planilha da Odebrecht, foi associado ao candidato e, em 25 de janeiro, “Ciro Gomes Sardinha” teve um pico de interesse. Já em março de 2016, o que elevou o volume de pesquisas pelo pedetista foi um confronto. Um protesto pró-impeachment na rua da casa do irmão dele levou-o a se exaltar. Aos gritos, Ciro chamou manifestantes de fascistas e declarou que “Lula é um merda”. Foi o quarto maior pico de popularidade do nome do pedetista, como indica o Google Trends, ferramenta que compara o grau de interesse por palavras e expressões ao longo do tempo.
O quinto maior volume de buscas associado a Ciro foi alcançado em 27 de março de 2017, quando desafiou o juiz Sérgio Moro a prendê-lo. “Hoje esse Moro mandou prender um blogueiro, ele que mande me prender! Eu recebo a turma dele na bala”, declarou o pedetista, em referência à condução coercitiva de um jornalista.
A diferença de popularidade entre o que diz Ciro oficial e o que mostram suas páginas auxiliares levaram a equipe do presidenciável a procurar a Ciro Sincero, oferecendo um vídeo do candidato. Postada em 28 de abril, a gravação – em que o candidato diz que Ciro Sincero é “ducacete” e faz um apelo por curtidas em seu canal oficial – ficou fixa no topo da página durante dias. “O pessoal dele nos procurou pelo Facebook mesmo e já enviou o vídeo dele agradecendo pelo nosso trabalho”, contou Juninho Oliveira, sobre o pedido de Ciro à página sincera. E logo emendou: “Mas não há nenhuma influência direta do Ciro na página, não. Foi com esse feedback [o vídeo] que a gente percebeu que ele acompanha e gosta do nosso trabalho.”