Maria Cecilia Marra
Desenhista, é diretora de arte da piauí
histórias publicadas
Areia na cozinha
Bernardo, consultor para questões científicas da Cozinha Transcendental e vizinho de blog, nos apresentou ao projeto Brasiliana da Universidade de São Paulo. O Brasiliana digitaliza livros e documentos antigos e acaba de publicar online vários tratados culinários do fim do século 19 e começo do 20. Folhear os livros e ler os conselhos e receitas é embarcar no túnel do tempo, espiar o passado e suspirar de alívio ao perceber que nos livramos de muita dureza.
Saladas - como evitar o horror que rasteja entre as folhas
Os amantes dos carboidratos conhecem a cena. Nada desperta mais a culpa do que testemunhar uma criatura devorando com grande gosto um pratão de salada. Pior se a salada consistir exclusivamente de folhas, uma sinfonia em tons de verde, tinindo de saúde e intenções louváveis. Uma salada livre de pão, derivados de carne, de batatinha, tomate, palmito, ervilha, milho, queijo ou qualquer outro aditivo interessante é uma visão arrasadora para quem troca qualquer coisa por uma empada. Azeite? Os mais xiitas usam o mínimo, apenas para reduzir o atrito entre as folhas. Folhas que naturalmente são as mais fresquinhas, cultivadas organicamente, o cúmulo da pureza. Será?
Gelado paulista
Gelado Paulista da Beth
Esta receita é uma das especialidades da Beth, nossa sous chef, e está entre as mais pedidas pela equipe da Cozinha Transcendental. O doce fica com a aparência de um pudim (leva calda de açúcar queimado como a do pudim de leite clássico) e se passar um tempo no congelador, fica parecendo um sorvete cremoso. O gosto fica parecido com o do manjar branco e a consistência lembra um pouco a da maria-mole.
Apesar do nome, Gelado Paulista, nenhum dos paulistas da redação conhecia a sobremesa até ser apresentado a ela em um dos lanches tradicionais de fechamento. Quem achar que a calda de açúcar é doce demais, pode substituir por qualquer uma das caldas de frutas que nossa editora de sobremesas, Raquel, já ensinou.
Lavando a cozinha
Quando uma cozinha fica fechada por muito tempo, como a nossa ficou, antes de voltar à ação é preciso limpar tudo com muito cuidado. A tarefa parece chatérrima, mas não precisa ser: coloque uma roupa confortável (e se, para você, confortável é um bom par de saltos altos, brinco e colar, não se acanhe), prepare uma seleção das músicas mais animadas e mãos à obra. Além de ficar tudo fresco e perfumado, a alegria de reencontrar a sua querida cozinha vai se espalhar e repercutir na primeira receita que você preparar.
A Veneza chinesa
No maior cassino do mundo, delírios de um Marco Polo de escola de samba
Galinha bêbada
Galinha ensopada à moda chinesa
E depois de constatar que no verão do outro lado do mundo o pessoal mais cool faz questão de circular de Havaianas, todo prosa de exibir a bandeirinha do Brasil (e tem imitações de monte, sinal de grande sucesso); que em todos os lugares que são (ou querem passar por chiques) acaba tocando bossa nova (eles não têm a menor ideia de que estão escutando música brasileira); e que todo mundo acha o Brasil o máximo, começamos a voltar para o fogão da Glória, no Rio de Janeiro.
Lição em Xangai: Oito tesouros, uma especialidade local
Frango Xadrez caseiro
"Graças à sabedoria de seus filósofos, os chineses têm séculos de treinamento na arte de extrair prazer das circunstâncias mais simples. Como comer é uma necessidade básica e diária, faz parte da cultura chinesa tornar a comida uma grande fonte de prazer e sem para isso depender de materiais raros ou caros, apenas de método e habilidade". Quem nos ensina sobre o papel fundamental da culinária na cultura chinesa é o diplomata F. T. Cheng em seu livro Reflexões de um gourmet chinês, de 1950.
Pad Kra-pao kai! Viva!
Picadinho de carne com manjericão à moda tailandesa
Para fechar em grande estilo o ciclo de observação dos fogões tailandeses, uma receita coringa, muito apreciada tanto pelos fregueses das cozinhas de rua quantos nos restaurantes. Esta versão da receita foi capturada por observação no Took Lae Dee, cujo nome significa 'bom e barato' e é mesmo, um prato sai em média por R$3,50. A cadeia de restaurantes 24 horas fica dentro dos supermercados Foodland e tem a aparência de uma lanchonete - ou um diner americano. Os cozinheiros trabalham como os nossos chapeiros, e preparam tanto pratos ocidentais quanto asiáticos à vista de quem se sentar no balcão. A equipe de cozinha é reduzida (dois cozinheiros atendem a todos os pedidos) mas eficientíssima, organizada e muito rápida. Os dois cozinheiros vão fazendo um prato atrás do outro, sempre em fogo altíssimo e sempre usando a mesma wok.
Salada cor de rosa: Nyom Kroch Thlong
Salada de grapefruit com camarões à moda cambojana
A receita de hoje não veio da rua e nem de restaurante, veio de uma escola. O curso de culinária khmer em Phnom Penh é oferecido diariamente por dois irmãos, um deles, Heng, cozinheiro profissional. Pode ser de meio período (dois pratos e visita ao mercado) ou manhã e tarde, 4 pratos e mercado. Basta chegar, pagar a aula e aderir.
Comidas da terra do rei bailarino: lok lak
Picadinho de carne à moda cambojana
Phnom Penh, capital do Camboja, está a menos de uma hora de vôo de Bangcoc, mas em estilo a distância é imensa. A cidade é pequena (6 mil habitantes por quilômetro quadrado) e lembra uma cidade do interior do Brasil, com vida de rua animada e tão barulhenta que dá a impressão de que é sempre feriado, uma comemoração coletiva. Quem sabe estão mesmo festejando o simples fato de estarem vivos, o que para quem tem só duas gerações de distância do infame Khmer Rouge, não é pouco e nem simples. Entre 1975 e 1978, durante o Ano Zero, o partido assassinou mais de 2 milhões de compatriotas em nome de uma sociedade agrária mais justa, numa fúria genocida que o mundo ocidental assistiu sem se incomodar e que coube aos vizinhos vietnamitas resolver em 1979. No rastro do Khmer Rouge ficaram cidades destruídas, famílias arrebentadas, minas espalhadas por todos os lugares, inclusive nas ruas e um país na miséria.