Divergente
Cortina fechada – as metáforas de Jafar Panahi
Com a maioria das 2645 salas de cinema existentes no País ocupadas por apenas quatro filmes americanos – “Divergente”, “Capitão América 2: o soldado invernal”, “Noé” e “Rio2” –, nos quais foram investidos cerca de 480 milhões de dólares, fora os gastos com promoção e propaganda, e já tendo rendido no circuito mundial, aproximadamente, 970 milhões de dólares, o que sobra para os demais filmes, quaisquer que sejam suas nacionalidades e custos de produção, é uma fatia pequena do mercado. A parte do leão fica mesmo com os estúdios americanos – Buena Vista, 20th Century Fox, Paramount e Lionsgate, produtores e distribuidores de cerca de 10% dos filmes em cartaz, neste momento, no Rio de Janeiro. Os 90% restantes são obrigados a se conformar com poucas sessões, em horários inusitados e salas decadentes.
Com a maioria das 2.645 salas de cinema existentes no País ocupadas por apenas quatro filmes americanos – , Capitão América 2: o soldado invernal, Noé e Rio 2 –, nos quais foram investidos cerca de 480 milhões de dólares, fora os gastos com promoção e propaganda, e já tendo rendido no circuito mundial, aproximadamente, 970 milhões de dólares, o que sobra para os demais filmes, quaisquer que sejam suas nacionalidades e custos de produção, é uma fatia pequena do mercado. A parte do leão fica mesmo com os estúdios americanos – Buena Vista, 20th Century Fox, Paramount e Lionsgate, produtores e distribuidores de cerca de 10% dos filmes em cartaz, neste momento, no Rio de Janeiro. Os 90% restantes são obrigados a se conformar com poucas sessões, em horários inusitados e salas decadentes.
O que dirá um filme escrito, produzido e dirigido por um cineasta condenado pelo governo do Irã, em 2010, a 6 anos de prisão, além de proibido por 20 anos de dirigir filmes, dar entrevistas e viajar para o exterior?
Apesar de tamanhas restrições, depois de ter desafiado a sentença, em 2011, fazendo Isto não é um filme, que mandou para o exterior em um pen-drive, Jafar Panahi realizou outro filme no ano seguinte – Cortinas fechadas, co-dirigido por Kamboziya Partovi–, em exibição no Rio, que estreou no Festival de Berlim, em 2013, onde ganhou o Urso de Prata para melhor roteiro.
Assim como Isto não é um filme, Cortinas fechadas foi filmado em segredo, neste caso na casa de praia de Panahi, de frente para o mar Cáspio. Embora sem menções explícitas, lida com a situação pessoal de Panahi e as circunstâncias nas quais o filme está sendo realizado. Para tanto, encadeia metáforas pouco sutis da reclusão, a começar pelo próprio título, assim como o plano de abertura e encerramento do filme – a grande janela gradeada dando para a praia.
Se fosse possível assistir a Cortinas fechadas sem saber nada sobre a situação de Panahi, essas metáforas não pareceriam tão óbvias. Mas é difícil que isso possa ocorrer. Fala-se pouco do filme em si, da qualidade do roteiro, hábil narrativa, composição dos planos, ambiguidade da metade inicial, forma de incluir na encenação a pequena equipe que está gravando etc. O que mais se comenta é o fato do filme ter sido exibido em Berlim à revelia do governo do Irã. E a falta de informações sobre como Panahi ainda consegue filmar e mandar seus filmes para o exterior, cria em torno a Isto não é um filme e Cortinas fechadas uma aura de clandestinidade da qual alguns não deixam de se aproveitar.
Faz sentido considerar os filmes recentes de Panahi à parte das circunstâncias em que foram realizados? Em tese, talvez sim. Afinal, todo filme deveria ter autonomia e precindir de informações que não estejam contidas nele mesmo. Casos como o de Panahi, porém, põem em questão essa independência e ele mesmo procura usar a condição de cineasta perseguido a seu favor.
Essa impressão resulta das notícias que, mal ou bem, são veiculadas a seu respeito pela imprensa internacional. “É difícil trabalhar, mas não poder trabalhar é ainda mais difícil, especialmente no auge da sua carreira”, declarou o co-diretor e ator de Cortinas fechadas, Kamboziya Partovi, no Festival de Berlim. Sobre o estado mental de Panahi, Partovi discordou da delcaração de uma pessoa que o conhece, publicada pelo Los Angeles Times, segundo a qual ele tem lutado com depressão nos último anos. “Ele não estava pensando constantemente em suicídio, por que se esse fosse o caso não teria sido capaz de fazer o filme. Mas se eu me imagino sem poder trabalhar e só ficando sentado em casa tenho certeza que começaria a pensar em suicídio”, declarou Partovi.
Em anotações feitas por Panahi, ele diz que começou o filme em um estado de profunda melancolia, mas se recuperou enquanto filmava. “Nós nos perguntamos”, declarou Partovi, “como podemos ganhar uma nova experiência nesta situação particular? Como podemos desenvolver algo novo e ter uma nova experiência? Se não lhe permitem mais falar sobre outros e sobre a vida dos outros, ele tem que falar sobre si mesmo e sua própria vida.”
Em uma declaração impressa, Panahi escreveu que Cortinas fechadas usa gêneros e histórias em constante mudança “para realçar por que fazer filmes é uma necessidade vital para um cineasta: é a necessidade imperativa para mostrar a realidade do mundo no qual vivemos.”
O governo do Irã negou a autorização pedida pelo governo alemão para que Panahi fosse autorizado a viajar para Berlim de maneira a estar presente na estreia de Cortinas fechadas. Do lado de fora do cinema onde são feitas as principais projeções do Festival um grupo do Prêmio independente do Filme pela Paz exibiu um estandarte recortado em tamanho real de Panahi onde estava escrito: “Eu deveria estar aqui.”
Segundo a Agência de Notícias dos Estudantes Iranianos (ISNA), o vice-ministro da cultura e diretor encarregado do cinema do Irã, Javad Shamaqdari, protestou junto aos organizadores do Festival de Berlim pelo prêmio dado a Cortinas fechadas. “Todo mundo sabe que é preciso ter uma autorização para fazer filmes em nosso país e enviá-los ao exterior”, declarou Shamaqdari, “mas há um pequeno número de pessoas que fazem esses filmes e os mandam para fora do país sem terem licença. Isso é uma ofensa… mas por enquanto a República Islâmica tem sido paciente com esse comportamento". Dias depois do Festival, o governo do Irã confiscou os passaportes do co-diretor de Cortinas fechadas e da atriz principal do filme, impedindo-os de viajarem para promover o filme em outros festivais.
A declaração de Shamaqdari contém uma mal disfarçada ameaça ao dizer que “por enquanto a República Islâmica tem sido paciente” com Panahi. Nessas condições, como podemos reclamar das suas metáforas?
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