Escrever o Brasil – quinto episódio de Desiguais
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Como criamos sentido de vida, beleza e cultura em meio à dificuldade?
É conhecida a frase do sambista carioca Beto Sem Braço: “O que acaba com a miséria é festa”. As aspas popularizadas sobretudo pelo historiador e escritor Luis Antonio Simas revelam esse traço da cultura: ser um uma resposta contra as desigualdades. A festa, o samba, o carnaval são expressões culturais dos marginalizados da sociedade. Nas palavras de Simas “celebrando a vida não porque ela é boa, mas porque é preciso que ela seja”.
Simas, o primeiro entrevistado deste episódio, é carioca, de uma família vinda majoritariamente do nordeste e se denomina um “historiador das ruas”. Para o professor, “Napoleão Bonaparte tem tanta historicidade quanto um bebum num boteco, uma rezadeira que tira quebranto ou uma criança que brinca numa praça”. Ele define essas historicidades como “miudezas” e afirma que elas também compõem a História do país. Entender a relevância da história que é escrita nessa chamada miudeza é o que baseia sua defesa da “grandeza civilizatória das culturas marginalizadas”. Culturas que produzem sentidos em meio a tantas adversidades.
Os movimentos culturais populares do Brasil, profundamente influenciados pelos africanos e seus descendentes, são exemplos vivos de como a vida pode ser dotada de significados ainda que entre muitas ausências – de dinheiro, de lazer, de serviços públicos.
A escritora Conceição Evaristo, segunda entrevistada do episódio, cunhou o termo “escrevivência” para descrever a construção de sentidos a partir da experiência vivida. Nascida e criada na periferia de Belo Horizonte, Evaristo desde cedo percebeu os contrastes sociais e os elaborou a partir de uma perspectiva política. Cotada para ser a primeira mulher negra na Academia Brasileira de Letras (ABL), recebeu apenas um voto, o que diz no episódio não considerar como derrota. Evaristo diz entender a magnitude de sua escrita pelo clamor popular que moveu brancos, pretos, leitores e políticos. E que, depois da sua indicação, toda escritora e escritor negros podem desejar pertencer à ABL. Ainda que essa inspiração não exclua a branquitude soberana da instituição e o fato de que quem formata o Brasil em termos de literatura e arte continuam sendo essas mesmas pessoas – não só brancas como de uma elite.
E ao falar sobre isso, Evaristo chama a atenção para o fato de que essa mesma elite não tem acesso garantido à Cultura só pelo consumo. Para ter esse acesso ela também precisa entrar em contato com o que é produzido e criado por quem não pertence à elite. A escrita de fé de que a verdadeira movimentação da vida acontece no meio pobre: o samba, os Racionais, o grafite, a cantora Anitta, o passinho, as batalhas de slam. E que mesmo em territórios de vácuo estatal, onde faltam serviços públicos, essa produção cultural e criativa acontece.
No quinto episódio de “Desiguais”, somos chamados a entender a cultura como um instrumento de reconstrução, num momento em que o país está tão polarizado. Um recordatório das potências que nascem das frestas e que vão nos constituindo como seres humanos e como sociedade.
DESIGUAIS é uma produção da Maranha Filmes, com apoio da Fundação Tide Setubal, OAK Foundation e Ford Foundation.
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