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    Uma espécie de fanatismo semiótico irradia em torno do turista: atenção, diz o formato em fruta da chave do seu quarto, aqui não queremos filisteus, aqui somos saudáveis e amamos os animais ILUSTRAÇÃO: GAYATRI GAMUZ

impressões de viagem

O turista infeliz

Há algo masoquista em comer a comida local, fazer esportes radicais, tolerar aquele calorão. O mundo do trabalho já invadiu seu paraíso: é preciso acordar cedo, é preciso, é preciso

Nuno Ramos | Edição 78, Março 2013

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Lagoas verde-esmeralda entre dunas beges; estranhos tucanos de penas pintadas uma a uma; o farol no meio da areia com uma lua atrás; uma assinatura imensa no canto direito de cada parede. Completaram as pinturas na parada do ônibus (não estavam prontas na ida); parecem ingênuas em suas cores fortes e pinceladas aparentes. É a mim que se dirigem. Sou um turista, no entanto, e nada teria sido feito para mim – devia estar aqui como um mosquito vindo da mata, compartilhando, cheio de interesse, uma vida que não é a minha. Mas carrego minha bandeira comigo. É óbvio que sou um turista, digo isso por todos os poros, espécie de idiota endinheirado, mimado por todo mundo, com uma carteira evidentemente cheia. Turistas alardeiam aquilo que são – não combinam as cores que vestem, misturam xadrez com listrado, comem e bebem demais, falam alto, usam chapéus que não usariam em seus lugares de origem. Como indicam as roupas folgadas, são trabalhadores fora das garras do trabalho, gritando na cara de todo mundo o privilégio de seu ócio. Estes dias são nossos. 

Quando viajava na década de 70, mochila nas costas, ainda adolescente, éramos hippies, éramos estranhos, cabeludos ou maconheiros, mas não éramos turistas. Ninguém nos chamava – Ei, turista!, como o menino me chamou da margem do açude, ali, no meio do nada, enquanto eu remava sozinho na canoa – Ei, turista!, e eu, ridículo como um turista, devolvi na lata – Você estuda? Sim, ele estuda, é claro que estuda, o que mais ele faria?

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Reportagens apuradas com tempo largo e escritas com zelo para quem gosta de ler: piauí, dona do próprio nariz

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