Na última foto em família, feita na China, estamos todos sorridentes, numa combinação entre o esforço de parecermos felizes e a sensação sincera de que era um privilégio estar ali CREDITO: ÁLBUM DE FAMÍLIA
Rota da seda
A última viagem de meu pai
Olavo Amaral | Edição 159, Dezembro 2019
Jiayuguan, China, maio de 2018. Minha mãe vem me chamar em meu quarto: pela primeira vez em mais de uma semana, meu pai tem apetite para comer algo além de sorvete e bebidas geladas. Surpresos com a boa notícia, decidimos sair em busca de uma refeição que lhe agrade e, com sorte, não desencadeie um novo ciclo de náusea e inapetência, ao despertar alguma memória adormecida da quimioterapia.
Deixamos o hotel e caminhamos pelas avenidas desproporcionalmente largas da cidade, um fim de mundo no meio do deserto cujo marco arquitetônico é um golfinho gigante iluminado por luzes coloridas. Lembrando de ter passado pelos mesmos quarteirões no dia anterior, eu os conduzo até um restaurante que me pareceu acolhedor para os padrões chineses, onde a comida é servida em grandes bandejas para ser cozida nos fogareiros de cada mesa.
O cardápio, porém, está cheio de ideogramas incompreensíveis – e como em qualquer lugar em Jiayuguan, ninguém fala uma palavra de inglês. Tentamos apontar para as mesas vizinhas, pedindo verduras ou qualquer outra coisa que pareça incapaz de provocar náuseas, mas mesmo a mímica falha.
Mudando de estratégia, tiro o celular do bolso e passo a câmera sobre os caracteres chineses. Um aplicativo de tradução simultânea converte o significado dos ideogramas para o inglês. Os primeiros pratos da lista, descubro, são cérebro de carneiro e intestino de boi, o que não me atrevo a dizer em voz alta. Não demora e o aplicativo para de funcionar, depois de alcançar o limite de palavras da versão grátis. Não há wi-fi para atualizar – e, mesmo que houvesse, jamais entenderíamos a senha.
Minha mãe começa a temer que o cheiro da fumaça das outras mesas estrague o apetite de meu pai. Derrotados, saímos e caminhamos pela via pedestre da Rua Datang em busca do restaurante em que, na véspera, eu havia jantado com meu irmão. Um lugar onde o garçom ao menos arriscava uma comunicação básica e o cardápio continha fotos.
No estado atual de meu pai, a caminhada de pouco mais de 300 metros equivale a alguns quilômetros. No dia anterior, eu me divertira observando famílias chinesas, ideogramas iluminados em neon e anúncios inusitados que, na sobreloja dos estabelecimentos da rua de passeio, prometiam karaokê, sexo pago ou uma combinação das duas coisas. Agora, só consigo sentir a ansiedade transbordante de minha mãe, desacostumada a não ter uma solução imediata para o problema à mão, qualquer que ele seja.
Meu pai, porém, persiste. Contrariando minhas expectativas, ele caminha conosco até o lugar que sugeri. A comida não é nada de espetacular, mas ele insiste em se mostrar satisfeito – mesmo que as incontornáveis pimentas ameacem constantemente sua mucosa oral inflamada. Na volta, pegamos um táxi até o hotel, e só ao chegar ao quarto me permito fazer a pergunta óbvia: O que viemos fazer aqui?
Três semanas mais tarde, fui a Porto Alegre assistir a uma palestra de meu pai sobre a Rota da Seda. A sala, pequena, estava repleta de gente quando ele começou a falar. Usando um projetor, mostrou cenas de crianças na Mongólia cavalgando e brincando com falcões. Depois, retomou o fio da meada da aula anterior, que eu tinha perdido, mas que aparentemente parara lá pelo século XII.
Cursos pagos sobre períodos específicos da história são parte do ganha-pão do Instituto Ling, onde especialistas discorrem sobre temas de arte e cultura para plateias de classe alta da capital gaúcha. A única coisa incomum ali era o fato de o palestrante ser meu pai – um médico sem nenhuma formação em história, que nem de longe se qualificaria como um expert na Rota da Seda.
Ainda assim, ele estava lá, concluindo um curso de duas aulas sobre uma de suas paixões intelectuais recentes, a despeito das metástases no fígado e dos paraefeitos nefastos de um coquetel de inibidores de proteína quinase. E se defendeu bem, ainda que para uma plateia formada em sua maior parte por amigos e conhecidos. Ao terminar, veio me dizer que a primeira aula tinha sido melhor, num comentário que parecia mais carregado de vaidade perfeccionista do que de frustração.
Naquele dia meu pai estava animado, falante e esbanjando confiança, como quase sempre acontecia quando se punha a falar de si, ou de algum tema que lhe fosse caro. Em retrospecto, talvez tenha sido a última vez que eu o vi assim.
A província de Gansu, onde fica o Corredor de Hexi, foi por muito tempo o cordão umbilical que conectava a China ao mundo ocidental. Com a fronteira ao Sul bloqueada pelo Himalaia, e a limitada capacidade de navegação marítima dos chineses, por toda a Antiguidade a região foi a principal via de escoamento da produção de seda, porcelana e outros itens de luxo orientais que alcançavam o Ocidente, objetos de desejo das classes dominantes na Pérsia, na Arábia e no Império Romano.
O Corredor foi tomado pelos chineses, governados pela dinastia Han, das mãos dos nômades que o habitavam, os Xiongnu, no século II a.C. Ao construir uma série de fortes e muralhas na passagem estreita entre as montanhas de Qilian, Mazong e Longshou, eles manteriam o controle do território até os dias modernos – exceto pelos intervalos em que o trono chinês foi ocupado por estrangeiros como mongóis e manchus. O Corredor se estendia até a franja do Deserto de Taklamakan, ao Sul da Mongólia, onde os chineses mantinham seu último entreposto no Oásis de Dunhuang. Ali o mundo conhecido terminava, e o território hostil que se abria para além de seus muros era conhecido apenas pelas caravanas que ousavam trilhá-lo rumo ao Oeste.
O interesse de meu pai pela Rota da Seda se iniciou em 2011 com uma viagem à Turquia, um lugar onde ele prometera nunca pôr os pés depois de assistir a O Expresso da Meia-Noite, nos anos 1970. A viagem abriu os olhos dele para a Ásia, e desenterrou um fascínio de longa data pela história das grandes conquistas e impérios da Antiguidade. Nos anos seguintes, ele faria viagens à Mongólia e à Índia, numa sequência que culminaria em uma improvável incursão pela Ásia Central em 2014. Num roteiro pouco usual, ele e minha mãe perambularam pelo Uzbequistão, Quirguistão e Cazaquistão, conhecendo capitais históricas de impérios obscuros como os dos sogdianos e samânidas, antes de cruzar a fronteira para chegar a Kashgar, na divisa da China com o Paquistão.
Foi pouco antes dessa viagem que meu pai começou a sentir uma dor no quadrante superior esquerdo do abdômen. Assim como veio, a dor acabou passando, e o incômodo não chegou a impedi-lo de partir. Ao consultar um médico, recebeu a sugestão de que, na volta, se submetesse a uma colonoscopia. A recomendação, porém, acabaria esquecida em um cotidiano atarefado, em que o luxo de uma carga menor de trabalho abria espaço para uma série de hobbies e aprendizados tardios. Ele já tinha lançado um livro de crônicas e um romance, e nos anos seguintes viria a produzir diversos volumes com as fotografias das viagens cada vez mais frequentes.
Minha ideia desses países obscuros da Ásia Central, cuja representação no repertório imagético ocidental é mínima, é basicamente constituída por essas fotos – que meu pai viria a expor no fim da vida, mesmo não sendo fotógrafo, assim como não era historiador. Nelas, crianças jogam futebol entre construções monumentais, homens com traços orientais e chapéus muçulmanos discutem entre xícaras de chá, e mulheres com vestidos decorados e lenços na cabeça perambulam por mercados que na minha imaginação se afiguram infinitos, comprando e vendendo roupas, verduras ou ovelhas. Tudo conspira para criar a impressão de um lugar tão distante como poderia haver. Um ponto de encontro entre civilizações no meio de lugar nenhum cujo ponto focal, não por acaso, é o mercado.
Por toda a Antiguidade, a fronteira Norte da China, que margeia a Rússia, a Mongólia e o Cazaquistão, foi uma zona de equilíbrio precário entre culturas díspares. Ao Sul, a civilização chinesa, com um grau avançado de urbanização e uma burocracia altamente organizada. Ao Norte, um amontoado confuso de povos nômades – dos quais os mongóis são o exemplo mais conhecido, mas não o único –, com um modo de vida baseado na pecuária e na peregrinação.
Historiadores podem argumentar que a oposição entre “civilização” e “barbárie” é injusta, já que o nomadismo de mongóis e seus congêneres tinha mais a ver com a busca por pastagens do que com desordem. Ainda assim, não se pode negar a belicosidade dos nômades asiáticos, atestada pelo estado de alerta permanente das sucessivas dinastias imperiais chinesas. A interação entre as duas civilizações sempre foi marcada pelo comércio – em geral de cavalos por bens manufaturados –, mas também pela cobrança de tributos em forma de moeda, seda ou mulheres que aprouvessem aos chefes nômades.
O pagamento de tributos por parte de um império maior e mais evoluído culturalmente pode parecer um sintoma inusitado de fraqueza ou submissão. Na prática, porém, não é tão distinto do equilíbrio complexo entre bairros afluentes e zonas pobres das grandes cidades contemporâneas. Para os chineses de séculos atrás, como para tantos depois deles, tais rituais eram o preço a ser pago para manter uma estrutura frágil a salvo do caos.
A demarcação das fronteiras entre chineses e nômades sofreria inúmeras alterações por toda a Antiguidade. O legado mais óbvio que resta disso é a trajetória incongruente da Muralha da China, construída em retalhos ao longo de centenas de anos para conter invasões. A situação de equilíbrio instável, porém, se romperia de forma abrupta no século XIII, com a ascensão meteórica de um certo Temüjin, que viria a ser conhecido posteridade afora pela alcunha de “Grande Chefe”, ou Gêngis Khan.
A conquista de boa parte do mundo conhecido pelos mongóis – que em menos de cem anos estabeleceram um império que se estendia da Coreia à Polônia – foi tão rápida quanto sangrenta. Relatos de cidades arrasadas e de extermínios de mulheres, crianças e fetos extirpados de barrigas grávidas precediam a chegada dos exércitos mongóis através das estepes, desertos e planícies. O terror que essas histórias geravam contribuiu para a capitulação não só da China, mas também de partes do mundo muçulmano, da Índia e da Europa Oriental.
A velocidade do avanço dos mongóis resultava de um método único de conquista – o qual, por sua vez, refletia sua vocação nômade. Após destruírem algumas cidades do inimigo com estardalhaço, forçando assim a rendição das demais, eles seguiam em frente em direção ao próximo alvo, deixando para trás apenas a estrutura mínima para o recolhimento de impostos. Consolidar fronteiras ou assimilar culturalmente os povos subjugados estava além dos seus interesses: aos mongóis, bastava lucrar com o território conquistado e seguir em frente.
Sem amarras que os prendessem ao território de onde haviam partido, eles se espalharam como uma horda de insetos vorazes pela Eurásia. Vorazes em tantos sentidos que há quem especule, com base no estudo de marcadores genéticos, que cerca de 0,5% da população mundial descenderia diretamente de Gêngis Khan. Essa hipótese revela a vantagem competitiva – se não para a sociedade, pelo menos para os genes de um organismo – de espalhar-se da forma mais livre de amarras possível.
O potencial destrutivo do câncer no corpo do hospedeiro também costuma estar relacionado à sua capacidade de penetrar e proliferar em locais distintos do sítio de origem. O desgarramento começa quando as células do tumor, ao se multiplicarem, perdem as proteínas responsáveis por sua fixação local, fazendo com que elas migrem localmente e atinjam as camadas mais profundas de um órgão. Com o tempo, este comportamento evolui para a metástase: a difusão por via sanguínea, serosa ou linfática do tumor para outros locais do corpo.
No caso do câncer de cólon, o crescimento local dos tumores – período no qual são detectáveis por uma colonoscopia e passíveis de tratamento cirúrgico – é seguido da invasão local, que leva o câncer a crescer para dentro da parede do intestino até perfurá-la. Quando a perfuração acontece, abre-se caminho para que as células malignas invadam um espaço maior e mais fértil, a cavidade peritoneal, onde terão a oportunidade de se estabelecer nas superfícies do peritônio e de órgãos como o fígado. A esta altura, a doença está além das possibilidades de cura, e a terapêutica disponível serve para conceder curtos acréscimos de sobrevida ao paciente.
Em 2015, alguns testes sanguíneos de função hepática de meu pai começaram a se alterar. Sem alertar ninguém, ele cortou boa parte do álcool que consumia – fato que passou despercebido por mim, mas não por minha mãe. A medida não surtiu efeito – seis meses depois, os exames vieram ainda piores, trazendo suspeitas de problemas mais graves. Avesso a demonstrar fraqueza, meu pai decidiu investigar o que se passava por sua conta, usando o equipamento da clínica de radiologia que administrava para examinar o próprio corpo.
Nunca tive coragem de perguntar ao meu pai sobre esse episódio, que persiste como um lapso na minha compreensão de seus últimos anos de vida. O que sei é que, depois de se autoexaminar, ele tomou uma lancha e passou uma semana longe da família, indo pela Lagoa dos Patos até o Uruguai. Após voltar para casa no meio da noite, ele contou a minha mãe que alguma coisa não estava bem. Dois dias depois, eles viajaram a São Paulo para fazer mais exames de imagem. A rigor, tinham à mão os recursos médicos de que necessitavam, mas não queriam criar alarde na clínica que dirigiam – e muito menos na concorrência.
Fiquei sabendo da viagem depois que eles já estavam na capital paulista. Após um dia tenso sem saber o que havia de errado, recebi a notícia no início da noite, e ela não era nada boa. Chamá-la de terrível, aliás, seria um eufemismo. O diagnóstico de um adenocarcinoma de cólon com metástases hepáticas e peritoneais vem acompanhado de estimativas de sobrevida mediana entre um e três anos. No caso do meu pai, a constituição genética do tumor tornava o prognóstico ainda pior.
Das memórias daquele dia, a mais nítida é a de ser consolado por ele ao telefone, enquanto eu, às lágrimas, mal conseguia falar. Ele evocou o sucesso na profissão, na construção de uma família e no encaminhamento dos filhos – um orgulho em que se apoiava no pior momento de sua vida. Suas palavras para descrever as perspectivas de futuro, que eu não esqueceria tão cedo, foram: “Seja lá o que acontecer, eu já estou no lucro.”
Não sei bem o que fez meu pai querer ir até o Corredor de Hexi em 2018, três meses antes de morrer. Retrospectivamente, parece uma decisão temerária se embretar em confins profundos da China quando sua saúde se equilibrava em um estado precário. Dito isso, é evidente que o entusiasmo necessário para levar a ideia a cabo veio de minha mãe. Foi ela quem carregou o fardo de alimentar a vontade de viver de meu pai nos três anos que se seguiram ao diagnóstico, enquanto a soma dos efeitos colaterais da quimioterapia com a evolução lenta da doença ia minando sua qualidade de vida.
Minha mãe se especializou em transformar as menores vontades manifestadas por ele em planos concretos, como se pudesse emprestar vitalidade e desejo a um corpo que dava sinais de cansaço. Em larga medida, ela teve sucesso. Um ano e meio antes, tinha levado meu pai ao Japão, país onde ele tinha morado nos anos 1970, e para o qual nunca voltara. Também o convenceu a publicar livros, lançar exposições, fazer festas, e não só a se manter firme no tratamento farmacológico, como também a consultar nutricionistas, fisioterapeutas, homeopatas e um médico tradicional indiano que o atendia por Skype.
Ainda assim, a ideia de percorrer milhares de quilômetros por terra na China parecia ousada àquela altura dos acontecimentos. Quando meu pai mencionou o projeto a um dos oncologistas que o tratavam, pouco antes de partir, a resposta que recebeu foi: “Que ótimo. Mas vá logo.” Meu pai saiu da consulta taciturno, mas quando eu e meu irmão do meio topamos participar da viagem, ele já tinha voltado a brincar sobre o assunto. “Vou levar vocês para me carregarem numa liteira por lá”, disse, dias antes de partirmos.
Infelizmente, a imagem acabou não ficando muito longe da verdade. Já na China, ele teve uma crise atroz de aftas orais – efeito colateral do cobimetinibe, um dos fármacos anticâncer que tomava na época. Sem conseguir ingerir muito mais do que líquidos e sorvete, seu estado geral se deteriorou durante a viagem, e passamos boa parte do tempo empurrando-o numa cadeira de rodas. Quando ele conseguia se levantar, as coisas não ficavam necessariamente mais fáceis, como descobriríamos em nossa caminhada em busca de comida em Jiayuguan.
Este texto nasceu nos corredores do Museu Provincial de Gansu, em Lanzhou, como uma tentativa de entender o que meu pai tinha ido procurar do outro lado do mundo. A fascinação pela Rota da Seda e pelas civilizações antigas que ele desenvolveu no fim da vida sempre me pareceu uma tentativa de se aproximar de uma espécie de existência paralela. Como Walter White em Breaking Bad, ou o protagonista de O Sul, de Jorge Luis Borges, a proximidade do fim, pelo menos na ficção, precipita vocações épicas que a cautela até então tinha impedido de florescer.
Meu pai não chegou a traficar drogas, morrer esfaqueado ou construir impérios. Ainda assim, não tenho dúvida de que era fascinado por figuras como Gêngis Khan porque gostaria de ter jogado o “grande jogo” e tido poder sobre o destino de territórios distantes. Na ausência de oportunidade, resolveu estudar para pelo menos poder falar deles – e exercer o poder de conhecer partes da história pouco conhecidas pelas pessoas ao seu redor. O gesto de ir até o outro lado do mundo, assim, talvez tenha sido uma tentativa de se aproximar desse destino que não tinha sido o seu.
Seja como for, o fato é que o destino se acelerava precipitosamente enquanto estávamos na China. Depois de quase três anos em que a doença se mostrara ora estável, ora lentamente progressiva, chegava o momento em que ela começava a sair de controle. Não sabíamos disso ainda, mas foi nessa época que o câncer de meu pai ganhou a corrente sanguínea e semeou definitivamente o seu corpo. Como os trens-bala que hoje atravessam o Corredor de Hexi, ou como um cavalo de bronze que pisa numa andorinha, avançávamos a toda velocidade em direção a algum lugar mais adiante.
É pouco provável que os comerciantes que se aventuravam na Rota da Seda tivessem noção de sua extensão completa. A própria denominação “Rota da Seda” só foi cunhada a posteriori por historiadores ocidentais, mais especificamente pelo alemão Ferdinand von Richthofen, em 1877. O nome se popularizou, mas ainda hoje pouca gente saberia dizer por onde ou quando a seda transitava. Tudo o que se costuma saber, como na Antiguidade, é o fato de que existe um caminho.
Um detalhe curioso – ainda que óbvio –, do qual eu só fui me dar conta por meio de meu pai, é que praticamente ninguém atravessava a rota do início ao fim. Os comerciantes que levavam mercadorias do Mar da China até Dunhuang não eram os mesmos que atravessavam o Deserto de Taklamakan até a Ásia Central, que tampouco eram os que carregavam a seda pelo Oriente Médio até Constantinopla ou Alexandria, ou os que continuavam a viagem pelo Mediterrâneo até alcançar os portos da Europa. A cada ponto em que a seda mudava de mãos, em troca de ouro ou azeite, os viajantes dos dois lados viravam as costas e retomavam o caminho de casa, e o que existia para além do entreposto permanecia um mistério para ambos.
Da mesma forma, minha jornada pela Rota da Seda terminaria em Dun-huang, sobre uma duna de areia gigantesca que meu pai não teve forças para subir. Mais adiante, ficam o Deserto de Taklamakan e a província de Xinjiang, hoje povoada por cidades imensas como Turpan, Urumqi e Kashgar. Além delas, a Estrada de Karakoram leva por sobre a Passagem de Khunjerab até a fronteira do Paquistão. É incerto que eu vá algum dia regressar para investigar esse canto obscuro do mundo. Meu caminho na Rota da Seda, como o dos mercadores antigos, vai até um certo ponto e retorna.
E, sem conhecer o outro lado, o melhor que se pode fazer é imaginá-lo a partir do que nos chega dele, em mercados cheios de gente que fala línguas estranhas, come sopas de cabeça de cabra, carneia ovelhas ou vende caranguejos em pleno deserto. O rumor do outro lado, para mim, sempre soou um pouco como o ruído dessas línguas e vozes que não chegamos a compreender, mas que adivinhamos nesses efêmeros oásis de contato entre dois mundos.
Em suas traduções mais comuns, o Evangelho de João nos conta que no princípio era o Verbo. Talvez por simetria, a civilização ocidental, forjada sobre os alicerces do cristianismo, costuma conceber o fim como o silêncio.
Dois anos antes de meu pai adoecer, eu havia escrito um conto sobre um homem afligido por uma fibrose idiopática da glote – doença que fazia com que falar se tornasse progressivamente letal, ao servir de gatilho para a obstrução das vias aéreas. Em busca de uma existência que o comporte, ele decide ir viver junto aos Skali, uma tribo nômade da Sibéria cujo idioma é o mais lacônico do mundo. Nem a doença nem a tribo existem, mas a mensagem do conto, para mim, era evidente: morrer, assim como viver plenamente, envolve uma aproximação progressiva do silêncio.
As poucas vezes em que estive na Ásia, contudo, me sugerem que existem interpretações diferentes do fim. Nenhuma delas é mais acachapante do que os funerais à beira do Ganges, em Varanasi, na Índia. O que salta aos olhos ocidentais não é o fato de os corpos queimarem em público, mas que isso ocorra a alguns metros das crianças jogando futebol, dos homens tomando banho, das mulheres lavando roupa, dos fiéis que cumprem rituais e dos aproveitadores que tentam extorquir os turistas. Ao contrário do Ocidente, não há portões no cemitério que garantam uma armadura de silêncio respeitoso à morte. O fim, como o resto do percurso, faz parte do fluxo, e estamos todos no mesmo rio.
Não é por acidente que tais rituais estejam associados a ideias de reencarnação, nem que a visão de mundo hinduísta seja menos personalista do que a cristã. Naquela última viagem à China, não consegui deixar de me perguntar se olhar para a Ásia não era a forma que meu pai encontrou de se deixar envolver, ao seu modo, pelo fluxo. É difícil saber – até porque, desde muito antes de adoecer, ele sempre optou pela economia de palavras ao expressar sentimentos. Mas gosto de pensar, ainda que seja só uma invenção minha, que algo na jornada o tenha ajudado a enxergar um fim diferente – menos como silêncio, e mais como o ruído de um mercado incompreensível entre um lado e outro da existência.
As Cavernas de Mogao – um entreposto comercial transformado em local de devoção por volta do século IV – ficam a alguns quilômetros da atual cidade de Dunhuang. Num exemplo clássico da associação entre interesses econômicos e religiosos, os ricos mercadores da Rota da Seda passaram a expressar sua fé financiando a construção e decoração de incontáveis santuários budistas. O resultado é uma sequência de templos arquitetonicamente simples – a maioria não passa de buracos na rocha –, mas espetacularmente decorados por estátuas e pinturas em seu interior.
Com tintas que permanecem vívidas após mais de mil anos, as paredes ecoam os motivos recorrentes do budismo, repetidos à exaustão: o Buda em suas diferentes formas, seus discípulos e os seres místicos que os cercam. Mas há outras figuras representadas nas rochas: camelos, caravanas e rituais da China imperial dão um caráter documental às imagens, complementado pelos manuscritos encontrados na chamada Caverna da Biblioteca. A delicadeza das paredes só é quebrada pelas monumentais estátuas abrigadas nas cavernas maiores. Na mais marcante delas, a Caverna do Nirvana, um Buda de 15 metros descansa deitado, de olhos fechados, velado por seus adoradores e parecendo estar em paz.
Como em quase todo o resto da China, visitei Mogao empurrando meu pai em uma cadeira de rodas. Para entrar nos templos, ele precisava se levantar, o que fazia com alguma dificuldade. Ainda assim, fez questão de conhecer todas as grutas a que foi levado, parecendo interessado e exausto. A última foto em família que temos foi tirada em frente ao templo principal. Nela, estamos todos surpreendentemente sorridentes – numa combinação entre o esforço de parecermos felizes e a sensação sincera de que era um privilégio estar ali.
Logo depois da visita, antes de voltar à cadeira de rodas para irmos embora, meu pai sentou numa mureta e chorou. Algo que o vi fazer poucas vezes na vida – até chegarem aqueles dias finais, eu contava nos dedos as vezes em que ele havia se permitido expressar fraqueza de forma explícita. Eu o abracei e lembro de ele me dizer algo como “lindo isso, né?”. Obviamente, também estava implícito no choro o fato de que nosso percurso pela Rota da Seda terminava ali.
A vida é movimento. E o ponto em que se começa a morrer, no fundo, é aquele em que se decide voltar pelo caminho conhecido. Talvez tenha sido essa percepção que tenha motivado meu pai a ir à China, com cadeira de rodas e tudo. Não porque fosse fácil ou agradável, mas pelo que desistir de ir representava. Por contrapartida, a própria viagem deixaria claro que aquele era o limite, e que não havia como ir mais longe. Tudo isso estava contido naquele choro em Mogao. A percepção de que ele tinha chegado a algum lugar especial, e que isso era significativo. E de que não chegaria ao próximo, o que era mais significativo ainda.
Para além de Mogao se estende o Deserto de Taklamakan, um território hostil de dunas e tempestades de areia com temperaturas que vão de -20oC nas noites de inverno até 40oC nos dias de verão. Não é onde a Rota da Seda termina. Mas é o ponto em que as caravanas partem para lados opostos, e onde a seda troca de mãos. Do resto do caminho, quem fica para trás apenas ouve falar. De dentro da estrada, tudo que se vê e ouve são o vento, as dunas e os camelos, a balbúrdia das línguas e o presente ao nosso alcance.
Com minha caravana estacionada na metade da vida, o que ouço falar do caminho adiante ainda são histórias de viajante, notícias de lugares que não tenho como provar que existem. Durante boa parte do percurso pela China, tudo que enxerguei foi o deserto – tanto nas dunas de areia que se divisavam das janelas dos trens quanto na sensação de que aquele era um ponto árido da vida. Ainda assim, quem olha de fora sabe que há rotas de passagem ao redor de Taklamakan. Meu consolo naquele tempo era essa confiança na existência do caminho, nutrida pelas parcas evidências que nos chegam dele: peles da Sibéria, incenso do Iêmen e espadas da Ásia Central. Relíquias trazidas pelo viajante que veio antes, e que serão entregues ao que está por vir.
Os dois meses que se seguiram à volta da China foram duríssimos para meu pai – e por tabela, para todos nós. Depois de um longo tempo sob controle, a doença explodia a olhos vistos, e ficava cada vez mais claro que não havia muito a fazer para controlá-la. Dizê-lo de forma aberta ainda era vedado, mas o fato era aparente para qualquer um. No Dia dos Pais, paguei um preço estapafúrdio por três calhamaços da National Geo-graphic com fotos dos cinco continentes para levar de presente – sabendo que aquele era provavelmente meu último Dia dos Pais como filho. Ele chorou mais uma vez ao ganhar os livros, ainda que mal tivesse forças para manusear os pesados volumes. Àquela altura, nós dois sabíamos que essa era a viagem que restava.
Quis o destino, porém, que eu estivesse numa banca de doutorado em Natal, no outro extremo do país, quando o fim se anunciou. Fiz sozinho o trajeto até Porto Alegre – que entre transporte terrestre, dois voos e conexão, deve ter levado umas dez horas –, com ligações recorrentes de minha mãe e irmãos dizendo “vem rápido” e “quem sabe antecipa o voo” para não deixar dúvidas do que acontecia. Quando um funcionário da companhia aérea disse que não tinha como trocar minha passagem, eu respondi com um fiapo de voz que meu pai estava morrendo. Ele levantou os olhos, viu meu rosto e fez a mudança às pressas.
Cheguei ao hospital com meu pai já sedado pela morfina, num estado de semi-inconsciência causado pela insuficiência renal aguda. Ainda assim, em algum momento da noite ele despertaria agitado, e eu acordaria para atendê-lo. Às minhas palavras de “oi, pai”, ele responderia, de algum lugar das profundezas em que tinha afundado, com um “oi, filho”. Foram suas últimas palavras, talvez num esforço de comunicar que sabia que eu, mesmo atrasado, tinha chegado a tempo. Duas palavras que justificavam a viagem, e que ainda hoje me reconfortam.
É difícil descrever as 34 horas que restaram a partir dali. Durante a faculdade de medicina, ouvi incontáveis críticas sobre a falta de naturalidade do ser humano diante da morte – mas ao ter a oportunidade de estar próximo dela, não é difícil entender a razão. Existe algo de obsceno – e difícil de romantizar – em ver o que, até havia pouco, era uma pessoa regredir a um estado cada vez mais entrópico e primitivo, e em se perguntar em que ponto do caminho ela deixa de existir. Os estágios intermediários entre a vida e a morte atentam contra a ideia do indivíduo como entidade única e indivisível – uma narrativa, porém, indispensável à nossa sanidade mental. Se algum segredo se revela quando assistimos a alguém morrer, a sensação que fica é a de que ele deveria permanecer recalcado, para que se possa seguir em frente.
Talvez a mesma experiência possa representar algo de transcendental para quem tem fé na existência após a morte. Da minha parte, porém, não consigo acreditar que meu pai ainda me ouça. Minha memória da passagem é uma mistura confusa de respirações ofegantes, agitações incompreensíveis e a sensação de que ele cruzava as sucessíveis fronteiras entre a experiência humana e a inconsciência de um animal, de uma planta, de uma pedra. O único mistério do processo, para mim, está em tentar compreender como essa estranha transformação dos últimos dias e horas deve ser quando vista pelo lado de dentro.
Ao imaginar o que ela pode ter sido para o meu pai, gosto de pensar que a percepção delirante daquelas horas, se é que houve alguma, tenha sido a de estar num mercado em algum canto remoto da Rota da Seda. Como o viajante cansado que deixa o desconforto do deserto para trás, e percebendo que não vai mais seguir adiante, nem tampouco voltar, se entrega à balbúrdia das línguas estranhas em volta. Que vão se tornando mais e mais incompreensíveis, trazendo a tranquilidade de saber que nossa presença ali é supérflua, que já não se pertence mais àquele lugar. Até que de repente não se pertence mais a lugar nenhum.
Dois meses depois da morte do meu pai, minha mulher se mudou de vez para a minha casa, trazendo com ela o filho de quase 3 anos – o que me catapultou de vez para a vida adulta. Pedro sempre teve um sono complicado, e ainda hoje acorda várias vezes por noite. Na tentativa de dividir o fardo, por vezes sou eu quem se levanta no meio da madrugada para tentar fazê-lo dormir, o que raramente funciona: mais frequentemente, minha presença só motiva um choro continuado com pedidos repetidos pela mãe.
Numa madrugada particularmente difícil, em que minha mulher tem de acordar cedo no dia seguinte, eu ignoro o choro e me sento para conversar com Pedro, explicando que a mãe não vai vir. “Ela está muito cansada, e a gente tem que deixar ela descansar porque gosta muito dela.” Para provar que ela está ali, eu o pego no colo e levo até o nosso quarto, para depois trazê-lo de volta à cama.
A aceitação do fato de que quem vai botá-lo para dormir sou eu não é instantânea. A cada madrugada dessas, Pedro passa por um novo ciclo de aceitação de algo que não entende bem, da forma insondável que isso possa ter na cabeça de uma criança de sua idade. Com o tempo, o choro arrefece, e eu consigo convencê-lo a se deitar. Com murmúrios de “mamãe” que vão ficando mais tênues, ele adormece.
É então que me lembro da última vez que me disseram que eu precisava deixar o meu pai descansar, numa derradeira reunião de família num corredor de hospital, com argumentos não tão diferentes dos que acabo de usar. E enquanto Pedro adormece, já sei que eu mesmo não conseguirei mais dormir, tomado de espanto e lágrimas pela simetria dos episódios. Nesse momento, mesmo que por um brevíssimo instante, Pedro é o elo mais forte da relação entre ele e a mãe, e cabe a ele cuidar dela e deixá-la descansar – os primeiros passos de uma transição lenta e inexorável que vai acompanhá-lo pelo resto da vida, até o fim.
A larva dauer é um estágio intermediá-rio do ciclo vital de alguns vermes, notavelmente o Caenorhabditis elegans, em que, devido às condições externas adversas, as funções reprodutivas cessam. Nessa forma, o animal atinge uma longevidade notável, que o faz exceder em muito a expectativa de vida dos membros bem alimentados da espécie. Como um esporo, ele aguarda por tempos melhores para se reproduzir.
A existência da larva é interpretada por estudiosos como a evidência de que nossos genes escolhem o momento propício para se propagar. E de que, quando o encontram, não hesitam em livrar-se da carcaça das gerações passadas tão rápido quanto possível, como fazemos com um carro que começa a falhar. A priori, não há nada no C. elegans que vive na fartura que o impeça de viver tanto quanto seu coirmão desprivilegiado. Mas uma vez que os genes foram passados adiante, não há sentido em demorar-se, e o programa do envelhecimento é posto em marcha. Sem a mercadoria, o comerciante deixa de fazer parte da rota e sai de cena.
A primeira vez em que pensei em ter um filho foi há mais de dez anos, em um inverno em que tudo parecia bem. O mundo logo trataria de provar, porém, que as coisas não eram tão simples. A fase dauer de minha vida se iniciou com um divórcio, passou por períodos de relativa estabilidade, enfrentou outras duas separações, a morte de amigos próximos, a doença do meu pai, e foi acabar pouco depois que ele faleceu. Nem três meses mais tarde, depois de um dia ensolarado na Ilha Grande, minha mulher achou que era a hora, e eu precisei apenas seguir uma trilha que já estava pronta muito antes que eu viesse a pisá-la.
Existem dois caminhos óbvios para deixar de ser criança. Um deles é ter um filho, o outro é perder os pais. Para mim, as duas coisas se sobrepõem, e eu me pergunto o quanto a ocorrência de uma pode ter precipitado a outra.
Durante a doença de meu pai, sempre tive a impressão de que, se já tivesse um filho, isso teria me ajudado no processo. É impossível saber se eu estava certo. Mas é fato que, com a partida dele, eu me sinto mais preparado para seguir caminho. Deixar o entreposto em que me encontro e tomar de novo a estrada, como uma larva que voltasse a se alimentar – num sonho lindo de morrer, como diria uma velha canção de Vinicius. Do oásis, levo as línguas que aprendi, mas mais do que isso, a sensação de que as palavras passaram a um segundo plano em meu mergulho abrupto na vida adulta.
Ao tentar escrever sobre meu pai, vai se tornando óbvio que essa história não é sobre ele. Até porque, por mais que o luto torne duro admiti-lo, ele se foi e já não importa. Essa história, como todas as outras, é a história da estrada, em que as caravanas andam precariamente amarradas. Uma estrada que, como a Rota da Seda, nenhum de nós chegará a trilhar por completo. Que só somos capazes de intuir pelos relatos dos que já se foram e dos que estão por vir, cujo trecho final está além de qualquer relato. Falar da morte entre os vivos é como falar de Roma na China de 2 mil anos atrás. Existe um deserto no caminho, para além do qual as palavras falham.
Algum tempo depois de tudo isso acontecer, eu me vi sentado na mureta da Urca, no Rio de Janeiro. O mesmo lugar onde tinha beijado minha mulher pela primeira vez nove anos antes, largado da mão dela por outros tantos e celebrado um casamento com um cortejo de Carnaval no mês anterior. Já com alguns dias de atraso menstrual, tomamos o que se afigurava como o último chope em um bom tempo, antes de caminharmos até a farmácia para comprar um teste de gravidez.
Naquela noite, não me lembro de ter pensado demais no caminho que me trouxe até aqui, ou de me lamentar por não ter tido tempo de dar a notícia ao meu pai. Nem pensei muito no futuro e nas mudanças gigantescas que um filho traria à minha vida. Todas essas reflexões só viriam depois: naquele momento, não havia Samarcanda ou Bukhara, Alexandria ou Roma. Apenas o trecho particularmente feliz da estrada onde estávamos. E a sensação de estar em movimento, de mais do que nunca estar no meio do caminho.
Meu trajeto nele é curto – e como a Rota da Seda, só faria sentido se visto com o distanciamento dos historiadores, ou dos satélites inexistentes. Para os que viajam, existe apenas o espaço logo adiante. Ainda assim, me parece evidente que, em algum lugar do outro lado do deserto, meu pai faz parte da rota. E que ela só faz sentido se a bagagem que me foi entregue for passada adiante. Se meu pai fez o esforço de sair do pequeno trecho que havia caminhado para tentar enxergar a estrada maior, com seus impérios, oásis e desertos, hoje eu tenho a impressão de andar na direção contrária. E de, ainda assim, continuar na mesma estrada.
Caio acaba de nascer. Nem meu pai, nem eu, nem ele iremos compreender o caminho que trilhamos, mas não importa. De alguma forma, a seda continua a chegar.
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