A Amazônia brasileira é a única floresta tropical do mundo a ter o desmatamento mensalmente monitorado a partir da análise de imagens de satélite. O acompanhamento regular teve papel importante no controle do desmatamento nesse bioma, que caiu cerca de 80% desde 2004. Não que a situação esteja sob controle: no último ano, foram derrubados 5,8 mil quilômetros quadrados de mata, 16% a mais do que no ano passado.
Atualmente há duas iniciativas para o monitoramento mensal da derrubada da Amazônia. Uma delas é promovida pelo governo federal e realizada desde 2004 pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, o Inpe. Há ainda uma iniciativa independente conduzida desde 2007 pela ONG paraense Imazon, Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia. (A história desse instituto e de Chris Uhl, um de seus fundadores, foi contada na reportagem “O mentor”, publicada na piauí 111, de dezembro de 2015 – atualmente nas bancas e disponível on-line para assinantes).
Mas o monitoramento mensal se restringia até agora à Amazônia, deixando de fora biomas sob intensa pressão da atividade agropecuária, como o cerrado, que tem registrado taxas anuais de desmatamento maiores que as da Amazônia. Esse quadro começou a mudar com a entrada em operação de uma iniciativa que vai monitorar a perda da cobertura vegetal em todos os biomas do país, incluindo também a mata atlântica, o pantanal, a caatinga e o pampa.
Batizada de MapBiomas, a iniciativa é fruto de uma parceria entre dezenas de universidades, empresas e ONGs brasileiras e foi lançada em versão beta num evento no fim de novembro. O primeiro produto derivado da nova plataforma será uma série de mapas que permitem acompanhar as mudanças no uso da terra em todo o território brasileiro ao longo de oito anos, de 2008 a 2015. Uma versão preliminar dos mapas foi apresentada ao público durante a COP21, a conferência do clima realizada em Paris no começo deste mês.
Assim como o sistema de monitoramento independente operado pelo Imazon, o MapBiomas recorre à tecnologia do Google Earth para a análise das imagens de satélite. As imagens são tratadas na nuvem, nos servidores da gigante do Vale do Silício, o que poupa tempo e recursos computacionais preciosos para os pesquisadores.
“É um grande playground”, disse o engenheiro florestal Tasso Azevedo, coordenador da iniciativa, enquanto fazia uma demonstração do sistema em seu laptop numa conversa com o questões da ciência nos corredores da COP21. Azevedo mostrou a evolução de uma região do Acre que era ocupada floresta primária e foi convertida em pastagem. O pesquisador chamou a atenção para a agilidade do sistema. “Se eu fosse fazer isso manualmente, demoraria quatro dias; trabalhando no melhor computador, seria preciso um dia”, explicou. “Aqui demorou o tempo de eu explicar e ele já gerou o resultado.”
Cada pixel das imagens usadas no MapBiomas representa um quadrado com 30 metros de lado. A resolução é maior que usada no monitoramento mensal da Amazônia feito pelo governo, conforme notou Azevedo. “A frequência é muito maior do que a do inventário nacional de gases do efeito estufa”, disse o engenheiro florestal. “Vamos enxergar coisas pela primeira vez.”
O coordenador do projeto notou ainda que a plataforma desenvolvida pelos pesquisadores brasileiros em parceria com o Google tem acesso aberto e poderá ser usada por cientistas de todo o mundo. A novidade já despertou o interesse de colegas da América do Sul. “Já temos demandas de uso do sistema por parte da Argentina, Colômbia, Peru, Guiana, Guiana Francesa, Suriname e da rede dos países amazônicos”, disse Azevedo.
Atualização: o post foi atualizado em 22/12/15 para corrigir a resolução do satélite que captura as imagens analisadas pelo MapBiomas (a versão original afirmava que os pixels representavam quadrados com 30 km de lado).