Nem reformas nem investimentos
Depois do escândalo dos grampos da JBS, analistas do mercado preveem "tempos sombrios" com ou sem Michel Temer na Presidência
Às sete e meia da noite – quando veio a público a notícia de que o presidente Michel Temer mandara comprar o silêncio do ex-deputado Eduardo Cunha –, o mercado financeiro já estava fechado, mas os telefones de analistas de bancos e de fundos de investimento tocavam sem parar. O dia já havia sido complicado por causa da revelação de que o presidente americano, Donald Trump, tentara obstruir investigações do FBI, mas nada comparável ao que aconteceria no Brasil no início da noite, quando o clima de tensão foi alçado a um estado de pânico. Embora houvesse dúvidas sobre o futuro de Temer – se renunciaria ao cargo ou sofreria um processo de impeachment –, e do rito político – convocação ou não de novas eleições diretas ou indiretas –, o que já se tinha certeza no mercado era de que as reformas em andamento, da Previdência e Trabalhista, subiram no telhado. Ninguém mais acredita ser possível que elas sejam votadas antes de 2019.
Isso significa, na visão de analistas, tempos sombrios. A expectativa era de que, principalmente com a reforma da Previdência, haveria um impulso na economia. Esperava-se que com sua aprovação o país voltasse a ser alvo de interesse de investidores estrangeiros. “Acreditava-se que entrariam investimentos novos no país após a reforma”, disse-me um gestor de um grande fundo. “Sua aprovação seria um sinal de que o Brasil conseguiria contornar sua enorme crise fiscal”. Agora o cenário mudou. Justamente em um momento em que a economia começava a dar sinais de recuperação, com reaquecimento do mercado de trabalho e o arrefecimento da recessão. Além disso, os indicadores econômicos também apontavam para dias melhores: inflação e juros em queda, e estabilidade no câmbio. À noite, o otimismo dos analistas deu lugar à desolação.
Boa parte da elite do mercado financeiro duvida que um potencial sucessor de Temer terá condições de tocar qualquer reforma ou conduzir a economia suavemente até as próximas eleições em 2018. Analistas de instituições financeiras tentavam desenhar um cenário político desde que a notícia-bomba explodiu. Não só o PMDB, mas outro importante partido da base do governo, o PSDB, está envolvido nas denúncias, em razão de o senador mineiro Aécio Neves ter sido incluído nas delações dos donos da JBS ao Ministério Público. Segundo Wesley e Joesley Batista, donos da empresa, Aécio Neves pediu 2 milhões de reais em propina.
As informações que chegavam aos analistas financeiros davam conta de que a Constituição é clara: em caso de renúncia ou perda de mandato do presidente e do vice, deverão ser convocadas eleições indiretas em até noventa dias. Embora no Congresso já se discutisse a convocação de eleições diretas, estas só podem ser feitas após a aprovação de uma Proposta de Emenda Constitucional, o que levaria muito tempo. Mas a convocação de eleições indiretas também é motivo de preocupação. O Congresso teria moral para fazer essa convocação?, questionavam os analistas. O nó da questão é o fato de a JBS ter sido a maior doadora de campanha nas últimas eleições. Liberou quase 400 milhões de reais em 2014 – o equivalente a 20% do lucro da empresa naquele ano – para políticos de praticamente todos os partidos. Seria um sinal claro de que o número de políticos envolvidos no escândalo pode ser surpreendente.
A crítica era que, por causa da delação premiada, a única punição para os irmãos Joesley e Wesley Batista, que participaram ativamente do esquema de corrupção, seria uma multa de 225 milhões de reais. Ficou combinado com a Justiça de que não seriam presos nem usariam tornozeleira eletrônica. Para o mercado, esse valor é insignificante diante da quantidade de recursos que a empresa recebeu do BNDES durante os governos Lula e Dilma Rousseff. “Eles receberam financiamento público de mais de 10 bilhões de reais a juros camaradas do BNDES, e agora só vão pagar isso? É piada. É um tapa na cara da população”, disse-me um analista.
Com o país em crise, que é o que mercado acredita que irá acontecer daqui para frente, a questão é saber quem seria o candidato com mais chances em 2018. Especula-se que, um aprofundamento da recessão possa favorecer a candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Não há dúvida, entre os analistas, de que, para Lula, quanto maior a crise, mais chances ele teria numa corrida presidencial, caso não seja preso ou se torne “ficha suja” por envolvimento na Lava Jato. Uma saída pelo centro poderia ser o prefeito de São Paulo, João Doria, nome bastante popular entre a elite empresarial e financeira do país. Doria teria a seu favor o fato de não ser um político profissional, o que pode agradar parte da população agastada com o comportamento deplorável da classe. Há um porém. Justamente por não ser um político profissional, Doria poderia ter dificuldade em conduzir as reformas fundamentais para tirar o país do atoleiro.
O que se comentava em tom de fofoca depois da divulgação da bomba contra Temer e Aécio, era o clima no Waldorf Astoria, em Nova York. Na véspera, havia ocorrido a festa de entrega do prêmio Homem do Ano, da Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos, que foi concedido a Doria. Estava lá o deputado Rodrigo Rocha Loures, do PMDB do Paraná – amigo do peito de Temer, foi filmado carregando uma mala com 500 mil reais pagos pelos irmãos Batista. “Com boa parte do PIB brasileiro na entrega do prêmio, a entrada do hotel deve estar em ebulição. É capaz de Doria ser lançado presidente ali mesmo”, brincou um figurão do mercado financeiro.
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