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    Os amigos, quarto longa-metragem da cineasta e roteirista Lina Chamie, conta a história dos personagens Téo (Marco Ricca) e Majú (Dira Paes)

questões cinematográficas

Os amigos – viagem aos braços de Majú

Um fenômeno raro ocorreu sexta-feira à tarde, em São Paulo. A tempestade espelhou o que estava sendo projetado, ao mesmo tempo, em uma das salas do Reserva Cultural. Não é comum tamanho sincronismo entre o que acontece nas ruas e o que se vê na tela. A odisseia de Téo (Marco Ricca) não tem a mesma dramaticidade, porém, do que aconteceu enquanto Os amigos, de Lina Chamie, era exibido.

| 15 dez 2014_13h22
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Um fenômeno raro ocorreu sexta-feira à tarde, em São Paulo. A tempestade espelhou o que estava sendo projetado, ao mesmo tempo, em uma das salas do Reserva Cultural. Não é comum tamanho sincronismo entre o que acontece nas ruas e o que se vê na tela.

A odisseia de Téo (Marco Ricca) não tem a mesma dramaticidade, porém, do que aconteceu enquanto Os amigos, de Lina Chamie, era exibido.Téo acorda em São Paulo e atravessa a cidade, atormentado por lembranças e sofrendo revezes que vão da morte do amigo de infância ao temporal, passando pela adulteração do seu projeto arquitetônico para uma escola. Mas ele sai relativamente ileso desses embates e, no final do dia, encontra abrigo nos braços da amiga Majú (Dira Paes).

Durante a sessão, conforme matéria da Folha de S.Paulo, carros e pedestres ficaram parcialmente submersos pela água. Uma árvore caiu derrubando fios de alta tensão e impedindo os moradores de sairem de casa. Alagamentos prejudicaram a circulação dos trens. Uma criança foi arrastada pela enxurrada, mas foi salva por pedestres. Comparada com a odisseia dos paulistanos, a de Téo fica parecendo amena. Quem sofre mais com a chuva em Os amigos são os animais enjaulados do Jardim Zoológico. E ao sair do cinema, o público da sessão de 17:35 enfrentou uma chuvinha fina sem ter ideia da dimensão do que ocorria na cidade.

No cinema, momentos antes de Os amigos começar, ao ser projetado um comercial da atual exposição de esculturas agigantadas de Ron Mueck na Pinacoteca do Estado, ouviu-se na plateia escura uma voz masculina dizer “que horror!”.

Pouco depois de encerrada a sessão, a apresentadora Leilane Neubarth disse um sonoro “chega!” no Jornal da Globo News Edição das 18 horas, antes de passar a palavra à sua colega Cristina Aragão para que apresentasse a matéria de encerramento do programa. Diante das notícias do dia, que incluiram corrupção, assassinatos em série e transtornos causados pela chuva, a exclamação de Neubarth foi um apelo por algo menos brutal, como a celebração da vida registrada no retrato íntimo de Tomie Ohtake feito por Tizuka Yamasaki mostrado por Aragão.

Os amigos está mais próximo da delicadeza do encontro de Ohtake e Yamasaki do que da contundência das figuras humanas hiper-realistas de Mueck. Apreciado por uns, o tom suave do filme de Lina Chamie pode aborrecer outros, condicionados pelo predomínio de espetáculos mirabolantes. Foi o que aconteceu à voz masculina anônima. Quando os créditos finais começaram a ser projetados, ela voltou a se manifestar alto e bom som, dizendo “que chatice, hem?”.

Como satisfazer o dono dessa voz, refratário tanto ao hiperrealismo de Mueck quanto ao tom menor de Chamie? Seria difícil, talvez impossível. Em vez das peripécias da Odisseia às quais faz sucessivas referências, Chamie trabalha com pequenos eventos, opção tão boa quanto arriscada. Porém, à memória atormentada de Téo falta substância para ser o alicerce da narrativa, o que enfraquece Os amigos.

 

Escultor australiano Ron Mueck trabalha em obra hiper-realista

 

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