ILUSTRAÇÃO: ANDRÉS SANDOVAL
O preço da fama
Um colunista em busca do amor
Chico Felitti | Edição 108, Setembro 2015
“Qual é o nome da mulher do Wesley Safadão?”, perguntou o colunista Leo Dias às duas repórteres de sua equipe. “É Thyane Dantas”, respondeu uma delas, a de cabelo curto, soletrando o primeiro nome. “E ela faz o quê?” É designer de moda. “Que porra é essa?” Estilista. “Ah! O Wesley é o cantor mais bem pago do Brasil. Estou super no universo sertanejo”, disse o jornalista, enquanto batucava o teclado com os dedos indicadores para finalizar a página dupla diária que assina no jornal carioca O Dia.
Com um blog que responde por metade da audiência do diário na internet e um nome que é dos mais buscados do país no Google, Dias virou uma celebridade que cobre celebridades. Recebe pedidos de autógrafo nas ruas e já deu entrevista para o programa de Aguinaldo Silva (que por sua vez criou um personagem baseado no colunista para a novela Império, interpretado por Paulo Betti). É repórter especial de festas do programa TV Fama, da RedeTV!, e comanda o talk show De Cara, uma das maiores audiências da FM O Dia. Foi o primeiro a noticiar a separação de Dado Dolabella e Luana Piovani, e o término do casamento de Grazi Massafera e Cauã Reymond. Aos 40 anos, o jornalista escreve há duas décadas sobre celebridades. Já passou pelas revistas Amiga, Chiques & Famosos e Contigo!, sempre usando o mesmo bordão: “A fama tem seu preço. Eu estou aqui para cobrar.” Numa de suas “cobranças” recentes, no dia 3 de julho, Dias publicou que a então mulher de Latino, a dançarina Rayanne Morais, havia simulado um sequestro-relâmpago para ir ao motel com um ex-jogador de futebol. Quando o colunista entrou em contato com o cantor para perguntar se ele queria se pronunciar, o intérprete de Festa no Apê respondeu com um SMS: “Estou sem chão.” A mensagem foi devidamente reproduzida na coluna. Latino, claro, se melindrou.
Jornalista e celebridade ficaram estremecidos até o fim daquele mês, quando ambos compareceram a uma micareta em Fortaleza. Latino acabou concedendo uma entrevista a Dias por lá, para quebrar o gelo. A certa altura da conversa, justamente quando o cantor explicava que não tinha virado crente, uma loura estonteante passou pelos dois. “Descobre quem é ela pra mim, Leo”, pediu o entrevistado. “Latino não mudou. Graças a Deus”, registrou o jornalista, selando a trégua.
Nem sempre Leo Dias se reconcilia com os personagens de suas notas. Acordos feitos para extinguir processos judiciais o impedem de citar o nome de atores como Otaviano Costa, Flávia Alessandra e Bianca Rinaldi. A proibição vale por dois anos. “Tenho uma pasta com notícias de cada um, para quando acabar esse tempo”, contou ele, aos risos, num programa de tevê.
O colunista tem uma relação que se alterna entre tapas e beijos com a maioria das celebridades. Comunica-se diuturnamente com a funkeira Anitta pelo WhatsApp. No mesmo dia em que fez as pazes com Latino, noticiou que a cantora estava “conhecendo melhor” um dono de barbearias paulistanas. “Ela vai negar e fazer que tá brava, mas amanhã já voltamos a nos falar”, afirmou. “É a vida.”
Como se não bastassem a coluna no jornal e os programas em rádio e tevê, Dias ainda quer ampliar seu horizonte de atuação. Em sua sala na redação de O Dia, contou que recentemente procurou os serviços de um programador. Pediu ao profissional que desenvolvesse um aplicativo para celular que publicasse suas notícias.
E o que a direção do jornal pensa disso? “Não é um bom momento para essa empresa, né?”, respondeu, apontando as cadeiras vazias a sua volta. “Então caguei.” A sala gélida ocupada por sua equipe é uma ilha em meio a um oceano de baias desocupadas. “Sabe o que era ali? O Brasil Econômico”, ele disse, aludindo ao diário que deixou de circular em julho, demitindo dezenas de jornalistas. “Tinha um repórter de petróleo que ganhava 25 mil reais”, contou. “É mais do que eu.”
O anseio do colunista por novos ares chega num momento em que sua própria celebridade apresenta a fatura. Leo Dias está acostumado a tirar de letra os comentários cheios de ironia que pipocam em suas notas na internet. “Essa notícia vai mudar o mundo”, vaticinou um leitor num texto sobre o casamento de Preta Gil; o novo corte de cabelo de Valesca Popozuda iria “derrubar ministros”, na análise de outro. O colunista só se abala quando os recadinhos virtuais lhe desejam alguma urucubaca, como quando um leitor escreveu que “sua maldade vai ter volta”. Dias, um homenzarrão de ombros largos e mais de um 1,90 metro de altura, disse que pensa diariamente nos críticos. “As pessoas não acham que eu faço jornalismo, não levam a sério”, queixou-se. O pai, policial militar aposentado, nunca leu sua coluna.
Acusado de ter destruído casamentos revelando adultérios, vuco-vucos e falcatruas, ele agora manifesta um princípio de crise de consciência. “Uma coisa é você saber que foi traído, outra é ver isso publicado.” E os ossos do ofício não lhe dão remorso ou culpa? “Um pouco, mas já passa. Só acho que minha vida pessoal não deslanchou como deveria por causa do trabalho.”
O colunista contou que já teve um grande amor com um historiador – com quem ainda mantém uma amizade e um cartão de crédito conjunto –, mas está solteiro há anos. Atribui sua solidão a uma questão de carma: seu infortúnio se explicaria pelo mal que causou a outros relacionamentos. “Se eu não tivesse estragado o casamento do Latino, talvez tivesse um namorado”, ponderou.
Às cinco e meia, Dias decretou o fim do expediente. Já na rua, avisou que não deixaria a reportagem de piauí entrar em sua casa (“É um apartamento de um quarto só, muito bagunçado, nem fogão eu tenho”), mas que poderia continuar a conversa no caminho. Andando macambúzio pelas ruas da Lapa, o colunista evocou de novo a falta de um amor e, pela primeira vez naquela tarde, o palavrório cessou. “Desculpa, é que deu vontade de chorar. Só costumo ficar assim na análise.” Tirou a mão da frente dos olhos para chamar um táxi enquanto duas lágrimas corriam pelo rosto moreno e imberbe.
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