O cavalo de Turim
Despedida de Béla Tarr
Ao receber o Grande Prêmio do Júri na 61ª Berlinale (Festival Internacional de Cinema de Berlim), em 2011, Béla Tarr (1955- ) anunciou que O cavalo de Turim era o último filme da sua carreira, iniciada em 1979.
Ao receber o Grande Prêmio do Júri na 61ª Berlinale (Festival Internacional de Cinema de Berlim), em 2011, Béla Tarr (1955- ) anunciou que era o último filme da sua carreira, iniciada em 1979.
Passado um ano, estreou em Nova York, depois de ter sido exibido em outubro de 2011 no New York Film Festival, onde Béla Tarr foi ovacionado (época em que também foi exibido no Festival do Rio – releia os posts Béla Tarr – um resistente, e Béla Tarr visto por Walter Carvalho).
Há um mês, a interrupção da sua carreira de diretor voltou a ser comentada, como não poderia deixar de ser, nas entrevistas dadas por Béla Tarr no lançamento americano do seu décimo e provavelmente último filme.
Observando a expressão de Béla Tarr na fotografia reproduzida acima, fica patente a desfaçatez da repórter que perguntou se ele estava falando sério quando anunciou que não pretendia mais dirigir filmes. O fato dela ser do Hollywood Reporter talvez explique a petulância à qual ele respondeu num tom que só podemos imaginar:
“Eu não sou um cara que esteja brincando. Se eu digo sim, você pode ter certeza que é sim. Se digo não, você pode ter certeza que é não.[…] Estou fechando minha loja. Esta loja está fechada.”
A intensidade do olhar direto para a lente, a proeminência do nariz, as rugas da testa e a calvíce no topo, as dobras marcadas na face e no canto da boca, formando linhas descendentes tendendo a convergir, são todos sinais que sugerem tristeza profunda e deixam pouca margem para duvidar da sinceridade de Béla Tarr.
O cavalo de Turim é um filme marcado por sinais de desespero. Os planos longos em preto e branco, e a ventania incessante provocam angústia, dando aos poucos a sensação de que a vida dos personagens está chegando ao fim. O cavalo recusa alimento, o impulso do pai e da filha de irem embora é frustrado. A rotina diária se limita a pegar água no poço, cozinhar e comer uma batata. Resta sentar diante da janela e olhar a paisagem desoladora.
Depois de um filme como o que seria possível fazer? A dificuldade de responder, vencendo o desafio de fazer um novo projeto depois de ter ido tão longe, talvez tenha influído na renúncia de Béla Tarr.
Para o escritor e roteirista Laszlo Krasznahorkai, colaborador de Béla Tarr, “O cavalo de Turim é aquele gênero de filme depois do qual é difícil fazer o próximo. Logo depois do apocalipse? Mais um? Sobre o apocalipse? Só há um [a fazer sobre esse tema].”
A justificativa nas palavras do próprio Béla Tarr é a seguinte: “durante 34 anos fiz tudo que quero, tudo que quero mostrar ao espectador está feito, eu disse tudo que tenho a dizer. Agora vou produzir filmes e ensinar numa nova escola de cinema na Croácia. Para mim basta, pois [dirigir] é trabalho duro. Não quero ser um cineasta idiota que apenas repete si mesmo.”
E ainda: “No início da minha carreira, eu tinha muita raiva social. Eu só queria contar quanto a sociedade é ferrada. Isso foi o começo. Depois, comecei a entender que os problemas não eram apenas sociais, são mais profundos. Achei que eram apenas ontológicos. É tão, tão complicado, e quando entendi mais e mais, quando me aproximei das pessoas… depois, consegui entender que os problemas não eram apenas ontológicos. Eram cósmicos. O mundo todo está ferrado, acabou. Isso é que tive de entender e é por isso que o estilo dos filmes mudou [do drama social realista e do expressionismo colorido]. Quando decresci, continuei descendo. O estilo se tornou cada vez mais para baixo, e acabou se tornando mais simples, muito puro. É isso que me interessa – descobrir alguma coisa passo a passo.”
O que haveria a dizer depois disso?
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A entrevista completa de Béla Tarr, dada a Eric Kohn, está disponível no site http://www.indiewire.com, onde foi publicada em 9 de fevereiro. A declaração do roteirista Laszlo Krasznahorkai está no artigo “Auteur’s Swan Song, an Ode to Survival”, de Nicolas Rapold, The New York Times, 3 de fevereiro de 2012.
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