Ida
Ida – filme incomum
Ida é um filme incomum. Na definição do diretor, Paweł Pawlikowski, é “uma meditação sobre identidade, fé e responsabilidade”. Elogiado pela crítica americana e premiado em festivais, é considerado forte concorrente ao Oscar de Melhor Filme em Língua Estrangeira, a ser entregue em fevereiro.
Ida é um filme incomum. Na definição do diretor, Paweł Pawlikowski,é “uma meditação sobre identidade, fé e responsabilidade”. Elogiado pela crítica americana e premiado em festivais, é considerado forte concorrente ao Oscar de Melhor Filme em Língua Estrangeira, a ser entregue em fevereiro.
Mais do que a consagração crítica, tem peso decisivo no favoritismo ao Oscar o fato de Ida ser, nos últimos 25 anos, o maior sucesso de bilheteria nos Estados Unidos de um filme polonês inteiramente filmado na Polônia. Produzido por $1800 mil dólares (cerca de R$ 4.800.000), já rendeu só no mercado norte-americano $3700 mil dólares (cerca de R$ 9.800.000).
Os elogios da crítica a Ida incluem “grande”, “fervorosa austeridade”, “pasmo”, “satisfação”, “obra-prima compacta”, “beleza sinistra”, “excepcional”, “contido, silencioso, perfeito”, “emocionante” e por aí vai.
Não é todo dia que surge um filme assim. Como entender seu aparecimento? Além de assistir ao filme, alguns indícios podem ser encontrados na palestra de Pawlikowski, em julho de 2014, na National Film and Television School, em Londres, disponível, em versão editada, no site do Guardian.
Vão resumidos, a seguir, alguns tópicos da palestra, em especial os que têm lições preciosas para profissionais e gestores de cinema atuantes no Brasil.
Formação e primeiros filmes – “Nunca frequentei uma escola de cinema, nunca aprendi as regras, e comecei fazendo documentários que em geral eu filmava e moldava à medida que ia fazendo. Começava com uma ideia, um personagem, uma situação; aí juntava à mistura toda espécie de coisas – cenas, imagens; algumas encontradas, outras inventadas. Aí embaralhava tudo – complicava, simplificava – até que eu encontrasse o filme. Esses filmes não eram documentários, nem ficções; eram híbridos estranhos que pareciam a melhor maneira e a mais simples de expressar uma verdade complexa. Como consegui me safar fazendo isso é um mistério.”
Roteiro – “A maioria dos roteiros, até onde podia dizer, eram literatura de segunda categoria e só pareciam fazer sentido no papel. Provavelmente eram muito úteis para contadores e planejadores, mas não tinham nada a ver com o filme vivo. Sem falar com a arte. Alguns roteiros – muito poucos – na verdade eram bem escritos e divertidos de ler, mas por que raios alguém iria querer dirigir um desses? O que havia para descobrir? Podia-se ver exatamente o tipo de filme que se tornariam. […] Um roteiro pode ser uma coisa útil, é claro. Mas Deus não permita levá-lo a sério demais e tentar filmá-lo como está escrito.”
Motivação – “O que me entusiasmava era a jornada para o desconhecido – ou, melhor, para algum lugar que você conhece e intui, mas você não sabe bem como chegar lá. Afinal de contas, é assim que a arte funciona em todas as outras áreas, e ninguém se opõe. Se você é um romancista, poeta, pintor ou compositor, você apenas se trancafia e trabalha na coisa, por uma semana, por um mês, por um ano – ponha a coisa de lado se precisar – e termine quando achar que está pronta.[…] Além de uma história, com dois ou três personagens interessantes, você só precisa uma ideia, emoção ou motivo transcendente para levá-lo por todo o processo. É claro que, ao dizer “só precisa” dessas coisas estou sendo meio cínico. “Essas coisas – o coração do seu filme – são de fato o mais difícil de conceber. Muito mais difícil do que produzir 90 páginas.”
Roteiro de Ida – “No caso de Ida, depois de quase uma década refletindo sobre as coisas, e um ano escrevendo e reescrevendo com minha brilhante e muito paciente co-roteirista Rebecca Lenkiewicz, acabei com 64 páginas que pareciam um filme e pareciam satisfazer os financiadores. […] Era o tipo de roteiro que podia servir para levantar dinheiro, mas com certeza não era o filme que eu queria fazer.[…] O filme que eu buscava seria feito de imagens gráficas fortes e sons. Funcionaria por sugestão em vez de explicação. Consistiria principalmente de cenas auto-contidas, feitas de um ângulo, em um plano contínuo, sem qualquer diálogo informativo, sem planos funcionais, sem nenhum dispositivo de enredo ou qualquer dos truques habituais que o cinema usa para provocar emoção. Um filme no qual forma, emoção e ideia seriam uma coisa só.”
Escolha da atriz – “Demos algum diálogo provisório a ela no roteiro, mas eu sabia que seria só quando tivesse escolhido a atriz certa que a personagem ganharia consistência e soaria verdadeira; só então eu poderia encontrar as palavras certas para ela. O problema era que não conseguíamos encontrar a atriz certa. Vasculhamos teatros e escolas de arte dramática em toda a Polônia por meses e não havia nenhuma Ida. No fim, cruzamos com uma mulher jovem, sentada no café embaixo de onde eu moro em Varsóvia, lendo um livro. Agata Trzebuchowska não era atriz, mas uma estudante de filosofia e estudos culturais na universidade de Varsóvia. Não apenas ela não era atriz, era uma dessas raras pessoas jovens que não tinha absolutamente qualquer desejo de trabalhar como atriz – perfeita para Ida.”
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Para quem já assistiu a Ida, os trechos acima podem servir para estimular a leitura completa da versão editada da palestra. Para quem ainda não viu o filme, servem para apresentar os termos nos quais o diretor, Paweł Pawlikowski, concebe seus filmes.
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