ILUSTRAÇÃO_FABRIZIO LENCI_VAPOR324_2018
Minhas casas, minha vida
Patrimônio imobiliário da família Temer cresce quase cinco vezes em vinte anos e chega a 33 milhões de reais
Allan de Abreu | Edição 143, Agosto 2018
A faixa urbana que começa na ponte do Jaguaré, perto do Parque Villa-Lobos, e se estende pela avenida Pedroso de Morais quase em linha reta até a avenida Brigadeiro Faria Lima, passando pelo Largo da Batata, compreende algumas das áreas mais valorizadas da Zona Oeste de São Paulo. Numa ponta está o Alto de Pinheiros, bairro muito arborizado, predominantemente residencial, repleto de praças e de casas de alto padrão dispostas ao longo de ruas sinuosas e pouco movimentadas. Mais adiante, quando se chega a Pinheiros, a paisagem se transforma. As casas dão lugar aos edifícios modernos e envidraçados da Faria Lima, onde se concentram alguns dos pontos comerciais mais cobiçados da capital. Endereço dos escritórios de Nizan Guanaes e Abilio Diniz, do BTG Pactual, fundado por André Esteves, e do Google, a Faria Lima se converteu numa das principais passarelas da riqueza que brota em solo paulistano. Desde que foi expandida, nos anos 90 – na chamada Nova Faria Lima –, a avenida passou a cortar também o Itaim Bibi e deu vida nova à Vila Olímpia, o badalado bairro vizinho.
Alto de Pinheiros, Pinheiros, Itaim Bibi e Vila Olímpia são, também, bairros familiares a Michel Temer. Se a Operação Lava Jato não lhe reservar alguma surpresa, é na sua casa na praça Conde de Barcelos, no coração do Alto de Pinheiros, que o presidente da República vai se recolher com a mulher, Marcela, e o filho Michelzinho a partir de 1º de janeiro de 2019.
O vínculo da família Temer com a região, no entanto, vai muito além desse endereço. Michel Temer, as três filhas do primeiro casamento, sua atual mulher e o caçula têm hoje um patrimônio imobiliário concentrado nessa faixa da cidade que vale pelo menos 33 milhões de reais. Quase tudo foi adquirido nas últimas duas décadas, período que coincide com a ascensão política do patriarca, de deputado suplente a presidente da República.
De janeiro de 1998 até agora, a família Temer movimentou 61,7 milhões de reais na compra e venda de imóveis na Zona Oeste paulistana, conforme um levantamento inédito feito pela piauí. Nesses vinte anos, o patrimônio imobiliário do clã Temer aumentou quase cinco vezes – passou de 6,8 milhões para os atuais 33 milhões de reais (os valores descritos nesta reportagem foram sempre corrigidos pelo IGP-DI de março de 2018). Curiosamente, o presidente ficou mais pobre, ao contrário de Marcela e dos filhos, beneficiados por doações do patriarca.
Comecei a fazer o levantamento da evolução do patrimônio imobiliário da família Temer no estado de São Paulo em março último. A análise das transações se tornou viável a partir daquele mês, quando a Associação dos Registradores Imobiliários de São Paulo disponibilizou um sistema unificado de pesquisa em todo o estado. Se antes era necessário pesquisar em cada um dos 316 cartórios de imóveis do estado, agora basta um pedido de busca para obter a relação completa dos imóveis de uma pessoa física ou jurídica em todo o território paulista. Os valores descritos nesta reportagem são os que constam nas matrículas dos imóveis, o que nem sempre expressa o valor real da transação nem o valor de mercado do imóvel – em ambos os casos, eles costumam ser maiores. Um exemplo: uma sala na Faria Lima adquirida por Temer em 2011 por 1,58 milhão de reais, em números atualizados, tem valor de mercado de 4,3 milhões, de acordo com dois corretores que consultei em São Paulo.
Faz exatamente cinco décadas que Michel Temer, então com 27 anos, obteve seu primeiro imóvel. Caçula de oito irmãos, ganhou em 1968 de herança dos pais libaneses, Miguel e March, parte de uma chácara de 6 hectares em Tietê – imóvel que ele tem até hoje. Na época, Temer atuava como advogado trabalhista na capital, recém-formado pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, onde já estudavam três de seus irmãos: Adib, Elias e Fued. Lá, Temer tomou gosto pela política estudantil. Na época, três agremiações – chamadas de partidos – disputavam o diretório acadêmico: Libertador, Renovador e Independente. Temer escolheu o Independente, influenciado por um aluno veterano, quatro anos mais velho do que ele. Chamava-se José Yunes. Um e outro eram como duas faces de uma moeda: Temer, contido e cerimonioso; Yunes, expansivo, destacava-se pelo carisma. A unir os dois, a habilidade política para aglutinar e formar consensos. Pelo partido Independente, Temer se candidatou para a presidência do diretório, tendo Yunes como seu grande cabo eleitoral. Perdeu por poucos votos. Mas ganhou um amigo para o resto da vida.
Enquanto Yunes seguiu na advocacia privada, o amigo enveredou pelo setor público, de onde não mais sairia. Em 1970, Temer tornou-se procurador do estado de São Paulo. Também passou a dar aulas de direito civil e constitucional na Pontifícia Universidade Católica e em uma faculdade de Itu, no interior paulista. Na época, já estava casado com Maria Célia de Toledo, escriturária de uma escola pública da capital paulista. Do relacionamento nasceram, entre 1969 e 1974, as filhas Luciana, Maristela e Clarissa, nessa ordem.
Naquela época, o nome de Yunes já estava associado ao setor imobiliário paulistano. Atualmente, ele, os filhos Marcos e Marcelo e as empresas da família são donos de 68 imóveis na capital paulista, com valor venal somado de 102 milhões de reais (é sobre o valor venal do imóvel que são cobrados os impostos pelo poder público; quase sempre esse valor é inferior ao de mercado). Um dos parceiros dos negócios de Yunes com imóveis na década de 70 era Fued, o irmão mais velho de Temer. Aconselhado por Yunes, o jovem procurador do estado decidiu seguir os passos de Fued e passou a investir na compra de imóveis. Em 1977, no intervalo de dois meses, comprou quatro: duas salas comerciais na Bela Vista, região central de São Paulo, e dois terrenos no Butantã, bairro vizinho ao campus da USP. Coisa modesta. Três anos mais tarde, o patrimônio imobiliário de Temer deu um salto, passando de 1,9 milhão de reais para 3,4 milhões, devido à compra de dois apartamentos, um no bairro da Consolação e outro no de Santa Cecília, ambos na região central, muito valorizada na época.
Foi também pelas mãos do amigo Yunes, deputado estadual entre 1979 e 1987, que Temer ingressou na política partidária. Em 1981, o procurador filiou-se ao PMDB, apadrinhado pelo parlamentar e pelo futuro governador de São Paulo, André Franco Montoro (1983-87). Logo em seu primeiro ano de mandato, Montoro nomeou Temer procurador-geral do Estado. Um ano mais tarde, ele virou secretário de Segurança Pública, mesmo sem experiência na área.
No novo cargo, Temer tinha à disposição quatro oficiais da Polícia Militar – cabia ao grupo fazer a ponte entre o secretário e o comando da corporação. Um deles era o então major João Baptista Lima Filho. Por ser o único solteiro dos quatro PMs, Lima tinha mais disponibilidade de tempo para acompanhar o novo secretário. Das constantes viagens, nasceu outra amizade sólida de Temer. Foi Lima quem coordenou a primeira disputa eleitoral do novo amigo, em 1986, para uma vaga na Câmara dos Deputados. Ao registrar a candidatura no Tribunal Regional Eleitoral, Temer anexou, pela primeira e única vez, a sua declaração de Imposto de Renda relativa ao ano anterior. Naquele ano de 1985, o secretário de Segurança Pública teve um rendimento total de 340 mil reais, ou 26 mil mensais, em valores corrigidos, considerando o 13º salário.
Temer não conseguiu se eleger, mas já no início de 1987 obteve uma cadeira na Câmara Federal como suplente no PMDB, no lugar do eleito Tidei de Lima, nomeado secretário de Agricultura pelo governador Orestes Quércia. No mesmo ano, tomou parte na Assembleia Constituinte. Ao fim do mandato de estreia, em 1990, seu patrimônio imobiliário chegava a 5 milhões de reais. Ele havia comprado três casas em Alto de Pinheiros – seus primeiros investimentos no bairro – e passado a morar com a mulher e as filhas em uma das residências, na rua Bennet. No pleito de 1990, Temer ficou novamente na suplência para uma vaga na Câmara e reassumiu o posto de procurador-geral.
Sempre em busca de um lugar ao lado do poder, Temer foi fiel aliado de Quércia nos anos 80 e na década seguinte passou a apoiar Luiz Antônio Fleury, afilhado de Quércia que rompera com o padrinho e se elegera governador de São Paulo. Em outubro de 1992, dias após o massacre do Carandiru, quando 111 detentos foram executados pela polícia, Fleury nomeou Temer secretário estadual de Segurança Pública. Ficou por quase dois anos em sua segunda passagem pela pasta. Na gestão Temer, a PM contratou a consultoria da Argeplan para a construção de torres de telefonia. A empresa era do arquiteto Carlos Alberto Costa, amigo de João Baptista Lima e sócio dele em uma fazenda de gado em Duartina, no interior paulista. Em 1988, o próprio Lima havia assinado uma alteração no contrato social da Argeplan, como procurador da empresa. O caso chegou a ser investigado pela Assembleia Legislativa, sem resultados. Somente em 2011, já conhecido como coronel Lima, ele ingressou formalmente como sócio da Argeplan.
Temer passou ao largo dessa polêmica em torno do amigo. Em abril de 1994, assumiu outra vez como suplente na Câmara dos Deputados e, seis meses depois, conquistou nas urnas, pela primeira vez, uma cadeira na Casa. Sua vitória coincidiu com o naufrágio de Quércia, que, candidato à Presidência, não chegou a obter 5% dos votos – Fernando Henrique Cardoso se elegeu no primeiro turno, beneficiado pelo impacto do Plano Real. Com o ex-aliado nas cordas e sem Ulysses Guimarães a lhe fazer sombra – o líder do PMDB morrera dois anos antes, em um acidente aéreo –, Temer viu uma oportunidade única de ocupar o vácuo de liderança dentro do partido. Seria o início do reinado da “turma do pudim”, que coincidiria com o crescimento meteórico do patrimônio do deputado.
Se Ulysses Guimarães gostava de servir aguardente de pera nos jantares com seus aliados políticos – o que rendeu ao grupo o apelido de “turma do poire” –, os amigos de Temer no PMDB preferiam concluir suas refeições de forma mais sóbria, com pudim de leite e calda de caramelo. E não demorou muito para que Temer e seus aliados no Congresso – Geddel Vieira Lima, Moreira Franco, Eliseu Padilha, Henrique Eduardo Alves, Renan Calheiros e Jader Barbalho – ficassem conhecidos em Brasília como a “turma do pudim”. Era nas refeições arrematadas com a singela sobremesa que o grupo decidia o seu cardápio de demandas ao recém-eleito presidente Fernando Henrique Cardoso.
Líder do PMDB na Câmara, Temer controlava a maior bancada parlamentar, com 109 deputados. Em 1997, foi eleito presidente da Casa e garantiu a FHC 68 votos a favor da emenda da reeleição. Em troca, Geddel e Temer ganharam seu pedaço do pudim, na forma de cargos de gerência dos portos brasileiros, sob a tutela do Ministério dos Transportes, na época comandado por Padilha.
Geddel acomodou o pai, Afrísio de Souza Vieira Lima, na presidência da Companhia das Docas do Estado da Bahia, a Codeba; e Temer emplacou o nome de Marcelo de Azeredo à frente da Companhia Docas do Estado de São Paulo, a Codesp, que administra o porto de Santos. Azeredo era um jovem economista que ocupara cargos de direção na Eletropaulo e na Sabesp, as companhias de luz e saneamento paulistas, no governo Quércia. Depois de tentar, sem sucesso, uma cadeira na Assembleia Legislativa em 1994, presidiu a Codesp de junho de 1995 a maio de 1998. Foi um momento-chave para os portos brasileiros.
Em 1993, no governo Itamar Franco, havia sido aprovada a Lei dos Portos, que previa a concessão de todos os terminais portuários do país à iniciativa privada. Já sob FHC, a Codesp iniciou a licitação dos terminais do porto de Santos. O de número 37, uma área de pouco mais de 20 mil metros quadrados, foi arrematado pela empresa Libra – Linhas Brasileiras de Navegação s.a., pelo prazo de vinte anos. O contrato foi assinado em setembro de 1995, durante a gestão de Azeredo, o afilhado de Temer. Dezessete meses depois, em fevereiro de 1997, a Libra venceria outra concorrência por uma segunda área – os armazéns 34, 35 e 36, que somam 100 mil metros quadrados e se situam logo na entrada do canal do porto, uma localização disputadíssima.
As licitações no porto de Santos foram providenciais para a Libra, que, sob a batuta dos irmãos Torrealba – Celina, Gonçalo, Rodrigo e Ana Carolina – deixaria de ser apenas uma empresa de navegação marítima para se transformar numa das maiores operadoras de terminais de contêineres do país.
Na concorrência de 1997, a Libra se propôs a pagar um aluguel de 24 reais, em valores corrigidos, para cada metro quadrado dos terminais, valor dez vezes superior ao preço mínimo exigido pela Codesp. A cifra exorbitante fez com que a segunda colocada entrasse com recurso para anular a licitação, alegando que a proposta era inexequível, mas o argumento não foi aceito pela Codesp. O contrato foi assinado em junho de 1998, quando o engenheiro Paulo Fernandes do Carmo já ocupava a presidência da Codesp – mais uma indicação de Temer.
Assim que firmou o contrato, porém, a Libra passou a contestar as faturas de cobrança. Alegou ter recebido uma área menor do que a anunciada e reclamou que obras prometidas pelo governo federal, como a retirada da linha férrea dos terminais, não haviam sido executadas, o que impedia o cumprimento da produtividade esperada pela empresa. Em dezembro de 1998, depois de uma queda de braço, um novo contrato com condições mais favoráveis à Libra foi firmado.
Em abril do ano seguinte, Temer emplacou um terceiro nome de sua confiança para presidir a Codesp: Wagner Rossi, outro amigo dos tempos da faculdade de Direito da USP. Muitos anos mais tarde, Rossi viria a ser ministro da Agricultura de Lula e Dilma Rousseff – sempre na cota de Temer.
Enquanto reinava como eminência parda no porto de Santos, Temer foi reeleito deputado federal em 1998 e escolhido mais uma vez para a presidência da Câmara. Quem primeiro jogou luz sobre a sua influência nas docas foi o então presidente do Senado, Antônio Carlos Magalhães, o maior cacique do antigo PFL. Em guerra contra o PMDB por espaço no governo, acm declarou em 1999: “As coisas morais nunca foram o forte do senhor Michel Temer. A prova disso é a luta que ele trava pelo porto de Santos.”
Nessa mesma época, o patrimônio imobiliário da família Temer cresceu de forma vertiginosa: de 6 milhões de reais em 1995 para 11,2 milhões em 2000 – um aumento de quase 90% em cinco anos. Seguindo os conselhos do amigo Yunes, a família repetia a tendência que havia esboçado na década anterior, investindo em casas de alto padrão no Alto de Pinheiros e em apartamentos nos arredores da avenida Faria Lima.
Foi na gestão de Paulo Maluf como prefeito de São Paulo, entre 1993 e 1996, que a Faria Lima ganhou novas feições. Com 1 quilômetro a mais de extensão entre as avenidas Cidade Jardim e Juscelino Kubitschek, transformou-se numa importante via de ligação entre as zonas Oeste e Sul da cidade, um corredor paralelo à marginal do rio Pinheiros. A prefeitura alargou a avenida e alterou o uso do solo, incentivando a verticalização e a instalação de empresas no entorno. Edifícios modernos passaram a ocupar o lugar onde antes havia residências e pequenas fábricas. “Quem entende do mercado imobiliário sabia que essa área iria se valorizar muito, por causa do investimento público desde aquela época”, afirma o urbanista Nabil Bonduki, ex-vereador pelo PT paulistano. Na avaliação de Rodrigo Luna, vicepresidente do Secovi, o sindicato das imobiliárias de São Paulo, “a Faria Lima e o seu entorno são, hoje, o grande vetor comercial de São Paulo; por isso, a região é a mais valorizada da cidade”.
Entre 1996, quando se aposentou como procurador do estado, e 2000, Temer comprou seis imóveis nessa região: dois apartamentos na rua Padre Carvalho (Vila Olímpia); a casa onde mora até hoje na praça Conde de Barcelos (Alto de Pinheiros); um apartamento e duas salas comerciais na rua Pedroso Alvarenga (Itaim Bibi). Na época, era possível acumular os vencimentos de deputado (30 mil reais, em valores corrigidos) com o de procurador aposentado (pedi o histórico dos salários de Temer na Procuradoria do Estado, recorrendo à Lei de Acesso à Informação, mas não tive resposta até o fechamento desta edição). O teto salarial a partir dos contracheques dos ministros do Supremo Tribunal Federal só passou a ser regra a partir de 2003, com a promulgação da Emenda Constitucional nº 41.
Com tantas compras, a evolução do patrimônio imobiliário do então presidente da Câmara tinha tudo para dar um salto expressivo. Mas não foi o que ocorreu. Ao mesmo tempo que adquiria os imóveis, Temer os doava aos seus familiares (como ilustra o gráfico abaixo). O secretário de Comunicação Social da Presidência da República, Márcio de Freitas Gomes, que me respondeu em nome de Temer e da família, atribuiu as doações ao fim do casamento do político com Maria Célia de Toledo. A separação ocorreu em 1988, e só sete anos mais tarde, em 1995, é que o patriarca começou a doar seus imóveis, primeiro para a própria ex-mulher, que recebeu a casa onde o casal vivia na rua Bennet, no Alto de Pinheiros, depois para as três filhas. Até uma namorada, que era professora de inglês e deu aulas para Temer, foi beneficiada: ganhou de presente uma casa na rua Alberto Faria, no mesmo bairro. Só Eduardo, o filho que Temer teve com uma jornalista de Brasília no fim daquela década, ficou à margem da partilha de bens em solo paulista.
Após tantas compras e doações, a família enriqueceu; Michel Temer, não. Nas eleições de 1998, ele declarou ao Tribunal Superior Eleitoral um patrimônio total de 12,6 milhões de reais, mas no pleito seguinte estava mais pobre, com 8,1 milhões de reais, em valores corrigidos. Desde então, seu patrimônio declarado em anos eleitorais (que inclui, além de imóveis, veículos e aplicações financeiras) tem oscilado entre 9 e 9,5 milhões de reais.
Até receberem as doações do pai, as filhas de Temer não tinham nenhum imóvel em São Paulo. Em 1999, Luciana tinha 30 anos e já era formada em direito; Maristela, com 27, era estudante de psicologia; e Clarissa, com 25, já se graduara psicóloga. Em janeiro daquele ano, as filhas de Temer compraram, em sociedade, um apartamento em Santa Cecília. Em 27 de outubro de 2000, adquiriram mais duas salas comerciais no Edifício Lugano, na rua Pedroso Alvarenga, no Itaim Bibi, por 1,3 milhão de reais, em valores atualizados – no mesmo ano, Temer comprou mais duas salas, no mesmo edifício, da Quality Desenvolvimento Imobiliário, empresa de José Yunes, por 653 mil reais cada uma. Em 7 de novembro de 2000, as três filhas fizeram nova compra: um apartamento na rua Silvia Celeste de Campos, no Alto de Pinheiros, adquirido por 2 milhões de reais.
Analisando em conjunto as transações imobiliárias das filhas de Temer entre 1999 e 2015 (depois dessa data não há registro de compra e venda em nome delas), observa-se que Luciana é, de longe, a mais agressiva nos negócios. Sozinha ou com o marido, fez dezessete transações. Maristela e Clarissa fizeram três cada uma. Além das compras individuais, as três irmãs negociaram imóveis juntas outras nove vezes.
Numa das ocasiões, Luciana e o então marido, o advogado Fernando Oscar Castelo Branco, adquiriram em sociedade com quinze pessoas físicas e jurídicas uma área de 1,4 mil metros quadrados na rua Cardeal Arcoverde, em frente ao Largo da Batata, a poucos metros da Faria Lima. No empreendimento, o casal gastou, em 2013, 159 mil reais, considerando a participação de 4,5% deles no negócio. Na esteira do processo de revitalização da região, os antigos prédios dos terrenos foram demolidos para dar lugar, em 2015, a mais uma moderna torre de salas comerciais da região: o Condomínio Faria Lima Offices. Luciana e Castelo Branco receberam duas salas no 5º andar, avaliadas em 1,27 milhão de reais no total, conforme as matrículas em cartório. Entre os sócios no empreendimento estão a Gambier Finance, uma offshore sediada em Belize, na América Central, e o empresário Jacques Feller, alvo, em 2007, da Operação Kaspar 2 da Polícia Federal, numa investigação que desvendou um esquema de evasão de divisas e lavagem de dinheiro envolvendo bancos suíços.
Luciana Temer não quis falar comigo por telefone. Por WhatsApp, disse: “Os imóveis têm duas fontes: os que estão em meu nome e em nome das minhas irmãs foram doação do meu pai como adiantamento de herança. Ele tem cinco filhos de relações diferentes e quer deixar a questão hereditária o mais organizada possível. A outra fonte é fruto de construção de vida e de dezesseis anos de casamento com o meu ex-marido, que é advogado como eu.”
Enquanto as três filhas investiam no mercado imobiliário, o pai engatava um namoro com uma jovem de 19 anos, 43 mais nova que ele. Marcela Tedeschi Araújo fora Miss Paulínia, sua cidade natal no interior paulista, e trabalhava como recepcionista em um pequeno jornal quando Temer a conheceu durante um encontro do PMDB em São Paulo. Casaram-se em julho de 2003. No ano seguinte, Marcela, que até então não tinha patrimônio em seu próprio nome, adquiriu uma casa em Paulínia. Sete anos mais tarde, aumentou seus bens ao comprar, por 1,2 milhão de reais (corrigidos pela inflação), uma casa na rua Castro Delgado, no Alto de Pinheiros. Quem vendeu o imóvel para Marcela foi José Yunes, o velho amigo de seu marido.
No início do século, uma briga entre marido e mulher arrastou Michel Temer para o centro de um escândalo na Codesp. A então estudante de psicologia Érika Santos entrou com um processo de dissolução de união estável, na Vara de Família de Santos, contra Marcelo de Azeredo. Pedia pensão de 10 mil reais mensais. Para justificar a cifra, alta para os padrões da época, os advogados de Santos argumentaram que o ex-marido tinha muitos bens em nome dele e de “laranjas”, adquiridos de forma ilícita. E anexaram ao processo planilhas retiradas do computador de Azeredo que sugeriam o repasse de propinas por parte da Libra e da Rodrimar, outra concessionária de terminais no porto, a pessoas identificadas como “MA”, “MT” e “L” – que seriam, supostamente, Marcelo de Azeredo, Michel Temer e João Baptista Lima Filho, o policial militar amigo de Temer que se aposentara nos anos 90. “Lima quer participação p/ MT + MA + L (em torno de 20%)”, diz um trecho da planilha. Em outro, há referência a duas das áreas arrendadas pela Libra em 1998: “Arrend. Armaz. 34/35 + pátio p/mov. contêiner invest. 40 milhões”, seguido da anotação: “Lima está terminando contrato. Percentual ainda não acertado… MT + MA + L.”
Foi nessa época que o coronel Lima, assim como Temer, engordou seu patrimônio imobiliário. Em 2000, comprou da offshore uruguaia Langley Trade Corporation um apartamento dúplex de 446 metros quadrados no Jardim Europa, em São Paulo, por 2,2 milhões de reais, em valores atualizados. Com a compra, seu patrimônio imobiliário passou de 2,5 milhões de reais para 4,7 milhões. Cinco anos mais tarde, em 2005, ele pagaria 790 mil reais para ampliar em mais de 500 hectares sua fazenda em Duartina.
Apesar das suspeitas, Lima não foi investigado no inquérito que a PF em Santos instaurou, em 2004, para apurar os crimes de corrupção, fraude em licitação e evasão de divisas por parte de Temer e Azeredo. “Na época, não sabíamos quem era o Lima que aparecia nas planilhas”, disse Cássio Nogueira, delegado responsável pelas investigações. Então deputado federal, Temer foi intimado três vezes a prestar depoimento sobre as acusações, mas não respondeu a nenhuma delas. Em tese, o seu comportamento poderia justificar um pedido de prisão temporária ao STF, mas nada ocorreu.
Érika Santos acabou mudando sua versão sobre o caso. Ao ser intimada a depor, retirou todas as acusações contra o ex-marido. Ainda assim, em razão de Temer ter foro especial, a investigação foi enviada ao STF, mas só em fevereiro de 2011, sete anos após o início do inquérito. Três meses depois, em maio, o ministro Marco Aurélio Mello decidiu pelo arquivamento do caso em relação ao deputado – uma agilidade no trâmite processual pouco comum no Supremo. Azeredo seguiu sendo investigado na Justiça Federal em São Paulo, em inquérito sigiloso, que também foi arquivado, segundo seu advogado, Antônio Sérgio Pitombo. “Não há qualquer documento válido naquele material que pudesse servir como indício contra ele”, afirmou o defensor.
O ano de 2011 foi profícuo para a família Temer. Logo em janeiro, o patriarca assumiu a Vice-Presidência da República. Era o corolário da aliança do PMDB com o PT, selada entre Temer e Lula no segundo mandato do petista. Nos dois últimos anos desse período, Temer fora eleito, pela terceira vez, presidente da Câmara, com apoio do PT. Mas nada se comparava ao poder político de uma Vice-Presidência. Em 6 de maio de 2011, Temer formalizou a compra de dois escritórios comerciais, com 288 metros quadrados e dez vagas na garagem cada um, no penúltimo andar do Edifício Spazio Faria Lima. O negócio fora acordado oito anos antes, em janeiro de 2003, por meio de um contrato de gaveta com a Quality Desenvolvimento, que depois mudaria o nome para Yuny Incorporadora, dirigida por Marcos e Marcelo Mariz de Oliveira Yunes, filhos de José Yunes. Temer pagou pelos dois imóveis 3,1 milhões de reais no total, em valores corrigidos. Duas semanas depois, em 23 de maio, transferiu as propriedades para a Tabapuã Investimentos e Participações Ltda. Criada em meados de 2010 por Temer e sua filha Luciana, a Tabapuã teve o capital social aumentado de 10 mil reais para 2,2 milhões de reais um dia após os dois escritórios terem sido transferidos para o nome da empresa, que é administrada por Adib, irmão do presidente.
Segundo Márcio de Freitas Gomes, secretário da Presidência, os imóveis foram adquiridos com honorários decorrentes de uma ação judicial impetrada por Temer e outros dois advogados na década de 70 e encerrada apenas em 2002. Quando pedi a ele detalhes do processo judicial (número de registro, partes, advogados), Freitas Gomes disse não poder informá-los. “São dados sigilosos do advogado”, afirmou. De acordo com ele, após comprar os imóveis, o presidente optou por transferi-los à empresa Tabapuã para facilitar o aluguel das salas. “Muitos poderiam se sentir desconfortáveis em alugar o imóvel diretamente dele”, disse.
O Spazio Faria Lima não é um edifício qualquer. Erguido em 2010, tem 33,8 mil metros quadrados de área construída e ocupa quase um quarteirão inteiro, entre a avenida Faria Lima e as ruas Iguatemi, Aspásia e Tabapuã. Coberto por vidros escuros, o prédio abriga uma agência bancária, casas de câmbio e corretoras de títulos imobiliários, entre outras empresas. O aluguel de uma sala comercial no prédio não sai por menos de 40 mil reais por mês, de acordo com imobiliárias consultadas pela piauí. Os números estão em sintonia com a valorização da Faria Lima. Em vinte anos, o valor médio do metro quadrado na avenida passou de 11,8 mil reais para 19 mil reais. Um crescimento de 61%.
Luciana Temer também foi às compras em 2011. Em 28 de outubro, ela, Castelo Branco e o sogro, Tales Castelo Branco, assinaram compromissos de compra de dez escritórios comerciais no edifício em construção FL Office, na rua Elvira Ferraz, esquina com a Faria Lima, no valor total de 15,6 milhões de reais – 1,6 milhão foi pago à vista e o restante, parcelado. Inaugurado em 2012, o FL Offices integra o condomínio FL Faria Lima, formado por três torres, sendo uma residencial e duas comerciais.
Com essas e outras compras de valores menores, o patrimônio imobiliário da família Temer deu um salto: passou de 10,3 milhões de reais em dezembro de 2010 para 30,4 milhões de reais doze meses depois. Um aumento de quase 200%.
Ao tomar posse como secretária de Assistência Social na Prefeitura de São Paulo, em janeiro de 2013, na gestão de Fernando Haddad, Luciana não informou a posse dessas dez salas comerciais. Fernando Oscar Castelo Branco disse por telefone que as dez salas comerciais foram compradas por ele e por seu pai. “Não tem relação com a Luciana. Quando nos separamos, em 2014, esses imóveis ficaram para mim.” Um advogado especialista em direito imobiliário e um juiz consultados pela piauí sustentaram que, formalmente, ela é coproprietária dos bens. Mas, ainda que essas dez salas fossem desconsideradas como bens da família, o patrimônio dos Temer cresceria 44% de 2010 para 2011.
Nesse mesmo ano de 2011, a Libra travou na Justiça uma disputa importante com a Codesp. A empresa dos Torrealba havia perdido, anos antes, uma ação contra a administradora do porto. A juíza Alessandra Nuyens Aguiar Aranha, da 4ª Vara Federal de Santos, condenou a Libra a pagar os valores acordados com a Codesp no contrato original. A arrendatária recorreu então ao Tribunal Regional Federal da 3ª Região, em São Paulo.
O recurso começou a ser julgado em 15 de setembro de 2011. Relator da apelação, o juiz federal Wilson Zauhy negou o recurso da empresa e foi acompanhado pelo juiz José Francisco da Silva Neto. Contudo, o terceiro e último julgador, desembargador Márcio Moraes, pediu vista dos autos e suspendeu o julgamento. Como a votação já estava 2 a 0 a favor da Codesp, o voto de Moraes não iria alterar o mérito do caso. A vitória da administradora do porto era certa. Entretanto, seis dias depois, a assessoria técnica do TRF publicou no diário oficial do tribunal a síntese do que o colegiado havia decidido, a denominada “tira de julgamento”, o que não poderia ocorrer antes do terceiro voto de Moraes. Não se sabe até hoje se houve erro ou má-fé. O fato é que, imediatamente, a Libra entrou com recurso pedindo que Zauhy se declarasse suspeito. O juiz deixou a relatoria e as partes abriram mão da disputa judicial e concordaram em levar o caso para arbitragem.
No fim de 2012, o impasse entre a Libra e a Codesp ganhou um novo capítulo. Dilma Rousseff editou uma medida provisória para modernizar os portos brasileiros que possibilitava, entre outras coisas, a renovação dos contratos de concessão de terminais em troca de novos investimentos por parte das arrendatárias. O texto original da medida vedava, porém, o benefício a empresas inadimplentes com o poder público, como era o caso da Libra.
Então líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha apresentou uma emenda que permitia a adesão de empresas devedoras caso estas aceitassem discutir dívidas antigas em processos de arbitragem, e não na Justiça comum. A proposta, na medida dos interesses da Libra, foi acatada por Dilma. A então presidente sancionou a lei em junho de 2013. Os Torrealba souberam retribuir o benefício. No ano seguinte, a chapa Dilma-Temer recebeu uma ajuda substancial do Grupo Libra – Ana Carolina Borges Torrealba e Rodrigo Borges Torrealba, sócios da empresa, doaram 500 mil reais, cada um, à conta bancária da campanha do emedebista.
No início do segundo mandato de Dilma, Temer emplacou mais um aliado para cuidar do porto de Santos. A pedido dele, em janeiro de 2015, a presidente nomeou o deputado federal Edinho Araújo, do PMDB, ministro-chefe da Secretaria Nacional de Portos, à qual se subordina atualmente a Codesp. Ao editar um decreto para regulamentar os processos de arbitragem, Araújo aproveitou para renovar o arrendamento dos terminais da Libra até 2035 em troca de um investimento de 750 milhões de reais da arrendatária no porto – em maio deste ano, o Tribunal de Contas da União julgou a medida ilegal.
Araújo ficou apenas dez meses no cargo. Dilma demitiu o ministro em outubro de 2015. Na famosa carta que enviou dois meses depois à presidente, aquela que começa com a citação em latim Verba volant, scripta manent (as palavras voam, os escritos permanecem), Temer inseriu a demissão do afilhado na lista de suas reclamações: “A senhora não teve a menor preocupação em eliminar do governo o deputado Edinho Araújo, deputado de São Paulo e a mim ligado.”
Em outubro de 2017, a dívida da Libra com a Codesp girava em torno de 2,78 bilhões de reais. A arbitragem entre as duas partes não havia sido concluída até o final de julho deste ano – seu prazo é setembro de 2019.
Logo após assumir a Presidência, em 2016, Michel Temer nomeou o amigo José Yunes como seu assessor especial. Mas o advogado não durou nem três meses no cargo. Em dezembro daquele ano, pediu demissão, após seu nome ter sido citado em delação do ex-diretor de Relações Institucionais da Odebrecht, Claudio Melo Filho. De acordo com o ex-diretor, 1 milhão dos 10 milhões de reais supostamente pedidos por Temer, para a campanha do PMDB nas eleições de 2014, foi entregue em dinheiro vivo no escritório de Yunes em São Paulo. Em depoimento à PF, o amigo de Temer confirmou ter recebido do doleiro Lúcio Funaro um “envelope lacrado”, a pedido do ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, mas disse ignorar que se tratava de dinheiro. Funaro rebateu Yunes. Em sua delação, afirmou que o amigo de Temer sabia que o tal “envelope” – na verdade uma caixa, segundo o doleiro – continha dinheiro vivo, a ser entregue posteriormente a Geddel Vieira Lima. Funaro também disse que Temer teria atuado na medida provisória dos portos editada em 2012, com o intuito de beneficiar a Libra.
No início de 2017, com base na delação do empresário Joesley Batista, do grupo J&F, a Polícia Federal instaurou um inquérito para investigar Temer e seu grupo político. Um dos alvos era Rodrigo Rocha Loures, deputado federal pelo PMDB do Paraná, homem de confiança do presidente. A pedido do então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, o STF autorizou a PF a monitorar as conversas telefônicas de Loures. Em um dos diálogos captados em 4 de maio, Loures pergunta a Temer a respeito de um decreto que ele assinaria dali a seis dias, aumentando de 25 para 35 anos o prazo das concessões das áreas portuárias. O diálogo dura dois minutos. Em seguida, Loures liga para Ricardo Conrado Mesquita, diretor da empresa Rodrimar, para repassar a informação. Mesquita comemora: “É isso aí, você é o pai da criança, entendeu?”
A gravação da PF serviu de base para a abertura de um novo inquérito, a fim de apurar supostas práticas de corrupção do grupo político de Temer no porto de Santos. Em fevereiro deste ano, a pedido da PF, o ministro Luís Roberto Barroso, do STF, autorizou a quebra dos sigilos bancário e fiscal do presidente. No mês seguinte, na manhã de 29 de março, a PF deflagrou a Operação Skala. Treze pessoas foram presas temporariamente, entre elas Yunes, Wagner Rossi (o ex-presidente da Codesp indicado por Temer), o coronel Lima, Antônio Celso Grecco (dono da Rodrimar) e Celina Torrealba (uma das proprietárias da Libra). Também foram apreendidos documentos nas sedes da Libra e da Rodrimar.
Em novo depoimento à PF, Yunes defendeu a legalidade das transações imobiliárias dele com a família Temer – “tudo foi registrado em cartório e também declarado no imposto de renda” – e disse desconhecer os donos do Grupo Libra e também o imbróglio entre a empresa e a Codesp no porto de Santos – “não tem conhecimento algum sobre o caso, lhe causando espanto as perguntas”.
Após passarem dois dias na carceragem da Superintendência da PF em São Paulo, Yunes, Lima e os demais detidos na Operação Skala foram soltos.
O advogado de Yunes, José Luís Oliveira Lima, argumentou que o inquérito da PF é sigiloso e por isso não poderia comentá-lo. “O único registro que cabe é o fato de José Yunes sempre ter se pautado pela correção e pela ética ao longo de mais de cinquenta anos de atividade profissional.” O coronel Lima afirmou, por meio de seu advogado Cristiano Rêgo Benzota de Carvalho, que “não cometeu qualquer ato ilícito ou irregularidade”.
Documentos e depoimentos colhidos pela PF demonstraram que parte dos 950 mil reais gastos por Maristela Temer com a reforma de uma casa que ela adquiriu por 1,3 milhão de reais no Alto de Pinheiros, em 2011, foi paga em dinheiro vivo. As obras ficaram a cargo da arquiteta Maria Rita Fratezi, mulher do coronel Lima.
Quando a Polícia Federal e a Procuradoria-Geral da República decidiram apertar o cerco contra Temer e seu grupo político, no ano passado, o presidente era um homem de poucos bens: tinha dez terrenos e uma chácara recebidos de herança dos pais em Tietê. Um patrimônio que soma apenas 101 mil reais, valor equivalente a apenas 0,3% do total de imóveis da família. Nem a casa em São Paulo, em que reside com a mulher e o filho caçula, pertence mais a ele – foi doada a Michelzinho, assim como as duas salas comerciais no Edifício Lugano que o presidente comprou de Yunes na virada do século. Temer ganha atualmente um salário mensal líquido de 25 mil reais, a maior parte decorrente de sua aposentadoria como procurador.
Já o coronel Lima, que recebe 16 mil reais por mês como oficial da PM aposentado, além dos ganhos como sócio da Argeplan, tem atualmente um patrimônio imobiliário de 4,7 milhões de reais, que inclui a Fazenda Esmeralda, de 2,1 mil hectares, em Duartina, em sociedade com o arquiteto Carlos Alberto Costa, o outro dono da Argeplan.
Por e-mail, o secretário de Comunicação da Presidência, Márcio de Freitas Gomes, disse que a evolução do patrimônio imobiliário da família é compatível com os rendimentos de Temer e que está tudo declarado em seu imposto de renda. “O presidente teve quatro fontes de renda razoáveis durante um longo período: foi procurador do estado de São Paulo, professor universitário em duas faculdades e advogado. E depois foi deputado durante várias legislaturas, vice-presidente e presidente da República.” Freitas Gomes rechaçou qualquer relação entre as concessões de terminais portuários em Santos e a evolução patrimonial da família.
Sobre a Operação Skala, da PF, Freitas Gomes negou que o presidente esteja envolvido em ilícitos e argumentou que, até o momento, o inquérito carece de materialidade. “O decreto dos portos não trouxe vantagens à Rodrimar, como a própria polícia admitiu. É uma investigação que não para em pé.”
O Grupo Libra não quis se manifestar. Em nota encaminhada pela assessoria de imprensa, a Rodrimar “esclarece que, em seus 74 anos, nunca recebeu ou atuou para receber qualquer privilégio do poder público”.
As investigações da Operação Skala são conduzidas pelo delegado Cleyber Malta Lopes em Brasília e tramitam no STF sob a relatoria do ministro Luís Roberto Barroso. Procurado pela revista, Lopes não quis se pronunciar. Até o fim de julho, o inquérito ainda não havia sido concluído.
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