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    Um ataque que procurasse de fato atingir os centros de poder e decisão hoje teria que visar e acertar não um alvo físico, mas entidades quase metafísicas, como Google, Amazon e Apple ILUSTRAÇÃO_MISHKA HENNER

questões contemporâneas

Arquitetura do nevoeiro

A sobreposição explosiva de opacidade e nitidez, incerteza e convicção, no tempo da “pós-verdade”

Guilherme Wisnik | Edição 144, Setembro 2018

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Em que pese o estado de “nublamento” da percepção que temos do mundo atual, não se pode deixar de reconhecer que, ao mesmo tempo, vivemos no império da nitidez, numa “sociedade da hipervisibilidade”, em que parte importante da população mundial possui câmeras fotográficas no bolso e tem acesso imediato à postagem das fotos que produz. A também chamada “sociedade da informação” é feita de precisão e de certezas. Se antes as dúvidas que se tinha sobre os mais variados assuntos precisavam ser respondidas com base no conhecimento acumulado das pessoas ou buscando informações em enciclopédias volumosas e em bibliotecas, hoje, por meio da internet, essas respostas são obtidas de maneira imediata e assertiva, ainda que não necessariamente correta. Assertividade autoconfiante que se prolonga no comportamento mediano das pessoas nas redes sociais e por intermédio delas se propaga. Pois, além de ser um riquíssimo espaço de pesquisa e de conhecimento em potencial, o ciberespaço é também – como meio de comunicação e interação – um “lugar” no qual as pessoas expõem muito menos dúvidas do que certezas. E as certezas exprimem vontade de nitidez, de explicitação, de definições precisas.

Vivemos, portanto, um momento histórico de inegável evidenciação da definição das coisas, que acompanha o crescimento vertiginoso do acesso à informação por meios digitais. Refiro-me ao hiperrealismo manipulado das imensas fotos de Andreas Gursky e Thomas Struth, por exemplo, no campo da arte, e ao bombardeio de imagens, sempre sedutoras e acessíveis, em nossas vidas, bem como à evolução das ferramentas digitais que permitem ampliarmos muito essas imagens em suas interfaces sem que elas percam nitidez, como no caso do Google Arts & Culture. É algo que se verifica também no protagonismo atual de uma plataforma como a do YouTube, que dá novos significados a tudo – como às músicas – pelo prisma das imagens em movimento. Evidenciação das coisas que igualmente ocorre quando, no Google Earth, mergulhamos ao léu em uma cidade qualquer e, usando o modo street view, conseguimos passear pelas ruas e até explorar o interior de alguns edifícios. Progressivamente mapeado e decodificado, o mundo se oferece a nós em imagens cada vez mais nítidas, nas quais as dúvidas e ambiguidades, ou zonas de sombras e incertezas, vão sendo apagadas.

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Reportagens apuradas com tempo largo e escritas com zelo para quem gosta de ler: piauí, dona do próprio nariz

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