A microempresária Claudia Maria de Miranda Lima de verde, amarelo e vermelho - Foto: Fernanda da Escóssia
A amarelinha sem monopólio
Eleitores de Lula inovam ao usar cores da seleção brasileira numa tentativa de recuperar símbolo apropriado pelo bolsonarismo
Nos últimos quatro anos, desde que a camisa da seleção brasileira virou símbolo de apoio a Bolsonaro, a microempresária Claudia Maria de Miranda Lima começou a sentir vergonha do verde-amarelo. Deixou de usar. Este ano, caiu em si: “Que maluquice é essa?, eu me perguntei. Esses símbolos são nossos.” Lima, eleitora de Lula, preparou com carinho o modelito para o dia da votação: calça de moletom verde, camiseta amarela com uma estrela. Na mão, um casaco vermelho. “Vivi o fim da ditadura, minha primeira lembrança política é a campanha pela anistia… eu me entendo como um ser político e não vou deixar que o bolsonarismo se aproprie de coisas tão representativas para mim, como as cores do meu país”, enfatiza.
Lima fez parte de um movimento tímido, mas perceptível, de recuperar o amarelo, que em 2013 começou a ser usado nas manifestações contra o governo Dilma Rousseff e de lá para cá se tornou a cor associada aos eleitores de Bolsonaro. Em muitas cidades brasileiras, como Rio de Janeiro e Brasília, as camisas amarelas de eleitores bolsonaristas, alguns com adesivo no peito, se sucediam nas ruas – mas num volume bem diferente do cortejo canarinho que tomou o país em 2018. Em Copacabana, na Zona Sul do Rio, a camisa da seleção foi a roupa que o porteiro Luiz Carlos Gomes escolheu para expressar sua opinião: “Sou patriota e sou Bolsonaro. A camisa está dizendo isso.” Em Botafogo, também na Zona Sul, o desenvolvedor Luiz Eduardo, 29, que não quis dar o sobrenome, também usava a amarelinha: “É apoio ao Bolsonaro e ao país. É um símbolo que a esquerda não tem como abraçar, porque defende um governo globalista, então não é patriota.”
Para eleitores brasileiros no exterior, o amarelo se mantém como símbolo do presidente candidato à reeleição – mas também foi usado por apoiadores de Lula. Na zona eleitoral de Madri, localizada no Colégio Maior Casa do Brasil, o empresário Marcos Aurélio Alves Martins vestiu a camisa com o intuito de deixar claro seu voto em Bolsonaro: “É para mostrar de que lado eu estou. Decidi um lado e quero que as pessoas saibam. É o mesmo que escolher um time e sair com a camisa dele na rua.” Residente na capital espanhola desde 2007, o paranaense participa pela terceira vez de uma eleição presidencial no exterior. Embora pense que o uso da amarelinha representa o lado escolhido, gostou que alguns apoiadores de Lula usaram a mesma vestimenta na Espanha. “Felizmente existe democracia aqui na Espanha. Não tem sentido deixar de usar certas coisas porque representa determinadas pessoas”, complementa.
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Natural de Balsas, no Maranhão, Lenesson Salles vive há três anos em Madri e trabalha com transporte de cargas. Acompanhado de dois amigos, compareceu à sua primeira eleição geral fora de casa e votou em Bolsonaro. Para ele, a camisa amarela representa sua origem, da qual tem muito orgulho: “Eu sou brasileiro, então eu posso usar quando for votar e onde eu quiser.” O maranhense diz que o uso da camisa teve a finalidade desvirtuada e quem mais perde é a democracia. “Associam a um partido de direita agora, assim como fizeram com a camisa vermelha para o PT ou outro partido de esquerda. Falta liberdade”, comenta Lenesson.
De volta à Zona Sul do Rio, a vontade de resgatar a cor símbolo do país levou o DJ João Maizena, 36, e a bartender Milina Lopes, 37, a saírem de amarelo neste domingo. Ela escolheu uma camisa amarela com a estrela vermelha, e ele, uma camiseta amarela com o “olê, olê, olê, olá” de Lula. Lopes trabalha num bar de rock em Ipanema e já usou a camiseta no expediente. “Algumas pessoas estranharam o amarelo, mas quando viram a estrela entenderam o recado”, conta. Para Maizena, usar amarelo é uma forma de dizer que os símbolos nacionais não são exclusividade dos bolsonaristas. “Este ano é ano de Copa e quero voltar a me sentir confortável com as cores da seleção. Eles roubaram a camisa da seleção, mas quero tomar de volta.”
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![Fernanda da Escóssia](https://s3.amazonaws.com/uploads.piaui.folha.uol.com.br/wp-content/uploads/2019/03/18131258/fernanda-150x150.png)
Jornalista e professora da Uerj. Foi editora da piauí, editora de Política do Globo e repórter da Folha de S.Paulo. Autora de Invisíveis: uma etnografia sobre brasileiros sem documento (Ed.FGV, 2021).
![Eduardo Chaves](https://s3.amazonaws.com/uploads.piaui.folha.uol.com.br/wp-content/uploads/2022/08/22004831/eduardochaves-removebg-preview-150x150.png)
É estudante de jornalismo na PUCRS, com passagem pela Universidade CEU San Pablo de Madri. Foi estagiário na piauí e na Band RS.
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