Consagração dos objetos que simbolizam os orixás no terreiro Ilé Maroketu Asé Ominarè, em São Paulo
A festa de Obalujé
Ensaio fotográfico numa cerimônia de candomblé
Rodrigo Zaim | Edição 193, Outubro 2022
Sou negro, mas tenho pais brancos de olhos claros. Eles me adotaram logo que nasci, em junho de 1991. Durante muito tempo, segui a religião de minha família, o kardecismo. Só me tornei umbandista aos 25 anos, quando senti necessidade de estreitar os laços com meus ancestrais. Também por isso criei a Ẹlẹ́gbára Lamb’s, uma microempresa que transforma fotos em cartazes (ou lambe-lambes, como gosto de dizer) e os espalha pela Grande São Paulo. Muitas das imagens retratam corpos pretos entregues às manifestações de orixás, caboclos ou pombagiras. Nas crenças de matriz africana, Ẹlẹ́gbára é uma das facetas de Exu, o mensageiro entre as divindades e os seres humanos.
Desde 2018, participo do Pluriversais, grupo de homens negros que se encontra semanalmente para discutir assuntos relacionados à masculinidade. Foi numa dessas reuniões que conheci o babalorixá Diego Santiago Montandon, um candomblecista mineiro de 33 anos. Ele fundou e lidera a Comunidade Girassol Egbé Ypò Òrun, localizada em Itaquera, na Zona Leste paulistana. Ali todos o tratam como babá Diego de Èsù. Um dia, a comunidade pretende virar uma escola afrocentrada, que oferecerá desde o ensino básico até cursos de pós-graduação. Professor de enfermagem na Universidade de São Paulo (USP), babá Diego sempre se preocupou com a educação de pretos e pardos, o que me faz admirá-lo muito.
Por enquanto, a Girassol abriga três terreiros. Um deles, o Ilé Maroketu Asé Ominarè, sediou os festejos de Olubajé em agosto. A cerimônia, que se originou no antigo Reino do Daomé, onde atualmente está o Benim, dura uma semana e homenageia Omulu, um dos membros da família Karejebe, constituída de outros seis orixás: Nanã, Euá, Obaluaiê, Iroco, Ossaim e Oxumarê.
O ritual de agosto também serviu para consagrar dois integrantes da comunidade: Thaís Ijìwalé, de 26 anos, e Reginaldo Olúmodupé, de 57. Ambos se converteram em sacerdotes naquela ocasião e podem, agora, abrir seus próprios terreiros.
Fotografei boa parte da cerimônia. Só deixei de registrar os momentos mais íntimos, que são restritos aos frequentadores da casa. Eu começava o trabalho pela manhã e o interrompia ao anoitecer. Curiosamente, não via as horas passarem. Nunca tinha pisado no terreiro de babá Diego. Mesmo assim, me reconheci em cada objeto de lá, em cada traje usado pelos devotos, em cada detalhe da festa, e constatei, mais uma vez, a força de minhas raízes.
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