A linda voz de Alaíde
Como a impressão digital, a voz humana é única e, talvez, este o seu maior fascínio. É certo que ela pode imitar tudo: outras vozes, os pássaros, outros animais, o sussurro do vento, o barulho das ondas do mar, o som das máquinas do mundo, mas seu timbre é único. Dentre uma infinidade de timbres há alguns que tem uma qualidade tão especial que, depois que o ouvimos, ficamos buscando aquele som, esteja ele onde estiver, com a mesma obstinação que um apaixonado persegue sua amada.
Como a impressão digital, a voz humana é única e, talvez, este o seu maior fascínio. É certo que ela pode imitar tudo: outras vozes, os pássaros, outros animais, o sussurro do vento, o barulho das ondas do mar, o som das máquinas do mundo, mas seu timbre é único. Dentre uma infinidade de timbres há alguns que tem uma qualidade tão especial que, depois que o ouvimos, ficamos buscando aquele som, esteja ele onde estiver, com a mesma obstinação que um apaixonado persegue sua amada. A voz humana é um instrumento e pode ser classificada pela sua tessitura, mas quando pensamos no timbre, o que dizer? Que é único. Quem consegue esquecer a emoção de ouvir pela primeira vez Chet Baker, cantando You don’t know what love is? E aí então sentir a inquietação que só se acalma quando descobrimos de quem era aquela voz. Assim também quando ouvimos Billie Holiday, Alaíde Costa. Diferentes. Únicas.
Chet Baker
Billie Holiday
Alaíde quando canta sempre provoca um grande silêncio ao seu redor. Começa a emitir as primeiras notas e deixa todos fascinados. Desde o início, no tempo da Bossa Nova, quando ela se apresentava naqueles shows com tanta gente e tanto burburinho, já era assim. Esse era o seu dom: ela extasiava todos, músicos e público e os silenciava. Eles eram só escuta. Ouvir Alaíde era algo assim como que sagrado.
https://youtube.com/watch?v=bhikNuRCDFI
Insensatez
Eu me lembro da primeira vez que a ouvi. Foi em 1964, estava em casa, assistindo a TV Record, o programa O fino da bossa, que era gravado no Teatro Paramount, em São Paulo. Quando ela começou a cantar eu já não estava na sala ouvindo, estava sei lá onde, num lugar imenso, indefinido – seria o céu?- sei lá, um lugar lindo e aquela voz me conduzindo e perguntando: Onde está você? Eu, sinceramente, não sabia. Só sabia que queria ficar lá, quem sabe, por toda eternidade
Onde está você
João Gilberto disse: “Quem canta deveria ser como quem reza”. Alaíde é assim. Quando canta, silencia o mundo. Conta Ruy Castro que “seu maior sucesso seria em 1964, ao silenciar o teatro Paramount com sua interpretação de Onde está você”. Neste mesmo ano ela participou de um show no teatro do XI de Agosto da Faculdade de Direito do Largo São Francisco, “onde Alaíde, como costumava fazer nos primeiros espetáculos da Bossa Nova em 1959, com Chora tua tristeza, ‘parou’ novamente o show, desta vez com sua interpretação do Onde está você.”
Alaíde Costa nasceu na cidade do Rio de Janeiro, em 8 de dezembro de 1935. Logo de início, participou do famoso programa de Ari Barroso, Calouros em desfile (1950) e teve a nota máxima. Foi aluna do grande Moacir Santos. Foi João Gilberto quem a apresentou para o grupo de compositores da Bossa Nova em 1959 e, assim, ela passou a integrar este grupo e a frequentar o apartamento do músico Bené Nunes, onde costumavam ir, além de João, Tom Jobim, Nara Leão, Sylvinha Telles, Carlos Lyra, Luiz Bonfá, Roberto Menescal, Ronaldo Bôscoli, Nana Caymmi, jovens artistas que naquele momento estavam fazendo uma música nova, uma bossa nova. Passou então a se apresentar nos diversos shows antológicos que aconteceram na cidade do Rio e ,em seguida, em São Paulo. Em 1962 Alaíde casou-se e veio para São Paulo, onde está até hoje. Dentre as canções que cantou e gravou, além de Onde está você e Chora tua tristeza, de Oscar Castro Neves e Lucervy Fiorini, estão Estrada Branca e Insensatez de Tom e Vinicius, Primavera, de Carlinhos Lyra e Vinicius, Ilusão à toa, de Johnny Alf, Lobo bobo, de Carlos Lyra e Ronaldo Boscoli, Minha saudade, de João Donato e João Gilberto, Solidão, de Dolores Duran e muitas outras
Ilusão à toa
Em 1972 gravou em dueto com Milton Nascimento a canção Me deixa em paz, de Airton Amorim e Monsueto, incluída no LP de Milton Clube da Esquina. Antológica.
Me deixa em paz
Em 2005, Alaíde recebeu o Prêmio Rival Petrobrás na categoria de melhor cantora. Depois lançou Voz e Piano, acompanhada pelo pianista João Carlos Assis Brasil, gravou as composições de Milton Nascimento e seu trabalho mais recente é Alaíde Canta Johnny – Em Tom de Canção (2012), com as composições de seu amigo e parceiro Johnny Alf. Uma boa notícia é que sua biografia – Faria tudo de novo – escrita por Ricardo Santiago, será lançada em breve. Alaíde continua seu caminho, seguindo sua inclinação, fazendo um trabalho belíssimo e discreto, tal como o amigo e parceiro Johnny Alf. Com sua linda voz, ela vai interpretando canções que povoam nosso imaginário. Belezas. E como um planeta de inconfundível luz, segue sua rota luminosa, no seu ritmo, desenhando inesquecíveis canções. E, se por acaso, alguém desavisado, perguntar a ela: “Alaíde, onde está você?”, ela calmamente responderá “Estou aqui” porque Alaíde sempre está aí, onde está a sua voz
E daí?
Mora na filosofia
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