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Festival piauí GloboNews de Jornalismo

Maratona investigativa, assédio nas redações e tietes da tecnologia: veja como foi o 1º dia do evento

Encontro internacional de jornalistas continua neste domingo

01dez2018_17h15
Com a participação da deputada eleita Janaina Paschoal, o Foro de Teresina, podcast de política da piauí, teve gravação ao vivo no primeiro dia do festival
Com a participação da deputada eleita Janaina Paschoal, o Foro de Teresina, podcast de política da piauí, teve gravação ao vivo no primeiro dia do festival /FOTO:RENATO PARADA

Quatro jornalistas convidados participaram neste sábado do primeiro dia do Festival piauí GloboNews de Jornalismo. O tema do encontro, que continua neste domingo, são os jornalistas especialistas, aqueles que conhecem os pormenores dos assuntos a que dedicam suas coberturas – os “setoristas”, no jargão da imprensa.

A cobertura completa do primeiro dia pode ser vista na fanpage do festival no Facebook, no perfil no Twitter e nos Stories do perfil da piauí no Instagram.

Na primeira mesa do dia, o convidado foi o jornalista investigativo argentino Hugo Alconada Mon, do diário La Nácion e colunista do New York Times em espanhol. Especialista em reportagens sobre corrupção, lavagem de dinheiro e fraude corporativa, Alconada Mon recebeu o prêmio Pulitzer no projeto Panama Papers, em 2017. Os mediadores da mesa foram o diretor de redação da revista piauí, Fernando de Barros e Silva, e a jornalista da GloboNews Renata Lo Prete.

Definido pelo diretor da piauí como um “maratonista do jornalismo investigativo”, Mon explicou seu método de trabalho, caracterizado pela disciplina rígida e por uma produção extensa – brincando, comparou-a com a do McDonald’s. “Tenho umas 20 investigações simultâneas, algumas delas com nove anos de produção e que ainda não foram publicadas.” Ele falou também de seu trabalho de acompanhamento de suas principais fontes – cerca de 300, afirmou. “Tenho controle do último contato que fiz com cada fonte. Quando passam 15 dias, recebo um aviso automático para mandar mensagem, e assim sempre manter a interação.”

Alconada Mon falou de seus cuidados para proteger suas fontes. “Uma das primeiras perguntas que faço é: quantas outras pessoas sabem disso? Se são três ou menos, não publico. Nesses casos, estimulo que a fonte faça a informação circular e, um mês depois, vejo se ela já está, de alguma forma, em circulação. Só então considero publicar.” Ele próprio já recebeu ameaças. “Mas não espero um beijo, um abraço e uma flor. Faz parte do nosso trabalho.”

Ao falar das consequências de suas investigações, Mon ressaltou um aspecto pouco debatido. “Dói saber que jornalistas amigos foram demitidos porque um anunciante deixou o jornal em consequência de uma investigação minha.”

Autor de reportagens sobre os desdobramentos internacionais da Lava Jato, que acompanha desde 2014, Alconada Mon criticou a decisão de Sergio Moro de tornar-se ministro da Justiça e da Segurança Pública do governo Bolsonaro, a partir de janeiro. “Na Argentina, a decisão dele foi mal recebida. Foi uma decisão egoísta, que manchou a Lava Jato. Aconteceu o mesmo na Mãos Limpas [na Itália] e no Peru, com a investigação contra Vladimiro Montesinos [chefe do Serviço Nacional de Inteligência no Peru entre 1990 e 2000]. Foram atraídos pelo canto da sereia.”

Após a fala de Alconada Mon, quem esteve no Festival pôde acompanhar a gravação ao vivo do podcast de política da piauí, o Foro de Teresina. O episódio estará disponível depois nos tocadores.

A segunda mesa do dia foi com a jornalista norte-americana Emily Ramshaw, editora-chefe do The Texas Tribune, que falou sobre a cobertura de políticas públicas locais e do modelo de negócio de sua publicação, baseado em doações e eventos patrocinados. Ramshaw comanda uma equipe que produz reportagens investigativas sobre temas locais e análise de dados e documentos de instituições públicas do estado do Texas. Ela faz parte do júri do prêmio Pulitzer e ganhou destaque anos atrás no diário The Dallas Morning News, com coberturas de repercussão nacional, como os casos de abuso sexual dentro da penitenciária para menores infratores do Texas. As repórteres Malu Gaspar, da piauí, e Andréia Sadi, da GloboNews, fizeram a mediação da conversa.

Sobre o modelo de negócios do Texas Tribune, Ramshaw afirmou que o desafio é justamente não ceder às pressões dos doadores. “Sempre dizemos: você está nos apoiando, mas não vai ter qualquer decisão sobre o conteúdo. Nunca ficamos dependentes de um doador”, explica. O perfil do Festival no Twitter traz mais informações apresentadas por Ramshaw sobre o financiamento do Texas Tribune:

A diversidade na redação é outra prioridade no Texas Tribune, dentro e fora da redação, segundo a jornalista. “Tomamos iniciativas para aumentar a diversidade nas nossas coberturas. Contratar jornalistas de diferentes origens, que falam espanhol, por exemplo, além de jornalistas negros de comunidades periféricas, é uma parte importante disso. Se não contarmos as histórias de um ponto de vista diverso, elas não terão diversidade.”

 

Na terceira mesa deste sábado, Hanna Rosin, apresentadora do podcast Invisibilia, da NPR, conversou sobre feminismo com Natuza Nery, comentarista da GloboNews, e Branca Vianna, apresentadora do podcast da rádio piauí Maria vai com as outras. Na revista online Slate, Rosin ajudou a fundar a seção DoubleX, com conteúdo sobre o universo feminino, e atualmente apresenta o podcast The Waves, que trata do mesmo tema.

Rosin disse que as redes sociais deram voz às mulheres – com o movimento #MeToo, contra o assédio sexual, que ganhou relevância mundial no ano passado a partir dos Estados Unidos. “Há distorções, há exageros nos movimentos que surgem das redes sociais, e é preciso aperfeiçoá-los, separando o que é verdade do que não é. A gente ainda não sabe como fazer, mas prefiro isso ao antigo mundo.”

A jornalista também comentou o seu livro “The End of Men”. Para ela, nos Estados Unidos, há uma sensação masculina de deslocamento que explica em parte a atual polarização na sociedade. “Os homens brancos não são mais o padrão, por isso assumiram identidade de vítimas, e isso gera um discurso raivoso.” A eleição de Donald Trump em 2016 contribuiu para piorar esse quadro, avaliou Rosin. Por outro lado, afirmou, a eleição de Trump também teve como consequência o fortalecimento do movimento feminista no país.

Sobre o podcast que ela produziu durante dez anos, Rosin afirmou que o segredo é criar uma empatia com o público. “Precisa haver um diálogo para que ele se sinta, de alguma forma, participante da conversa.” Rosin disse que se surpreendeu com a constatação de que a maior parte do público do podcast é masculina. “Aquilo foi chocante demais. Mostrou que os homens também se interessam pelo tema feminismo.”

Uma das perguntas da plateia foi sobre o papel dos homens no feminismo. A resposta: “Não assediem as mulheres. Não precisa usar um chapéu cor-de-rosa. Basta ser humano. E pagar suas funcionárias da mesma forma que seus funcionários.”

Jack Stewart, jornalista especializado em transporte e cidades na Wired, fechou a programação deste sábado. A mesa é mediada pelo repórter Raul Juste Lores, da Veja São Paulo, e por Mônica Waldvogel, jornalista da GloboNews. Formado em engenharia mecânica e jornalismo, Stewart cobriu ciência e tecnologia por quinze anos na BBC, onde foi apresentador do programa de rádio ‘Science in Action’, o mais antigo da rede britânica.

A tietagem na cobertura de tecnologia – como quando os jornalistas recebiam entusiasticamente cada novidade anunciada pela Apple – foi um dos temas abordados por Stewart. Segundo ele, houve evolução, à medida que os jornalistas se acostumaram aos grandes anúncios das novidades.

Ele citou a relação da Wired com a Tesla como exemplo. “Assim como fazemos com qualquer empresa, nós falamos bem quando algo bom é feito, e criticamos quando há algum erro. Fizemos recentemente críticas à Tesla e Elon Musk não gostou. A questão é que ele faz muitas promessas grandes e não nos passa informações suficientes para embasar essas promessas.” Stewart adiciona que é preciso cuidado para não fazer a cobertura dos empresários como se fossem celebridades. “Ele retuíta perfis de blogueiros, sites de fãs que não fazem críticas. E agora acha que estamos sendo críticos demais. Parou de nos seguir, depois voltou a nos seguir, e depois deixou novamente. Parece que se desacostumou com o que é o jornalismo.”

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