“Amor?” – atraso duplo
“Amor?”, dirigido por João Jardim, foi recebido com reações variadas pelos críticos dos principais jornais do Rio e de São Paulo – aplausos, elogios, algumas críticas moderadas e uma mais severa. Com exceção de Luiz Zanin Oricchio no “Estado de S. Paulo”, porém, todos sentiram necessidade de indagar qual seria o gênero do filme, tendo chegado a afirmar que seria “documentário de um lado e ficção do outro” e construído “no limite entre ambos”.
“Amor?”, dirigido por João Jardim, foi recebido com reações variadas pelos críticos dos principais jornais do Rio e de São Paulo – aplausos, elogios, algumas críticas moderadas e uma mais severa. Com exceção de Luiz Zanin Oricchio no “Estado de S. Paulo”, porém, todos sentiram necessidade de indagar qual seria o gênero do filme, tendo chegado a afirmar que seria “documentário de um lado e ficção do outro” e construído “no limite entre ambos”.
Fora o fato de João Jardim ter esclarecido no Festival de Brasília de 2010 que “tudo em ‘Amor?’ é cena, atuação”, como informa a matéria da Ana Paula Sousa na “Folha de S. Paulo”, o filme em si mesmo é eloquente nesse sentido, não deixando margem de dúvida que justifique a confusão alimentada pelos críticos.
“Amor?” é um filme encenado – o que ocorre diante da câmera foi propiciado pelo diretor, que sabe de antemão o que vai ser dito e tem o poder de filmar cada plano quantas vezes quiser (e o orçamento permitir) até ficar satisfeito com o resultado. O fato de as falas reproduzirem depoimentos reais, colhidos em pesquisa, não faz do filme um documentário. Pretender o contrário seria tão absurdo quanto considerar que todo filme baseado em fatos reais não é de ficção.
Preocupados com essa discussão de gênero, os críticos deixaram de lado o que realmente importa com relação a “Amor?” – o filme sofre de um duplo atraso, síndrome grave no cinema.
João Jardim se deparou com a mesma situação que levou Krzysztof Kieslowski a abandonar o cinema documentário na década de 1980, citada neste blog há duas semanas: “a impossibilidade de filmar o que mais o interessava.” Com trinta anos de atraso, Jardim constatou o que é evidente: “de tão extremas, algumas situações não poderiam ser relatadas pelos personagens reais” e “não tinha o direito de expor a segunda pessoa envolvida”.
O outro atraso refere-se à evidente relação, mencionada por alguns críticos, de “Amor?” com “Jogo de cena”, dirigido por Eduardo Coutinho, em 2007.
O fato de o projeto de “Amor?” anteceder o de Eduardo Coutinho, conforme Jardim declarou, não elimina sua aparência de contrafação. Enquanto em “Jogo de cena”, mais do que o conteúdo das falas, o que interessa é o dispositivo que instaura ambiguidade entre documentário e ficção, “Amor?” se limita a encenar depoimentos reais. Por melhores que possam ser algumas interpretações, é pouco para sustentar de pé o documentário de João Jardim.
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