Até cem anos de proteção a Pazuello e cinco para quem denunciou milícia no Rio
Justificativa foi de que documentos continham informação pessoal; o de Pazuello ganhou sigilo de um século, e as cartas, de cinco anos
Em novembro de 2012, duas cartas enviadas à Polícia Federal denunciaram a suposta atuação de um grupo de milicianos no Rio de Janeiro. O caso envolveria políticos locais e até funcionários de uma prefeitura, que estariam extraindo areia e barro de terrenos desocupados de forma irregular, com uso de tratores da prefeitura. As denúncias, escritas à mão, foram enviadas a um chefe do setor de inteligência da instituição, e continham nome e endereço dos remetentes, além da íntegra das cartas, com grafia dos denunciantes. Um dos documentos começa com a seguinte frase: “Caríssimo sr, bem sei que podes localizar-me e identificar-me, porém peço solenemente que não faça, por favor.”
Para proteger as informações, a PF impôs sigilo de cinco anos ao documento em 2013, classificando-o, no jargão jurídico, como “reservado”. E assim ficou até 2018. Um ano depois, já sob o governo Jair Bolsonaro, um cidadão solicitou acesso ao relatório, que foi fornecido na íntegra, sem ocultação nem mesmo do nome do remetente ou de seu endereço. Até pedirmos um posicionamento à PF, no dia 8 de junho, a informação ainda estava disponível na internet, em domínio público. Foi excluída no dia seguinte.
A CGU, órgão do governo que fiscaliza o funcionamento da LAI no país e toma decisões técnicas sobre se informações solicitadas por cidadãos devem ou não ser fornecidas, já havia decidido que sindicâncias arquivadas não configuram informação pessoal, coincidentemente em outro caso envolvendo as Forças Armadas. “Saliente-se novamente que o entendimento deste órgão de controle é que pedidos de acesso que têm por objeto procedimentos disciplinares concluídos devem ser publicizados, com a obliteração dos dados dos denunciantes e de outras informações protegidas por legislação específica, como dados bancários, fiscais e informações pessoais sensíveis”.
Procurada pela piauí, a PF afirmou que observa as prescrições da LAI sobre resguardo de dados pessoais. “Caso seja verificada falha pontual no tratamento de informações em determinado processo, serão imediatamente adotadas as providências necessárias à correção do erro e à verificação das responsabilidades porventura existentes”, disse a PF.
É mestre em jornalismo de dados pela Universidade Columbia e um dos diretores da Abraji
É designer e diretora do estúdio BuonoDisegno
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