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Questões da Ciência

Chegada e despedida

A virada do ano foi marcada por duas notícias importantes para quem acompanha a cobertura internacional de ciência. No fim de dezembro, o jornal La Nación, um dos mais tradicionais da Argentina, anunciou o fim da sua editoria de ciência. Numa tendência inversa, o Huffington Post, influente portal americano de notícias na internet, anunciou a criação de seu canal de ciência no início de janeiro.

Bernardo Esteves | 12 jan 2012_13h46
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A virada do ano foi marcada por duas notícias importantes para quem acompanha a cobertura internacional de ciência. No fim de dezembro, o jornal , um dos mais tradicionais da Argentina, anunciou o fim da sua editoria de ciência. Numa tendência inversa, o Huffington Post, influente portal americano de notícias na internet, anunciou a criação de seu canal de ciência no início de janeiro.

A nova seção do HuffPo estreou no último dia 5. No post em que anunciou a novidade, a editora do portal, Arianna Huffington, delineou os objetivos do canal:

Não há melhor momento que agora para lançar um espaço para explorar as grandes questões do nosso tempo, dada a explosão do pensamento medieval em nosso mundo – e não só nas margens. É um mundo em que temos senadores e candidatos à presidência que não acreditam na evolução e pensam que o aquecimento global é um mito. Um mundo em que os políticos não têm apenas suas ideias, mas também seus próprios fatos.

A iniciativa soa louvável, a julgar pelo tom do post de Huffington. No entanto, a notícia foi recebida com otimismo moderado pela blogosfera de ciência, devido à reputação controversa do HuffPo entre os divulgadores. O portal já foi acusado de dar espaço à homeopatia, ao movimento antivacinas e a ideias no mínimo duvidosas, como a tese de que o câncer é causado por fungos ou a alegação de que enemas são uma boa forma de prevenção contra a gripe suína.

Na segunda semana de janeiro, o cardápio do canal de ciência do Huffington Post incluía desde notícias mundanas, como uma reportagem sobre a ciência da ressaca, até reflexões mais elaboradas sobre a importância da divulgação científica ou o pouco apreço dos republicanos pela ciência. As próximas semanas devem definir com mais clareza o tom da cobertura de ciência do portal.

Sem ciência em
Do outro lado do rio da Prata, os leitores argentinos interessados por ciência estão órfãos com o fim da seção de ciência do . Desde o fim de dezembro, as notícias sobre o tema são publicadas sob a rubrica “Información General”, junto com relatos sobre cidades, segurança e sociedade. A reformulação editorial foi anunciada numa nota breve publicada em 17 de dezembro.

Em carta aberta ao jornal, jornalistas de ciência integrantes da Red Argentina de Periodismo Científico deploraram essa iniciativa do diário que, como eles destacam, foi o primeiro a noticiar a descoberta de fósseis em território argentino no fim do século 19 e a primeira comprovação experimental da teoria da relatividade geral, em 1919:

Entendemos que, dessa maneira, perde-se um importante espaço de difusão de temas científicos, o que implica uma desvalorização objetiva do conteúdo. Consideramos que a existência de seções específicas e definidas, especialmente de ciência, contribui para melhorar e profissionalizar ainda mais a tarefa dos jornalistas.

A ausência de um espaço específico para notícias de ciência não implica necessariamente no declínio da cobertura do tema. Tome-se o exemplo de um jornal prestigiado como o britânico The Guardian: ali, as notícias de ciência saem no primeiro caderno junto com outros relatos de interesse geral, sem que haja um espaço delimitado para o tema – e sem prejuízo na qualidade ou no volume da cobertura. Essa opção parece alinhada com uma visão da ciência como tema que perpassa inúmeros tópicos do noticiário tradicionalmente veiculado em outras editorias (vide o Código Florestal, a construção da usina de Belo Monte ou o acidente nuclear de Fukushima, por exemplo).

Mas não parece ser esse o caso de . Poucas semanas depois do fim da seção de ciência, a medida aparentemente acarretou uma diminuição do número de notícias sobre ciência e da cobertura da pesquisa local nas páginas do jornal, como notaram os observadores do Knight Science Journalism Tracker. De fato, na edição de 12 de janeiro, um texto sobre o paleontólogo argentino José Bonaparte aparece perdido entre relatos sobre crimes e o noticiário do verão 2012.

costumava se caracterizar por uma cobertura atuante de ciência. Um monitoramento da cobertura de ciência pela imprensa latino-americana feito por pesquisadores do Museu da Vida/Fiocruz e publicado numa coletânea de ensaios sobre o tema mostrou que, em 2006, esse jornal publicou um número de notícias sobre o tema acima da média do continente, com foco no noticiário local. Resta torcer para que o fim da sua seção de ciência não signifique uma ruptura com essa tradição.

(foto: Elke Örter)

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