Arthur Lira, em entrevista coletiva na Câmara dos Deputados, em outubro (Lula Marques/ Agência Brasil)
Como Arthur Lira tentou ajudar os irmãos Batista
O deputado articulou para mudar a jato a lei de arbitragem, o que favoreceria a J&F
A três meses da eleição presidencial de 2022, o deputado Arthur Lira, presidente da Câmara, arregaçou as mangas para agilizar a tramitação de um projeto que fazia uma mudança radical num tema ao qual ninguém estava prestando atenção — a lei de arbitragem. Por coincidência, a J&F, a holding dos irmãos Batista, havia sofrido uma derrota de 3 x 0 num tribunal de arbitragem na disputa que trava com a Paper Excellense, empresa do indonésio Jackson Wijaya, na venda da Eldorado, uma das maiores fábricas de papel e celulosa do Brasil. Desde então, a J&F se interessava em mudar as regras para, quem sabe, reverter o resultado desfavorável.
Lira então avalizou uma negociação que envolveu líderes de seis partidos. A articulação foi costurada pelo maranhense André Fufuca, também do PP, partido de Lira, e atual ministro do Esporte. A articulação resultou na apresentação de um pedido de urgência para aprovação do novo projeto de lei. A autora do projeto era a deputada piauiense Margarete Coelho, outra correligionária do PP e integrante do grupo da estrita confiança de Lira, que já a escalara para outras missões sensíveis.
No projeto, Margarete Coelho introduzia enormes mudanças na lei de arbitragem, incluindo o ponto de maior interesse da J&F: ampliava o “dever de revelação” dos árbitros. Ou seja, aumentava o conjunto de informações que todo o árbitro deveria informar previamente para afastar eventuais suspeitas sobre sua independência e imparcialidade. Até então, o árbitro deveria revelar tudo que pudesse gerar “dúvida justificadas”. No projeto, virava “dúvidas mínimas”. Era o que a J&F queria para tentar impugnar a nomeação de um árbitro no tribunal em que havia sofrido a derrota unânime.
A comunidade da arbitragem se mobilizou contra as mudanças e a urgência com que o projeto tramitava. O Comitê Brasileiro de Arbitragem (CBAr), associação que reúne o maior número de árbitros, advogados e estudiosos do assunto, deu telefonemas, fez reuniões e visitas a Brasília e apresentou notas técnicas. A Câmara de Conciliação, Mediação e Arbitragem Ciesp-Fiesp divulgou nota assinada por seu presidente, Sydney Sanches, ex-ministro do Supremo Tribunal Federal, refutando as alterações.
Diante disso, tornou-se imprudente colocar o projeto em votação às carreiras. Deu-se então o recuo. Em novembro, no mês seguinte à eleição presidencial, Lira participou de um seminário sobre arbitragem e anunciou que o projeto de lei estava adiado por tempo indeterminado. “Não haverá açodamento, tumulto”, disse. (A piauí procurou o deputado para perguntar por que havia acelerado a tramitação do projeto sobre a arbitragem, mas o parlamentar não quis dar entrevista.)
A tentativa de mudar as regras da arbitragem é um capítulo do litígio entre Jackson Wijaya e os irmãos Batista sobre o controle acionário da Eldorado. É a maior disputa corporativa em curso no país, que envolve cifras bilionárias, espionagem, ameaça de morte, golpes e contragolpes, orgulho, ganância e até questões de soberania nacional. Durante cinco meses, o repórter Breno Pires investigou o conflito, cujos desdobramentos mostram que os irmãos Batista, depois do vendaval da corrupção e de três temporadas na prisão, estão de volta à cena do jogo pesado.
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