Crédito: Joedson Alves/Anadolu Agency via Getty Images
Como as polícias de Brasília atuaram a favor do golpe
Policiais militares e federais tomaram decisões que facilitaram ataques no dia da diplomação de Lula e no 8 de janeiro
Ana Clara Costa, em reportagem publicada na edição de junho da piauí, faz um inventário da atuação de polícias militares do Distrito Federal e de agentes da Polícia Federal. A matéria mostra que, tanto no dia da diplomação de Lula, em 12 de dezembro, quanto em 8 de janeiro, as duas corporações tomaram atitudes que acabaram viabilizando o vandalismo em Brasília. No caso da PF, a prisão de um indígena justamente na data da diplomação foi permeada de ineditismos que insuflaram os baderneiros. No caso da PM, parte da cúpula da corporação ignorou os avisos de que as manifestações de 8 de janeiro poderiam ser violentas e planejou uma investida muito aquém do normal contra os manifestantes, dando tempo hábil para que vândalos destruíssem a Praça dos Três Poderes. A seguir, alguns dos pontos principais:
— A Polícia Federal esperou de sexta até segunda-feira para cumprir a ordem de prisão do indígena José Acácio Serere Xavante por “condutas ilícitas em atos antidemocráticos”. Deixaram para prendê-lo justamente no dia da diplomação de Lula, quando se sabia que a cidade seria tomada por protestos. A PF fez a prisão dentro de um ônibus lotado de bolsonaristas que estava a caminho do Palácio do Alvorada. E, violando a sua própria praxe, pela primeira vez levou o preso para a sede central da PF – que fica mais próxima do acampamento dos bolsonaristas no QG do Exército – e não para a sede local da corporação, a mais de 8 km de distância. A prisão produziu um dia de cão em Brasília, com incêndio de carros e ônibus, quebra-quebra, roubo de botijões de gás, ataque à sede da PF e uma delegacia da Polícia Civil. Ao depor na CPI da Câmara Distrital, o comandante do choque da PM, coronel Jorge Eduardo Naime Barreto, justificou por que ninguém foi preso. Disse que, quando a PM tentou fazer as prisões, “por incrível que pareça, os caras sumiram”.
— Em seu depoimento, George Washington Sousa, preso e condenado pelo fracassado atentado a bomba no aeroporto de Brasília, disse que mantinha contato com um “importante general do Exército” e que, no ataque à sede da PF em Brasília, ele havia conversado com bombeiros e policiais militares no local. Contou que ouviu deles que “não iam coibir a destruição e o vandalismo desde que os envolvidos não agredissem os policiais”. Sousa disse que acreditava que a “PM e o Bombeiro estavam ao lado do presidente” e que “em breve seria decretada a intervenção das Forças Armadas”. Em maio, ele foi condenado a 9 anos e quatro meses de prisão. Seu comparsa, Alan Diego Rodrigues, pegou 5 anos e quatro meses. O terceiro criminoso, Wellington de Souza, está foragido até hoje.
— Para fazer a segurança do dia 8 de janeiro, a cúpula da Polícia Militar do DF fez uma planejamento estranhamente aquém do normal. Escalou um major para cuidar da tropa na Esplanada, e não um tenente-coronel ou coronel, como era praxe. Em vez de oficiais, mobilizou alunos da Academia de Polícia Militar de Brasília sem equipamento apropriado. Não providenciou água nem comida para os policiais escalados. Não fez o planejamento operacional, em que se informa a quantidade de efetivo e a posição dos batalhões. Para piorar, na noite do dia 7, o subcomandante-geral da corporação, o coronel Klepter Rosa Gonçalves, determinou que todo o efetivo ficasse de sobreaviso em casa, e não de prontidão no quartel. Com isso, entre o acionamento de um oficial e sua chegada a campo, gastam-se pelo menos duas horas – tempo suficiente para que a Praça dos Três Poderes fosse destruída. O comum seria que deixasse ao menos um grupo de prontidão.
— A Polícia Federal realizou uma operação na casa do coronel Paulo José Bezerra, responsável interino pelo Departamento Operacional da PM e encontrou mensagens comprometedoras. Mostram que, quando cumpriu a ordem de deixar a tropa apenas de sobreaviso para o dia 8 de janeiro, o coronel Paulo José estava a par da gravidade dos atos. Ele tinha um informante dentro do QG que lhe dissera, no próprio dia 7, que os manifestantes estavam “preparados para a guerra” e “não vão ceder de forma alguma”. Alertava que havia risco de “morte” e que as coisas estavam “mais sérias do que muitos brasileiros estão imaginando”.
— No dia 8 de janeiro, o coronel Fábio Augusto Vieira, comandante-geral da PM, cumpriu seu dever. Pediu desde a noite do dia 7 que a tropa da PM fosse reforçada – e foi ignorado por seus subordinados. Ele entrou em ação, atuando nos confrontos e saiu ferido. Mesmo assim, ficou 24 dias preso até os investigadores descobrirem que não estava conspirando a favor do golpe. Já seus subordinados, que desobedeceram suas orientações, só agora começaram a ser, de fato, investigados. Em maio, o Ministério Público Federal concluiu que a atuação dos policiais militares não teve “dolo”. A PF apontou que o coronel Paulo José, que sabia por meio de um informante que os atos seriam violentos, incorreu apenas em “omissão”. O coronel Klepter Gonçalves, que deu a ordem para deixar a troca de sobreaviso, foi promovido a comandante-geral da PM quando o coronel Fabio Augusto estava injustamente preso. Segue no cargo até hoje.
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