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    Mateus Baldi, Eugênia Ribas-Vieira, Ieda Magri, Clarisse Escorel e Estevão Ribeiro Foto: Giovanna Silveira

flip 2024

Como nasce uma plaquete

Escritores experientes e novatos conversaram sobre os desafios de construir uma história em poucas páginas

| 10 out 2024_20h57
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Plaquetes são pequenos livros que comportam quase todo tipo de texto: crônicas, contos, ensaios, poemas. A estrutura mais breve é, por um lado, libertadora. O autor se despe da obrigação de construir uma história densa e pode experimentar cenas avulsas, vozes passageiras, que saem de cena tão rapidamente quanto entraram. Por outro lado, é um formato restritivo, sobretudo em prosa: nem toda história se desenvolve bem em tão poucas páginas. É difícil construir personagens críveis e dar senso de conclusão a um texto que mal começou.

Quatro autores de plaquetes discutiram o assunto nesta quinta-feira (10), em uma mesa da Casa de Histórias, na Festa Literária Internacional de Paraty (Flip). A casa é organizada pela piauí em parceria com a Netflix, a Janela Livraria e a editora Mapa Lab. Participaram da mesa Clarisse Escorel, Eugênia Ribas-Vieira, Estevão Ribeiro e Ieda Magri. A autora Fernanda Moreira, que também participaria, não pôde comparecer por motivos de saúde.

Os quatro escreveram histórias muito diferentes entre si, todas publicadas pela Janela em parceria com a Mapa Lab. A plaquete de Escorel, Diamantes, entrelaça três contos centrados, a princípio, em três objetos concretos: jacas, diamantes e caliandras. A plaquete de Ribas-Vieira, Museu dos Sonhos, é um relato onírico, baseado em desejos inconscientes da autora. Largo Tereza amanhã!, de Ribeiro, é escrito da perspectiva de um homem obcecado por uma mulher. Um laço para três homens, de Ieda Magri, desfia a memória em três atos.

Nascido no Espírito Santo, Ribeiro é escritor, quadrinista e roteirista (trabalha atualmente na série Cidade de Deus, adaptada do filme homônimo). Ele contou que, convidado a escrever uma plaquete, quis se desafiar. “Será que consigo contar a história de um cara falando da mulher por onze páginas?” A dificuldade, ele explicou, era torná-lo multidimensional, e não a caricatura de um stalker. “É um personagem questionável, mas ao mesmo tempo o que ele sente pela Tereza é muito humano.” Ribeiro avalia que conseguiu o que queria: uma história de fôlego curto, mas bem delineada. “É um monólogo sobre Tereza e a relação do Ricardo com ela. Acho legal isso, um narrador que não é onisciente mas conhece muito da pessoa. Aquilo, para ele, é Tereza. O cheiro dela, como ela se veste, do que ela reclama.”

Magri relatou o mesmo dilema – agravado, no seu caso, por um formato mais experimental. “Minha plaquete continua uma investigação que tenho feito nos meus livros. Tento usar vozes diferentes que contam histórias parecidas, ou às vezes a mesma história. Uma voz mais irritada, uma mais melancólica, uma mais sonhadora…” Doutora em literatura, Magri publicou os romances Uma exposição (Relicário, 2021) e Ninguém (7Letras, 2016). “A dificuldade da plaquete era criar, num texto curto, personagens que não virassem tipos.”

Tanto Eugênia Ribas-Vieira quanto Clarisse Escorel escreveram histórias pessoais. A de Escorel é uma montagem de três contos escritos em momentos distintos, sobre assuntos diversos, que se unem pela relação que têm com os sentimentos da autora. Não foram pensados como uma plaquete, mas se adaptaram bem ao formato ligeiro. Entre os objetos analisados por ela está a jaca. “Desde a infância a jaca me intrigou. O cheiro me incomodava, o aspecto me incomodava. Mas, recentemente, meus vizinhos quiseram derrubar uma jaqueira e fui contra a ideia.” O texto se constrói em cima dessa contradição. Escorel é uma neófita na literatura: tem mestrado em direito internacional pela USP e publicou no ano passado seu primeiro livro, pela editora Ouro sobre Azul: Depois da chuva.

Ribas-Vieira, jornalista e agente literária, contou que a plaquete Museu dos Sonhos foi “uma concretização do meu trabalho como escritora”. Em vez de construir uma narrativa com começo, meio e fim, ela disse que se permitiu “simplesmente observar os sonhos e tentar contá-los”. Seu primeiro livro, Onde choram as crianças (Faria e Silva Editora, 2022), também é permeado pela linguagem onírica. “Nele, trabalho principalmente meus grandes pesadelos. Na plaquete, eu trabalhei os desejos, da infância à vida adulta. É um convite a todo mundo para que visitem seus próprios sonhos, e um convite à minha intimidade.”

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