Aplicação da CoronaVac: especialistas trabalham numa versão mais eficaz do imunizante - FOTO: DANILO VERPA/FOLHAPRESS
CoronaVac e o alfabeto das variantes
Butantan pedirá à Anvisa aprovação de uma dose de reforço da vacina; diretor diz que, em testes, nova versão do imunizante mostrou maior proteção contra mutações
O Instituto Butantan apresentará em julho à Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) o pedido para fazer testes em humanos de uma nova versão da CoronaVac elaborada na China com base na P.1, a variante do novo coronavírus identificada em Manaus. Estudos preliminares indicam que essa versão do imunizante oferece maior proteção contra todas as cepas já identificadas.
O instituto pretende aplicar essa nova versão como uma terceira dose de reforço, a chamada booster, do imunizante. Estudos preliminares em animais apresentaram resultados animadores, disse o diretor do Butantan, Dimas Covas, em entrevista à piauí. “É excelente a resposta” em relação à cepa indiana, a Delta na nomenclatura da OMS (Organização Mundial da Saúde). A versão aplicada desde janeiro tem eficácia de 50,38%, de acordo com dados informados pelo instituto.
A nova versão da CoronaVac “responde melhor a todas as cepas, porque a P.1 (Gama) incorpora as principais mutações observadas em outras variantes e isso explica a sua gravidade. Os anticorpos induzidos pela vacina P.1 nos ensaios in vitro, em animais, mostraram resposta às variantes da África do Sul (Beta) e da Índia (Delta)”, disse ele nesta terça-feira (29).
Os dados ainda não foram publicados e requerem ser testados agora em ensaios clínicos – isto é, em humanos – para se obter valores de sua eficácia. “Em termos de eficiência, é muito eficiente. Com relação especificamente à cepa original de Wuhan, é praticamente o triplo da eficiência neutralizante, segundo estudos de laboratório que ainda não foram publicados”, disse Covas. “Contra a P.1, a nova vacina contém três vezes a proteção.”
O epidemiologista Pedro Hallal disse ver com bons olhos a tentativa de implementar novas tecnologias que ajudem num programa de vacinação. “É sempre possível que os estudos em humanos encontrem resultados diferentes dos testes iniciais, mas parece que tem todo um acúmulo de conhecimento que faz com que seja bastante provável que os bons resultados dos testes se confirmem nas fases posteriores”, afirmou.
O diretor do Butantan afirmou que o instituto planeja com a Sinovac, a fabricante chinesa da CoronaVac, um braço do estudo clínico (em seres humanos) no Brasil dessa nova versão da vacina para Covid-19.
“Isso já foi objeto de conversa preliminar com a Anvisa no sentido de deixar bem claro o ambiente regulatório [para a aprovação do uso no país]. Vamos sem dúvida nenhuma, nas próximas semanas, apresentar essa proposta de estudo, que será como um booster”, afirmou, em referência a uma terceira dose de reforço do imunizante. As vacinas da AstraZeneca e Pfizer estão em processos similares de exame da necessidade de reforço, no Brasil e fora do país.
A Sinovac recebeu do Butantan amostras da cepa P.1 no início do ano, e a fabricante chinesa elaborou a nova versão do imunizante, de acordo com Dimas Covas. “Foram feitos estudos em animais e agora vamos fazer exatamente isso, progredir para o estudo em humanos”, uma vez obtida a aprovação regulatória.
O processo de pesquisa e desenvolvimento de uma vacina começa com a pesquisa básica. Depois realizam-se os testes pré-clínicos (in vitro e/ou in vivo), cujo objetivo é averiguar a segurança e o potencial imunogênico da vacina. Por fim, entra-se na terceira etapa, de ensaios clínicos, a mais longa e mais cara, subdividida em fases. A fase 1 é o primeiro estudo em ser humano para demonstrar a segurança da vacina. A fase 2 afere a imunogenicidade. A fase 3, a última antes da obtenção do registro sanitário, mede a eficácia. Se aprovada pela Anvisa, a nova vacina pode ser distribuída para a população. O Butantan reiterou que as duas doses da versão original da CoronaVac garantem a proteção e não é necessário o cidadão imunizado procurar o serviço de saúde para tomar a dose extra até orientação diversa.
De acordo com o epidemiologista Paulo Petry, não é comum que os estudos em humanos revertam totalmente os resultados obtidos com cobaias, “mas a possibilidade teórica de não se confirmar existe”.
Ele observou que a demora na vacinação em massa permite que o coronavírus causador da Covid circule, replique-se e sofra mutações genéticas, gerando as variantes. A P.1 de Manaus, por exemplo, é tida como responsável pela segunda onda – mais letal – em abril no Brasil.
Por isso é natural, nas suas palavras, que as vacinas demandem doses de reforço e atualização de tecnologia.
“A circulação de novas variantes preocupa pela perda de potência de proteção das vacinas, mas eu não diria que a Coronavac perdeu potência. Alguns estudos mostram que a redução da mortalidade de pessoas com mais de 80 anos é de 50%. Se nós entendermos que a grande mortalidade ocorreu a partir da circulação da variante P.1, a de Manaus, nós tínhamos a nova cepa e a grande maioria das vacinas inicialmente administradas foi a Coronavac, ela se mostrou eficaz. Não se sabe se perdeu algum ponto de proteção, mas que a proteção está se refletindo na redução de mortes, temos certeza disso”, afirmou Petry.
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