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    Ilustração: Carvall

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Senta a pua, Lula: não é hora de ficar na defensiva

Professor brasileiro radicado nos Estados Unidos escreve uma carta ao candidato na reta final da eleição

Marcelo Paixão | 25 out 2022_12h16
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A primeira vez que estive fisicamente perto de você, Lula, foi quando eu tinha 17 anos. Isso se deu no auditório do sétimo andar da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) no Centro do Rio de Janeiro. Estávamos em 1984, creio que em março, e haveria uma plenária do PT para discutir os rumos do partido na campanha das Diretas Já. Ali, bem na primeira fila do auditório, me acompanhava um amigo inseparável, o hoje jornalista Marcelo Gaba. Quem o conhece sabe que Gaba é aquele típico mineirinho prosador bem boa-praça. Aquele que todo brasileiro gostaria de ter um para chamar de seu. Pois bem, ele estava sentado do meu lado e havia imensa expectativa de que você iria estar lá para coordenar nossas mobilizações. Afinal, era aquela cidade a caixa de ressonância política do país em um momento tão decisivo nos estertores da ditadura militar. Você de fato compareceu, e sua presença seria inesquecível para o irriquieto e magricela adolescente negro ainda em suas primícias para entender as desgraças do mundo. Daquele encontro não me passou despercebido um detalhe que compartilhei com o velho compadre: “Gaba, o Lula não tem um dos dedos da mão…” Como diz mestre Candeia, “vejo o tempo entregar à distância minha mocidade”. As memórias da campanha das “Diretas” já vão se perdendo na poeira do tempo, não é mesmo? Que dias bonitos foram aqueles.

Lula, dirijo este texto a você. E se o faço não é para compartilhar minhas antigas memórias, que não devem interessar a muita gente. Não posso perder kbits de computador falando abobrinhas enquanto vejo meu país se afundando no lamaçal da burrice e da covardia acompanhando o rastro das botinas de um candidato a autocrata. Sei que você não lerá este texto, o que é compreensível. Mas talvez algum assessor mais próximo o faça. Se o fizer, por favor, companheiro assessor, repasse ao menos uma síntese ao candidato. Mas se nem isso acontecer, paciência. Ao menos cumpri o que julgo ser o meu dever cívico, político e moral ao longo de uma semana que certamente será tão decisiva para todos nós.

Tão longe que nem sei, escrevo este texto daqui de Austin-Texas, a cerca de 8 mil km da minha eterna Cidade Maravilhosa. Aqui não me sopra a brisa da “alma encantadora das ruas”, tal como na não menos encantadora expressão do célebre cronista João do Rio. Longe sim, alienado não, vim acompanhando com viva atenção o andamento das eleições brasileiras. Assisti a algumas de suas entrevistas e participações em debates e aproveito para lhe dar algumas sugestões. Mesmo não mais filiado ao seu partido, entenda que elas são dadas com a exclusiva intenção de ajudar.

Certamente sigo lhe admirando muito. Você já está cascudo em debates. Eu sou mais experiente em sala de aula, afinal de contas é minha profissão. Mas isso não nos exime de dialogar francamente quando percebemos que podemos – você e todos nós – afiar nossos argumentos. Precisamos derrotar o neonazifascismo que bate às nossas portas. Portanto, às favas com desnecessários protocolos e formalismos.

No último debate antes do primeiro turno na Globo você foi provocado pelo Padre Kelmon (PTB). Ele, em dobradinha com o candidato à reeleição, lhe agrediu verbalmente de forma especialmente insidiosa. Com justificável motivo, você ficou zangado, fez cara feia para ele e o chamou de impostor. De fato, talvez até por não ter sido tão diretamente agredida, a candidata Soraya Thronicke, do União Brasil, teve mais tranquilidade para ser mais espirituosa, chamando-o de “padre de festa junina”. Mas deve ser mesmo efeito inebriante do duplipensar ver que um candidato presidencial pelo partido de Roberto Jefferson, que estava em prisão domiciliar usando tornozeleira eletrônica, tenha se dado ao luxo de ir para cima de você com aquele tipo de vitupério (os fatos recentíssimos demonstraram que além disso o sr. Jefferson é também capaz de atos terroristas). “Fala sério!” Ah, que saudades do humorista Bussunda.

Não preciso de bola de cristal para saber que, ao longo desta semana e no último debate presidencial a ser realizado nesta sexta, 28 de outubro, você voltará a ser incessantemente cobrado pelo tema da corrupção, inclusive as que foram reveladas nos tempos em que o PT esteve no governo. Você vem corretamente apontando que os culpados foram punidos, mas que processos que pesavam contra você foram ou integralmente anulados ou resultaram em vossa absolvição. E depois que vieram à tona as conversas taciturnas de Sergio Moro, Deltan Dallagnol e o conjunto dos procuradores envolvidos na Operação, soubemos que na Lava Jato o combate à corrupção era apenas um meio – no caso, a pavimentação das vias para um golpe de Estado – e não uma finalidade em si. As suas respostas àquelas acusações são pertinentes. Mas elas podem melhorar.

No debate antes do primeiro turno na Globo você foi cirúrgico nessa questão. Ninguém combate a corrupção se autoproclamando honesto. Se queremos extirpar essa chaga da vida política nacional, ampliemos os mecanismos de controle, transparência e poder de investigação dos órgãos competentes para tal. Malgrado todas as dificuldades e contradições, durante seus anos em Brasília, os governos petistas criaram ou incrementaram as formas de mecanismos de transparência pública e controle do Estado. A criação da Controladoria-Geral da União (CGU), do Portal da Transparência, a autonomia do Ministério Público para fiscalizar as ações do governo, o tom duro mas respeitoso com os meios de comunicação. Em suma, estas foram as ações concretas realizadas pelo seu governo para combater a corrupção. E que funcionaram. Pelo menos até o momento que determinados procuradores resolveram assumir o papel de justiceiros.

Em tempo de totalitarismo pós-moderno é risível a suposição de que no atual (des)governo não tenha havido corrupção. O orçamento secreto do Centrão é o quê? E as acusações que pesam sobre o ex-ministro de ouro da Educação? E as rachadinhas? E a compra por parte de familiares de dezenas de imóveis com dinheiro vivo? E os sucessivos decretos impondo o sigilo de 100 anos sobre as decisões de governo? E a tentativa de compra de vacinas superfaturadas para o combate à Covid? E as seguidas anistias de multas ambientais a garimpeiros e fazendeiros? O candidato à reeleição é filiado a um partido que tem como presidente Valdemar Costa Neto, um dos condenados no julgamento do mensalão? Que absurdo, não é mesmo? Será mesmo que o atual mandatário é a pessoa adequada para nos dar lições de combate à corrupção? Parta para cima dele, Lula. Você não precisa ficar na defensiva no que tange à transparência da gestão da coisa pública e no combate à corrupção. O atual mandatário é quem tem muitas, mas muitas, explicações a dar.

No último debate promovido pelo pool liderado pela Bandeirantes apareceu o tema da privatização. Venho de uma família de funcionários públicos, situação que a rigor, como professor da Universidade do Texas, ainda sigo sendo. Portanto não tenho simpatia por essa política, tal como você também não tem. Porém, Lula, há a necessidade de acenarmos mais pungentemente para os eleitores de centro e da direita não radical. E nesse tema temos uma bela oportunidade antes que um problema. Seu vice é Geraldo Alckmin, e os tucanos não erraram quando privatizaram o sistema Telebrás/Embratel. Em plena era da telefonia celular, das tecnologia “xG” e da Internet, não tínhamos mais como ter filas de pessoas amontoadas contando dinheiro vivo nas portas das empresas de telecomunicação para poderem comprar um mísero telefone de parede uma das outras. Indiretamente seus programas de combate à pobreza foram incrementados pelo fato de os trabalhadores de baixa renda do setor informal terem acesso a um celular, assim agilizando o estabelecimento dos acertos para a prestação de um serviço ou venda de algum produto. Neste momento tão complicado para a vida do país, não há porque não se reconhecer que antigos tucanos acertaram nessa medida. Nós precisamos unir contra o totalitarismo pessoas das mais distintas inclinações políticas, e aqui temos um bom caminho para a consolidação de um mínimo de diálogo entre elas.

Não acho que a privatização da Companhia Vale do Rio Doce tenha sido benéfica para o país, mas honestamente não tenho tanta certeza sobre as empresas do setor siderúrgico. Deixe patente que você entende que empresas como a Petrobras, Banco do Brasil, Caixa Econômica, os Bancos do Norte e Nordeste, as universidades, os Correios entre outras empresas consideradas estratégicas para o interesse nacional não serão privatizadas. Aliás, em um momento em que o tema dos insumos energéticos tão fortemente voltam ao centro do debate na seara internacional, sugerir que abramos mão da Petrobras soa como um verdadeiro despropósito. Você pode cobrar isso do candidato à reeleição. Mas, se essa questão aparecer no debate, não feche as portas de antemão para essa política em qualquer contexto. A Empresa de Planejamento e Logística S.A. (EPL), aquela do malsucedido projeto do trem-bala entre o Rio e São Paulo, é um ilustrativo caso.

Em suma, Lula, o tema da privatização é somente um exemplo. A recomendação é que nos debates, diante de temas semelhantes, você sinalize com mais denodo para o voto de centro, para a direita não radical e os indecisos que certamente não concordam com suas orientações mas sabem os riscos que a democracia e a sociedade brasileira correm neste momento. Nesta altura do campeonato, não adianta pregar apenas para os que já estão convertidos.

Volta e meia aparece o atual mandatário se jactando da criação do Pix – um ato do Banco Central, planejado desde a gestão de Michel Temer no Planalto, e não exatamente do atual presidente. De fato, não custa reconhecer que o Pix foi uma medida acertada e que caiu no gosto da população. Mas será que o atual governo fez isso sozinho? Não é o que depreendemos lendo o Relatório da Inclusão Financeira do Banco Central de 2011. Esse documento indicou que, entre 2006 e 2010, os que tinham acesso aos serviços financeiros saltaram de 91 milhões para mais de 115 milhões, um aumento muito superior à taxa de crescimento da população adulta no país no mesmo período (1,5%). Se hoje tanta gente faz uso do Pix, isso só pode ter ocorrido porque aumentou o número de pessoas com acesso aos serviços financeiros. E isso só ocorreu pela ampliação da rede de proteção social. Sem essas medidas prévias não haveria como haver transações financeiras pelo Pix pelo simples fato de que um razoável percentual da população brasileira sequer tinha conta bancária. Companheiro Lula, anota essa. Se necessário atualize esses dados. Mas não deixe seu oponente levar essa assim na maior.

Outra questão que certamente vem dando uma imensa agonia é essa bolha reacionária que se formou no Sul, Centro-Oeste e parte da região Norte. Como sabido, em alguns desses estados, a vitória do candidato à reeleição no primeiro turno chegou perto de 70%, como em Roraima. A forma como o mapa eleitoral do primeiro turno no Brasil foi sendo desenhado não é mera coincidência. Tanto no quarto como último artigo aqui na piauí já mencionei parte dessas razões reportadas aos deslocamentos de “paulistas” e “gaúchos” para essas regiões, acompanhando a reprimarização da economia brasileira e a absorção dos excedentes demográficos no setor agrícola por parte das regiões centrais e setentrionais do país. 

Talvez seja mesmo impossível em 2022 reverter o humor do eleitorado daquelas regiões. Mas isso não nos poupa de desafinarmos “o coro dos contentes”, agora citando Torquato Neto. O que move vastos setores das regiões Centro-Oeste, Sul e parte do Norte ao voto no atual mandatário é a agenda ambiental e de proteção aos povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais, que eles são em sua maioria contra. Aqueles segmentos pensam que essa pauta compromete seus interesses mais imediatos e, assim, defendem a desregulamentação da proteção ao meio ambiente e temas derivados. Não há porque supor que os habitantes dessas regiões não sejam pessoas inteligentes e capazes. Todavia, como não há correlação necessária entre inteligência e habilidade, para tomar decisões prudentes e acertadas, talvez seja hora de alertar que aquela visão de curto prazo coloca em risco seus interesses mais do que as políticas em prol do meio ambiente.

O que ameaça o agribusiness brasileiro atualmente não é o MST ou veganos maluquinhos querendo se alimentar de jiló orgânico. Mas o modelo predatório de uso dos recursos humanos e naturais. Primeiramente, porque há evidências de que os desequilíbrios atualmente causados pelas queimadas, desmatamento e perda de recursos hídricos estão afetando a produtividade agrícola no país. E, em segundo lugar, porque em tempos de cataclismo climático, estamos correndo um sério risco de termos nossos principais produtos de exportação excluídos dos mercados agrícolas europeu, americano, chinês e de outros países com efeitos inestimáveis sobre os complexos da carne, aves, soja, cana-de-açúcar, laranja entre outras cadeias agroalimentares. Mesmo os mercados destinatários da exploração madeireira passam por critérios progressivamente mais estritos através da obrigatoriedade de selos como o Forest Stewardship Council (FSC), exigindo comprovação da origem do produto dentro do princípio da comprovação da cadeia de custódia. Será que vale mesmo a pena a perda do acesso brasileiro aos mercados de commodities por conta de uma perspectiva empresarial tão tacanha? Será que os eleitores das regiões Sul, Centro-Oeste e os estados de Acre, Rondônia e Roraima, inteligentes que são, não percebem as ameaças que rondam seus próprios negócios uma vez se deixando levar na lábia da extrema direita?

Os temas das relações de gênero e raça são outros assuntos que felizmente vêm aparecendo com alguma regularidade nos debates eleitorais. As declarações misóginas e racistas do atual mandatário acompanham sua vida pública e não preciso citar uma a uma. Mas você precisa. Se o tema emergir, convoque o candidato à reeleição para que dê suas explicações. É verdade que ele quer acabar com as cotas para pobres e negros nas universidades? Ele confirma as palavras do sr. Sérgio Camargo de que o movimento negro brasileiro “é uma escória maldita” e que o herói nacional brasileiro Zumbi dos Palmares “era um filho da puta que escravizava negros?” De fato não há problema algum em um negro se identificar com a direita. Mas aqui não se trata de um problema de politicamente correto. Essas foram apenas algumas das agressões com que os negros vieram sendo alvejados por parte do então presidente da Fundação Cultural Palmares, instituição que teoricamente deveria defender seus direitos. Como o candidato à reeleição responde a essas questões?

Lula, este texto já vai se alongando. É o último da série de sete que me comprometi a escrever para a piauí. O conjunto de sugestões que poderia lhe dar poderia chegar a copiosas páginas, senão a um inteiro livro. Temas estratégicos como política científica e tecnológica, relações internacionais, direitos humanos e políticas de segurança pública poderiam ter entrado aqui. Qual seria a melhor estratégia para reverter o cenário no Rio de Janeiro hoje dominado pelo fundamentalismo religioso e por milícias? Não tenho espaço para aprofundar esses assuntos. Mas deixe-me encerrar este artigo apontando para o tema dos temas, o eixo dos eixos do debate eleitoral de 2022: neste pleito é preciso derrotar os inimigos da democracia.

Este artigo começou na ABI e daqui parto para o seu final. Barbosa Lima Sobrinho, ilustre presidente daquela associação por muitos anos, costumava dizer existirem dois partidos no Brasil. Um era o de Joaquim José da Silva Xavier, o nosso Tiradentes. E o outro, de Joaquim Silvério dos Reis, que delatou os inconfidentes. Uma definição muito simplista, decerto. Mas que abriga uma profunda verdade. Temos hoje as duas “agremiações” em embate mais uma vez. E é neste veio que me vem outra analogia.

Nunca vi ou li o atual mandatário se dizendo expressamente nazifascista, mas o seu um dia ministro da Cultura, Roberto Alvim, em 2020, não se avexou em literalmente citar o infame Goebbels, proclamando que a “arte deve ser heroica e imperativa, ou não será nada”. Segundo a pesquisadora Adriana Dias, há provas de que pelo menos desde 2004 neonazistas interagem politicamente com o atual candidato à reeleição. E não é segredo para ninguém a colaboração entre Steve Bannon, um dos expoentes do supremacismo branco em todo o mundo, com os auxiliares mais próximos do cara que ocupa a Presidência da República atualmente. Em suma, este aqui pode não se dizer nazifascista, mas – “diga-me com quem andas e te direi que és” –, entre seus correligionários mais próximos há quem o seja. E já que é contra esse tipo de gente que lutamos, então voltemos ao tema sobre o que está em jogo no dia 30 de outubro.

“Senta a pua!” Este era o grito de guerra do 1º Grupo de Aviação de Caça da Força Aérea Brasileira que lutou contra os nazis durante a Segunda Guerra Mundial. O símbolo foi criado pelo então capitão aviador major-brigadeiro Fortunato Câmara de Oliveira, comandante da Esquadrilha Azul. Seu símbolo era o de um avestruz, só que em sentido invertido. Esse jamais escondia a cabeça diante do perigo. A analogia tem limites, e não há aqui nenhum chamado às vias de fato contra aqueles a quem por justificadas razões nutrimos profundo desacordo (mas que prefiro não classificar como nossos inimigos, ou ao menos não no sentido literal da palavra, isso apesar de nem sempre o contrário ser verdadeiro). Reviver o “Senta a pua!” implica em colocar à luz do dia as fake-verdades. Em desmascarar um projeto de mundo semelhante à sua matriz na Europa ocidental dos anos 1930 e 1940 dando sua famigerada colaboração para lançar toda a humanidade nos umbrais de um imenso cataclismo global.

Estamos fartos de tanta covardia, estupidez, infâmia e miséria humana. Tirem as patas de cima de nossas florestas, dos povos indígenas, quilombolas e de nossos jovens, especialmente os negros e os periféricos. De nossas universidades e cientistas que fazem das tripas coração para trabalhar em meio à crônica falta de estruturas e recursos. Não existe ideologia de gênero, deve haver sim o combate à ideologia do “pintou um clima”. A exigência de respeito e proteção às nossas meninas e mulheres e contra a violência machista de quaisquer naturezas. Nós queremos ver o Brasil sendo admirado e respeitado nos fóruns internacionais e não passando vergonha nas Nações Unidas e instituições vinculadas por meio de fundamentalistas religiosos despreparados e apalermados contribuindo para nos isolar do resto do mundo.

Lula, Alckmin e todos os que vos apoiam: senta a pua! Se inspirem no exemplo de nossos heroicos pracinhas, batalha montanha acima em Monte Castelo, para livrar a humanidade das garras do racismo, do ódio e da xenofobia. Que nesta semana a força dos justos esteja convosco! A força do Caipora, defensor das florestas dos povos originários. De Xangô, o Orixá da Justiça. Dos quilombolas e abolicionistas lutando contra a escravidão, da juventude periférica lutando contra a violência policial e o racismo e pelo seu direito de serem felizes. Didi disse no campo de jogo na final da Copa de 1958, contra a Suécia: “Vamos encher esses gringos de gol.” Sim, vamos. Vamos vencer esse bando de reacionários, convencer nossos compatriotas com outros propósitos de existir, de outro modelo de sociedade e país fundados nos parâmetros da justiça, da paz, da generosidade e da compreensão. Lutemos como uma Marielle Franco e um Anderson Gomes. Lutemos como uma Beatriz Nascimento, como uma Azoilda Loretto, como uma Lélia Gonzalez, assim como outras tantas milhares de companheiras de todas as origens e formas.

Lula, na quinta, às vésperas do debate, nada de se desgastar com comícios e carreatas. Se concentre em casa, se alimente orientado por um nutricionista, beba bastante água. Leia poesia, veja os vídeos com as imortais conquistas do seu Corinthians. Faça um pouco de exercício aeróbico, ouça os passarinhos, faça yoga, curta música zen (ou qualquer outra que preferir), medite. Se prepare para ir muito bem ao longo desta semana e, especialmente nesta sexta, 28 de outubro, quando ocorrerá o derradeiro debate que certamente lhe exigirá muito fisica, mental e emocionalmente.

Não será pela primeira vez na história deste país que a voz de muita gente boa será verbalizada através de você, Lula. Para lhe falar a verdade não lhe invejo por este momento pois a barra não deve estar sendo fácil. Como deve ser complicado ter fôlego para encarar a pressão e expectativas de tanta gente. Mas seu destino já tinha sido desenhado há 77 anos atrás no ventre de dona Lindu, lá em Caetés, em Pernambuco, não é mesmo? E dele, do destino, não temos como fugir. Como foi meu caso há 38 anos quando, ao lado do Marcelo Gaba, te vi de perto pela primeira vez. Assim como é o de milhões de brasileiros, que por compartilharem o horror e a indignação com o estado de coisas que tomou conta da nação, parecem estar eternamente condenados à encantadora luta pela realização da utopia de um Brasil e de um mundo melhor.

 

 

P.S. 1. Por motivos mais ou menos imaginados, o recebi com desconfiança quando Vossa Senhoria tomou posse no Supremo Tribunal Federal em 2017. Mas sua altivez e coragem neste período eleitoral o colocam à altura de um Sobral Pinto ou um Raymundo Faoro, entre tantos juristas ilustres que este país forma e formou. Aceite meus cumprimentos, Exmo. Sr. Ministro Alexandre de Moraes.

P.S. 2. Este artigo é dedicado a quatro queridos amigos: Eduardo Alves, Fernando Firmo, Mario Theodoro e Paulo Adissi. Sempre juntos na batalha, irmãos! Que a força também esteja sempre com vocês. Obrigado Irene Rossetto e Marcelo Parada Figueiredo pela leitura preliminar dos textos que iria enviar para esta coluna. Valeu, tia Magdalena, por me chamar a atenção para a novidade política representada pela Simone Tebet.