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    FOTO: PEDRO LADEIRA/FOLHAPRESS

questões eleitorais

Em terra de Bolsonaro, Jucá é plebeu

No estado em que o ex-capitão seria eleito em primeiro turno, xenofobia contra venezuelanos e rejeição ao governo atrapalham reeleição de líder de Temer

Josette Goulart | 22 ago 2018_18h32
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Candidato ao quarto mandato consecutivo como senador por Roraima, Romero Jucá (MDB) enfrenta disputa acirrada para se reeleger. Divide a segunda colocação nas pesquisas de intenção de votos no estado – numericamente atrás, mas tecnicamente empatado com outro candidato –, sob risco de perder uma das duas vagas abertas ao Senado. Além do mandato, o senador também busca manter o foro privilegiado. Líder do governo Temer no Senado e ex-ministro do Planejamento, Jucá é investigado em 14 inquéritos no Supremo Tribunal Federal e em março se tornou réu, acusado de corrupção e lavagem de dinheiro, em caso resultante da delação da Odebrecht na Lava Jato.

Entre as questões que atrapalham a reeleição do líder de Temer em Roraima estão os conflitos entre moradores locais e refugiados venezuelanos, atacados no fim de semana na cidade fronteiriça de Pacaraima. A rejeição ao governo federal, que detém 88% de desaprovação no estado, também dificulta os planos do ex-ministro. O que são dificuldades na campanha de Jucá – crise migratória e má-avaliação do governo ao qual é associado –, por sua vez, são pontos que favorecem a candidatura de Jair Bolsonaro em Roraima. Com discurso xenófobo e contra a “política tradicional”, o candidato do PSL à Presidência lidera no estado.

Roraima é hoje o menor colégio eleitoral do Brasil, com 331 mil eleitores. Em pesquisa realizada em 17 de agosto, em um cenário sem Lula, Bolsonaro tem 39% das intenções de voto, o que corresponde a 53% dos votos válidos (descontados brancos e nulos e não sabem). Ou seja, o suficiente para eleger um candidato em primeiro turno. E, mesmo no cenário com Lula como candidato, Roraima é um dos dois estados, entre 17 pesquisados pelo Ibope em agosto, em que o militar reformado aparece como líder isolado (o outro é Santa Catarina). 

Bolsonaro tem defendido que sejam criados campos de refugiados para impedir a presença de venezuelanos no dia a dia das cidades de Roraima. A crise provocada pela falta de estrutura para receber os imigrantes virou assunto obrigatório na campanha local. Até aqui, Roraima já recebeu cerca de 130 mil venezuelanos, que buscam refúgio por causa da crise humanitária, econômica e política do país de Nicolás Maduro, onde há desabastecimento generalizado e inflação de 1.000.000%, segundo o Fundo Monetário Internacional.

 

Em uma tentativa de superar as dificuldades na disputa estadual, Jucá tem usado a estrutura do governo federal e do Senado para tratar dos temas sensíveis a Roraima. Na semana passada, protocolou um projeto de lei para estabelecer cotas de imigrantes, definidas a partir da capacidade de acolhida do estado. Depois dos conflitos do fim de semana, ele publicou vídeo nas redes sociais em que dizia estar a caminho de Brasília para se reunir com Temer. Reforçou que sua proposta de cotas restritivas resolveria a questão.

A governadora de Roraima, Suely Campos (PP), adversária de Jucá no estado e que também busca a reeleição, é uma das vozes radicais contra a presença dos venezuelanos. Reprovada por 62% dos eleitores e em terceiro lugar na disputa pelo governo estadual, ela endureceu sua posição na agenda anti-imigração – desde abril, vem pedindo o fechamento de fronteiras ao Supremo. No início de agosto, o tribunal negou o pedido, alegando que a decisão de ajuda humanitária cabe ao poder Executivo. Após os ataques do último fim de semana, Campos pediu fechamento de fronteiras novamente, alegando que busca há dois anos, sem sucesso, maior auxílio do governo federal.

Com a crise dos imigrantes tratada como prioridade pelos rivais em sua base eleitoral, Jucá também endureceu o discurso. No vídeo postado no domingo, disse condenar a “politização do processo” que só ampliaria o conflito e afirmou que o envio de tropas era um “paliativo”. Segundo o senador, ele disse ao presidente que a situação era “insustentável” e, a exemplo da governadora, pediu o fechamento provisório da fronteira em Pacaraima. O ministro da Secretaria de Governo, Carlos Marun, disse ver “grandes dificuldades” para uma medida como essa, “haja vista a tradição de acolhimento que marca a vida brasileira”.

Se, de um lado a questão dos imigrantes ainda não tem solução, de outro Jucá afirmou ter conseguido um avanço em mais um tema caro aos roraimenses, o abastecimento de energia. O governo Temer anunciou que vai iniciar a construção da linha de transmissão que ligará Roraima ao sistema interligado nacional – o chamado Linhão do Tucuruí, licitado em 2011 mas que nunca saiu do papel. Hoje o estado depende de energia fornecida pela Venezuela, mas, em meio à crise no país vizinho, o abastecimento apresenta problemas. Só neste ano foram 35 blecautes. Jucá usou a seu favor a promessa presidencial. Garantiu, em postagem nas redes, que a situação será resolvida ainda em 2018. Nos últimos sete anos de mandato do senador, não houve solução para o imbróglio, que depende da negociação com indígenas da tribo Waimiri-Atroari para liberação das obras.

Procurado pela piauí, Jucá não atendeu aos pedidos de entrevista. Sua assessoria de imprensa informou que ele está em viagem ao interior de Roraima. Sobre os inquéritos no Supremo, o advogado de Jucá, Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, nega as acusações, que tratam, em sua maioria, de supostas negociações de medidas legislativas. Kakay afirma que, como seu cliente foi presidente da Comissão de Orçamento, “participava de reuniões com os mais diversos segmentos”.

 

Para se eleger senador por Roraima, são necessários entre 100 mil e 150 mil votos. Mesmo tendo que conquistar um eleitorado relativamente pequeno (em 2010, conquistou 118 mil votos), Jucá encara uma disputa ferrenha este ano. São onze candidatos para as duas vagas. Segundo a pesquisa Ibope divulgada em 17 de agosto, ele aparece em segundo, com 25% das intenções de voto, numericamente atrás, mas tecnicamente empatado com Mecias de Jesus (PRB), que detém 26% das intenções. Na liderança, Angela Portela (PDT) aparece com 30%. O páreo segue embolado na sequência, com Chico Rodrigues (DEM) e Luciano Castro (PR), cada um com 21% das intenções de voto. A margem de erro da pesquisa é de três pontos para mais ou para menos. Uma vantagem para Jucá seria o fato de ele ser o candidato mais lembrado na pesquisa espontânea.

À Justiça Eleitoral, o ex-ministro declarou patrimônio de 194 mil reais – ou 413 mil reais mais pobre do que na eleição de 2010. É um dos menos abastados entre os candidatos em Roraima. Declarou patrimônio superior, apenas, ao dos candidatos do PSTU e PCB. Antes de ser líder de Temer no Senado, Jucá exerceu a mesma função nos governos de Lula e Fernando Henrique Cardoso. Após o impeachment de Dilma Rousseff, exerceu papel de liderança do governo Temer, mas durou poucos dias como ministro. Deixou o cargo com a divulgação da gravação de uma conversa sua com o ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado, em que Jucá afirma que era preciso mudar o governo para “estancar a sangria” da Lava Jato, em um pacto “com o Supremo, com tudo”.

O cientista político e professor da Universidade Federal de Roraima, Elói Martins Senhoras, diz que as acusações de corrupção devem pesar nas escolhas locais nesta eleição. Mas afirma que, em Roraima, é comum que as pesquisas de intenção de votos apresentem erros. Segundo ele, os institutos não conseguem retratar os eleitores que trocam de voto na última hora, incentivados pela ação das oligarquias. “Roraima não tem um motor econômico. Funciona em função do contracheque [com muitos funcionários públicos] e, por isso, a ingerência política é determinante”, disse.

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