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    Hoje eu quero voltar sozinho

questões cinematográficas

Hoje eu quero voltar sozinho – triunfo em tom menor

Escrito e dirigido por Daniel Ribeiro, Hoje eu quero voltar sozinho reafirma, entre outros fatos, (1º) a existência de vida inteligente no cinema brasileiro; (2º) a viabilidade de um filme de produção modesta que trata de tema de interesse transnacional ter boa receptividade em um dos principais festivais internacionais de cinema

| 28 abr 2014_15h23
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Escrito e dirigido por Daniel Ribeiro,  reafirma, entre outros fatos, (1º) a existência de vida inteligente no cinema brasileiro; (2º) a viabilidade de um filme de produção modesta que trata de tema de interesse transnacional ter boa receptividade em um dos principais festivais internacionais de cinema; (3º) a possibilidade de ter recepção favorável no mercado interno investindo na delicadeza e rejeitando a estupidez; (4º) a dificuldade, até para um filme brasileiro com excelentes credenciais e que, comprovadamente, agrada ao espectador, de ser rentável para o produtor apenas no mercado interno; (5º) a necessidade de incentivar carreiras iniciantes como a de Daniel Ribeiro, criando condições para que floresçam; (6º) a conveniência de investir em projetos inovadores e criativos, quaisquer que sejam seus temas, invertendo a prioridade economicista de pé quebrado que pauta os gestores públicos do cinema brasileiro em âmbito federal, estadual e municipal.

Além de premiado pela Federação Internacional de Críticos de Cinema (FIPRESCI) como melhor filme da mostra Panorama, Hoje eu quero voltar sozinho recebeu também este ano o prêmio Teddy Bear, dado a produções com temática gay, no Festival Internacional de Cinema de Berlim. O prêmio da crítica internacional amplia o alcance do filme ao indicar que seu valor não se restringe ao tema, sendo devida também às suas qualidades cinematográficas.

Hoje eu quero voltar sozinho é um bom exemplo do que há de melhor no atual cinema brasileiro de ficção – filme realista de alcance delimitado que demonstra talento narrativo ao lidar com situações concretas e personagens bem desenhadas; não busca transformar o mundo; ambiciona, em vez disso, retratar situações que o realizador demonstra conhecer bem; prova de sensibilidade, dada por um roteirista e diretor de 31 anos ao fazer seu primeiro  filme de longa-metragem depois de graduado, em 2006, no Curso Superior de Audiovisual da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo (USP).

Do seu premiadíssimo curta-metragem feito em 2010 que deu origem a , Daniel Ribeiro preservou o mesmo assunto, enredo e elenco. Além da sutil mudança do título – Eu Não Quero Voltar Sozinho –, a principal diferença do longa-metragem parece ser a maior profundidade das personagens, a sutileza e suavidade da progressão narrativa, além das sínteses visuais em sequências que dispensam diálogos para serem compreendidas. Qualidades que devem resultar, em parte, simplesmente da duração dilatada, mas que devem provir também do exercício prático anterior, no qual alguns momentos mais abruptos tenham sido percebidos e reformulados. Demonstração, se ainda fosse preciso comprovar, de que o aprendizado fundamental do cinema ocorre fazendo filmes.

Os dados mais recentes indicam que teve, em duas semanas, cerca de 87.000 espectadores e acumulou renda aproximada de R$ 1.100.000,00. Peculiar é o fato de ter estreado em 33 salas e 18 cidades, tendo passado na segunda semana para 45 salas e 23 cidades, e para 54 salas e 32 cidades na semana seguinte.

Não é comum filmes brasileiros ampliarem o número de salas, semana a semana, a partir da estreia, e ter crescimento de renda de 21% da primeira para a segunda semana de exibição, como como aconteceu com . Considerando o resultado positivo obtido até agora, e a perspectiva de distribuição no exterior em 14 países, poderá servir para analisar as condições a que estão sujeitos no mercado interno até mesmo filmes brasileiros bem sucedidos de baixo orçamento (feito com R$ 2,5 milhões). Como qualquer produção, seria preciso ter receita cerca de três vez maior do que seu custo para cobrir o investimento.

Um dos achados de Daniel Ribeiro [foto acima] foi centrar a ação de em um jovem deficiente visual. “Um bom artifício”, ele declarou, “para falar das sensações e sentimentos que ganham força” quando a atração deixa de se basear na visualidade para “mostrar situações de afetividade, de uma relação nascendo, a leveza que pode ter um namoro, seja formado por um casal heterossexual,” seja por um casal de meninos ou meninas. O fato dos demais personagens, e dos espectadores, verem o que Leo (Guilherme Lobo) não vê contribue para criar uma tensão permanente que mantém aceso o interesse pelo enredo. A economia dos diálogos e o excelente trio de atores adolescentes, completado por Tess Amorim e Fabio Audi, fazem de um soberbo espetáculo em tom menor.

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