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Lars von Trier – soberba e melancolia

Lendo a crítica de Melancolia publicada ontem (4/8) no Globo, a soberba de André Miranda me lembrou do pecado que eu teria cometido algumas vezes nesses dois anos de colaboração com a revista piauí e escrevendo neste blog. Tendo comentado o filme escrito e dirigido por Lars von Trier na piauí deste mês, fiquei chocado ao me deparar com o bonequinho dormindo – condenação sumária de Melancolia, decretada por André Miranda. Haveria no texto justificativa para um julgamento tão categórico, eu me perguntei. E quais seriam os argumentos que levaram à avaliação oposta à minha?

| 05 ago 2011_10h45
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Lendo a crítica de publicada ontem (4/8) noGlobo, a soberba de André Miranda me lembrou do pecado que eu teria cometido algumas vezes nesses dois anos de colaboração com a revista piauí e escrevendo neste blog. Tendo comentado o filme escrito e dirigido por Lars von Trier na piauí deste mês, fiquei chocado ao me deparar com o bonequinho dormindo – condenação sumária de , decretada por André Miranda. Haveria no texto justificativa para um julgamento tão categórico, eu me perguntei. E quais seriam os argumentos que levaram à avaliação oposta à minha?

Minha mãe nonagenária costuma me repreender quando julga que tive atitude soberba nos comentários que venho escrevendo. “Meu filho”, me disse mais de uma vez, “deixe de lado a arrogância”.

Atendendo à recomendação materna, venho tentando entender os filmes que comento em vez de julgá-los, o que admito nem sempre consigo fazer. A tentação da soberba é grande, por mais que procure resistir não colocando as obras “nem no trono, nem no patíbulo”, como recomendou José Miguel Wisnik no encerramento da palestra dele na Flip que já citei em post anterior. Embora ainda distante desse ideal, persisto nesse objetivo.

André Miranda, de seu lado, não parece preocupado com nada disso. Começa afirmando que “Lars von Trier é um gênio do cinema […]”, o que ficaria claro, segundo Miranda, “nos primeiros oito minutos de seu novo filme […].” É um recurso retórico conhecido – glorificar para depois demolir.

Adiante, o crítico insiste na suposta “genialidade” de Trier que se transformaria em “presunção na forma que ele encontra para passar sua mensagem”. Retratar “o fim do mundo para explorar as reações humanas a adversidades” seria “coisa demais, até para ele” [meu grifo]. Por falar em “presunção”, fica a dúvida entre quem é mais presunçoso: Trier ou Miranda?

Com a expressão “até para ele”, Miranda começa a desmontar sua afirmação inicial de que “Lars von Trier é um gênio”. Afinal, se fosse um gênio não deveria ter dificuldade em retratar “o fim do mundo para explorar as reações humanas a adversidades”. Quantas vezes isso já não foi feito por autores menores que nunca foram chamados de gênios?

Mesmo dando o desconto da quantidade de texto produzida diariamente e da pressa da escrita que a imprensa diária impõem, salta aos olhos a incongruência da crítica de André Miranda, ao atribuir “gênio” a um diretor e afirmar que ele pretende “passar sua mensagem”. Pode-se dizer muita coisa sobre os filmes de Lars von Trier, mas reduzi-los a veículos de uma mensagem revela incompreensão total.

O uso do diminuitivo para qualificar o sorriso de Kirsten Dunst – “seu sorrisinho inocente e suas bochechas de menina”, escreve André Miranda – soma condescendência à soberba.

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Entre o parágrafo inicial e o final da crítica de André Miranda, Lars von Trier passa de “gênio” a autor e diretor de um filme “esquemático, tanto pela estrutura quanto pelos personagens um tanto caricatos”. À condescendência e à soberba é acrescentado o sarcasmo.

A última frase confirma a presunção da crítica – teria “faltado direção para o novo filme de um dos mais geniais diretores contemporâneos”.

Entre vários comentários possíveis que se pode fazer sobre os filmes de Lars von Trier, inclusive , há um difícil de fundamentar – falta de direção. Quem conhece sua obra, e sabe o que representa escrever um roteiro e dirigir um filme, só poderia escrever isso cedendo à tentação da soberba.

Terei mesmo sido alguma vez tão condescendente, soberbo e sarcástico quanto André Miranda? Vou telefonar para minha mãe e conferir.