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Manual de estilo para cientistas
Nos artigos científicos, os pesquisadores adotam um tom impessoal, em que impera a voz passiva e os adjetivos não têm lugar. Da mesma forma, eles se limitam a descrever os resultados e não costumam especular sobre suas implicações. Mas a prosa científica não tem que ser necessariamente monótona e desinteressante, como defende o biólogo Kaj Sand-Jensen. É oportuno resgatar os conselhos que ele dá aos pesquisadores em um clássico instantâneo da estilística científica.
Quando circulou na internet o boato sobre descoberta de possíveis indícios do bóson de Higgs, um dos aspectos mais curiosos do comunicado interno do LHC vazado era o estilo em que o texto foi redigido, diferente em vários aspectos do tom dos artigos científicos, como notei no post sobre o tema. Em contraste com a cautela habitual, o comunicado não hesitava em interpretar aquele achado como “a primeira observação definitiva da física além do modelo padrão”. Onde se esperava encontrar um estilo comedido, os autores apresentavam o resultado como o prenúncio de “uma nova física excitante”.
Não é difícil entender o motivo da discrepância. Tratava-se de um comunicado de circulação interna, escrito para ser lido apenas por cientistas daquele grupo. Nos artigos científicos, os pesquisadores adotam um tom impessoal, em que impera a voz passiva e os adjetivos não têm lugar. É uma forma de conferir ao texto uma suposta objetividade – como se os cientistas falassem em nome da natureza, diria o antropólogo francês Bruno Latour.
Da mesma forma, os pesquisadores se limitam nos artigos a descrever os resultados e não costumam especular sobre suas implicações – ao contrário dos jornalistas que escrevem a respeito, nem sempre com propriedade. A exceção mais notável é o famoso artigo de 1953 em que James Watson e Francis Crick descrevem a estrutura em dupla hélice da molécula do DNA. Numa das mais elegantes conclusões já feitas para um artigo científico, eles mostram como a estrutura sugerida para a molécula implicava seu mecanismo de replicação: “Não fugiu à nossa atenção que o pareamento específico que postulamos sugere imediatamente um possível mecanismo de cópia para o material genético”
Mas a prosa científica não tem que ser necessariamente monótona e desinteressante, como defende o biólogo Kaj Sand-Jensen, da Universidade de Copenhague. Esse pesquisador é autor de um clássico instantâneo da estilística científica: “Como escrever literatura científica consistentemente chata”, publicado em 2007 na revista Oikos, um periódico respeitado da área de ecologia.
“A ciência deveria ser divertida e atraente”, lembra o biólogo em seu artigo. “Ao fim de muitos meses de trabalho pesado com pedidos de financiamento, coleta de dados e cálculos, quando tudo está pronto para a publicação dos incríveis resultados, é muito triste que as fases finais de leitura e escrita sejam tão enfadonhas.”
Diante dessa discussão estilística, é oportuno resgatar os conselhos que Sand-Jensen dá àqueles que quiserem perpetuar a tradição de impessoalidade que prevalece na prosa científica. Eis o seu decálogo:
1. Evite o foco
2. Evite a originalidade e a pessoalidade
3. Escreva contribuições l o n g a s
4. Elimine a maioria das implicações e qualquer especulação
5. Descarte ilustrações, especialmente as boas
6. Omita passos fundamentais do raciocínio
7. Use muitas abreviações e termos técnicos
8. Elimine o humor e a linguagem floreada
9. Reduza as espécies e a biologia a elementos estatísticos
10. Cite vários artigos para afirmativas óbvias
Foto: Lin Pernille
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