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A volta do caudilho
Depois de oito anos de exílio e prisão, o general Lino Oviedo tem boas chances de, pelo voto, retornar ao palácio presidencial de Assunção. E o governo Lula vai adorar
Consuelo Dieguez | Edição 15, Dezembro 2007
A caminhonete 4×4 avançava pela estreita estrada asfaltada que liga Assunção à cidadezinha de Ybycuí, no leste do Paraguai. No banco de trás, o general Lino Cesar Oviedo não desgrudava do celular. Falando ora em espanhol, ora em guarani, ele acertava com integrantes de seu partido, a Unión Nacional de Ciudadanos Eticos, Unace, sua agenda de reuniões, comícios e encontros com militantes. Eram dez e meia da manhã de um domingo ensolarado no começo de novembro. Seis dias antes, a Suprema Corte de Justiça do Paraguai absolvera Oviedo no processo por tentativa de golpe de Estado, em 1996. Com isso, validou a sua candidatura a presidente nas eleições de abril próximo. Depois de quase meia hora de conversas ao celular, entremeadas por risos, exclamações, ordens e contra-ordens, o general desligou o aparelho e, apontando para a estrada margeada por sitiozinhos humildes, desafiou: “Escolha uma dessas casas, qualquer uma. Eu vou mandar o motorista parar e você vai ver como eu sou conhecido em todas elas”.
A escolhida foi uma pequena casa cor-de-rosa, com um pátio malcuidado na frente. Ali, uma família de traços indígenas – um casal e seis crianças seminuas e com os narizes escorrendo – se reunia em torno de uma pequena mesa de pedra. Oviedo desceu do carro, abriu o portão de arame farpado e entrou sem cerimônia, saudando, de braços abertos, os moradores que, sem entender, o fitavam. Iniciou-se uma conversa em guarani. A dona da casa, Cerila Camiz, aos poucos foi se dando conta de quem era o estranho, e escancarou a boca num sorriso sem dentes. O marido, mais retraído, apertou a mão de Oviedo, que na hora ordenava a seu motorista que distribuísse os santinhos da campanha. “Viu como me reconhecem?”, perguntou o candidato, satisfeito.
Enquanto seguia cumprimentando moradores, Oviedo avistou, do outro lado da estrada, uma faixa presa à cerca do sítio, em frente. Era uma propaganda de Blanca Ovelar, pré-candidata à presidência pelo Partido Colorado que há sessenta anos detém o poder no Paraguai. Oviedo animou-se ainda mais: “É para lá que eu vou agora”, disse, despedindo-se rapidamente dos seus ainda surpresos anfitriões. Atravessou a pista, acompanhado por seu assessor de campanha, Elsinho Mouco, dono da Pública Comunicação, uma agência de marketing político de São Paulo. “General, talvez não seja uma boa idéia o senhor entrar aí”, argumentou Mouco, em portunhol. “A jornalista já viu como o senhor é conhecido. Para que provocar?”
Ignorando o apelo, Oviedo empurrou o portão da casa, quase esmagando um galo de encontro à cerca, e entrou, espantando patos, galinhas e cachorros que latiam nervosamente. Cinco índias, desconfiadas, saíram da casa. Uma delas, Pablina Freitas, reconheceu o visitante e gritou: “Que emoção, não é possível que ele esteja aqui!” Oviedo abraçou uma por uma as moradoras eufóricas, falando-lhes em guarani. Uma entrou correndo na casa e voltou com carteirinhas do Unace, comprovando a filiação da família ao partido. Orgulhoso, Oviedo as exibiu: “Está vendo? A candidata do governo paga para pôr cartazes na casa dessa gente, mas todos eles votam em mim”. O dono da casa, um senhor de cabelos grisalhos e mãos trêmulas, surgiu na porta da cozinha. Com a doença de Parkinson, ele arrastou penosamente as pernas, até que Oviedo foi ao encontro dele e o abraçou: “O senhor está doente? Não se preocupe. Depois desse meu abraço o senhor vai se curar”. O general se despediu e saiu apressado em direção ao carro, deixando para trás os aturdidos camponeses.
Em 1989, o então coronel Lino Oviedo foi um dos líderes do golpe militar que pôs fim à ditadura de 35 anos do general Alfredo Stroessner. Ele galgou rapidamente posições dentro do Exército e tornou-se o braço direito do general Andrés Rodríguez, que substituiu Stroessner na presidência. No governo seguinte, o de Juan Carlos Wasmosy, ele foi nomeado chefe das Forças Armadas. Atritou-se e começou a disputar espaço com o presidente, e, em 1996, foi acusado de arquitetar um golpe para derrubá-lo. Condenado à prisão, foi solto dois anos depois, com a chegada à presidência de Raúl Cubas, que tinha como slogan de campanha “O seu voto vale dois: Cubas eleito, Lino solto”. No governo de Cubas, Oviedo mandava e desmandava, nomeava ministros, demitia desafetos, distribuía cargos. Em março de 1999, foi acusado pela oposição de ter tramado, com Cubas, o assassinato do vice-presidente Luis María Argaña, com quem o general vivia às turras.
A morte de Argaña provocou uma onda de protestos. Uma multidão aglomerou-se na praça Independência, em frente ao Congresso, exigindo o esclarecimento imediato da morte do vice-presidente. Durante a manifestação, franco-atiradores postados em prédios vizinhos atiraram e mataram sete estudantes. Com a matança, Cubas não teve como se sustentar no cargo, e foi obrigado a renunciar. Ele e Oviedo fugiram do Paraguai, embora não tenha sido comprovada a sua participação nos crimes.
Oviedo primeiro se exilou na Argentina, e depois no Brasil, onde chegou a ficar preso por 18 meses, a pedido do governo paraguaio. Ele foi libertado em 2001, quando o Supremo Tribunal Federal brasileiro negou o seu pedido de extradição. “O pedido era escandaloso”, diz Maurício Corrêa, que era presidente do Supremo Tribunal e relator do processo. “Havia uma clara perseguição política, já que não foi apresentada prova alguma de que Oviedo fora o mandante dos crimes.” O seu voto, negando a extradição, foi seguido pelos outros dez ministros da casa. Corrêa diz que teve uma excelente impressão de Oviedo: “A vida dele sempre foi dedicada a tentar reerguer o Paraguai. Se estiver com ele em Assunção, mande meu abraço. Diga que aguardo um convite para visitá-lo”.
Criada para investigar o assassinato de Argaña, a comissão mista do Senado e da Câmara do Paraguai chegou a uma conclusão oposta à do Supremo brasileiro. Um informe da comissão, de outubro de 1999, sustenta: o “‘oviedismo’ não pode ser explicado pela trajetória ou psicopatologia de Oviedo, e sim como um projeto de tintas nazi-fascistas que, com todo o seu potencial destrutivo, se levantou contra as instituições políticas republicanas, o sistema econômico e a ordem jurídica da nação paraguaia. (…) Oviedo fez política na condição de militar da ativa, e ameaçou com reiteradas tentativas de golpe de Estado, de 1992 a 1996. Durante sete anos, se sentiu no direito de impor sua vontade nos círculos do poder, sobre as autoridades constitucionais e sobre a lei. (…) Esse lapso foi também aproveitado para obter, de forma ilícita, recursos econômicos destinados a alimentar seu projeto político”.
Solto pela Polícia Federal brasileira, mas ainda processado pela justiça paraguaia, Oviedo instalou-se em Foz do Iguaçu. Lá, ele se reunia com integrantes do seu partido e definia estratégias eleitorais abertamente, a ponto de o governo paraguaio solicitar providências ao Itamaraty. Um diplomata brasileiro, que acompanhou o caso de perto, disse que as conspirações de Oviedo colocaram em risco as boas relações entre os países: “A embaixada do Paraguai chegou a gravar e a fotografar algumas dessas reuniões, e fez reiterados protestos junto ao ministério das Relações Exteriores”. O general foi então chamado ao ministério da Justiça, e lá ouviu apelos para que fosse mais discreto.
A vontade de Oviedo em influir na política paraguaia nunca esmoreceu. “De seu apartamento em Foz do Iguaçu, ele avistava Ciudad del Este, e dizia que sentia muita falta de seu país”, contou o advogado brasileiro Oswaldo Loureiro, amigo de Oviedo, durante um recente jantar em Assunção. “Eu o incentivei a voltar. Disse que se ele quisesse um dia chegar à presidência, teria que se entregar.” Foi o que Oviedo fez, finalmente, em 2004. Ele foi preso assim que desembarcou no aeroporto de Assunção, sob os protestos de uma pequena multidão, arregimentada para recepcioná-lo. “Fiquei preso três anos, dois meses e oito dias”, contabiliza o general. “Durante um ano inteiro tentaram me fazer abaixar a cabeça. Criavam todas as dificuldades para que eu visse minha família e meus amigos. Era o único preso político que não podia receber visitas no Natal e no Ano-Novo.”
Em setembro deste ano, o governo paraguaio, que tratava o general com rigor, libertou-o sem maiores explicações. “Há um interesse do atual governo que Oviedo concorra às eleições”, afirmou a historiadora Milda Rivarola, em sua casa, num bairro de classe média de Assunção. “Até setembro, Oviedo estava praticamente incomunicável e era considerado o inimigo político número um. De repente, o presidente Nicanor Duarte decide libertá-lo, e a Justiça, que o processara pelos assassinatos de Argaña e dos sete jovens, aceita a decisão sem questionar. Isso não parece estranho?” A tese corrente hoje no Paraguai, com a qual Milda concorda, é que Oviedo foi solto para dividir os votos da oposição, que, pela primeira vez, ameaçava tirar o Partido Colorado do poder.
Até a libertação do general, o ex-bispo católico Fernando Lugo, candidato da frente dos partidos de oposição chamada Concertación, aparecia em primeiro lugar nas pesquisas eleitorais, com uma boa diferença sobre a candidata governista, Blanca Ovelar. Não que as pesquisas eleitorais no Paraguai sejam confiáveis. Os resultados costumam variar ao sabor dos interesses do partido que as contrata. No caso de Lugo, porém, havia consenso. Ele aparecia sempre com mais de 50% da preferência dos eleitores. Entre os partidos que o apoiavam, estavam o Pátria Querida – liderado pelo empresário Pedro Fadul –, o Partido Liberal – o maior do país, depois do Colorado –, o minúsculo Democrata Cristão, do próprio bispo, e até o Unace, de Lino Oviedo. O Unace, apesar da prisão do seu líder, tem sete dos 45 senadores. “A oposição estava toda unida com o propósito de tirar os colorados do poder”, disse Milda, com ar de desalento. “Era a chance de se dar uma virada na vida política do Paraguai.”
Outro fator parecia favorecer ainda mais a oposição: a divisão dentro do próprio partido do governo, já que Blanca Ovelar, embora ungida pelo atual presidente, não contava com apoio unânime entre os seus pares. Em meados de agosto, porém, ao ser indagado sobre a situação do seu partido, o presidente Nicanor Duarte fez uma declaração enigmática: “Já tenho a fórmula para dissolver a Concertación“, disse ele, sem dar detalhes. Menos de um mês depois, Oviedo foi solto. Como previsto por Duarte, a Concertación se dissolveu. Agora, cada partido sairá com seu próprio candidato (à exceção do Liberal, que manteve a aliança com o bispo, indicando o seu vice-presidente).
Dias depois de Oviedo deixar a prisão, as pesquisas mostraram uma mudança no panorama eleitoral. Lugo despencou nas pesquisas e Oviedo disparou, obtendo a preferência de 30% dos eleitores – um resultado surpreendente para quem esteve tanto tempo fora da cena política. Parte da explicação para tamanha popularidade está no uso, e no abuso, que Oviedo fez da propaganda de si mesmo, quando esteve no poder. Ele anunciava como seus alguns dos projetos do governo Cubas, como a construção da futura ponte sobre o Rio Paraná. No dia de seu aniversário, 23 de setembro, mandava publicar nos jornais cartas de funcionários públicos, louvando suas qualidades. “Os grandes homens, os grandes estadistas, só aparecem a cada certo tempo”, dizia uma delas, publicada pelos empregados do ministério da Saúde. O analista político Alfredo Boccia, que escreveu livros sobre a participação dos médicos na tortura a presos políticos durante a ditadura Stroessner, diz que, nos anos de poder, Oviedo se travestiu em chefe messiânico destinado a salvar a nação, chegando a se comparar a Jesus Cristo. “Havia uma devoção quase fanática a ele”, diz Boccia. Um ministro da Agricultura disse que havia “Deus no céu e Oviedo na Terra”. E o general se apresentava como “a síntese do povo feito Exército, e do Exército feito povo”. Para Boccia, esse comportamento tende a seduzir a população mais humilde: “Infelizmente, os paraguaios parecem se sentir atraídos por um líder autoritário, o grande pai, o salvador”.
Lino Oviedo ajeitou-se no banco da caminhonete. Ele é um homem pequeno e magro, com os cabelos um pouco grisalhos. Aos 64 anos, tem uma energia que o mantém à beira da hiperatividade, mas, apesar da agitação, a sua roupa está sempre irretocável. “Não posso parar para pensar, se penso cinco minutos arranjo mais vinte horas de trabalho”, disse ele, rindo. Sua mulher, Raquel, aquiesceu: “Quando ele pensa muito, fica agitado e não deixa ninguém dormir”. Ela nasceu na Argentina, mas mudou-se com a família para o Paraguai ainda criança. Naquele domingo coube a ela o pior lugar na caminhonete – o estreito banco sobre o porta-malas, que a obrigava a viajar quase deitada, para não bater com a cabeça no teto do veículo. Em nenhum momento ela reclamou do desconforto. A sogra de Oviedo, Sara, uma altiva senhora de 80 anos, seguia no banco da frente, ao lado do motorista, ereta, maquiada e impecavelmente vestida com conjunto branco de saia e blusa de algodão. “Essa é a melhor sogra do mundo”, desmanchou-se o general.
Raquel e Sara sempre estiveram ao lado de Oviedo. Na fuga do Paraguai, em 1999, elas foram fundamentais. “Fugimos de avião, com minha mãe e as três crianças”, contou Raquel. “Na hora da decolagem, Lino quis descer, disse que ia voltar e enfrentar todo mundo. Eu disse que, se ele fizesse isso, desceríamos todos, pois a família não se separaria. Começamos a brigar, até que o piloto, nervoso, decidiu levantar vôo, porque já estavam no nosso encalço.” Eles fugiram primeiro para Corrientes, na Argentina, cidade natal de Sara e Raquel. “Nós nos instalamos ali, mas o Lino não pôde ficar. Ele foi sozinho para a clandestinidade, porque temia ser morto pelos adversários.”
O general ficou escondido no sul do Brasil, num local que nem ele nem a mulher revelam. A cada quinze dias, Raquel ia encontrá-lo no seu esconderijo, para levar a comida que Sara fazia: “Eu levava nove horas para chegar até onde ele estava. Tinha que atravessar o Rio Uruguai de canoa, para não correr o risco de ser seguida”. Sara entra na conversa: “Cada vez que ela ia, eu ficava com o coração aos pulos”. Um dia, ao sair da missa, Raquel viu, pela televisão, o marido sendo preso no Brasil. Ela correu para uma cabine telefônica e ligou para o celular dele. “Ele atendeu o celular e dali mesmo me deu instruções sobre quem eu tinha que procurar”, lembra ela. A tensão teve um custo: Raquel chegou a pesar 114 quilos e, no ano passado, submeteu-se a uma cirurgia de redução do estômago. “Agora estou magra, feliz, na minha casa, com meus filhos e meu maridinho”, disse.
Oviedo interrompeu a conversa para atender o celular. O chamado vinha de Ybycuí, destino final da viagem. Queriam saber em quanto tempo chegariam. Oviedo se comprometera com o líder político local a participar da festa de aniversário de 8 anos da filha dele. Ele desligou o telefone e disse: “Raquel, quando chegarmos lá, invente uma desculpa, diga que tenho que viajar, que não podemos ficar muito tempo”. Raquel não concordou: “Não vou inventar desculpa nenhuma. Eles têm que entender que você é um homem solicitado, e está fazendo um enorme sacrifício em deixar seus compromissos políticos em Assunção para ir até lá”.
No começo de outubro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva reuniu, no Palácio do Planalto, todos os embaixadores brasileiros acreditados nos países da América do Sul. Ele queria fazer um balanço das relações do Brasil com os seus vizinhos. Uma das preocupações do presidente é a de que o Brasil venha a perder espaço para a Venezuela de Hugo Chávez, que exerce uma influência crescente sobre um parceiro estratégico, a Bolívia. Sobre o Paraguai, o presidente se queixou da falta de interesse dos empresários brasileiros em investir no país vizinho.
A relutância dos empresário brasileiros em investir no Paraguai se deve à corrupção. Num estudo da Transparência Internacional, uma ONG sediada na Alemanha que avalia a percepção de investidores estrangeiros, funcionários de multinacionais e analistas internacionais sobre a corrupção dos diversos países, o Paraguai aparece na 140ª posição, numa lista com 145. Ele só não é considerado mais corrupto do que países como a Nigéria ou o Haiti. Essa percepção se repete no plano interno: em novembro, uma pesquisa revelou que os paraguaios consideram o governo de Nicanor Duarte um dos mais corruptos da história paraguaia.
Numa análise do Fórum Econômico Mundial que leva em conta, além da corrupção, critérios como infra-estrutura, saúde, educação, eficiência, capacidade tecnológica e inovação, o Paraguai aparece na 106ª posição, o que o aponta como um dos menos atrativos para investimentos. Seus parceiros do Mercosul, em contraste, embora tampouco sejam grandes exemplos de corre ção, ocupam posições muito melhores na lista: o Brasil, a 66ª; a Argentina, a 69ª; e o Uruguai, a 73ª. “Há um fosso gigantesco entre o Paraguai e o resto do Mercosul”, avalia um integrante do governo Lula. Para completar o quadro, o Paraguai tem um Produto Interno Bruto de apenas 10 bilhões de dólares, e uma renda per capita de 1 400 dólares, uma das mais baixas do continente. Ou seja, todo esforço de investimento bate num mercado pequeno.
Freqüentemente, o Itamaraty recebe informes de seu consulado em Assunção reportando queixas dos brasileiros ali radicados contra o comportamento de autoridades paraguaias. Os plantadores de soja, os brasiguaios, são alvos de constantes achaques. Eles reclamam que o governo paraguaio se recusa a conceder vistos de permanência ou certificados de propriedade de terra, o que os obriga a pagar propina para que os funcionários façam vista grossa à sua ilegalidade. “A regularização do estatuto dos brasiguaios não acontece porque interessa a perpetuação dos achaques”, diz um membro do governo brasileiro.
Esse, porém, é só um dos problemas do Brasil com o Paraguai. “A maior dificuldade é controlar a extensa fronteira entre os dois países”, diz um dirigente da Polícia Federal. Ali acontece de tudo: desde tráfico de drogas até contrabando de armas, cigarros, aparelhos eletrônicos, computadores, bebidas e uma infinidade de produtos piratas. “Se apertamos o cerco em Ciudad del Este, eles correm para Pedro Juan Caballero, na fronteira com o Mato Grosso do Sul”, afirma o funcionário. O mau aparelhamento da polícia paraguaia também dificulta o controle da criminalidade na fronteira. É o governo brasileiro que vem treinando os funcionários da Secretaria Nacional Antidrogas, do Paraguai. “Só podemos contar com esses agentes, que são oitenta no total. A polícia nacional do Paraguai é um desastre de tão corrupta”, diz o policial brasileiro. A Receita Federal tem queixas semelhantes.
Fernando Masi é um dos mais respeitados economistas paraguaios. No início do governo de Nicanor Duarte, ele foi o responsável por algumas reformas importantes, que aumentaram a arrecadação, contiveram os gastos públicos e aumentaram as reservas do país. A lua-de-mel com a modernidade durou pouco. Logo, Duarte revelou que continuaria com as mesmas práticas de seus antecessores, de usar o caixa do governo em benefício dos políticos do Partido Colorado. Masi demitiu-se de suas funções.
No ministério, Masi ouviu diversas vezes a mesma queixa de autoridades brasileiras: o contrabando do Paraguai atrapalhava a indústria nacional. Numa dessas conversas com o ministro brasileiro das Cidades, Márcio Fortes, Masi argumentou que o contrabando paraguaio era como um tango: precisava de duas pessoas para ser dançado. “Se há alguém vendendo, é porque tem alguém comprando. Não vamos também tirar a culpa dos brasileiros na história”, disse ele.
Masi é dono de uma consultoria econômica, o Centro de Análise e Difusão da Economia Paraguaia, que funciona numa antiga mansão amarela no centro de Assunção. Um dos seus trabalhos recentes mostra que o Paraguai importa três vezes mais do que consome. Isso significa que a maior parte desse excedente está vindo ilegalmente para o Brasil. “O problema maior do contrabando para o Brasil está no Porto de Paranaguá, onde o Paraguai possui uma zona livre”, explica Masi. Durante a ditadura Stroessner, o governo brasileiro cedeu um espaço para o Paraguai no porto, como uma forma de dar ao país vizinho um acesso ao mar. As mercadorias ali desembarcadas não são fiscalizadas pelos brasileiros. Segundo Masi, boa parte do que entra fica direto no Brasil – só a papelada segue para o Paraguai. E não se pode pôr a culpa apenas nos paraguaios, porque a maior parte dos grandes importadores que lá operam é de brasileiros. “Os brasileiros são os donos das grandes lojas em Ciudad del Este. São eles que operam a reexportação. Os comerciantes de São Paulo ligam e fazem encomendas”, afirma Masi. E não é só o Brasil que perde nesse processo. “A reexportação desestimula o Paraguai a desenvolver a sua própria indústria, como ocorre nos outros países do Mercosul.”
Se Blanca Ovelar, a candidata do governo, representa a continuidade do atual estado de coisas, o que esperar de Lino Oviedo ou Fernando Lugo? “Estamos literalmente entre a cruz e a espada”, diz Milda Rivarola. “Ou o bispo ou o general. Dois extremos ideológicos.” O governo brasileiro não quer ser pego novamente de surpresa, como ocorreu com Evo Morales. Durante a campanha presidencial na Bolívia, tanto Lula quanto Marco Aurélio Garcia, assessor especial do presidente e maestro da política latino-americana do Brasil, deixaram claro o seu apoio a Morales. Para eles, soou como uma traição a decisão do presidente boliviano, poucos meses depois de eleito, de nacionalizar os campos de gás das empresas instaladas no país, entre elas a Petrobras, e de determinar a invasão da refinaria da companhia brasileira pelo Exército.
Com relação ao Paraguai, o governo brasileiro está sendo mais cauteloso. No final do encontro com os embaixadores brasileiros na América do Sul, o presidente deu um minuto para cada diplomata falar do país onde serve. Abriu uma exceção para o representante brasileiro em Assunção. “Embaixador, o senhor terá mais do que um minuto”, disse Lula. “Precisamos saber o que nos espera no Paraguai depois das eleições.” O embaixador Walter Pecly não arriscou palpites sobre quem seria o vencedor. Fernando Lugo, representante dos movimentos de camponeses e adepto da Teologia da Libertação, teria tudo para agradar parte da esquerda do governo Lula. Mas, devido ao precedente de Evo Morales, ele é visto em Brasília com mais desconfiança do que simpatia. Suas declarações de que pretende rever os contratos de energia de Itaipu e sua má vontade com os brasiguaios têm sido motivo de preocupação.
A caminhonete estacionou em frente a um casarão de muro alto e logo foi cercada por dezenas de pessoas, que saudavam e tentavam tocar Lino Oviedo. Salvador Ortiz Mayo, o dono da casa, o acompanhou, orgulhoso, até o saguão de entrada, repleto de balões cor-de-rosa, com as paredes decoradas com fotos do general e da sua família. A aniversariante, a pequena Lina Cesar (o nome é uma homenagem ao padrinho), com os cabelos cacheados à Shirley Temple, se encaminhou até Oviedo, e, sem saber bem o que fazer, o segurou pela mão. Num pequeno palco, uma dupla de cantores, Rolando e Antônio Persy – “hermanos de Dios, padre y madre” -, entoou uma polca em homenagem ao general. “A gente o chama Lino-ô, Lino-ô, a semente que germinou”, repetia o refrão.
Oviedo circulou de mesa em mesa, cumprimentando os convidados, até acomodar-se na maior de todas, instalada na varanda, e uma das poucas protegidas do sol inclemente. A dona da casa, Flor de Maria, com um vestido de renda coral e os cabelos louros armados em pequenos cachos, surgiu com uma travessa de pato assado e a ofereceu ao general. Com os olhos marejados, ela contou que começou a engordar a ave quando Oviedo foi preso no Paraguai, e prometeu assá-la para ele assim que deixasse a prisão. O general deu boas garfadas no pato.
Pouco depois, talvez sem saber como se livrar de Lina Cesar, ainda agarrada a seus dedos, ele a levou até a mesa onde o bolo, coberto por um glacê cor-de-rosa, ameaçava desmanchar-se sob o sol. Cantou um Parabéns apressado, e, abrindo caminho entre a multidão que o cercava, voltou ao carro e disparou para Assunção. Duas horas depois, estava no quintal de sua casa, onde um grupo de correligionários o esperava para uma reunião.
Oviedo passara a madrugada de sexta para sábado no velório de um integrante do Unace, Carlos Cardozo, seu amigo dos tempos de caserna. Dormira menos que três horas e, pela manhã, saíra cedo à procura de um prédio onde instalar um novo comitê de campanha. Às duas da tarde, recebeu amigos brasileiros para o almoço. A casa de Oviedo parece uma fortaleza. O muro alto e branco esconde toda a fachada. O pátio de entrada é de pedra. Pregado na porta principal, há um quadro com uma imagem do Cristo e os dizeres: “Jesus, em vós confio”. Na sala, decorada com sofás de veludo verde sobre tapetes persas industrializados, espalham-se esculturas e quadros com imagens de cavalos, uma paixão do general. O almoço daquele sábado foi servido no quintal da casa, num galpão ao lado da piscina, mobiliado com duas mesas de ferro redondas, cobertas com toalhas de flores amarelas.
Um dos convidados era Walter Sâmara, fazendeiro e dono de cartório em Ponta Grossa, no Paraná. O empresário é um velho amigo do presidente Lula e de sua mulher, Marisa. Sâmara cedeu seu avião para a campanha de Lula à presidência, em 2002. Recentemente, o empresário foi apontado pela revista Isto É como beneficiário em um esquema de obras da Infraero. “Tudo mentira”, garantiu ele. Vestindo calça bege e camisa coral, Sâmara se mostrava eufórico com a candidatura de Oviedo. “Estou doido para apresentar o Lino ao Lula. Acho que eles vão gostar muito um do outro. Os dois se parecem demais”, disse, sorridente. “Veja só, os dois têm quatro letras no nome e o nome dos dois começa com a letra L. Só falta agora o Lino cortar um pedaço do dedo. Aí é que não vai ter diferença.”
Terminado o almoço, Oviedo seguiu para a vizinha cidade de Luque, para o enterro do amigo Carlos Cardozo. Postou-se ao lado da viúva e evitou a disputa para carregar o caixão. “Não faço a menor questão”, cochichou. Enquanto a viúva recebia os pêsames, o general recebia os cumprimentos. No caminho de volta para casa, disse ao motorista que o levasse até o local onde pretendia instalar um novo comitê de campanha. Era uma construção de três andares e salas amplas, num bairro da elite paraguaia. Oviedo inspecionou cômodo por cômodo, mas não se decidiu a fechar o negócio. O quartel-general da candidatura fica no centro da cidade, num prédio enorme, que ostenta na fachada um gigantesco cartaz de Oviedo vestido de general. Ao lado, os dizeres: “Deus, pátria e família”.
Oviedo nasceu numa fazenda onde seu avô trabalhava como capataz. Sua mãe era professora e o pai, funcionário público. A família teve uma vida modesta. O filho Lino mudou-se para a capital com intenção de servir ao Exército, a forma mais rápida de ascensão social entre as famílias de baixa renda. Um dos seus maiores orgulhos foi ter estudado na Alemanha, quando era um jovem oficial da cavalaria. Foi nessa tropa do Exército que a sua carreira deslanchou, e isso ele não esquece: o seu símbolo de campanha é uma ferradura ao lado de uma espada.
No livro Dossiê Paraguai: os Donos das Grandes Fortunas, o historiador Aníbal Miranda conta que Oviedo ficou milionário depois do golpe contra Stroessner, ao se apropriar de fazendas e imóveis dos militares fiéis ao ditador. Ele está ligado a negócios que incluem cervejaria, moinhos de trigo, importação de veículos e fazendas de gado. De acordo com o livro, Oviedo também teria se beneficiado de negócios ilícitos, recebendo propina para fazer vista grossa ao que ocorria na fronteira com o Brasil, quando, em 1993, teve sob sua jurisdição Ciudad del Este e Pedro Juan Caballero.
O general negou todas as acusações. De volta do enterro, enquanto se servia de suco de laranja e comia um sanduíche na sala de almoço da sua casa, disse que os seus bens foram expropriados durante o exílio. “Vivi da ajuda de amigos”, afirmou. O alvo predileto de seus ataques é o ex-presidente Juan Carlos Wasmosy, que o acusou de tentativa de golpe. “O Wasmosy me destituiu do comando das Forças Armadas porque alertei alguns senadores para não aprovarem a proposta do governo de construção de uma nova ponte ligando o Paraguai ao Brasil”, contou. “A ponte seria feita pela construtora dele. Era um escândalo. Eu fui perseguido porque impedi a corrupção. Ele inventou que eu estava me recusando a deixar o cargo, mas deixei o cargo assim que ele assinou minha destituição. Nunca pensei em dar golpe. Sou um democrata.” Oviedo disse que não foi coincidência a sua prisão ter sido decretada um ano depois da acusação de golpe, justamente quando ele vencera as prévias do Partido Colorado para concorrer às eleições presidenciais de 1998. Depois disso, desligou-se do partido e criou o Unace.
Cinco dias depois, estive na sede da empresa de Wasmosy, a Conempa, numa movimentada avenida de Assunção. No seu escritório, as paredes estão cobertas por quadros com fotos suas ao lado de autoridades como os ex-presidentes Bill Clinton, Fernando Henrique Cardoso e Jacques Chirac. Um canto da sala é ocupado por uma enorme estante de madeira, onde estão expostos mais de uma centena de troféus obtidos por seu gado em feiras no Brasil. O ex-presidente iniciou a conversa advertindo que falaria apenas cinco minutos, mas levou uma hora e meia desancando Oviedo: “É tudo mentira. Os envelopes nunca foram abertos. Como ele pode dizer que eu ia ganhar a concorrência da ponte? O Oviedo é um golpista, e usa essa mentira como desculpa para ter tentado me tirar do poder”.
Wasmosy escreveu um livro de 500 páginas, Contra o Vento e a Maré, em que dá a sua versão para o episódio. Logo na introdução, ele ataca Oviedo: “Um dos chefes de destacada atuação na Noite da Candelária [como é chamado o golpe que derrubou Stroessner, em fevereiro de 1989] foi o então coronel Lino Oviedo. Mas, cegado pelo êxito dessa jornada e por obsessões messiânicas, iniciou, a partir de então, sua alucinada carreira acima do poder político, esquecendo que as pes-soas corretas, uma vez cumprida sua obrigação, sabem regressar com humildade ao seu trabalho cotidiano”.
Um diplomata brasileiro, que durante muitos anos serviu em Assunção, analisou a troca de acusações permanente entre os políticos paraguaios: “O Paraguai é uma macarronada de rabos presos. Ali, todo mundo se beneficia ou se beneficiou do Estado, de alguma forma. Essa é razão para o Partido Colorado permanecer tanto tempo no poder. Quando há qualquer risco de os políticos perderem os seus benefícios, eles se juntam para se proteger e defender a hegemonia do partido”.
Desde a libertação de Oviedo, as eleições presidenciais passaram a ocupar diariamente as manchetes dos jornais. As declarações dos candidatos alimentam páginas e mais páginas. Oviedo anunciou que uma de suas prioridades é reforçar os vínculos com o Brasil. “É o nosso principal parceiro comercial. Temos que buscar o apoio do Brasil e não o confronto”, disse. Sua campanha está calcada nas seguintes promessas: a construção de uma nova sede para o poder Executivo; o desenvolvimento da região do Chaco, no norte do país, com criação de uma zona industrial; a construção de uma ferrovia ligando Assunção a Ipacaraí; e o desenvolvimento do ecoturismo na tríplice fronteira. “Parte do projeto foi elaborada com ajuda das grandes empreiteiras brasileiras”, afirmou Elsinho Mouco. “Todas elas. A idéia é fazer um programa de parceria público-privada com essas companhias, para ajudar no desenvolvimento do Paraguai.”
A proximidade do general com o Brasil leva Fernando Lugo a bater sempre na mesma tecla: Oviedo é o candidato verde-amarelo. Não é um elogio. “Aqui no Paraguai, os ianques somos nós”, disse um empresário brasileiro durante uma conversa num café de Assunção. “Prefiro ser chamado de candidato verde-amarelo a candidato de Hugo Chávez”, disse Oviedo. A ligação de Lugo com o presidente da Venezuela, e também com Evo Morales e Rafael Correa, o presidente do Equador, é sistematicamente criticada pela grande imprensa.
O comitê de Fernando Lugo fica numa ruazinha tranqüila e sem calçamento. Para chegar a ele, é preciso cruzar uma longa avenida, e perder-se por um labirinto de pequenas ruas. Ali, numa casa de tijolos aparentes, local mais apropriado para quem busca recolhimento e não visibilidade, o ex-bispo me esperava em sua sala. Vestia uma camiseta com inscrições em defesa dos índios norte-americanos e sandálias de couro. Lugo não aparenta os seus 56 anos, embora seus cabelos fartos estejam totalmente grisalhos. “Padres não têm mulher nem filhos, por isso custam a envelhecer”, brincou ele.
O ex-bispo explicou que não tem qualquer animosidade em relação ao Brasil, mas avisa que irá rever as tarifas de Itaipu. “Queremos preços de mercado”, disse ele. Que preços seriam esses? Um grupo de assessores foi então chamado à sua sala. Falaram ao celular, usaram a calculadora, mas não chegaram a nenhuma conclusão. O Paraguai, pelo acordo feito com o Brasil durante a construção da hidrelétrica, tem direito a usar 50% da energia produzida por Itaipu. Hoje só usa 2%. O restante vende ao Brasil, por falta de demanda. Apesar da energia abundante, a menos de 100 quilômetros de Assunção, toda eletricidade provém de geradores, devido à inexistência de linhas de transmissão.
Recentemente, o presidente Lula repreendeu de maneira indireta a Fernando Lugo, ao dizer que o Paraguai, em vez de querer aumentar as tarifas para o Brasil, o que é proibido por um tratado binacional, deveria estar preocupado em desenvolver a sua indústria, para utilizar a energia produzida.
Lugo garantiu também que não pretende hostilizar os produtores brasileiros no Paraguai. “Apenas vamos querer que apresentem os certificados de posse de terra”, disse, candidamente. Como a situação fundiária no Paraguai é caótica, é bem provável que os brasileiros, sem ter como comprovar propriedade, tenham suas fazendas incluídas no programa de reforma agrária que ele pretende realizar. Um fazendeiro paraguaio, que esteve com Lugo no ano passado para uma reunião em Luque, junto a outros vinte produtores rurais paraguaios e brasileiros, disse que o ex-bispo deixou clara a sua má vontade com os brasiguaios. Ele teria sido tão descortês que os brasileiros, que ali estavam para ouvi-lo, deixaram a reunião no meio, irritados. “Lugo insinuou que os brasileiros eram uns aproveitadores”, contou o fazendeiro.
Durante a entrevista, enquanto enchia constantemente de água a sua cuia de mate, o ex-bispo se manteve amável e não se esquivou de nenhuma pergunta, embora as suas respostas fossem sempre vagas. Ele rechaçou qualquer semelhança com Chávez: “Não tenho a menor intenção de me manter eternamente no poder. Serei presidente de um só mandato. O que eu quero é limpar a corrupção do Paraguai. Dói muito sermos considerados um dos países mais corruptos do mundo”.
Oviedo, apesar do seu passado, é visto como um possível parceiro pelo governo brasileiro. No tempo do exílio, o general fez amizades com vários políticos e empresários brasileiros, entre eles o governador do Paraná, Roberto Requião, e o senador Álvaro Dias, do PSDB paranaense. Dias fez um discurso no Senado, em setembro, comemorando a libertação do general: “Estive no último sábado em Assunção”, disse. “A convite do general Lino Oviedo, fui comemorar com o povo paraguaio a sua libertação.”
O analista político Alfredo Boccia não tem dúvidas: “A eleição de Oviedo será um retrocesso para o Paraguai. Não podemos esquecer que ele se beneficiou da ditadura de Stroessner e enriqueceu após o golpe. Como todo caudilho, ele é populista e autoritário”. Um empresário brasileiro que tem negócios no Paraguai concorda com as críticas do analista paraguaio. Mas faz uma ressalva: “É verdade, ele é um caudilho. Mas é o nosso caudilho”.