FOTO_VALENTINO FIALDINI MONTAGEM COM A OBRA TEMPO DE VERÃO_BEATRIZ MILHAZES_2006_CORTESIA GALERIA FORTES VILAÇA_SÃO PAULO
Abre alas que lá vem bolo-de-rolo
Como o marchand Marcantonio Vilaça conseguiu elevar as cifras da arte brasileira contemporânea
Bruno Moreschi | Edição 32, Maio 2009
Viajar de primeira classe causava indisposição ao pernambucano Marcantonio Vilaça. Para ele, uma poltrona que deitasse 180 graus significava complacência – era festa, não trabalho –, razão pela qual preferia a classe econômica.
Não que desprezasse as benesses da vida. Ao entrar no avião naquela tarde quente de agosto de 1998, vestia um terno preto da estilista alemã Jil Sander. O estômago estava forrado com o salmão levemente grelhado que pedira no restaurante do Beverly Wilshire Four Seasons, o hotel superlativo que Julia Roberts e Richard Gere usaram como refúgio amoroso em Uma Linda Mulher. A novidade do dia era que Marcantonio cedera finalmente ao apelo dos amigos – diziam-lhe que trabalhava demais e dormia de menos nas viagens – e, fazendo um agrado às compridas pernas, ocupou um assento na segunda fila da primeira classe.
Nem bem abriu o New York Times, sentiu o cutucão no ombro esquerdo. De mãos na cintura, sem disfarçar a impaciência, uma mulher esguia, de cabelos pretos e bochechas rosadas, foi avisando:
– This is my seat, sir.
Marcantonio revirou os bolsos do terno. Encontrou a caneta Bic sem tampa, o bloco amassado de anotações e por fim a passagem. Em inglês, desculpou-se por errar de poltrona. Recebeu em troca um suspiro de aborrecimento.
Enquanto transferia a maleta para outro bagageiro e se reacomodava na nova poltrona, Marcantonio espremia a memória: aquela mulher lhe era familiar. O rosto longo, o ar afetado, o sotaque nova-iorquino carregado… A lacuna estava lá, faltava preenchê-la. Tentou uma pessoa, tentou outra, e eis que, pimba!, o nome se encaixa como um cubo de criança. Era Barbara Gladstone, dona da galeria de arte homônima, uma das mais importantes do mundo. Marcantonio não titubeou. Retirou três volumes da maleta e com passos firmes se aproximou da poltrona que acabara de deixar:
– Miss Gladstone, prazer em conhecê-la. Sou Marcantonio Vilaça, um marchand brasileiro. Posso lhe mostrar uma coisa?
Gladstone começou a engatilhar um não, mas ele foi mais rápido e pôs na mão dela o CD Pássaro Proibido, de Maria Bethânia. “É a maior cantora do Brasil”, disse, para perplexidade de sua interlocutora. Antes que ela tentasse outra reação, Marcantonio esticou um segundo presente, um embrulhinho cilíndrico de papel-alumínio. Tendo perdido o domínio da situação, só restou a Gladstone desfolhar o objeto. Um cheiro de goiaba alcançou seu nariz. Com certa dificuldade, Marcantonio tentou explicar o mimo: uma delicada massa de farinha recheada com geléia de goiaba.
– What? – balbuciou Gladstone.
– It’s bolo-de-rolo – ele respondeu, como se explicasse alguma coisa. E sorriu orgulhoso, pois não se tratava de um bolo-de-rolo qualquer, mas do bolo-de-rolo feito por sua própria mãe. – My mother…
Não se sabe se comovida ou desamparada, Gladstone usou seus dedos de unhas longas e vermelhas para beliscar a beirada do rocambole e levar um pedacinho à boca. Mastigou. Engoliu.
– God! This is marvelous!
Era a hora pá-pum de entregar a terceira, última e mais importante lembrança: uma folha dobrada. Os dedos de Barbara, agora lambuzados de goiabada e açúcar de confeiteiro, desdobraram o papel, no qual se via um desenho geométrico e vibrante que bem passaria por uma margarida estilizada.
– Be-a-triz Mi-lha-zes…
Ele pronunciou sem pressa o nome da autora. Gladstone buscou um foco de luz, ergueu o papel contra a claridade do corredor e franziu a testa. Depois de analisar o desenho por uns instantes, balançou a cabeça e devolveu o papel:
– Bullshit.
Para Marcantonio, o mundo desabou.
Nove anos depois, no dia 15 de maio de 2008, o nome de Beatriz Milhazes foi pronunciado em circunstância bem diversa. Não em sílabas escandidas, mas em triunfo, sob palmas arrebatadoras. O local era o salão da casa de leilões Sotheby’s em Nova York, que naquela data submetia ao martelo 444 obras de arte contemporânea.
A tela O Mágico, um conjunto algo lisérgico de flores, pétalas, caules, nebulosas e um alvo vermelho, vinha descrita no catálogo como uma reunião de art déco, op art, abstração geométrica, efeitos psicodélicos e tropicália – e isso era bom. Essa mistura de referências – era a 16ª obra mais cara do lote de mais de quatro centenas – recebera dos organizadores do evento uma avaliação que ia de 250 mil a 350 mil dólares.
Atingiu 1,49 milhão de dólares, o maior valor já alcançado em leilão internacional por uma obra de artista brasileiro vivo. Arrematou-a o colecionador argentino Eduardo Costantini, o mesmo que, em 1995, comprara por 1,5 milhão de dólares o Abaporu de Tarsila do Amaral, hoje em exposição permanente no Malba, o Museu de Arte Latino-americana de Buenos Aires. Para quem acompanha o mercado brasileiro de arte, a notícia do recorde foi na verdade uma meia-surpresa. Cerca de três semanas antes do leilão, em vernissages em São Paulo e no Rio, tinham surgido boatos de que O Mágico superaria o lance inicial de 350 mil dólares; os mais otimistas apostavam em 700 mil. A façanha estava, sobretudo, em quebrar a barreira – econômica e psicológica – do milhão de dólares.
Beatriz Milhazes, carioca nascida em 1960, ficou feliz com a venda. E só. Não ganhou um centavo com o arremate, pois desde 2001 O Mágico pertencia a um colecionador espanhol. Graças em boa parte ao trabalho do homem que seduzia o mundo das artes com bolo-de-rolo e discos de Maria Bethânia, Milhazes se alçara a um patamar de preços e prestígio – inclusive internacional – incomum entre artistas brasileiros. Em 9 de dezembro do ano passado, por exemplo, uma tela sua que tinha lance mínimo de 550 mil reais driblou a crise e foi vendida por 600 mil no leilão da Bolsa de Arte do Rio de Janeiro. Uma boa tela de Guignard não ultrapassou os 300 mil.
Tanto nessa ocasião como no leilão de seis zeros, Beatriz Milhazes pintava em seu ateliê no Rio de Janeiro quando soube da venda. Àquela altura, infelizmente, não era Marcantonio quem lhe telefonava para dar a boa notícia.
Marcantonio Vilaça nasceu de madrugada, às 4h45 do dia 30 de agosto de 1962, numa família da assim chamada “aristocracia pernambucana”, gente com raízes na terra, orgulhosa de seu nome e de suas boas bibliotecas. A contração dos prenomes Marcos e Antonio é um sestro italiano. A família não tem origens na Itália, mas os pais acharam elegante lembrar o tempo de césares e centuriões. Do tronco materno vieram o dinheiro e uma vida financeira tranquila, garantida por fazendas de gado em Pernambuco e uma indústria de óleo vegetal em Presidente Prudente, no interior de São Paulo. Do lado paterno, Marcantonio herdou o apreço pela cultura.
O pai, Marcos Vinicios Vilaça, ministro do Tribunal de Contas da União, professor de direito internacional público na Universidade Federal de Pernambuco e presidente da Academia Brasileira de Letras em 2006 e 2007, se diz fruto de uma loteria familiar: “Meu avô lavrador só podia escolher um dos nove filhos para mandar para o seminário e receber uma educação melhor”, conta. “Meu pai foi o escolhido.”
De Marcos Vinicios veio a decisão de matricular o menino Marcantonio, então com 2 anos, na escolinha de artes da família de Abelardo Rodrigues [1908-1971], poeta e pintor pernambucano que se destacou como um dos maiores colecionadores de arte sacra do país. Dali não sairia artista nenhum – os desenhos de Marcantonio eram lamentáveis até para um pirralho –, mas um obsessivo apreciador da obra alheia.
Perguntaram-lhe que presente ele queria ganhar no aniversário de 15 anos. “Eu tinha certeza de que ele me pediria uma viagem ao exterior”, conta o ministro. Marcantonio pediu uma xilogravura. Não qualquer uma, dessas que se encontram fácil no centro de Recife, mas uma de Gilvan Samico, recifense com obras no acervo do Moma de Nova York. O pai concluiu que ele estava vendido para as artes, principalmente a da tradição local. Acertou em parte.
Marcantonio escolheu o curso de direito na Universidade de Brasília. Um dia, depois de uma partida de vôlei, relaxava o corpo num banco de cimento do campus quando chamou a atenção de Luiz Carvalho Fonseca, estudante de engenharia. “Não consegui tirar os olhos dele”, lembra Fonseca de um telefone celular em Paris, cidade onde mora há mais de vinte anos. “Me aproximei e elogiei a beleza dele. Marcantonio me respondeu com um sorriso demorado. Foi o que bastou pra gente começar uma conversa deliciosa.”
Na terceira semana de encontros, Fonseca apareceu na casa de Marcantonio e disse que tinha um assunto. Nesse dia trocariam o primeiro beijo – e o assunto ficou por isso mesmo. Fonseca voltaria à carga um mês depois. Marcantonio estranhou: “Então a tal conversa não era só um pretexto?”
Não. Fonseca queria avisar que estava de viagem marcada para Paris, onde moravam seus pais. Acabara de conseguir uma bolsa para estudar na Sorbonne. O beijo – e o encantamento subsequente – o havia impedido de contar antes. Agora não dava mais para postergar: embarcaria em dois dias. “Ele se irritou, me chamou de desonesto. Nós só nos vimos de novo cinco anos depois, em Paris, numa festa de amigos”, conta. “Ele nem me cumprimentou.” Marcantonio disse a amigos que essa desilusão amorosa – a primeira – foi um dos motivos principais de ele ter deixado Brasília.
Terminou os estudos em São Paulo, na Universidade Presbiteriana Mackenzie. Nas horas vagas circulava pelas galerias da cidade, experiência cujas consequências podem ser resumidas com uma frase de Victor Hugo: “Isto matará aquilo.” A força do que via recalibrou seu olho, tirando boa parte do viço das obras mais tradicionais que se acostumara a colecionar. Marcantonio não tinha a ingenuidade de acreditar que um movimento estético destrói o predecessor, mas sabia que negar a tradição, ainda que momentaneamente, é condição para o surgimento de manifestações originais. Make it new, como dizia o poeta Ezra Pound.
O galerista João Manoel Sattamini, falecido em 1990, disse na época que o recém-chegado preenchia os requisitos para ser o benfazejo catalisador dos ímpetos criativos que a geração dos anos 80 queria pôr em prática: Marcantonio tinha entusiasmo, dinheiro e olho. Foi Sattamini quem o levou ao ateliê de um quase desconhecido, Nuno Ramos, hoje um dos mais importantes artistas brasileiros. Na época, praticamente nenhum colecionador distinguia alguma virtude em suas obras, quase sempre recobertas por sucata e espessas camadas de tinta.
Marcantonio contaria cinco anos depois que, tímido, ao entrar no ateliê de Nuno encontrou “a complexidade em forma de arte”. Comprou várias peças, entre as quais uma pilha de caixotes de madeira cujas laterais vazadas deixavam entrever um punhado de cal. Às gargalhadas, ele diria ao autor que, uns dias mais tarde, a faxineira dera umas vassouradas na cal que escorria para fora da obra. Além de apoiar Nuno com aquisições frequentes, Marcantonio lhe ofereceria uma mesada de 500 dólares. Estava verdadeiramente interessado no título de mecenas de artistas em ebulição.
Ele nunca estudou história da arte. Justificava suas escolhas citando uma frase do poeta Cruz e Souza: “Não tenho orgulho do que sei, mas do que sinto.” Colecionou arte durante 22 anos. Publicado pela editora Cosac Naify em 2001, um livro que leva seu nome catalogou 220 peças. A coleção reunia os objetos-coisa de Nuno Ramos, o barroco contemporâneo de Adriana Varejão, o minimalismo de Iran do Espírito Santo, a luminescência das fotografias do japonês Hiroshi Sugimoto e os bordados e desenhos de Leonilson. Possuía uma das notas de zero dólar que Cildo Meirelles fez circular no Rio de Janeiro entre 1978 e 1984. Uma fotografia da americana Cindy Sherman. Uma boneca do japonês Takashi Murakami. Uma pele de boi sobre tela da francesa Courtney Smith. Uma máscara criada pelo americano Paul McCarthy.
A timidez, tão evidente na época das primeiras visitas a artistas que mal conhecia, havia dado lugar à voz segura de quem tomara consciência da própria importância. Não havia colecionador mais arrojado do que ele. O novo poder veio acompanhado de alguns tiques. Marcantonio falava alto, com um sotaque pernambucano que gostava de exagerar. Se alguém reclamasse da mímica aristocrática, frisava que a civilização pernambucana tinha quase um século a mais do que a dos quatrocentões paulistas.
Ao ver uma obra pela primeira vez, não dispensava apenas juízos estéticos. Decretava sentenças de amor e ódio. Se gostasse, gostava com paixão e adotava o artista. Se não gostasse, todos ao redor logo saberiam. Pela acidez de seus comentários, recebeu uma alcunha que não o incomodava: Senhor do Engenho.
Aos 28 anos Marcantonio já soltava trovoadas na imprensa. Em dezembro de 1991, enquanto corriam os últimos dias da 21ª Bienal de São Paulo, ele passou uma tarde inteira na redação da Folha de S.Paulo, enfronhado em diatribes sobre o evento. Publicado na contracapa do caderno Ilustrada, seu artigo tachava de “oportunista” o goiano Siron Franco, que apresentara uma instalação com carrinhos de plástico queimados, placas de trânsito e cruzes. A propósito de uma instalação de bichos empalhados do paulista Alex Flemming, disse que o animal que mais sofria com a obra era o Homo sapiens, na figura do “pobre público que caiu nesta arapuca estética”.
Marcantonio perguntava no texto se havia mesmo necessidade de um prédio tão gigantesco para uma feira de artes: “Uma das doenças históricas do ‘bienalismo’ é um certo apelo injustificado ao monumental.” A questão daria o ar da graça, de novo, na Bienal do ano passado, por conta do andar completamente vazio que os organizadores da mostra resolveram exibir ao público.
Ele parecia à vontade no papel de colecionador independente e desbocado. Todavia, sua personalidade inquieta não se contentava com performances de polemista. Em agosto de 1991, Marcantonio foi acompanhar a montagem de uma exposição no Museu Municipal de Arte de Curitiba. Uma noite convidou Nuno Ramos para jantar e, antes da sobremesa, revelou-lhe um segredo: tinha decidido abrir uma galeria de arte. Do amigo à sua frente, um dos primeiros artistas em que apostara, esperava apoio incondicional. Mas Nuno não apenas não se entusiasmou, como chegou a externar com veemência uma opinião contrária: “Falei que ele ia perder dinheiro à toa. Ele ficou furioso, e até 96, quando resolvi fazer parte da galeria, tive que aguentar o Marcantonio me dizer que eu era só um fenômeno local.”
Marcantonio tinha um traço fundo entre os olhos, quase uma dobra de pele. Era a “marca do leão”, diziam. Uns dias depois do jantar, seu amigo Ali Cordero Casal, diretor de um fundo venezuelano para a promoção da arte, receberia um fax: “Resolvi, enfim, criar uma galeria. O leão vai finalmente rugir.”
Para abrir a galeria Marcantonio se associou a Karla Camargo, que ele havia conhecido em 1989, na Bienal de São Paulo. Acomodada no sofá caramelo de um café na rua Oscar Freire, Karla mantém as costas absolutamente eretas durante toda a conversa. A postura a deixa ainda mais alta e elegante. Os cabelos, louros, de caimento impecável, parecem obedecer ao mesmo comando dado às costas: nenhum fio comete o desvario de se rebelar.
Ela explica o sucesso da Camargo Vilaça: “A verdade é que nem eu nem o Marcantonio precisávamos viver do lucro da galeria. Foi o trunfo que nos permitiu crescer em meio à turbulência do período Collor. Tudo o que ganhávamos era reinvestido na própria galeria. Arriscamos sem medo do prejuízo e, em menos de um ano, a galeria estava no azul.” A família jamais permitiria que algo faltasse a Marcantonio. Karla, por sua vez, não deixara a função de administradora dos negócios familiares. Até o último ano de funcionamento da galeria, viajou praticamente todos os fins de semana a Londrina, no interior do Paraná, para supervisionar as plantações de cana-de-açúcar nas terras da família.
Com uma coletiva de Lygia Pape, Jac Leirner, Laura Vinci e Daniel Senise, a galeria Camargo Vilaça foi inaugurada em maio de 1992, na esquina da rua Fradique Coutinho com Purpurina, na Vila Madalena. De arquitetura minimalista, o local mantinha o mundo do lado de fora, impedindo que qualquer ruído interferisse na fruição das obras expostas: janelas lacradas, paredes pintadas de branco, assepsia.
Karla, centrada e pé-no-chão, gostava de ficar nos bastidores. Marcantonio, ao contrário. Dificilmente permanecia mais de quinze minutos na escrivaninha de trabalho, um móvel do século XIX. Ele era o rosto da galeria no Brasil e no exterior, a tal ponto que muitos achavam que seu nome completo era Marcantonio Camargo Vilaça.
A galeria chegou a representar 35 artistas, a maioria nomes da coleção de Marcantonio, como Adriana Varejão, Vik Muniz, Iran do Espírito Santo e Ernesto Neto. Beatriz Milhazes entrou já no primeiro ano. Pouco apreciadas pelos colecionadores, suas obras não passavam de 2 mil dólares. Marcantonio costumava pregar entre amigos que as telas não eram kitsch, como muitos insinuavam. “Ela apenas não tem medo de ser brasileira”, dizia, “com todo o colorido que isso pressupõe.”
Seguindo ordens indiretas do marchand, Beatriz transformaria a cor de suas telas em marca pessoal. Deu certo. Uma reprodução de seu trabalho ilustrou a capa do segundo volume de um livro importante, Art Now, publicado no início de 2008 pela editora alemã Taschen. No terceiro volume, lançado no final do ano passado, ela continua entre 137 artistas contemporâneos: “Em suas pinturas e colagens, Milhazes sempre se deliciou com o espectro de cores carnavalescas do seu Rio de Janeiro natal e com os padrões decorativos do artesanato popular. Suas obras têm assumido sistematicamente o feitio de telas vibrantes, de tonalidades tropicais. […] O efeito assemelha-se à estonteante imagem residual de pontos luminosos que surge diante de nós ao olharmos diretamente o Sol.”
Houve, porém, um conselho claro de Marcantonio: “Um dia ele chegou no meu ateliê e disse que eu devia pintar menos, no máximo vinte telas por ano. Até hoje sigo à risca esse ensinamento”, conta Beatriz, ciente de que a parcimônia valoriza o trabalho e que, somada ao acaso de um mercado de arte sempre afoito por novidades, contribui para torná-la um nome conhecido mundo afora.
A Camargo Vilaça foi a primeira galeria brasileira a distribuir gratuitamente o catálogo das exposições que montava. No início da década de 90, sendo muito difícil encontrar no país gráficas que não cobrassem uma fortuna pelo serviço, Marcantonio contratava a impressão no México. Outra coisa: se um artista representado pela galeria participasse de uma exposição no exterior, era inadmissível que não estivesse presente. Passagens aéreas e estadia corriam por conta da galeria.
Antes de Marcantonio, obras contemporâneas brasileiras eram vendidas no exterior como especiaria exótica num mercado persa. Os preços não eram estáveis nem tinham chão. O comprador estrangeiro sugeria um valor, cabendo ao galerista simplesmente aceitar ou não. Agora, pela primeira vez havia um preço mínimo, abaixo do qual era impossível arrematar as obras. Em 1996, na Feira Ibero-Americana de Arte em Caracas, o preposto de um milionário russo ofereceu 10 mil dólares por um trabalho de Adriana Varejão cotado pelo dobro. Marcantonio não aceitou. O homem insistiu e ouviu um não ainda mais sonoro. Não desistiu, e na quarta tentativa Marcantonio não teve dúvida: encheu os pulmões e, em alto e bom som, soltou o verbo: estava ali um comprador que se interessava por quadros como quem se interessa por bananas. Na tentativa de diminuir o constrangimento público, o turrão levou a obra pelo preço estipulado.
Para os negócios internacionais, Marcantonio contava com uma conselheira que morava em Nova York, Márcia Fortes. Filha do ex-deputado federal carioca Márcio Fortes (PSDB), nascida na Tijuca e criada no Leblon, Márcia entrou aos 16 anos no curso de jornalismo da PUC. Pouco depois já estagiava no Jornal do Brasil. Cansada da faculdade, foi para os Estados Unidos trabalhar como assistente do fotógrafo John Fellows. Para completar o orçamento, pedalava pela cidade como office girl de escritórios. Por insistência do pai, voltou a estudar e se formou em literatura na Universidade de Nova York, com uma monografia sobre o Ulisses de Joyce. A última frase do livro ainda ecoa em sua mente: “… e seu coração batia como um louco e sim eu disse sim eu quero Sim.”
Márcia conheceu Marcantonio por intermédio do artista plástico Carlos Bevilacqua, seu primo, para desgosto da família, seu namorado na época. Ela mantinha uma espécie de salão aberto no apartamento de Nova York, no qual a dupla acolhia pintores, escritores e outros brasileiros com pendor artístico que vinham à cidade.
Inúmeras vendas internacionais foram intermediadas por ela, que passou a exercer um papel-chave na vida profissional de Marcantonio. Desde o início ele ambicionara atrair o interesse de colecionadores internacionais para artistas brasileiros. No terceiro ano da Camargo Vilaça, estrangeiros já representavam 70% da carteira de clientes – feito que levou muita gente a considerá-lo, erradamente, o primeiro galerista a abrir uma brecha no mercado externo.
Thomas Cohn, 74 anos, dono da galeria que leva seu nome em São Paulo, caminha com certa dificuldade do escritório à sala onde recebe as visitas. Seu sotaque ainda é fortemente alemão e não raras vezes mistura português e espanhol: “Buenas, eu tive um único inimigo. E ele se chamou Marcantonio Vilaça.”
Cohn nasceu na Alta Silésia, região que na época fazia parte da Alemanha e foi depois incorporada à Polônia. Com a ascensão de Hitler, a família fugiu do país, encontrando pouso em Montevidéu. O menino Thomas estava com 5 anos. Não sabia uma só palavra de espanhol, mas, sendo bom de matemática, a escola permitiu que seguisse adiante. Adulto, empregou-se numa firma de representação de aparelhos médicos que viria a abrir uma filial brasileira e o mandaria para o Rio de Janeiro.
Foi no Rio que ele começou a frequentar galerias de arte, escassas na cidade. Suas primeiras aquisições seguiram o padrão previsível de apostar em antiguidades. Um dia, deparando com um quadro de Antonio Dias, Cohn se deu conta do mundo que existia para além das tapeçarias chinesas. Passou a investir em artistas de sua geração, a dos anos 60: Lygia Clark, Lygia Pape, Amilcar de Castro.
Em 1983, impulsivo por natureza e exasperado com mais uma reunião enfadonha no emprego, anunciou aos berros que estava se demitindo. Não passou meia hora até lhe vir à cabeça a idéia de ser galerista – e ele achou imediatamente que estaria em seu poder internacionalizar a arte brasileira. Em 1984, onze meses depois de abrir a galeria, Cohn já exibia seus artistas na feira espanhola Arco, tipo de coisa que até ali nenhuma galeria brasileira havia feito. Brasileiros de sucesso no exterior eram casos isolados, resultado de circunstâncias individuais. Sergio Camargo, por exemplo, fora premiado na Bienal de Paris de 1963, e Hélio Oiticica tinha exposto em Londres em 1969.
Em 97, Cohn resolveu se mudar para São Paulo. As vendas no Rio vinham caindo havia anos. A cidade empobrecia, ao passo que a capital paulista se mostrava mais e mais convidativa. “Eu segui o fluxo do dinheiro e estava certo. Hoje uma Beatriz Milhazes pinta no Rio, mas vende é em São Paulo.”
Quando Marcantonio soube que Thomas Cohn planejava invadir seu território, decidiu protestar. Como tudo o que fazia, não silenciosamente. Começou a dizer para quem quisesse ouvir que reprovava o concorrente porque “cada um tem que cuidar do próprio galinheiro”. O fato de os dois jamais terem trocado pontapés em vernissages deve-se à circunstância de se evitarem com todo o cuidado.
Na opinião de Cohn, Marcantonio não passava de um imitador: “Ele repetiu literalmente a minha idéia de internacionalizar a arte brasileira. A diferença é que tinha muito mais dinheiro do que eu.”
Quanto ao gosto do adversário, Cohn é taxativo: “Eu jamais diria que Marcantonio era o que no mundo das artes nós chamamos de ‘galerista de olhos’. Ele era ‘de ouvidos’. Ouvia o boato de que um artista era bom e, antes que o preço subisse demais, saía correndo para comprar tudo o que pudesse. Eu jamais fiz isso. Eu comprava Tunga quando as pessoas não colocavam na sala nem se eu pagasse.” Ao responder à última pergunta – Marcantonio não possuía nenhuma qualidade? –, Thomas Cohn sorri: “Foi um adversário à minha altura.”
Marcantonio não sabia descansar. O ministro Marcos Vinicios chega a dizer que seu filho era um masoquista, sempre exigindo de si mais e mais trabalho. Cruzava os braços – um gesto peculiar nele –não em sinal de repouso, mas de expectativa. Sua obsessão em tratar de arte 24 horas por dia era percebida como algo admirável, pelo menos nos primeiros anos de galeria. “De 92 a 99”, diz Karla Camargo, “ele fez sozinho pela arte o que uma pessoa normal levaria no mínimo vinte anos para fazer.”
A certa altura, os ataques de asma que o acompanhavam desde a infância foram se tornando mais e mais frequentes, situação que só piorava com o ódio que tinha Marcantonio de ir ao médico e de tomar remédio. As viagens o deixavam cada vez mais irritado e exausto. Os dois sócios concordavam que, para o prestígio da galeria, era fundamental marcar presença na Feria Internacional de Arte Contemporáneo, a Arco Madrid, na Frieze Art Fair de Londres, na Art Basel suíça e na Art Basel Miami Beach. Marcantonio, achando pouco, acrescentava outros destinos ao roteiro anual obrigatório. Quando era o caso, além de supervisionar a instalação do estande da Camargo Vilaça, fazia questão de abrir as caixas e pregar os quadros pessoalmente.
Um dos grandes amigos que o acompanhavam nessas viagens era o venezuelano Ali Cordero Casal. Em maio de 98, Marcantonio decidiu visitá-lo em Caracas. Iria finalmente descansar quatro dias. “Foi impressionante”, relembra Cordero. “Ele deixou as malas no quarto e já veio com uma lista de pessoas que queria conhecer e de exposições que pretendia visitar. E, é claro, pediu para usar o telefone, porque precisava ligar para a galeria dele.”
Mas pegou o telefone e nada: não conseguia apertar as teclas. A mão estava paralisada. Assustado, começou a chorar. Cordero abraçou o amigo, que, aos soluços, disse: “Eu já tentei achar alguém para viajar no meu lugar, mas são todos uns imbecis.”
Combinaram de deixar as visitas de lado e passar o dia no jardim botânico da Universidade Central, resolução que durou o tempo de um banho. Cordero se lembra: “Quando Marcantonio apareceu, tinha vestido uma roupa formal. Tentei convencê-lo a não trabalhar, mas ele deu um sorriso e disse que não, que estava melhor e preferia correr as galerias. Era como se o maior prazer da vida dele – a arte – fosse também o maior carma.”
No Brasil, Marcantonio contava com a amizade de Nair dos Santos, hoje com 45 anos, copeira e primeira funcionária da Camargo Vilaça. Com os olhos parados numa pintura da carioca Adriana Varejão, ela conta: “Eu não sabia nem ler. Era faxineira numa mansão. Quando entrei na galeria, o Marcantonio olhou pra mim e disse que tinha ido com a minha cara. Na mesma hora me deu a chave da galeria, disse que precisava sair e me pediu para receber uma obra de arte que iam entregar.” Nair diz como reagiu: “Quando chegou a obra… Meu Deus do céu! Era um amontoado de pano feito pela Leda Catunda! Depois aprendi que aquilo se chamava arte contemporânea.”
Marcantonio insistiu em que ela se educasse. Nair aprendeu a ler e se tornou um dos rostos mais conhecidos da galeria. Muitas vezes o patrão a chamava para lhe fazer companhia no escritório. Em 1999 os pedidos se intensificaram. A copeira o encontrava já deitado no sofá, de pés descalços. Ele começava a reclamar da vida – “Estou tão cansado… Mas não dá pra parar agora” – e ela, a lhe fazer massagem nos dedos do pé. Terminada a fieira de reclamações, ele se encolhia e, em posição fetal, acomodava-se no colo dela. Nair lhe fazia cafuné.
Desde que Marcantonio se tornara galerista, os relacionamentos amorosos haviam desaparecido de seu cotidiano. Nenhum dos inúmeros entrevistados que iam às festas organizadas por ele na abertura das bienais de São Paulo se recorda de vê-lo com namorado.
Charles Cosac, um dos donos da editora Cosac Naify, era seu vizinho de prédio na avenida São Luís, no centro de São Paulo. Volta e meia trocavam telefonemas para reclamar da solidão: “A gente tinha a mesma opinião sobre casos amorosos. Achávamos uma bobagem essa história dos gays que lutam para casar, ter filho e reproduzir o modelo tradicional de família que precisaram quebrar. Eu e Marcantonio sabíamos que a nossa escolha sexual significava levar uma vida mais nebulosa, em que a rejeição é a prima mais próxima.” Cosac vive hoje num apartamento de 1 200 metros quadrados no bairro de Higienópolis, na companhia de dois pastores alemães e muitas obras de arte.
Marcantonio viajou como nunca nos últimos três meses de 1999. De Paris, onde participou da Feira Internacional de Arte Contemporânea, foi para o Texas, acompanhar a instalação de uma obra de Ernesto Neto. De lá, voltou à Europa. Na Bienal de Istambul, ao encontrar o amigo Ivo Mesquita, curador da Pinacoteca do Estado e da 28ª Bienal de São Paulo, aceitou o conselho para se hospedar num hotel cinco estrelas. Uma noite, foi pego por uma crise de asma. Mesquita correu ao quarto, onde Marcantonio já havia sido atendido pelo médico que o hotel chamara às pressas. O ano terminaria com um saldo de dezoito crises, de uma violência que ele até ali desconhecia.
Como sempre fazia, Marcantonio planejara passar as festas de fim de ano com os pais, em Recife, na praia de Boa Viagem. Na antevéspera do Natal, 23 de dezembro, trabalhou na galeria até as 21 horas. Só encerrou o expediente porque Nair apagou as luzes e o obrigou a ir embora. Ele parecia triste quando se despediram na calçada. “Estou com uma sensação muito estranha, Nair, um aperto no coração que eu não sei se é físico ou sentimental”, disse. Abraçou-a e pediu que ela o acompanhasse na viagem. Nair ficou sem jeito. Ele fez de tudo para arrastá-la, mas a amiga teve medo de atrapalhar o programa familiar.
Na noite de Ano-Novo Marcantonio jantou com a família. Às tantas, pediu que a mãe, Maria do Carmo, procurasse um apartamento para ele em Recife. Não aguentava mais a correria de São Paulo, queria se afastar um pouco. Terminado o jantar, avisou aos pais que passaria a virada na casa de amigos e não tinha hora para voltar. Chegou na hora do café da manhã. Não comeu nada, tomou banho e foi para o quarto.
No primeiro dia do novo século, já no final da tarde, Maria do Carmo foi acordar o filho. Abriu a porta e viu que a televisão estava ligada. Marcantonio, caído no chão, um braço estirado na direção da porta, parecia pedir ajuda. Tinha uma veia estourada no lado direito do rosto. Aos 37 anos, havia sofrido um ataque fulminante do coração.
A galeria Camargo Vilaça continuou a existir por mais dois anos. Alessandra d’Aloia, ex-cunhada de Marcantonio, ocupou a vaga deixada por ele e se tornou a representante dos Vilaça. Márcia Fortes, a amiga de Nova York, foi convidada a levar adiante a galeria. Karla Camargo deixaria a sociedade em 2001, rompendo o trio feminino temporariamente no comando. Segundo argumentou, não conseguia continuar num lugar que lhe lembrava tanto a figura de Marcantonio.
Alessandra e Márcia reabriram a galeria no mesmo local, apenas mudando o nome para Fortes Vilaça. Corria o comentário de que Márcia era oportunista. Não tinha vivido o dia-a-dia da galeria, faltava-lhe experiência. Seu único mérito teria sido servir de conselheira a Marcantonio nas idas dele a Nova York.
Não era verdade. Os faxes trocados pelos dois demonstram o papel de Márcia no sucesso da empreitada. Embora nunca tivesse trabalhado formalmente na galeria, fez curadorias em Nova York e Liverpool, transportava obras de arte de um lado para outro – até dentro da própria mala – e, quando necessário, despachava a volumosa correspondência em inglês.
Márcia é desassossegada. Fala sem parar, com um carregado sotaque carioca. Na estante de sua sala conserva o que chama de “altar do Marcantonio”: um retrato dele em roupas sociais, deitado em pose de galã, e abaixo uma fotografia do belga Francis Alÿs – A Imprevidência da Nostalgia, na qual se vê um par de sapatos com meias entrelaçadas num nó. “Acho que foi o que aconteceu com Marcantonio. Apareceu um problema no meio do caminho e ele sofreu uma pane”, especula Márcia enquanto enxuga as lágrimas.
Ela e Alessandra têm 40 anos. Ao se tornarem sócias, prometeram a si mesmas que não repetiriam os erros do amigo. “Decidimos viver pela arte, mas não morrer por ela”, diz Alessandra. Ao longo dos anos, elas inverteram a proporção entre clientes brasileiros e estrangeiros – 70% e 30%, respectivamente – para passar mais tempo no Brasil, ao lado da família. Continuam, porém, a participar das principais feiras de arte. Em maio do ano passado, na Basiléia, a Fortes Vilaça exibiu os novos trabalhos de seus artistas. Brad Pitt circulou por lá.
Em 2006, a editora Taschen selecionou quinze galeristas e lhes pediu que dispensassem seus conselhos profissionais em livro. O resultado está no volume de entrevistas Collecting Contemporary [Como Colecionar Arte Contemporânea], organizado por Adam Lindemann. Márcia Fortes, uma das convidadas, já na primeira resposta defende a importância de Marcantonio para as artes plásticas brasileiras. Uma de suas colegas de livro é Barbara Gladstone, a galerista bombardeada no avião com Maria Bethânia, bolo-de-rolo e Beatriz Milhazes.
Em dezembro do ano passado, a revista americana Art + Auction, dirigida a colecionadores, incluiu Márcia e Alessandra entre as 100 pessoas mais influentes no mundo das artes. Nove meses antes elas haviam inaugurado mais uma galeria em São Paulo, o Galpão Fortes Vilaça, um prédio de 1 500 metros quadrados que abriga escritórios, reserva técnica e área de exposição.
A nova aposta das duas é Marina Rheingantz, de 25 anos, ex-estagiária da galeria, contratada no período em que estudava pintura na Fundação Armando Álvares Penteado. Quando contaram a Márcia que os quadros da moça eram promissores, ela quis dar uma olhada na mesma semana. Gostou e a demitiu. Agora paga para ela um ateliê e vende seus trabalhos.
Dos 35 artistas que a Fortes Vilaça tem hoje em catálogo, 22 são brasileiros. Destes, dezesseis integram o grupo original trazido por Marcantonio, como Beatriz Milhazes – suas telas não saem por menos de 300 mil dólares –, Adriana Varejão – com obras vendidas por 275 mil dólares –, Ernesto Neto – suas instalações chegam a 250 mil dólares – e Vik Muniz – talvez o brasileiro com maior visibilidade fora do país, autor de obras cujas cifras pomposas são mérito, antes de tudo, de Marcantonio Vilaça.
Ao ouvir de Barbara Gladstone que Beatriz Milhazes – na época a artista mais importante que representava – era uma porcaria, Marcantonio emudeceu. Por poucos segundos.
– Why do you say that, madam?
Antes que Gladstone se explicasse, Marcantonio jogou no colo dela outras reproduções da artista. Ela repetiu o gesto de segurá-las contra a luz e então sorriu. Olhando com mais atenção, disse, descobria-se um colorido original que, exposto numa sala branca, teria provavelmente um efeito impactante. Pediu para ficar com as imagens.
Marcantonio respondeu que eram mesmo para ela, assim como o CD de Bethânia e o bolo-de-rolo. Despediu-se com um convite para que visitasse a galeria dele se um dia viesse a São Paulo. Gladstone nunca apareceu. No entanto, quando conhece algum brasileiro, não deixa de contar a história daquele homem engraçado e intrometido que vendia arte como um doceiro.