Em defesa das cobaias & a nostalgia do futebol
| Edição 138, Março 2018
A DOR ALHEIA
Sou fã da piauí desde criancinha. Tenho todos os exemplares. Mas não tenho tempo nem paciência para certos temas, como o artigo sobre as cobaias (“O fim das cobaias”, piauí_137, fevereiro). Como não li, não sei se a questão que apresento foi tratada e respondida: gostaria que a turma que alega que é crime usar animais como cobaias em experiências de laboratório me dissesse se é crime quando a gente encontra um rato dentro de casa e cai de pau até que ele estrebuche num canto da parede. Ou se é crime agir preventivamente espalhando veneno por toda a casa. Perguntar ofende?
PAULO VOGEL_PETRÓPOLIS/RJ
RESPOSTA DURA DA REDAÇÃO: Perguntar não ofende, o que ofende é deixar de ler a reportagem. Adiantamos que “a questão foi tratada e respondida”. Ou não. Ficou tenso? Leia.
Mês curto, tive de assistir aos protestos na Marquês de Sapucaí e não consegui terminar a leitura da piauí. Mesmo assim, arrisco-me a comentar a matéria sobre cobaias. A questão é que desde a revolução agrícola usamos animais em nosso proveito. A ética animal não supera a ética humana e, se quisermos a longevidade com qualidade, experimentaremos nas dóceis cobaias antes. Podemos evitar o desnecessário, como teste de cosméticos, e fazer testes alergênicos em cultura de células, mas a eficácia de medicamentos e mesmo a prática cirúrgica passa pelo contato com corpos. Queremos desenvolver a mente como se fosse desprovida da matéria, mas não é.
ADILSON ROBERTO GONÇALVES_CAMPINAS/SP
Caro Roberto Kaz, sua matéria sobre o futuro da experimentação animal é tema que merece reconhecimento em todos os segmentos da sociedade. Como biologista e experimentalista, vejo a necessidade de comentar a reportagem aproximando mais ainda os leitores dos momentos futuros que já se fazem sentir no presente.
A relação entre os seres humanos e os demais seres vivos do planeta é estreita, com influências diretas entre eles em uma transversalidade absoluta e inequívoca. Nosso gradual aumento da expectativa de vida se deve às conquistas da ciência. Nossa alimentação está cada vez mais aprimorada – praticamente comemos muitos dos seres do planeta, com mais controle e diminuição de riscos, e mais oferta de variedade. Cada vez mais nos tornamos aptos a controlar doenças e pragas, às quais facilmente estaríamos vulneráveis. Minorar as consequências de viver mais, controlar infecções e remediar a degeneração do corpo são conquistas da pesquisa científica, e boa parte destas se deve à experimentação animal, seja em escala inicial exploratória do conceito ou até mesmo em escala de pré-aplicação, ou ainda no controle da produção de produtos (medicamento, vacinas, vestimentas etc.).
Sem dúvida a experimentação animal é uma triste etapa da existência humana – eu diria, ainda, uma prova do seu esforço em controlar o meio onde vive. No atual quadro evolutivo, outra espécie não faria o mesmo. Muito se conquistou e vem se conquistando com essa experimentação, e isso não é “culpa de Darwin”, mas de nós mesmos, que usamos seus conceitos como caminho para solucionar os problemas que nos afligem. Tenho certeza de que os cientistas de hoje fazem melhor proveito do pensamento de Darwin no esforço de simular o complexo estilo de vida dos seres vivos deste planeta. Essa nova visão vem da engenharia biomédica com o exemplo do Organs on a Chip: um chip tridimensional de cultura de células que simula respostas fisiológicas de órgãos e de completos sistemas de órgãos. Mas ainda é uma conquista distante da realidade das respostas biológicas que se fazem necessárias às etapas da pesquisa básica de novos fármacos e vacinas.
Os leitores desta revista devem ter consciência de que o Organs on a Chip ainda não é capaz de definir “o fim das cobaias” e isso pode levar mais gerações do que se imagina, sobretudo no Brasil, devido à atual política de apoio à pesquisa científica.
CARLOS ROBERTO ALVES_RIO DE JANEIRO/RJ
A ODISSEIA DO TIMON
Poderia pautar essa carta discorrendo sobre a nostalgia que essa matéria me proporcionou, quando me lembrei dos meus tempos de aspirante a jogador de futebol, comendo pão com mortadela e percorrendo intermináveis viagens pelo interior paulista – mas nunca uma tão longa como essa. Conseguiria até mesmo remeter o texto do Fábio Fujita (“A Odisseia do Timon”, piauí_137, fevereiro) à história de tantos outros consagrados jogadores de futebol, que viram a bola como instrumento de ascensão econômica e social. Por último, produziria linhas e mais linhas a respeito da disparidade de condições que a Copa São Paulo oferece para as equipes grandes e regionais, em detrimento das situadas em localidades mais longínquas, que apenas reforça as colossais e abismais desigualdades sociais do “país do futebol”.
Porém, quero apenas celebrar a resiliência, a perseverança e a determinação que esses jovens jogadores brasileiros possuem. Tem que ser forte e sonhador para enfrentar esse dia a dia. Torço por eles. Obrigado, Fábio e piauí.
FELIPE MACHADO DANIEL_CAMPINAS/SP
Comprei a piauí pela primeira vez neste mês. Gostei muito da revista, principalmente do texto sobre os meninos que foram para a Copinha. Me emocionei ao ler e deixei cair lágrimas nas páginas nos momentos em que relacionava a história dos jovens jogadores com a minha.
Também quis ser jogador de futebol quando fui criança e adolescente. Nosso time treinava na quadra da escola, mas éramos uma equipe de futebol de campo. Uma vez fomos convidados para um campeonato, mas ninguém tinha como ir. O treinador, Pérsio, dirigia uma Parati e enfiou todos os onze dentro dela. Foi a primeira vez que participei de um campeonato grande. Ele também dizia para a gente não baixar a autoestima por causa da nossa condição.
Ótimo texto. Parabéns ao escritor pela matéria!
GUSTAVO RIBEIRO_RIBEIRÃO PRETO/SP
Olá, Fábio Fujita, gostaria de parabenizá-lo pela reportagem. Sem dúvida está entre os melhores textos que já li, você conseguiu passar aos leitores o quanto é desafiador para uma equipe com estrutura menor se deslocar e apresentar seu futebol na Copinha. Notei que, apesar de todos os infortúnios, o grupo de atletas do Timon parece ser bem unido e descontraído. Foi uma viagem inesquecível para todos. Lendo e relendo, me peguei a pensar: Quantos “Timons” e “Thalysons” existem em nosso país?
EDUARDO BENTO_SENADOR CANEDO/GO
Excelente a reportagem sobre a odisseia do Timon para disputar a Copa São Paulo. O relato nos mostra a verdadeira face do futebol brasileiro, distante das nababescas arenas da Copa do Mundo e dos astros com salários milionários. A realidade da maioria dos jogadores do país é semelhante àquela enfrentada pelos jovens da equipe piauiense.
Faço um único reparo: as despesas com hospedagem e alimentação dos times participantes da competição são bancadas pelas prefeituras das cidades-sede e não pela rica Federação Paulista de Futebol.
VINÍCIUS GALANTE_SÃO PAULO/SP
NOTA DA REDAÇÃO: Erramos. O leitor está certo.
A piauí 137, ao publicar a excelente reportagem do jornalista Fábio Fujita (a saga de uma equipe da categoria Sub-20 para participar da Copa São Paulo de Futebol Júnior de 2018), que embarcou num ônibus com a delegação do Timon, mostra a luta de jovens oriundos de nossos rincões pelo país que, buscando um lugar ao sol, sujeitam-se a todas as adversidades, sonhando com a chance de um dia integrarem as equipes de ponta do profissionalismo.
A cidade de Timon está localizada à margem esquerda do rio Parnaíba, na divisa com o Piauí, muito próxima de Teresina, na outra margem. Embora seja a quarta cidade maranhense em popu-lação, pertence à Região Integrada de Desenvolvimento da Grande Teresina. A curiosidade é que há duas equipes de futebol profissionais na cidade, o Esporte Clube Timon, que disputa a segunda divisão do Campeonato Piauiense, e o Timon Esporte Clube, que joga na segunda divisão do Campeonato Maranhense.
Um capítulo especial é o relativo aos cartolas, pequenos empresários que investem no clube objetivando a negociação, para alguma equipe de renome, de algum jogador que chame a atenção. Apesar do time não ter passado da primeira fase da Copinha, seus dirigentes foram bem-sucedidos, pois seu principal jogador, Thalyson, que estava na mira de olheiro do Internacional gaúcho, posteriormente foi negociado para o Colorado.
DIRCEU LUIZ NATAL_RIO DE JANEIRO/RJ
NOTA CRÍTICA DA REDAÇÃO: Assim como Luciano Galvão Filho (ver última carta), nós também somos fãs de Dirceu Luiz Natal. Achamos, contudo, que seus momentos de maior inspiração acontecem quando sua pena não se atém a uma só reportagem, como aqui, mas antes nos regala com um sobrevoo descritivo de toda a edição. Se agro é pop, Dirceu é plural. Um desperdício, portanto, que se confine a um só artigo. Espalhe-se, Dirceu!
O CÂNCER E SUAS CIRCUNSTÂNCIAS
Excelente o artigo de Siddhartha Mukherjee (“Invasão misteriosa”, piauí_137, fevereiro). Inteligente, introduz um novo raciocínio na equação das pesquisas sobre o câncer, e é escrito de tal forma que desperta o interesse de leigos e profissionais. Mas, ele apresenta uma falha.
Talvez a compreensão autêntica que se almeja possa ser alcançada ao lembrar que a abordagem holística, sem aspas, de fato toma o ser humano como um todo, isto é, nossa anatomia, fisiologia e nossa vida interior, que é a que nos distingue de um lago, por exemplo. Somos seres complexos porque pensamos, sentimos, interagimos com outras pessoas, somos dinâmicos e sujeitos a inúmeros roteiros de vida que impactam nossa existência e, consequentemente, nosso sistema imunológico. Sem levar esses aspectos em consideração, jamais se entenderá o solo.
Hoje em dia já existe uma cadeira, a psico-oncologia, que se dedica ao estudo da interação corpo e mente relacionada ao câncer.
EDITH M. ELEK_SÃO PAULO/SP
OS HOMENS DE FERRANTE
Bastante do que o Alejandro Chacoff escreveu sobre a tetralogia de Elena Ferrante (“À espera dos bárbaros”, piauí_137, fevereiro) ressoou com o que li da obra. Só a sugestão sobre o tema central dos livros que não. Ele cita “a dicotomia entre civilização e barbárie” como o motif da saga, quando na verdade a vejo como um ensaio épico sobre a amizade. A odisseia se inicia pelo fim, com o desaparecimento misterioso de uma das personagens, e segue adiante com o momento fundador da amizade que duraria uma vida inteira. Atravessando períodos de camaradagem, briga, separação e reunião – não necessariamente nessa ordem –, Ferrante explora a amizade em toda a sua complexidade, como um vínculo irresistível entre duas pessoas. Mais para o final do artigo, Chacoff sugere que leitores do sexo masculino, como ele, provavelmente se identificaram com as qualidades e defeitos dos personagens masculinos da obra. Acredito que tenha esquecido de observar que esses leitores também se identificariam com Lenu ou Lila, vendo em uma ou outra alguma de suas amizades. Um amigo da universidade, bastante próximo, me presenteou a tetralogia quando eu passava por um término de namoro complicado. Ao terminar a leitura eu lhe disse que ele sempre foi minha Lila.
PEDRO SILVA ROCHA LIMA_BRASÍLIA/DF
CARTUNS 137
Excelentes os cartuns de Roberto Negreiros, é disso que nós precisamos hoje para enfrentar o dia a dia, podem repetir.
LEO E. J. ALBERTI_RIO DE JANEIRO/RJ
NOTA SERVIL DA REDAÇÃO: É disso que nós precisamos hoje para enfrentar o dia a dia.
CARTAS 137
A piauí está de parabéns, atinge um amplo espectro da população; isso pode ser comprovado pelas cartas publicadas na edição 137 de leitores incomodados ou ofendidos com os quadrinhos de Allan Sieber (“Jujumbo & Mimiga”, piauí_136, janeiro), excelentes, engraçadíssimos, rachei. Uma leitora inclusive sugere outros assuntos áridos, mas precisamos dar um tempo de vez em quando, né?
DJALMA ROSA_SÃO SIMÃO/SP
Pela leitura das cartas da edição 137, deu para perceber que há leitores da piauí para todos os gostos: no campo político-ideológico, da esquerda à direita; no quesito sacanagem, dos libertinos aos pudicos. Eu mesmo adorei a capa do Adão, a fábula adulto-infantil do Allan Sieber e as aventuras tupiniquins narradas por Reinaldo Moraes (“A verdadeira viagem ao Brasil do arcabuzeiro Hans Staden”, piauí_134, novembro 2017). Para aguentar as sacanagens políticas de 2018, só com muita sacanagem!
FELIPE BERNARDO FURTADO SOARES_BELO HORIZONTE/MG
NOTA SAFADA DA REDAÇÃO: Estamos tão de acordo que, na edição corrente, forçamos Santo Agostinho e o marquês de Sade a botar o pé na jaca. Est concupiscentia divina!
PIAUÍ 136
Foi justo na despudorada edição 136 que minha sogra resolveu me pedir emprestada a piauí. De tanto me ver agarrado com a revista, pensou por certo haver coisa interessante entre tantas colunas de letrinhas miúdas (sua médica lhe havia sugerido procurar por boas leituras; elas talvez lhe ajudassem a manter o ânimo durante um longo tratamento).
Não sem alguma reticência, admito, entreguei o exemplar. Era besteira minha: ela gostou muito e não viu qualquer problema digno de nota nos cartuns enxeridos que povoavam a edição. Foi mesmo desapontador não ver sobressaltada a moral da aposentada católica, nascida e criada próximo a uma zona rural no Agreste do Rio Grande do Norte. Meu sogro, que também se animou a ler umas esquinas, tampouco fez caso dos desenhos.
Reação eu só veria semanas depois, mas na seção de cartas do número seguinte. A parte da revista pela qual começo revelou uma parcela ruborizada de leitores, alguns encolerizados, aos prantos por causa de escrotos, ânus, sexo, escracho e até pelo desperdício de papel. Só Reinaldo Moraes (que não me empolga, devo dizer) escapou de represálias.
Porra, mas a gente anda muito azeda! Vejam que sobrou até para o Dirceu Luiz Natal, o patrimônio da seção, por quem passei a nutrir mais simpatia após saber que neste caminho sem volta ele também entrou após se deparar na edição 55, de abril de 2011, com a matéria “Rakudianai” (se mais essa frente for aberta no Fla-Flu em que têm se transformado os nossos dias, aviso que estarei no #teamdirceu).
Pois que a revista continue desafiando os nossos recatos!
LUCIANO GALVÃO FILHO_RECIFE/PE