Mais difícil do que matar mamute
| Edição 99, Dezembro 2014
DECLÍNIO DOS SARNEY
Gostaria de parabenizar a repórter Malu Delgado pela matéria “Maranhão 2014” (piauí_98, novembro) e acrescentar que, mais difícil do que matar um mamute, é remover seus escombros. Como maranhense, nascido e criado na Ilha do Amor, como a ilha de São Luís é conhecida, político como todo ser humano deve ser, mas apartidário, tenho que reconhecer que José Sarney é um grande animal político, “pois quem muito sabe muito manda”, e o seu poder de mando se encrostou no Judiciário, a última instância, onde ele é sempre vencedor.
Ambíguo, camaleão, a imagem colhida no dia da eleição, em que ele, tendo apoiado Dilma Rousseff, é flagrado votando no 45 de Aécio Neves, é a síntese de sua personalidade. Vendendo nacionalmente a imagem de democrata, transformou-se ao longo dos anos em caudilho em terras maranhenses, se reinventando a cada eleição. Sua filha e herdeira política não tem o tino do pai, mas, graças à força dele, foi eleita governadora três vezes.
Agora que o poder muda de mãos, renovam-se as esperanças dos homens e mulheres de bem do Maranhão. Eleito com votação avassaladora, Flávio Dino tem que mostrar a que veio, do contrário o grupo capitaneado por Sarney volta com força total.
LUIZ THADEU NUNES E SILVA_SÃO LUÍS/MA
É impressionante como Malu Delgado, que provavelmente teve pouco contato com o Maranhão antes dessa reportagem, conseguiu mergulhar fundo no contexto político e social do estado. Afinal, antes da chegada da Alcoa e da Vale, nos anos 80, o Maranhão só tinha grandes e memoráveis poetas. Vivi em São Luís por sete anos, e penso saber do que estou falando. O melancólico colapso da dinastia Sarney – umas duas décadas atrasado – está eloquentemente retratado no texto.
XIKITO AFFONSO FERREIRA_SALVADOR/BA
AVIAÇÃO
A matéria “O voo 447” (piauí_98, novembro) foi de tirar o fôlego, intensa, densa e comovente. William Langewiesche, Jorio Dauster e Luciano Mangoni. Três mestres.
DJALMA ROSA_SÃO SIMÃO/SP
A matéria põe em foco a complexidade da relação entre o homem e a máquina nos aviões modernos. O controle da relação homem–máquina é atualmente o cerne da segurança da aviação, que está entre os meios de transporte mais seguros. Por essa razão, a companhia Air France foi uma das primeiras no mundo a sistematizar o treinamento “fatores humanos” para suas tripulações.
No entanto, a companhia Air France deplora que o autor, informado sobre assuntos aeronáuticos, misture fatos levados em conta pelos investigadores do BEA, o Escritório de Investigações e Análises para a Segurança da Aviação Civil, com especulações com base notadamente na psicologia e na vida privada dos membros da tripulação do voo AF 447. Essas especulações não se apoiam em nenhum elemento que apareça nos diferentes relatórios emitidos e sobretudo no relatório definitivo do BEA. Assim, a Air France desaprova esse amálgama deliberado, que visa colocar em dúvida a competência e o comprometimento da tripulação. Além disso, o autor não considera os elementos ligados ao funcionamento dos sistemas e ao comportamento do avião que contribuíram para o acidente, como revelado pelo relatório do BEA.
A Air France reitera, mais uma vez, que os pilotos do voo AF 447 tinham sido formados conforme a regulamentação e os mais altos parâmetros da indústria. A Air France está mais do que nunca comprometida com a melhoria da segurança de seus voos. A empresa deseja novamente prestar homenagem à memória dos passageiros e membros da tripulação que perderam a vida nesse acidente, e envia seus mais sinceros pensamentos e condolências às suas famílias.
HUGUES HEDDEBAULT, DIRETOR-GERAL DA AIR FRANCE-KLM PARA O BRASIL E O CONE SUL
O primeiro trecho de “O voo 447” antecipa a “atitude desatenta do comandante”, relacionando-a às atividades dos tripulantes nos três dias entre sua chegada ao hotel no Rio de Janeiro e sua lutuosa última viagem. É um preconceito difícil de aceitar em um profissional do nível de William Langewiesche, autor do artigo abundante em citações de técnicos. Acordo devidamente regulamentado entre empresas aéreas e tripulações permite a viagem com passageiro acompanhante. Nos minutos que antecedem o início da emergência, mostra-se um comandante leitor de revista e admirador dos dotes operísticos de sua acompanhante, cantora de ópera. Um pouco mais adiante, destaca-se sua atitude, na verdade comum, de se retirar para descansar no cubículo existente em todos os aviões de longo curso. Iniciado o processo de anormalidade do voo, o autor ressalta a ausência do comandante, realmente inaceitável. A partir dali, com certa reticência, destaca-se a solidez do seu comportamento profissional. Logo se admite a ideia de um comandante que compreende o que está ocorrendo e seu desenlace inevitável. Apesar disso, ele mantém sua integridade e se registram suas últimas palavras, expressadas calmamente: “Inclinação de 10 graus.”
Existe uma tendência de sempre se considerar a tripulação de uma aeronave como responsável por acidente, algo que Fernando de Barros e Silva exemplifica no último artigo da edição, intitulado “A queda” (piauí_98, novembro), ao citar uma declaração: “É como um acidente de avião: você não tem uma causa única, mas entre elas está sempre alguma culpa por parte do piloto.”
Lapidar é o último parágrafo de Langewiesche [“Ainda ocorrerão acidentes, mas chegará o dia em que só poderemos culpar as máquinas.”]. A mim ele evoca a imagem dos drones.
JORGE MARTINELLI_SÃO PAULO/SP
Que angustiante o relato sobre o voo Air France 447! Pensar que a sofisticação da engenharia vai no caminho inverso da compreensão por parte dos pilotos de elementos básicos de um voo. Se isso acontece em uma empresa internacionalmente respeitada, imagina nas nossas companhias sem nenhuma expressão internacional. Qualquer moleque que já tenha jogado Ace Combat sabe que CAUTION STALL, CAUTION STALL significa que você está insanamente alto e tem que abaixar o bico (nivelar com o horizonte).
CÁSSIO LOREDAN BARBOSA_BELÉM/PA
MARINA
O relato do jornalista Fernando de Barros e Silva sobre a participação da Marina no último debate entre os presidenciáveis na Rede Globo (“A queda”, piauí_98, novembro) é a crônica de uma derrota anunciada. Captou muito bem o estado de espírito da candidata, que parecia impotente e sem disposição para lutar com as forças poderosas que a minaram numa batalha desigual. Além da falta de estrutura nacional dos partidos que a apoiavam, ainda dispunha de um tempo diminuto para se defender dos ataques e formular suas propostas para o país.
Do lado positivo, parece que ela perdeu de vez suas ilusões com o petismo, pois ainda preservava a figura do ex-presidente, que a feriu profundamente, a ponto de levá-la ao choro. A acriana é valente, porém, pois já enfrentou batalhas piores e muito ainda contribuirá com propostas inovadoras para nossa democracia.
DIRCEU LUIZ NATAL_RIO DE JANEIRO/RJ
POLARIZAÇÃO
Parabéns pelo artigo “A polarização voltou”, de Marcos Nobre (piauí_98, novembro), a respeito da recente disputa presidencial. É uma análise equilibrada que aborda, entre outros aspectos, o aumento da influência do PMDB no sistema político e a disputa social a partir do imaginário oposicionista e do situacionista.
No entanto, uma análise isenta não pode passar ao largo da influência da grande mídia na disputa eleitoral no Brasil. Dada a concentração dos meios de comunicação, o apoio, ora velado, ora explícito, ao candidato Aécio Neves por parte da emissora de tevê dominante, a Rede Globo, e de grandes jornais e revistas como O Globo, Estadão e Veja, representa uma forma acintosa de, mais uma vez, tentar intervir indevidamente no processo eleitoral. Acho que um dos desafios de uma análise política imparcial é a disposição de abordar esse aspecto, sem nenhum cunho partidário.
Assim como é democraticamente legítimo que determinados setores receiem uma cubanização ou venezuelização do país em virtude do aparelhamento do Estado ou do uso indevido da máquina pública, devemos pensar na possibilidade de uma ditadura velada em decorrência da atuação de uma mídia coordenada e altamente concentrada.
MARIA CRISTINA DE SOUZA LEÃO ATTAYDE_BRASÍLIA/DF
Apreciei muito a lucidez do artigo “A polarização voltou”, mas fiquei perplexo com a fé no dogma pelo qual alguém melhora só se alguém piora, como se a economia fosse um jogo de soma zero, tal qual a roleta.
GIANFRANCO BELLINZONA_RIO DE JANEIRO/RJ
DILMA NO PODER
Posso ser um grande entusiasta do trabalho político de Lula, mas, entre a palavra dele e a de Daniela Pinheiro, eu fico com a da Pinheiro. Ao ler a carta do ex-presidente (piauí_98, novembro), me dei conta de que piauí e seus jornalistas conseguiram conquistar minha completa confiança. Espero que sejam dignos dessa credibilidade!
IURI BAPTISTA_PORTO ALEGRE/RS
Com referência à matéria “A afilhada rebelde” (piauí_97, outubro), no que diz respeito ao evento que contou com a participação do ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva e de Marco Tronchetti Provera em março, em Milão, informo que, em nenhum momento, houve juízo de valor a respeito do desempenho da presidenta Dilma Rousseff, seja durante a visita à sede da Pirelli, seja no jantar na residência de Marco Tronchetti Provera. A informação não tem nenhum fundamento.
PORTA-VOZ DE MARCO TRONCHETTI PROVERA, MILÃO, ITÁLIA
NOTA DA REDAÇÃO: A reportagem reafirma a informação sobre as críticas feitas pelo ex-presidente Lula à presidente Dilma Rousseff. Duas pessoas presentes ao jantar relataram o acontecido a um proeminente empresário brasileiro.
AMAMENTAÇÃO
A história pessoal de Margarita García Robayo (“Leite”, piauí_98, novembro) me fez voltar 55 anos no tempo. Para Lisboa, onde, aos 22 anos, eu acabara de ter meu primeiro filho. Sozinha na Europa, com um marido de 24 anos em sua segunda aventura teatral, eu não tinha à mão nem mãe, nem sogra, para me orientar e ajudar. E me desesperava por não ter leite.
Flávio Eduardo Frederico passou por todas as etapas de Vicente. Meu marido viveu tudo que o pai de Vicente viveu. E eu chorei, me desesperei, contei gotinhas, medi o peso do bebê gramon a gramon e me senti incompetente e às vezes má como Margarita. Não tendo também a meu alcance o pediatra tradicional da família, procurei em desespero a médica indicada por uma jovem recém-amiga portuguesa, que me sugeriu o melhor leite em pó e me ajudou a escolher mamadeiras – que elas chamavam de biberóns – de 250 gramas e de 100, para os lanchinhos entre as seis mamadas regulamentares.
Foi, finalmente, a alegria e a liberdade. Às vésperas do Natal de 1959, despachei o bebê, a ama e as mamadeiras para a casa de Teresa – a tal amiga – e voei, feliz, com o marido italiano para Roma, onde passei o melhor Natal da minha vida. O bebê guarda até hoje o cartão que lhe mandamos – e me culpa, evidentemente, por todos os males e pelo sentimento de rejeição que o persegue há 55 anos. Mas sobreviveu – e eu também.
CECILIA THOMPSON_SÃO PAULO/SP
SÓ EM INGLÊS
Pessoal, sério. Infinite Jest em português não dá (“Graça infinita”, piauí_98, novembro). Sugiro a todos que comprem a tradução a ser lançada e se acostumem com o jeitão dos livros do finado Dave [David Foster Wallace]. Mas não parem por aí. Aqueles que gostarem devem pensar em investir no inglês e voltar depois munidos de seu dicionário de inglês da Oxford, oitava edição, para os braços do original.
Não me entendam mal, a tradução é bastante boa. Esperava algo BEM pior. O problema é que os livros “pós-modernos” de língua inglesa estão tão atrelados ao idioma de origem que traduzi-los é o mesmo que escrever um outro livro sem trocar o nome do autor. Estão nessa lista Thomas Pynchon, William Gaddis, James Joyce e o próprio Foster Wallace. Imaginem, por exemplo, a tradução para o inglês de Grande Sertão: Veredas. Imaginem agora um sol bem grande ao meio-dia e você, otimista, apontando-lhe uma peneira tentando se esconder.
VICTOR JOSÉ DE SOUZA TEODORO_SÃO PAULO/SP
NOTA DA REDAÇÃO: Victor, What the hell means peneira?
FICÇÃO
Fascinante o texto de Marcílio França Castro, “Roteiro para duas mãos” (piauí_97, outubro), que permitiu a um simples escrevente do Judiciário como eu, que até hoje usa uma Olivetti Linea 98, uma viagem incrível pela literatura através dos sons da datilografia.
JOSÉ ROBERTO ZORZETO_SÃO JOÃO DA BOA VISTA/SP
QUESTÕES AMBIENTAIS
Quando li na piauí_97 as duas reportagens que tratavam de assuntos relativos ao meio ambiente (“Sapo de fora não chia” e “Esse mundo já era”), pensei em escrever um comentário a respeito do meu estado de choque e indignação diante do que considerei práticas terríveis, suicidas e cruéis, envolvendo espionagem, difamação, lucro acima de tudo e o círculo vicioso do consumismo. Desisti porque pensei que, diante do relato que deixa clara a política nada ética de multinacionais químicas como a Syngenta, e das evidências cada vez mais explícitas sobre o papel da raça humana na alteração do equilíbrio climático do planeta, é óbvio que eu não seria o único a deixar claros meu medo e indignação.
Pego a edição de novembro, e qual foi minha surpresa! Não havia cartas a respeito das reportagens. Isso me causou mais indignação do que os próprios relatos.
Será que nenhum leitor se deu conta de que as picuinhas políticas, a crise econômica, o diário da presidenta, o economista camaleônico que percorreu todos os governos desde a ditadura militar e ainda é considerado um guru da política, e até mesmo as picuinhas entre leitores, nada disso é tão grave ou importante quanto a sobrevivência do planeta Terra? Somos todos cínicos? Se destruirmos o planeta, não fará mais sentido falar em “corrupção”.
ANDRÉ LUIS ROSA E SILVA_SÃO PAULO/SP
ANIVERSÁRIO
Vocês bem que poderiam fazer uma promoção para os leitores mais assíduos de piauí na edição 100, de janeiro de 2015. Por exemplo: pedir a quem tem todos os exemplares, desde outubro de 2006, fotos criativas ou um quiz especial sobre as reportagens publicadas. Pensem aí! O prêmio não precisa ser uma assinatura, ou mesmo o pinguim, mas sim uma visita à Redação, ou o texto do ganhador publicado na edição 101, sei lá. Claro que tive essa ideia porque possuo todas as piauís até agora, sou jornalista e tenho um parafuso a mais. Nada é por acaso.
RODRIGO ROMERO_JACAREÍ/SP
NOTA DA REDAÇÃO: Ok, Rodrigo, faremos força para atender a sua sugestão. Saiba, porém, que não vai ser fácil pensar a bordo do Iate de piauí rumo a Turks & Caicos Islands, onde vamos depositar o nosso 13º.