O mestre Antônio Luiz, no corredor de sua casa
O amálgama
Um ensaio fotográfico na Chapada do Araripe
Augusto Pessoa | Edição 181, Outubro 2021
Durante três décadas como fotógrafo, registrei o relicário interiorano que é a Chapada do Araripe, um platô verde que une Ceará, Pernambuco e Piauí. Em junho deste estranhíssimo 2021, cumprida uma longa e necessária quarentena, voltei à região para reencontrar Ronaldo Fraga – e reencontrei o estilista e designer, mas reencontrei também minha própria fotografia. A ideia era registrar o trabalho de Ronaldo, que visitou os mestres da região em busca de inspiração para criar sua nova coleção, exibida nas passarelas virtuais da última São Paulo Fashion Week.
Passamos, Ronaldo e eu, quatro dias percorrendo o circuito local, que mistura paleontologia, religiosidade popular, biodiversidade e, acredite, moda. As onze fotos publicadas nestas páginas da piauí foram feitas em cinco cidades da Chapada do Araripe, todas no Ceará: Barbalha, Crato, Juazeiro do Norte, Nova Olinda e Potengi. “Se o Nordeste é o grande amálgama da cultura brasileira, o Cariri cearense é o epicentro de tudo isso”, diz Ronaldo Fraga.
Fiz imagens de grandes mestres, como Espedito Veloso de Carvalho, o Espedito Seleiro, homem simples de Nova Olinda que levou a arte do couro para as passarelas do mundo, ou como Antônio Luiz de Souza, artista de Potengi que mantém vivo o último grupo de reisado, que confecciona suas próprias máscaras de madeira e couro. Fotografei também a modelo Suyane Moreira, a índia kariri que empresta tanta personalidade às roupas que veste.
Enquanto visitávamos rezadeiras, bandas cabaçais, artesãos e brincantes, ficava cada vez mais evidente a urgência de valorizarmos a cultura popular e nos livrarmos desse labirinto de desprezo e negacionismo em que nos metemos. “Precisamos remar, remar, remar mais um pouco e jamais desistir”, disse um mestre, na sua sala azul repleta de santos na parede. Talvez esteja aí o fio de Ariadne que nos levará à saída.
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