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Como ler (ou reler) clássicos russos à sombra da guerra na Ucrânia

    Púchkin em dose dupla: depois de ser banido pelo czar por causa de um poema, o Púchkin que defendia a liberdade individual passou a se revezar com o Púchkin que celebrava o Império Russo CRÉDITO: VÂNIA MIGNONE_2023

posfácios do nosso tempo II

Como ler (ou reler) clássicos russos à sombra da guerra na Ucrânia

Uma análise da ideologia em Anna Karenina, Crime e Castigo e Eugene Onegin

Elif Batuman | Edição 201, Junho 2023

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A primeira e única vez em que estive na Ucrânia foi em 2019. Meu livro Os Possessos – um conjunto de ensaios que publiquei sobre meus estudos da literatura russa em 2010 – acabava de ser traduzido para o russo, junto com A Idiota, um romance autobiográfico. Eu estava indo à Rússia no papel de emissária cultural, em uma iniciativa da PEN America e do Departamento de Estado norte-­americano. No caminho, parei em Kiev e Lviv: cidades que, até então, eu só conhecia de leituras, primeiro dos romances russos e depois do noticiário internacional. Em 2014, forças de segurança haviam matado uma centena de manifestantes na Praça da Independência, em Kiev, e separatistas apoiados pelos russos declararam a independência de duas minirrepúblicas na região de Donbass. Quase todo mundo que conheci em minha viagem – jornalistas, estudantes, adidos culturais – parecia saber de alguém que havia sido ferido ou morto nos protestos, ou que se alistara no exército voluntário que combatia os separatistas no Leste.

Por ser autora daqueles dois livros intitulados Os Possessos e A Idiota, ou­vi um bom número de opiniões sobre Dostoiévski. Chegaram a me dizer que ninguém na Ucrânia queria pensar em Dostoiévski naquele momento, porque os romances dele continham a mesma retórica expansionista usada pelos russos para justificar a agressão militar. Minha reação imediata foi desprezar essa ideia, tomando-a como um compreensível efeito colateral da guerra, como algo “não objetivo”.

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