"Apesar de Kalil ser um político vestido de branco, ele é muito discreto, muito tímido", disse sua mulher. No governo Lula, o médico passava finais de semana com a família na Granja do Torto. Acima, em sua casa, exibe um dos retratos com o amigo, paciente e companheiro de pescaria FOTO: EGBERTO NOGUEIRA_ÍMA FOTOGALERIA_2012
O médico (e o) político
Como pensa, vive, trabalha e articula Roberto Kalil Filho, o cardiologista do poder brasileiro
Paula Scarpin | Edição 65, Fevereiro 2012
Como ele está? – perguntou Roberto Kalil Filho, dispensando a formalidade do cumprimento.
– Agora, bem. Mas foi uma cirurgia delicada. Tivemos que abrir o abdome de uma ponta à outra. Essa marca no pescoço é por causa do cateter. Depois de uma operação como essa, por quanto tempo vocês deixam o cateter num ser humano? – perguntou o veterinário, um jovem musculoso de camiseta e calça jeans.
– Depende muito, esquivou-se o sócio do Clube Hípico de Santo Amaro, virando as costas para deixar a filha a sós com o cavalo recém-operado. Isabella Kalil tem 17 anos. Ocupa o sétimo lugar na categoria Jovem Cavaleiro do Ranking Brasileiro de Hipismo.
Duas horas antes, naquele mesmo sábado de janeiro, Kalil andava agitado pelos corredores do Hospital Sírio-Libanês. Entre visitas a pacientes internados, tentava falar com a filha caçula, que acabara de chegar das férias na Disney. Finalmente, Rafaella, a mais velha, de 19 anos, atendeu o celular e passou à irmã. Kalil tentou convencê-la a ir com ele até a hípica, sem maiores explicações. A garota estranhou a disponibilidade do pai: “Tá com saudade dos cavalos? Fala logo, o que aconteceu?” O médico precisou contar que Willen, campeão que havia importado da Bélgica para presentear Isabella no Natal anterior, tinha passado por uma cirurgia delicada devido à obstrução da alça intestinal. “Ela percebeu que tinha alguma coisa estranha. É muito inteligente, muito sensitiva. Puxou ao pai”, disse Kalil, satisfeito, ao fim da ligação.
O avô do cardiologista foi um dos fundadores da hípica, clube que congrega cerca de 600 sócios na Zona Sul de São Paulo. O pai, Roberto Kalil, foi um montador de renome, quatro vezes campeão brasileiro por equipe, uma vez na categoria individual. Herdeiro de uma mina de quartzo e de um poço de areia na região da Grande São Paulo, sua ocupação principal eram os cavalos. Costumava se reunir com amigos militares às quartas-feiras para treinar salto. Foi nesse ambiente que conheceu João Baptista Figueiredo, antes que este chegasse à Presidência. Tornaram-se muito próximos. Mais tarde, já presidente, o general ficaria marcado pela declaração de que preferia o cheiro dos cavalos ao cheiro do povo. Mesmo no poder, jamais deixou de frequentar a casa dos Kalil.
“Olha aqui o Beto novinho, sentado do lado do Figueiredo”, apontou para o retrato Guiomar Kalil, uma senhora de cabelos impecavelmente arrumados e sapatos de lacinho. No 2º andar de sua residência, no Jardim Guedala, bairro rico de São Paulo, cercada de fotografias que ilustram a vida social da casa, ela falou sobre o filho. “Ele sempre gostou muito de política. Quando o Figueiredo vinha aqui, ficava esperando no portão.” E acrescentou que o irmão mais novo, o ginecologista e obstetra Renato Kalil, nunca demonstrou o mesmo interesse pelos convidados ilustres.
Até hoje Paulo Maluf é uma presença assídua na casa de Guiomar. Ele chegou a namorar uma tia de Kalil, irmã do seu pai, antes de se casar com Sylvia Lutfalla. “Namoro platônico, coisa de antigamente”, contou Maluf. Afeiçoado desde menino ao tio postiço, Kalil foi militante da Juventude Malufista. Em 1986, quando Maluf se candidatou ao governo do Estado, o estudante tinha camisetas e bandeiras de campanha armazenadas em casa. Os colegas de faculdade o apelidaram de “Kaluf”.
No altar do primeiro casamento, com Fernanda Luna, em 1989, os três casais de padrinhos eram Paulo e Sylvia Maluf, Romeu e Zilda Tuma e, claro, João e Dulce Figueiredo. Guiomar abre um sorriso: “Até pouco tempo, a Dulce ligava pra dizer: ‘Guiguiii, eu não me conformo! O meu Beto atendendo esse Lula!’ Eu passava o telefone para ele, que explicava: ‘Dona Dulce, eu sou médico. Fiz um juramento, preciso atender todo mundo.’” A viúva do ex-presidente faleceu no ano passado.
Na sala de estar de Guiomar, uma planta de chão de folhas longas e rígidas – a espada-de-são-jorge – se destaca na decoração clássica. A crendice popular lhe atribui o poder de proteger o ambiente contra a inveja e o mau-olhado. No outro canto da sala, sobre um aparador, Luiz Inácio Lula da Silva posa sorridente entre ela e o filho. Na foto, a mãe de Kalil tem o indicador e o dedo médio em riste: “É o V da vitória! Eu tinha horror ao Lula, o Beto me chamou para conhecê-lo e eu acabei gostando dele. Eu disse: ‘Lula, eu posso até gostar de você, mas meu dedinho não tecla 13 de jeito nenhum!’” Guiomar também já quis ser política. Tentou duas vezes uma vaga como deputada estadual pelo Partido Progressista de Maluf. Na última, em 2006, teve pouco mais de 3 800 votos.“O Beto não me apoiou. Ele sabia que eu não tinha chance. E ele não gosta de perder.”
Em 2010, a menos que Marina Silva, o azarão, disparasse na disputa presidencial, Roberto Kalil Filho não corria o risco de perder seu posto como médico particular da Presidência. Cardiologista e clínico geral de Dilma Rousseff e de José Serra, ele sempre repetia: “Não revelo meu voto, é secreto”; “É uma honra ser o médico dos dois, mas para mim eles são pacientes como todos os outros.”
Perto do segundo turno, a Folha de S.Paulo lhe pediu que divulgasse os laudos médicos dos candidatos. Kalil preferiu emitir uma nota protocolar para preservar a privacidade dos pacientes. Nela, atestava que Dilma e Serra tinham “boas condições de saúde física e mental, estando aptos para suas atividades profissionais e demais atos da sua vida civil”. Especulou-se na campanha de Serra que o documento, lacônico e superficial, estaria acobertando uma eventual condição clínica delicada de Dilma. Entre abril e setembro de 2009, a petista havia se submetido a sessões de químio e radioterapia para tratar de um linfoma – diagnosticado por Kalil durante um check-up de rotina.
Dilma e Serra dividem as atenções do cardiologista com outros figurões da política nacional. Lula, em primeiro lugar. Como ele, os ex-presidentes José Sarney e Fernando Collor, além dos ministros petistas Aloizio Mercadante, José Eduardo Cardozo e Paulo Bernardo, entre muitos. Roberto Carlos, Gilberto Gil e Wanessa Camargo também o elegeram. O cardiologista não revela quanto cobra dos pacientes famosos. É frequente entre os médicos de elite do país que a clientela de grande visibilidade (políticos, artistas, astros do esporte) seja tratada de graça. Para o cidadão sem holofotes, a primeira consulta com Kalil custa 900 reais. No dia 23 de janeiro, era possível agendar um horário para 23 de fevereiro. Com outros cardiologistas que atendem no próprio Sírio, a consulta oscila entre 500 e 750 reais.
Kalil costuma acordar sozinho às 6h30, em seu apartamento, no Jardim Paulista. As gatas Sarah e Marie – presentes do cirurgião Fabio Jatene, filho do ex-ministro Adib – são sua única companhia durante a semana. Ele e a mulher, a endocrinologista Claudia Cozer, ambos no segundo casamento, concluíram que viver em casas distintas seria a melhor maneira de evitar os conflitos da rotina familiar. Claudia tem um casal de filhos, também do primeiro casamento.
Depois de engolir um Toddynho, Kalil vai para o InCor, aonde chega por volta das 7h30. De lá, segue às 11 horas para o Hospital Sírio-Libanês, do qual é o diretor-geral do Centro de Cardiologia e membro do conselho. Até as 14 horas, visita seus pacientes – em torno de quarenta, cerca de 10% das internações do hospital, cuja capacidade é de 341 leitos. Almoça sempre que consegue no restaurante Solarium, no próprio Sírio, e só precisa atravessar a rua para chegar ao consultório. Não costuma sair antes das 22 horas. A sala de Kalil é decorada com diplomas na parede. No início de janeiro, além de um microscópio sobre a mesa, que ele guarda desde a infância, havia um vaso de rosas brancas. No chão, a espada-de-são-jorge – a mesma planta que protege a casa da mãe.
No Sírio há um grupo de auxiliares de enfermagem que se autointitulam “kalilzetes”. Naquela mesma manhã de sábado, uma delas tinha a edição da revista Época São Paulo dobrada na página com a foto de Kalil. E corria aos gritinhos: “Ai, como o chefe é lindo!” Com desdém, o cardiologista sugeriu: “Cola a foto na parede” – ao que ela respondeu: “Vou colar no meu quarto!”
Aos 52 anos, o médico do poder, como hoje é mais conhecido, disse que prefere ser identificado como um profissional atento e firme, que não se inibe diante das credenciais de pacientes que não costumam ser contrariados. Gosta de lembrar, por exemplo, que em 2010 foi até o Aeroporto de Congonhas para receber Lula, que voltava às pressas do Recife, depois de uma crise de hipertensão. O presidente seguiria para o Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça, onde seria homenageado. Kalil se orgulha de tê-lo convencido a cancelar a viagem. Em outubro passado, procurado por Marisa Letícia (também sua paciente) para que examinasse a rouquidão do marido, o cardiologista recomendou que ele fizesse um check-up urgente. Foi diagnosticado o câncer na laringe.
No último dia 12 de dezembro, Kalil pegou o telefone e ligou pessoalmente para a assessora de comunicação do Sírio-Libanês. Ordenou que convocasse uma coletiva de imprensa no final da tarde. Concluído o segundo ciclo de quimioterapia de Lula,queria anunciar a redução de 75% no tamanho do tumor. Especificou quais médicos da equipe estariam na mesa e fez questão de revisar o texto da convocatória antes que ele fosse distribuído aos jornalistas. Durante a coletiva, sentou-se na cadeira central – tinha o cirurgião Luiz Paulo Kowalskie o oncologista Paulo Hoff à sua direita; e, à sua esquerda, o também oncologista Artur Katz e o otorrinolaringologista Rubens de Brito. Todos os repórteres se dirigiam a Kalil, que ora respondia, ora transferia a pergunta para o médico mais indicado, como um mediador.
“Se sou o dono do doente, eu diagnostico e decido quem é o profissional mais adequado para encaminhar o tratamento”, disse o infectologista David Uip em seu consultório, numa tarde de dezembro. Aprovando a conduta de Kalil, completou: “Somos gestores de doentes, conhecemos o paciente por inteiro. Somos da mesma escola: a escola Fúlvio Pileggi” – referência a um dos veteranos da cardiologia no país, responsável pelo InCor durante mais de quinze anos.
Poucos ministros tiveram direito a uma cerimônia de posse tão disputada quanto à de Kalil no início de novembro, quando se tornou diretor do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas. Com o câncer recém-descoberto, Lula ficou em casa. Mas Dilma estava lá. Com ela, o governador Geraldo Alckmin, o prefeito Gilberto Kassab e uma legião de políticos. Entre cumprimentos efusivos, o médico ganhou de Maluf um beijo na testa. “Vi esse menino nascer. É um self-made man, um empreendedor. Quando jovem, ele enxergava em mim o que gostaria de fazer”, disse o ex-prefeito, em entrevista na última semana de janeiro.
Na véspera da posse, Kalil ofereceu um jantar em seu apartamento a colegas seletos – o secretário de Estado da Saúde de São Paulo, Giovanni Cerri, o presidente do InCor, Fabio Jatene, os superintendentes do Sírio, Gonzalo Vecina e Paulo Chapchap, o urologista Miguel Srougi, o oncologista Paulo Hoff e David Uip, entre outros. A convidada mais ilustre era a presidente da República. Guiomar Kalil gostou de Dilma: “Achei ela bem cabeça. Falou bem com os médicos. Acho que foi a terceira vez que ela foi lá. Mas não sei, porque ele também não me convida muito…”
Na maratona de comemorações, Kalil ainda seria homenageado depois da posse, à noite. O anfitrião, dessa vez, foi um empresário emergente da área da saúde. José Seripieri Junior, presidente da Qualicorp (empresa gestora de planos de saúde como o Bradesco, a Unimed e a Golden Cross), reuniu médicos, políticos e alguns de seus pares em sua cobertura duplex – que já pertenceu à amazona Athina Onassis –, na Vila Nova Conceição. Os ministros Alexandre Padilha, da Saúde,e José Eduardo Cardozo, da Justiça, circulavam ao lado de José Serra. O repórter José Roberto Burnier, da TV Globo, cumprimentou alguns grão-petistas com um beijo no rosto. Estava ali como convidado. Pela manhã, no coquetel, podia ser visto abraçado à mãe de Kalil. Autor do livro Os Últimos Passos de um Vencedor, sobre a agonia de José Alencar, ele e o cardiologista se tornaram grandes amigos. Foi Kalil quem lhe deu em primeira mão, dentro da UTI do Sírio, a notícia da morte do vice de Lula.
A maior incentivadora da candidatura de Roberto Kalil Filho ao cargo de professor titular de cardiopneumologia da USP foi uma mulher de 33 anos, com acentuado sotaque goiano e longos cabelos louros. Filha de um fazendeiro em Anápolis, Ludhmila Hajjar trocou a cidade natal por Brasília aos 17 anos, para cursar medicina na UnB. Foi durante sua residência no InCor, já em São Paulo, que conheceu Kalil. Segundo ela, ficou logo encantada com “esse jeito de ‘cuidado, cão bravo’”. Coordenadora das UTIs de cardiologia do InCor e do Sírio, Ludhmila é o braço direito de Kalil. Discute com ele procedimentos médicos, orienta as prioridades em sua agenda e até seleciona pessoalmente suas assistentes. “Tem que ser mulher, nenhum homem ia aguentar o Kalil. E precisa ser bonita. Ele diz que o paciente já está doente, merece ser atendido por uma mulher bonita. Mas, claro, tem que ser dedicada e inteligente, né? Para evitar esporro.” Essa parece ser a parte mais difícil. Num telefonema de Kalil para uma de suas atendentes, o vocativo “queridinha” evolui rapidamente para “antinha”. Ele explica: “Tem Angra 1, Angra 2… por que eu não posso ter a Anta 1, Anta 2, Anta 3?”
No final de 2010, durante um jantar que o médico ofereceu a colegas, Ludhmila pediu a palavra e anunciou que ele seria candidato à diretoria do InCor. “Ele ficou uma vara”, disse ela. “Mas tinha que ser ele, sabe? Ele é demais, é muito comprometido. Só ele ia dar um jeito nisso aqui.”
Inaugurado em 1977, o InCor já foi uma referência internacional em cardiologia. Hoje ainda se esforça para sair de uma grave crise financeira que culminou, em 2007, no afastamento do então diretor José Franchini Ramires. Socorrido pelo BNDES e pelo governo paulista, o hospital equacionou sua dívida, mas perdeu prestígio e ficou tecnologicamente defasado. Deixou de ser visto como um centro de excelência do sistema público de saúde.
Ludhmila se dispôs a ajudar Kalil a preparar o memorial e ensaiar a aula pública a ser dada diante da banca examinadora. Nos meses seguintes, foi com frequência à casa dele. Com o material de estudo debaixo do braço, ela chegava por volta das 22 horas e só saía quando os dois caíam de cansaço, já de madrugada. Quase no final da maratona, houve um dia particularmente tenso no consultório. Kalil avisou que não teria tempo para os estudos, e a médica insistiu na importância do encontro. “Quando cheguei à casa dele, ele pegou o material que eu tinha levado e rasgou, jogou para cima.” Kalil gritava: “Não vai ter mais concurso nenhum! Eu não vou deixar de atender um só paciente por causa dessa merda!” Ludhmila se diverte ao recordar as reações intempestivas do chefe. Os dois parecem gostar dos papéis que desempenham. Certa vez, o cardiologista ficou irritado com o excesso de ligações que ela recebia e simplesmente arremessou seu iPhone novo, espatifando-o contra a parede. Essa história foi repetida três vezes ao longo dos encontros da repórter com a dupla.
No dia 10 de janeiro, uma terça-feira, o Instituto do Câncer do Estado de São Paulo – Icesp – iria inaugurar um centro público de pesquisa clínica. Convidado para a cerimônia, Kalil sabia que Alckmin estaria presente. Ao chegar ao InCor, horas antes, o médico reclamou do ar-condicionado: “Vocês querem me matar! Isso aqui está uma geladeira!” Enquanto ouvia, a secretária Helenice Teixeira, que trabalha com Kalil há vinte anos, já lhe trazia um Toddynho. “Vou me encontrar com o governador já, já”, disse, olhando para o relógio, entre um despacho e outro em sua sala, onde também há um vaso com a espada-de-são-jorge.
Quando o horário da inauguração do Icesp se aproximou, o cardiologista interpelou a secretária, que lhe trazia uma Coca-Cola: “Chama a Ludhmila.” Mal a médica entrou na sala, ele protestou: “Eu não vou! Não me importa se vem o governador, eu tenho que trabalhar.” É difícil discernir quanto da cena se resumia a teatro. Como de hábito, Ludhmila conseguiu convencê-lo. “Olha só, o helicóptero acabou de pousar, vamos lá!”, disse ela, ao receber o comunicado via SMS. Uma chuvinha fina, mas insistente, caía no vidro da janela.
– Ludhmila, eu não vou tomar chuva! Você tem que me garantir que eu não vou tomar chuva!
– Eu garanto. Eu compro um guarda-chuva no camelô aqui na porta.
Não havia nenhum camelô na porta do InCor. Mas a distância entre os dois prédios não superava 20 metros. Kalil disparou na frente:
– Ludhmila, eu não posso tomar chuva! Vou pegar uma pneumonia! Você disse que eu não ia me molhar! – reclamava Kalil enquanto corria. Ela ia atrás, rindo. Quando se deu conta de que dois elevadores estavam reservados para o cerimonial, Kalil ficou novamente irritado: – Eu não acredito, isso é um hospital!
No andar do evento, Ludhmila abriu caminho entre os cinegrafistas: “Eu estou com o dr. Kalil, com licença.” O governador já o aguardava junto com o secretário Giovanni Cerri e o oncologista Paulo Hoff.
– Como você está, Kalil? – perguntou Geraldo Alckmin.
– Cheirando a café – respondeu de bate-pronto o cardiologista, provocando um riso constrangido no governador. No último encontro que tiveram, um assessor de Alckmin havia derramado café quente em cima de Kalil.
O grupo seguiu para o auditório. No elevador, Kalil não perdeu a chance de alfinetar Paulo Hoff: “Vai aproveitando a fama agora, porque daqui a pouco o InCor vai voltar para valer. Vai humilhar o Icesp.”
Hoff foi coordenador do Núcleo de Estudos Clínicos em Câncer do Hospital Albert Einstein entre 2001 e 2003. Hoje é diretor-geral do Centro de Oncologia do Sírio-Libanês. Ele afirma que ambos os hospitais têm corpo clínico e equipamentos de altíssimo nível. Mas sustenta que o Sírio investiu pesadamente no tratamento de câncer nos últimos anos e houve – coincidência ou não – casos excepcionais de personalidades políticas que elegeram o hospital para o tratamento – daí viriam a visibilidade e a projeção do hospital na imprensa.
Há, além disso, concepções diferentes na maneira de lidar com os meios de comunicação. O auditório do Sírio é frequentemente ocupado por entrevistas coletivas. Ao longo da doença do vice-presidente José Alencar foram ao menos cinco. O estilo comunicativo de Kalil foi incorporado pelo hospital. Nos últimos cinco anos, o Einstein promoveu apenas uma coletiva – para tratar do câncer da apresentadora Hebe Camargo, a pedido dela.
Não são apenas as entrevistas que colocam o Sírio no noticiário. No último dia 27 de janeiro, Geraldo Alckmin foi visitar Lula, que fazia radioterapia no hospital. A foto dos dois – acompanhados ainda do presidente do Paraguai, Fernando Lugo, também em tratamento contra um câncer linfático – teve ampla divulgação. O governador estava ali a pedido de Kalil. Foi ele, pessoalmente, quem telefonou para Alckmin e sugeriu que fizesse uma visita de cortesia ao ex-presidente.
Para virar diretor do InCor, Kalil precisou disputar a vaga de professor titular da Faculdade de Medicina da USP com outros três cardiologistas – Edimar Alcides Bocchi, Luiz Antonio Machado César e Bruno Caramelli. Todos fizeram sua graduação na própria USP, à exceção de Kalil, que cursou em uma instituição privada. Sua indicação acabou sendo unânime – os cinco membros da banca examinadora votaram em Kalil –, mas deixou sequelas na universidade e até hoje foi mal-assimilada pelos derrotados. Como estava em jogo um título acadêmico, coloca-se em questão se a escolha não teria privilegiado predicados como capacidade gerencial e rede de relacionamentos, não necessariamente aqueles que se esperam de um pesquisador de ponta.
“Estou certo de que Kalil tem capacidade para fazer uma boa gestão no InCor”, disse Edimar Bocchi, passando então a fazer ressalvas: “Se você vai fazer pesquisa de alta qualidade, como se espera de um titular, precisa de dedicação exclusiva. Basta ver os modelos das universidades americanas e europeias – o indivíduo passa o tempo todo lá dentro.”
“O meu memorial era o melhor. Eu tenho o maior número de pesquisas. O motivode a banca ter escolhido o outro candidato foge à minha capacidade de entendimento”, lamentou Bocchi, no final de uma tarde de janeiro, em seu consultório no InCor.
Ao tomar conhecimento dos comentários do colega, Kalil irritou-se: “O InCor não precisava de um cientista com dedicação exclusiva, precisava de um choque de gestão.” Segundo ele, Bocchi tinha, de fato, o melhor “índice H” (que quantifica as citações de um cientista em publicações especializadas), mas se isso representasse tudo não haveria nem necessidade de concurso: “Dei uma lavada. Ganhei por unanimidade. Minha arguição oral foi a melhor, eu era o único candidato com formação no exterior, tenho a melhor experiência administrativa. Bolei o Centro de Cardiologia do Sírio-Libanês, que, além da assistência excelente, tem a residência em cardiologia mais concorrida dos últimos anos.” Por fim, disse Kalil, mencionando sem rodeios o ponto, na prática, decisivo de seu currículo: “Por causa da clínica, a minha relação com a sociedade também vai ajudar na retomada do InCor.”
Um dos mais respeitados médicos do país, o urologista Miguel Srougi pensa exatamente isso. “O InCor estava quebrado, por problemas de gestão, talvez até de desonestidade. A dívida chegou a 250 milhões de reais, hoje está em torno de 50 milhões, é pagável. A gente precisava de um líder. E, antes mesmo de assumir o cargo, Kalil conseguiu 5 milhões do governo para a compra de equipamentos do InCor.’’ De acordo com Srougi, não há do que reclamar: “O Kalil pode ter defeitos, é temperamental, mas ele é bom para o processo de recuperação do InCor. A banca que o escolheu foi neutra, foi honesta.”
Ao mesmo tempo que estudava com Ludhmila, preparando-se para a avaliação acadêmica, o cardiologista disse que reservou parte do tempo para se reunir com colegas, expor suas ideias, pedir apoio. “Era uma eleição como outra qualquer; precisa fazer aliança, discutir, isso faz parte.” Kalil fez mais do que isso. Pelo menos em uma ocasião, telefonou para um médico que também conhecia um de seus concorrentes. Pediu que transmitisse ao cardiologista Luiz Antonio Machado César o seguinte recado: deveria abrir mão da disputa; se insistisse em permanecer, que arcasse com as consequências. O interlocutor entendeu a ligação como uma forma de ameaça.
Na última sexta-feira de janeiro, por telefone, Luiz Antonio admitiu à piauí que, sim, “aconteceu de eu ter sido pressionado”. E emendou: “Agora, como aconteceu, eu não vou dizer.” Formado em 1976, ele foi diretor da Unidade Coronariana do Sírio entre 1994 e 2002. Deixou o cargo quando se tornou professor-associado da USP. Concurso acadêmico, disse ele, “não é como eleição, não existe campanha. Esse último ficou politizado por causa do Kalil e dos seus contatos políticos”. Para Luiz Antonio, o critério acadêmico e científico ficou em segundo plano: “Nesse momento, se você tem alguém capaz de atrair verbas extras para a instituição, essa é a melhor escolha. Na arguição individual dos candidatos, ficou muito claro que a banca estava focada em gestão. Todo o processo girou em torno disso.” Como Bocchi, ele critica o tempo que Kalil reserva ao InCor: “Eu e os outros dois derrotados sacrificamos o consultório pela instituição. O Kalil fez a vida dele no Sírio-Libanês. Ele não fica o dia todo no InCor. E disse que não iria ficar.”
Fúlvio Pileggi foi professor e médico assistente de cardiologia na Faculdade de Medicina da USP, antes da fundação do InCor. Participou da comissão de planejamento do Instituto, do qual foi diretor-geral entre 1981 e 1997, quando completou 70 anos e precisou se aposentar compulsoriamente. Casado com uma irmã de Roberto Kalil, Pileggi chama o sobrinho, carinhosamente, de Robertinho.
“Eu vou falar só das características boas do Robertinho”, enfatizou ao iniciar a conversa em seu consultório, na Bela Vista, numa tarde de janeiro. Recém-aposentado, com 84 anos, terminava de resolver algumas questões burocráticas dias antes de desmontar completamente seu local de trabalho.
Para ser bom médico, ele disse, “você tem que gostar da profissão, porque é muito sacrificado: não tem hora para dormir, não tem hora para comer. O Robertinho é muito obstinado. É só pôr uma coisa na cabeça que ele consegue. E, acima de tudo, ele tem uma capacidade de trabalho impressionante. Se precisasse levantar três vezes de noite para ver um paciente, ele nunca rateava. Levantava e ia”.
Pileggi confessa que a pesquisa sempre o atraiu mais do que o consultório. Por isso, acabava indicando pacientes para os novatos na profissão – inclusive para Kalil. “Eu ia passando pra ele porque o meu negócio era estudar. Se eu ficasse no consultório, poderia estar milionário, mas vou me aposentar com um salário de 11 mil reais”, disse. “Em medicina, se você não estuda, fica para trás. Tudo muda rápido. Imagine então agora, com a internet. Você precisa ter um limite. Se tem pacientes demais, não dá tempo de estudar.”
Fazendo questão de frisar de que falava em termos genéricos, sem pensar em ninguém ou mencionar exemplos, Fúlvio Pileggi disse que não aprova a crescente exposição de médicos nos meios de comunicação: “No meu tempo, se eu desse uma entrevista como essa, seria chamado na Congregação e suspenso. Quem tinha que fazer a sua propaganda eram os doentes, eram os seus trabalhos publicados em congresso.” Os médicos, disse, só deveriam aparecer na televisão para esclarecer temas relativos à saúde. “Eu atendia governadores, senadores, deputados. Fui médico de dois presidentes, o Sarney e o Figueiredo. Só que eu nunca apareci em jornal e televisão.”
A respeito do InCor, Pileggi praticamente repete as palavras do sobrinho: “O Roberto, pelos conhecimentos que tem na sociedade, pode ajudar o InCor a voltar a ser o que era.” E emenda: “O instituto já melhorou muito de três anos para cá, graças a três médicos: o doutor Fabio Jatene, que é fora de série, opera um coração maravilhosamente, e agora está operando pulmão também; o doutor Jorge Kalil, que além do InCor está dirigindo o Instituto Butantan e fazendo a vacina contra a febre reumática, é um baita pesquisador; e o doutor José Eduardo Krieger, que é um cara de proeminência internacional na área de biologia molecular, código genético. São pessoas de alto padrão. Agregando-se a esses três, Robertinho tem tudo para dar uma erguida no InCor.”
Guiomar Kalil lembra que o filho anunciava que seria cientista desde muito pequeno. Aos 7 anos, pediu um microscópio de aniversário e começou a fazer experimentos com alimentos mofados e sementes que brotavam num lavabo de casa. Quando ainda cursava o pré-vestibular, já decidido a ser médico, comentou com a mãe: “Eu só tenho certeza da especialidade que não vou seguir: cardiologia. Se eu me destacar, vão falar que foi por causa do meu tio.” Depois da segunda tentativa frustrada para entrar na USP, Kalil se matriculou no curso de medicina da Universidade de Santo Amaro. “Eu não queria perder mais tempo, queria logo ser médico”, disse.
Sua mãe recorda da aflição que todos viveram até que Kalil fosse aprovado na residência médica do Hospital das Clínicas. É Pileggi quem explica: “O médico formado pela USP tinha prioridade para a residência no HC. Sobravam duas ou três vagas para os alunos de fora. Eu não tinha tempo para orientar o Robertinho pessoalmente, então arrumei umas pessoas para discutir os pontos com ele. Ele disputou com todo mundo e entrou. Fez um ano de clínica médica, e depois outro de cardiologia.”
Ao final da residência, o tio recomendou a Kalil que fizesse um curso de especialização no exterior para gabaritar o currículo. “Eu tinha um intercâmbio com a Johns Hopkins, ele fez o teste e foi aceito para estudar a aplicação da ressonância na cardiologia”, contou Pileggi. Por exigência do pai, Kalil se casou antes de ir para o exterior. Segundo Kalil pai, foi também por ordem dele que o filho voltou depois de dois anos e concluiu o mestrado, o doutorado e a livre-docência no InCor, sempre trabalhando ao lado do tio.
A família tende a ver Kalil como o herdeiro natural de Pileggi. “Todos criticavam a vida do meu cunhado, que comia, bebia e dormia o InCor”, disse Guiomar. “E agora a vida do Fúlvio se repete na figura do Beto.” A comparação desagrada a Pileggi: “Isso de herdeiro não existe. Ele tem qualidades.”
Diferentemente de muitos dos pacientes de Kalil, Lula nunca chegou a ser tratado por Pileggi. Quando voltou da especialização nos Estados Unidos, em 1991, Kalil foi indicado por outro veterano do InCor, o já falecido Giovanni Bellotti, para tratar de Dirce Teixeira, mãe de Roberto Teixeira, advogado petista, um dos maiores amigos de Lula. No mesmo ano, Teixeira apresentaria Kalil para o compadre: “O Lula ainda não era penico. O Teixeira lhe recomendou o Robertinho. Foi assim que ele entrou para a corriola”, disse Pileggi, emendando: “Ele tem uma percepção muito grande, deve ter pensado: ‘Deixa eu pegar esse cara, ele vai ser presidente.’ E pegou.”
Kalil não esconde a pretensão de influenciar o poder. “Sempre tive política na minha veia, mas eu gosto é de medicina. Se eu tenho acesso direto às pessoas importantes do país, ao presidente da República, e dou a opinião de um médico que quer o bem da medicina do país sem pedir nada em troca, a minha opinião é levada muito a sério”, disse no InCor. “Eu falo o que eu quero, e eu sou bocudo mesmo, é meu direito. Eu não faço parte do governo, não quero ser secretário, não quero ser ministro. É uma contribuição. Se eu sei de algo que está errado, pego o telefone e falo com o ministro. É uma informação extraoficial, é importante.”
A amizade com Lula é particularmente cara a Kalil. Às vezes parece uma relação de pai e filho, define a mãe. Quando Lula ainda era presidente, Kalil costumava passar fins de semana com a família na Granja do Torto. O petista o acordava pessoalmente para irem pescar juntos. “Apesar de todo mundo saber que o Kalil é um político vestido de branco, ele é muito discreto, muito tímido”, disse a mulher, Claudia Cozer. “Na época do Lula, quando a gente tinha mais intimidade, eu falava pra ele pedir ingressos da Fórmula 1, para levar as crianças”, comentou Claudia. “Mas ele não pedia, ele morre de vergonha.”
O médico, no entanto, não resistiu e fez um pedido pessoal a Lula quando Barack Obama visitou o Brasil, no ano passado. O ex-presidente não decepcionou o amigo. Arranjou-lhe um lugar no sofá durante um café no Palácio da Alvorada, do qual participaram apenas a família de Dilma e alguns ministros. Kalil foi apresentado pela presidente como seu médico e fez questão de guardar uma recordação do encontro. Na semana seguinte, quem cruzasse com ele no Sírio era interpelado. “Sabe quem é esse cara?”, perguntava, com o iPad já aberto na foto com o presidente americano.
Kalil detesta viajar. Tem medo de avião e horror a areia. “Quer deixar ele estressado? É só tirá-lo da rotina. Ele não gosta de férias. A cabeça fica aqui”, disse Claudia. Recentemente, no entanto, por influência de Miguel Srougi, o casal comprou uma casa em um condomínio em Bragança Paulista, a 90 quilômetros de São Paulo. No primeiro fim de semana, ainda estavam sem internet, tevê a cabo e telefone. “Pensei que ele fosse se matar”, disse a mulher. Srougi mostrou a Kalil a sua coleção de motocicletas. “Agora ele ama ir para lá no fim de semana, para andar de ‘motinho’. Comprou uma amarela e um capacete vermelho, uma cafonice completa”, se divertiu a mulher. Fora disso, poucas coisas distraem o médico além do trabalho. Quando Fabio Barreto lançou Lula – O Filho do Brasil, fez uma sessão num sábado de manhã apenas para Kalil e seus convidados. Ele obviamente gostou. “Se você arrastá-lo até um cinema e ele gostar do filme, como o Planeta dos Macacos, ele fica até o fim. Se não, no meio da sessão já está ligando para alguém.”
Kalil se considera um espiritualista. Faz mapa astral todo ano com a astróloga Maricy Vogel. “Ele vive o mapa astral, se influencia muito”, comentou Claudia. “Eu sou canceriano. Ou seja: sou chato, perfeccionista, sofro muito”, disse Kalil. “Ele é muito místico, gosta de pedras, cristais, feng shui, astrologia, de tomar energia, passe”, prosseguiu a mulher. Católica fervorosa – na sua própria definição –, ela já o acompanhou ao terreiro da Mãe Menininha do Gantois, na Bahia, e a Goiás, em sessões com o médium João de Deus. “Ele é muito intuitivo, sensível, capta muito as coisas. Percebe quando uma pessoa está mentindo ou não está bem. Tem uma parte espiritual muito desenvolvida”, resumiu Claudia.
“Eu acredito que nada é por acaso”, disse Roberto Kalil Filho um pouco antes do encontro com Alckmin em janeiro. “Eu não me deslumbro com nada. Vim de baixo, se cair de novo não vai ser um problema para mim.” Numa entrevista à revista Veja em 2010, o cardiologista disse que vinha de uma família de classe média e que seus pais tiveram dificuldade para manter os dois filhos no Colégio Dante Alighieri. Segundo ele, seu gosto pelo cachorro-quente vinha dessa época: “Meus amigos todos compravam o sanduíche no recreio, mas, como eu não tinha dinheiro, era obrigado a comer o pão com manteiga que trazia de casa.”
“Nem me fale dessa história do cachorro-quente!”, agitou-se Guiomar na sala. “Você está vendo esta casa? Ele cresceu aqui! Com piscina, quadra de tênis. Nós nunca tivemos menos de oito empregados.”
Ao saber que o filho havia dito que precisou de bolsa de estudos no colégio, Guiomar desatou a rir: “Que filho da… Eu não sei por que ele faz isso.” Inconformada, telefonou para o pai de Kalil, de quem é divorciada, e pediu que ele fosse até sua casa endossar sua versão da história. Roberto Kalil, o pai, mora por perto e não demorou a chegar. “Acho gozado”, limitou-se a comentar sobre a história. “O outro filho é que é o sol da minha praia. O nome desse é Roberto Kalil Filho… da Guiomar”, disse, em tom de chacota. “Ele sempre foi ávido por dinheiro. Eu o chamava para jogar tênis, ele reclamava que a perna estava doendo. Eu dizia ‘Eu pago!’, e ele respondia: ‘Quanto?’”
Assim que o ex-marido foi embora, Guiomar contou um pedaço de sua própria história. O filho ainda fazia a especialização nos Estados Unidos quando, um dia, o marido lhe pediu que assinasse alguns papéis, “burocracias da casa”, ele teria dito. Logo depois, Guiomar soube que havia assinado, na verdade, uma autorização de venda do imóvel. Roberto Kalil, o pai, usou o dinheiro da venda da casa para construir uma vida nova longe dela. Em apuros, com o filho caçula ainda cursando medicina na Faculdade da Santa Casa, ela confessou que pensou até em suicídio. A amiga Dulce Figueiredo viajou do Rio para São Paulo e ajudou Guiomar a se mudar para um apartamento. Paulo Maluf empregou-a em seu gabinete, e ela contou ainda com o apoio do amigo Ademar de Barros Filho – padrinho de seu casamento com Roberto Kalil. Ademar, por coincidência, também tinha acabado de se divorciar. Os dois não demoraram a engatar um relacionamento. Casaram-se e, logo depois, ela foi morar na casa dele, no Pacaembu. Ao tomar conhecimento do relato da ex-mulher, Roberto Kalil não quis se pronunciar sobre o assunto.
Anos mais tarde, Kalil já era um cardiologista estabelecido quando foi chamado para atender uma paciente com angina no Jardim Guedala. Ao chegar lá, se deu conta de que era exatamente a casa onde havia crescido. No fim da consulta, não resistiu e comentou que havia vivido ali por muitos anos. A paciente respondeu que morava de aluguel, mas em breve devolveria o imóvel, porque ia se mudar para outro estado. Kalil anotou o telefone do proprietário, comprou a casa de volta e a deu de surpresa para a mãe. Para a decoração da sala, presenteou-a com um vaso de espada-de-são-jorge.