"Eu achava, e ainda acho, que Machado de Assis era um monstro. Um monstro que não fazia mal a ninguém, que nunca haveria de fazer mal a ninguém, mas não obstante, um monstro" FOTO: SASCHA HARNISCH © ACERVO DO CONDOMÍNIO DOS PROPRIETÁRIOS DOS DIREITOS DE IMAGEM DE MANUEL BANDEIRA
O palhaço da burguesia, O monstro, O Cavalo, O Falso ridículo
Em textos inéditos, só agora reunidos em livro, o poeta pernambucano opina sobre Oswald, Machado, Rubem Braga e Bilac
Manuel Bandeira | Edição 19, Abril 2008
OSWALD DE ANDRADE
O prefácio de Serafim Ponte Grande torna quase inútil qualquer crítica que se pretenda fazer ao romance. “Epitáfio do que fui”, diz o autor. Na lista das suas obras renegadas (todas) está incluída a mesma história de Serafim. Quem renega uma obra, não a publica. O gesto do autor, publicando-a, faz compreender a cautela do Partido Comunista que não o quis aceitar até hoje. De fato, não se imagina ninguém mais longe da mentalidade marxista: o marxista é um sujeito sério como um antimarxista. O jovem Otávio de Faria se parece muito mais com um marxista do que Oswald de Andrade.
Mas admitamos que não haja ainda no Serafim nem sombra do marxista atual. O romance não acrescenta nada à obra do Andrade. Quase não interessa depois do João Miramar. É uma repetição. Com o mesmo defeito de misturar freqüentemente os sentimentos e os processos de escrita do autor com os de seus personagens: como Miramar, Serafim se torna de vez em quando o poeta admirável que foi e continua a ser o Oswald de Pau-Brasil e do Primeiro Caderno de Poesia. Um poeta “de cujo fundamental anarquismo jorra sempre uma fonte sadia, o sarcasmo”. Nem sempre sadia.
Oswald nega, rene-ga. O que será amanhã?
No Serafim é ainda o palhaço da burguesia. O drama atual de Oswald é que só um sujeito como eu, pequeno-burguês e poeta menor, pode gostar do que ele escreve. O comunista que ruminou O Capital na íntegra e o proletário que lia A Classe Operária não o sentem nem o entendem. Esperemos a obra futura e vejamos se o homem de Pau-Brasil é capaz de, em bem da revolução, se despojar daquele individualismo que tanto se compraz – acima de tudo se compraz – na deformação diletante e feroz, de que o Serafim e o seu prefácio são o último exemplo.
1933
MACHADO DE ASSIS
O caso Antonieta Rudge me faz pensar no caso Machado de Assis. Perdão, eu conheço bem as enormes diferenças. O caso Machado de Assis era complicadíssimo, o de Antonieta simples.
Machado de Assis era inquietante. Conheci-o pessoalmente, eu era rapazola. Laranjeiras… O rio da Carioca a descoberto. Era particularmente pitoresco nas proximidades da casa do mestre. Uma casa que era um amor de simpatia. Porque era do mestre. A prova é que havia mais duas ou três iguais a ela e não eram a mesma cousa. Eu passava por lá sempre com um bruto respeito. O Brás Cubas fora escrito ali? Em todo caso o Dom Casmurro. A casa de Capitu. À tardinha havia sempre uma janela aberta na sala de visitas, a primeira janela à esquerda, e eu já sabia que havia um vulto de senhora, bonita cabeça de cabelos todos brancos, com um livro aberto nas mãos. Era Corina, Carolina, a esposa do mestre, que o esperava de volta do Ministério da Viação. Todas as noites quando eu ganhava a rua depois do jantar via passar um casal agarradinho: o mestre com Carolina. Machado de Assis dava a impressão de um homem muito tímido, muito discreto, incapaz da menor maldade. Seria bom? Era bom no sentido de não fazer a menor maldade a ninguém. Mas eu lhe tinha lido a obra inteira. E embora fosse um fedelho, não sei, Machado de Assis me inquietava. Aquela história do enfermeiro… O soneto “Suave mari magno”… Nos versos como no conto o gosto doentio de espiar o sofrimento alheio. E a psicologia dura, derrotista, insultante de quase toda a obra. Sempre o móvel egoísta, e ainda que limpo, inconfessável. Machado de Assis dava o sentimento desconfortante que aos olhos dele não adiantava ser bom, que era impossível fazê-lo reconhecer a generosidade de um nosso gesto de bondade, de dignidade ou de modéstia. Certa vez tive de levar a Machado de Assis uma carta de meu pai demitindo-se do lugar de consultor técnico do ministro da Viação. O engenheiro deixava o seu cargo por solidariedade com um amigo, injustamente atingido num caso escandaloso da administração. Levei essa carta danado da vida. Fui todo o caminho pensando que Machado de Assis havia de formular a respeito do ato de meu pai uma filosofiazinha desagradável. E eu só de imaginar nisso tinha vontade de bater em Machado de Assis. Em suma eu achava, e ainda hoje acho, que Machado de Assis era um monstro. Um monstro que não fazia mal a ninguém, que nunca haveria de fazer mal a ninguém, mas não obstante um monstro.
Ao passo que Antonieta é, sempre me pareceu, um anjo. Principia que é loura. Nisso eu fiquei criança: anjo para mim tem que ser louro. Adorei os anjos mulatinhos do quadro de Tarsila, mas francamente não acredito neles. Estou cert que, para os serviços angélicos do paraíso, Deus tem o preconceito de cor. Ora muito bem, Antonieta é anjo. É de tal maneira anjo, que pode ser ao mesmo tempo mulher, e eu acredito que Antonieta seja uma mulher como as outras (Machado de Assis no caso). E Antonieta é simples. – Como? É mulher e é simples? – Perfeitamente, vamos deixar dessa história. Machado de Assis era simplíssimo na expressão, complicado no sentimento: “Tinha outro dentro”, como dizia a cozinheira do Ribeiro Couto em Campos do Jordão. Antonieta não tem outra dentro. É aquilo mesmo. Eu não disse que ela era anjo? Os anjos são assim.
Afinal comecei escrevendo que Antonieta me lembrava Machado de Assis e já estou quase no fim destas duas meias colunas e até agora só disse que ele era um monstro e que ela é um anjo. Vou depressa desmanchar a antítese. Ambos são iguais no extraordinário pudor. A nenhum dos dois falta aquilo que a crítica de música chama temperamento. Mas que recato na expressão dessas cousas! O nosso grande João Ribeiro declarou uma vez não conhecer nada mais – como dizer? – sex-appealing do que na obra de Machado de Assis o conto “Os braços de dona Severina”, onde no entanto não há nada de mais sensual senão aqueles braços e em verdade nada acontece. Muitas vezes ouvindo certas interpretações tão finas de Antonieta (não esquecerei nunca o adágio da Apassionata há anos no Municipal carioca) tenho pensado, sem querer, nos braços de d. Severina.
O pudor desses dois artistas não se limita apenas ao domínio propriamente sexual, senão a tudo. Machado de Assis nunca descreveu uma paisagem. Acho que ele foi o único brasileiro que teve o sentimento de pudor diante da paisagem brasileira. Esse senso do pudor está na base de todo estilo. E aí está afinal de contas o que desde o princípio eu queria dizer de Antonieta: ninguém melhor que ela ilustra o sentido dessa palavra tão difícil de definir – o estilo.
1930
No seu estudo crítico e biográfico sobre Machado de Assis, escreveu Lúcia Miguel Pereira: “A um amigo seu que o acusava de materialista, já no fim da vida, retrucou, vivamente: Materialista, eu? absolutamente!”
E no pé da página vem a nota: “O dr. Abel Ferreira de Matos, o amigo Abel citado por Machado de Assis num admirável conto, ‘O incêndio’, publicado em 1906 no Almanack Garnier. Abel de Matos e seu colega Manuel Sousa Bandeira eram consultores técnicos do Ministério da Viação…”
Peço licença para retificar: o dr. Abel de Matos não era consultor do Ministério; mas freqüentava assiduamente o gabinete do meu pai, onde Machado de Assis aparecia de vez em quando para espairecer.
De uma feita que Machado de Assis entrou lá estava meu pai fazendo uma mancha do posto semafórico do Castelo, uma aquarelinha em papel almaço. Machado de Assis gostou muito da pintura e pediu-a a meu pai. No dia seguinte contou que tinha mandado encaixilhar a aquarela.
Meu pai ficou tão cheio de honra, que saiu dali narrando o fato a meio mundo.
Dias depois o dr. Antonino Fialho, encontrando-se com Machado de Assis, falou-lhe no caso. Pra quê? Machado de Assis espinhou-se todo e respondeu amoladíssimo:
– J… á é a t… erceira pessoa que me fala nisso!
Ao que o dr. Antonino replicou simplesmente:
– Sinto muito ter sido a terceira…
Foi por esse tempo que tive a fortuna de conhecer o mestre.
Tinha acabado de aparecer o Dom Casmurro. Uma tarde, tomando o bonde no Largo do Machado, aconteceu sentar-me ao lado de Machado de Assis, que vinha lendo um jornal. Pois, não é que ele dobrou o jornal e puxou conversa com o rapazola de 15 anos? Fiquei radiante. Machado de Assis começou a contar um passeio que fizera na baía com um grupo de escritores, passeio durante o qual o Holanda recitara:
– Recitou aquela estrofe dos Lusíadas… Como é mesmo? Do episódio em que Vênus vai pedir a Júpiter pelos portugueses…
Eu, muito vaidoso de mostrar a minha familiaridade com o Camões, recitei:
– “C’um delgado cendal as partes cobre…”
Machado de Assis interrompeu-me:
– A estrofe anterior!
A memória traiu-me. Não houve meio de me lembrar da estrofe anterior! Fiquei desolado.
Naquele ano estive à noite em casa de Machado de Assis no dia do seu aniversário. Como eu tinha vontade de conhecer aquele interior, quando passava de tarde pela rua e via um vulto de d. Carolina sentada junto à janela da esquerda lendo! Interior simples, como o descreve Lúcia Miguel Pereira. Poucos amigos, só os íntimos. Lembro-me bem do dr. Heitor Bento Cordeiro.
Machado de Assis, como o conheci, está todo no livro de Lúcia Miguel Pereira. É uma ressurreição digna de figurar ao lado dos melhores de Strachey. Sente-se neste estudo, a par de senso crítico incomum, a imaginação da romancista, tudo penetrando, tudo vivificando. Crítica e biografia, conduzidas a par e passo, equilibram-se através de todo o volume. No gênero não me lembro de outra obra em nossa literatura que dê maior impressão de harmonia. E pode-se dizer que nela Lúcia Miguel Pereira revela toda a medida do seu talento crítico e dos seus dotes de escritora.
Ela sabe dizer muito numa frase curta. Por exemplo: “Encostava-se, sem abraçar.” Capítulo admirável é aquele em que ela analisa os romances A Mão e a Luva, Helena e Iaiá Garcia, mostrando que eles representam o debate que Machado de Assis travou com a sua consciência para justificar a seus próprios olhos o abandono de Maria Inês.
Esse capítulo é uma aquisição nova e definitiva para a crítica.
Virada a última página do livro, que impressão se guarda do biografado? Hum… ruinzinha!
Em vão Lúcia Miguel Pereira temperou a sua solidez intelectual com a simpatia e carinho que demonstra pelo grande esquizóide.
O abandono de Maria Inês, a ocultação da epilepsia a Carolina são nódoas irreparáveis. Machado de Assis venceu em toda a linha. Mas foi uma vitória que lhe envenenou as fontes do pensamento. O seu pessimismo não me parece ingênuo. Sendo o egoísmo a linha mestra da sua vida, teve, para não se desprezar a si próprio, de desprezar os homens em bloco, de atribuir sempre aos atos humanos um móvel egoísta. E é horrível pensar-se a que mesquinho ideal Maria Inês foi sacrificada – o bem-estar burguês, a tranqüilidade burguesa. Pouco importa que dentro desse repouso o romancista tenha criado uma grande obra. Essa obra nos enche de admiração mas deixa-nos no coração um sentimento amargo.
Lúcia Miguel Pereira espanta-se que Machado de Assis, tendo assumido todas as exterioridades burguesas, não se tenha aburguesado. Aqui é que não concordo com ela, pois me parece que Machado de Assis foi visceralmente um burguês, pelo seu amor ao conforto prudentemente mediano e pelo egoísmo feroz com que se aplicou a alcançá-lo. A aridez de sua obra foi o preço do seu triunfo.
1939
VELHO BRAGA
Foi ele próprio que começou a chamar-se assim, embora não lhe assistisse nenhum direito ao adjetivo. Hoje que chega ao meio século, e é embaixador, nosso representante em Marrocos, e tem dois netos (por obra de um filho louquinho que se casou antes dos 20 anos), hoje pode principiar, com alguma modéstia, a pretender ao título com que costuma enfeitar as suas crônicas. De fato foi a 12 de janeiro de 1913 que o céu nos mandou via Cachoeiro de Itapemirim, estado do Espírito Santo, esse grande poeta disfarçado em jornalista, essa ótima praça que é o nosso amigo Rubem Braga.
Quem quiser tomar conhecimento da folha corrida de Rubinho, como o chamam Vinicius e outros cupinchas do peito, recorra a minha Antologia dos Poetas Brasileiros Bissextos Contemporâneos, onde, entre outras coisas, pus por escrito que o mais ilustre dos cidadãos de Cachoeiro estudou até os 14 anos nos pagos natais, terminando o curso secundário em Niterói e entrando depois para a Faculdade de Direito do Rio (foi quando descobriu a “eterna rua do Catete”), transferindo-se depois para a Faculdade de Belo Horizonte, onde se formou em 1932. Mais: desde 1929 trabalhava na imprensa, tendo começado no Correio do Sul de Cachoeiro, e passando a seguir por vários jornais e revistas de Minas, S. Paulo, Rio, Porto Alegre e Recife. Mais: em 1944 acompanhou a Força Expedicionária Brasileira como correspondente de guerra. Mais: em 1936 publicou o livro O Conde e o Passarinho, no qual reuniu o seu primeiro punhado de crônicas, gênero em que atualmente no Brasil e na América do Sul ninguém lhe leva a palma.
E não leva por quê? Qual o segredo de Braga? Creio ser este: pôr em suas crônicas o melhor da poesia que Deus lhe deu. Outros põem também poesia nas suas crônicas, mas cautelosamente, só o refugo; a melhor eles guardam para os seus poemas. Ao passo que o velho Braga, poeta sem oficina montada, descarrega todos os seus bálsamos e venenos na crônica diária. Braga na crônica é sempre bom, e quando não tem assunto então é que tripudia no melhor: mestre no puxa-puxa, espreme no palmo de coluna certa inefável poesia que é só dele. Sempre me irritou dizer de um sujeito estúpido: “É um cavalo.” O cavalo é um animal inteligente, observador; grande observador, e o que é importante, sans en avoir l’air (“sem parecer”). Braga também é assim. Com aquele seu ar contrafeito, hipocondríaco, songamonga, parecendo não prestar atenção a nada, não perde nada, anota nos escaninhos do subconsciente os mil detalhes da vida enorme, os quais, muito mais tarde, a propósito disto ou daquilo, comparecem numa crônica a tempo e a hora, no minuto exato em que são requisitados pela memória de Braga para nos surpreender a sensibilidade incauta.
Velho Braga, jovem cinqüentão glorioso, o iminente octogenário Bandeira te saúda com uma saudade grande como o oceano que neste instante nos separa.
1963
AMORES DE BILAC
Antes dos 23 anos Bilac esteve noivo de Amélia de Oliveira, irmã de seu amigo Alberto de Oliveira. Seu livro Via Láctea foi dedicado a ela nestas palavras: “À que me espera.” Se não tivesse morrido o pai de Amélia, é muito provável que os noivos tivessem casado: o pai consentira no casamento. Seu filho mais velho, porém, o Juca, não via com bons olhos o enlace da irmã com um poeta notoriamente boêmio. Como chefe da família, depois do falecimento do pai, opôs-se tenazmente ao casamento e conseguiu impedi-lo. Bilac teve que afastar-se da casa dos Oliveira, cessou as relações até com Alberto, com quem só voltou a reatá-las muitos anos depois. Viveu a sua vida, amou outras mulheres (versos seus o atestam), mas morreu solteiro.
Morto o poeta, começou a formar-se a lenda de um Bilac sempiternamente fiel ao amor de Amélia, um Bilac vitalício, atitude de namorado sem ventura ou, como se dizia no princípio do século, de coió sem sorte. E é esse Bilac bastante ridículo que nos apresenta o livro Vida e Poesia de Olavo Bilac, recentemente editado e da lavra de Fernando Jorge. Para comprovar a falsificação romântica bastará transcrever o impagável episódio da página 357:
“Na mesa do poeta”, conta o biógrafo, “havia sempre flores vermelhas. Eram oferecidas por Amélia de Oliveira à irmã de Bilac, com o objetivo de serem colocadas ali.
“Fitando essas flores, Olavo adivinhava-lhes a procedência, recordava-se do vulto de Amélia.
“Uma feita, a irmã de Bilac quis ver o efeito que elas iam causar ao poeta. Pôs um ramilhete de rosas numa jarra e escondeu-se atrás de um reposteiro. E ficou a olhar os movimentos de Olavo.
“Ele, sentado em sua poltrona, permaneceu embebido na contemplação das flores. Depois de largo tempo, levantou-se e beijou, com enorme delicadeza, uma olente rosa escarlate, que lhe lembrava, sem dúvida, a tépida maciez de uns lábios purpúreos, outrora sofregamente osculados.
“E nas pétalas dessa rosa fragrante, caiu o rocio de suas lágrimas quentes.”
Tudo nessas linhas caprichadas – a “enorme delicadeza”, a “olente rosa”, os lábios “sofregamente osculados”, o “rocio das lágrimas quentes” – concorre para o efeito ridículo, que seria magistral se tivesse sido preparado com tal intenção.
No entanto há outro episódio no livro que devia ter esclarecido o seu autor sobre a verdadeira psicologia de Bilac. É o da página 339.
“Amélia de Oliveira”, diz Jorge, “diversas vezes procurou Gregório da Fonseca para ver se este conseguia aproximá-la de Olavo. Ela afiançava que não havia nenhuma pretensão amorosa. Os dois estavam envelhecidos e nada mais natural, portanto, ‘que se vissem como simples amigos de mocidade’. Apesar de tudo, Bilac sempre se opôs. Mostrava-se recalcitrante. E dizia a Gregório:
“- Que diabo de graça tem agora nós nos encontrarmos? Que diabo vamos dizer um ao outro? Eu estou velho, neste estado; ela é hoje uma verdadeira matrona. Eu morreria de ridículo.”
Eis o verdadeiro Bilac. E Jorge ainda acrescentou: “Algumas vezes, quando Bilac e Gregório se achavam juntos, Amélia surgia ao longe, numa esquina ou numa porta. O poeta, em tais circunstâncias, puxava o braço do amigo, querendo mudar de caminho. E deveras atrapalhado, sem saber onde colocar os pés, ele gaguejava: – Vamos… vamos… vamos dobrar aqui… lá vem a ‘minha viúva’…”
Repito: este é o verdadeiro Bilac e quem algum contacto tenha tido com o poeta sabe disso; o outro é criação da pieguice de alguns admiradores bem-intencionados mas ineptos: com que força de expressão Bilac os qualificaria! Essa lenda precisa acabar. O idílio com Amélia foi, como o definiu o próprio poeta, “o sonho vago que expirou tão cedo, soçobrado no porto antes do surto!”.
1963
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