Uma enxurrada de críticas
| Edição 111, Dezembro 2015
ACIDEZ E VODCA
Ainda atordoado pela leitura de “À deriva” e “O fim do fosso?” (piauí_110, novembro) – e antes mesmo de terminar de ler a revista –, resolvi, mais por arrebatamento do que por delicadeza, enviar-lhes esse desafogo epistolar, que espero sirva ao menos como um bálsamo para o meu esôfago ácido.
“À deriva” aborrece, enfada e nauseia qualquer brasileiro naturalmente triste e involuntariamente bronzeado pelo sol sul-americano, alheio à sombra das palmeiras de Miami Beach. Faltou espírito crítico ou capacidade de análise à repórter. A miserável condição da Petrobras não pode ser creditada apenas à vaidade de seus diretores ou do Conselho de Administração, nem mesmo a escolhas equivocadas consumadas no passado, e eventualmente ainda em vigor no presente. Como foi possível não tratar dos interesses multinacionais em uma reportagem tão detalhista?
Quanto a “O fim do fosso?”, é preciso fazer uma constatação evidente: a de que a luta de classes promove a luta de ideias, e consequentemente alguma contenda social, ainda que indesejada. É claro que a situação argentina é mais complexa do que isso, mas não muito. O que aparece ali é o fastio da vida. O mundo é vil, e nós geralmente somos medíocres. Felizmente temos a arte; e alguns têm também os espíritos, os discos voadores e as teorias conspiratórias. Josefina Licitra, lide com isso – e deixe as lamúrias para a seção de cartas.
LAMARTINE NASCIMENTO_RIBEIRÃO PRETO/SP
A reportagem da jornalista argentina Josefina Licitra “O fim do fosso?” faz lembrar uma propaganda televisiva da década de 80. Aquela da Vodka Orloff, cujo bordão “Eu sou você amanhã” funcionava perfeitamente para os fatos políticos: aconteciam primeiro na Argentina, e logo em seguida eram replicados no Brasil. Assim como o kirchnerismo se esgotou após doze anos de governo, o lulismo passa agora por grave crise de governabilidade, que põe em risco o seu futuro. Lá, como aqui, a sociedade foi radicalmente dividida, nós contra eles, pobres contra ricos, um maniqueísmo populista que resulta numa fratura ideológica. Caberá agora a Mauricio Macri tentar superá-la. Se o efeito Orloff continuar funcionando, também por nossas bandas deverá surgir alguém para exercer esse papel.
DIRCEU LUIZ NATAL_RIO DE JANEIRO/RJ
ERRO
A respeito da matéria “À deriva”, gostaria de esclarecer que a agência FCB Brasil não foi investigada na Operação Lava Jato. Foi citada, mas não investigada. Nenhum executivo da agência foi denunciado nessa mesma operação. Além disso, a Caixa Econômica Federal e o Ministério da Saúde não são clientes da FCB Brasil. Assim, a frase “executivos da agência já foram denunciados por pagamento de propina ao deputado André Vargas, por contas da CEF e do Ministério da Saúde” não é verdadeira. A campanha “Petrobras de Portas Abertas” não era de nossa responsabilidade: foi criada exclusivamente pela agência Heads, que detém a parte institucional da conta da Petrobras. Tampouco a FCB Brasil criou alguma campanha para o patrocínio da Fórmula 1 na TV Globo. Esse patrocínio pertence à área de atuação da agência NBS.
MARIA CLARA CACAIA JORGE, DIRETORA DE RELAÇÕES PÚBLICAS DA FCB_SÃO PAULO/SP
NOTA DA REDAÇÃO: Ao contrário do que foi publicado na reportagem “À deriva”, a agência FCB Brasil não teve executivos denunciados na Operação Lava Jato. Os denunciados são da agência Borghi/Lowe, que pertence ao mesmo grupo da FCB Brasil. Segundo o Ministério Público, eram da Borghi/Lowe os executivos que pagaram propina ao deputado André Vargas por contratos na CEF e na Saúde. A agência também não criou a campanha do patrocínio da Fórmula 1, que ficou a cargo da NBS.
VULTOS DA REPÚBLICA
Os vultos da República estão rareando. Neste mês de outubro o retratado foi Jean Wyllys (“A bancada de um homem só”, piauí_110, novembro). Se a série continuar, o próximo escolhido talvez seja Sibá Machado, o farol do petismo na Câmara Federal.
LUIS ROBERTO FERREIRA_GUARUJÁ/SP
A desgraça televisiva do BBB serviu ao menos para uma coisa: revelar Jean Wyllys. Também foi reveladora a matéria de Adriana Abujamra sobre o deputado, que nos apresenta meandros importantes da política, da discussão de gênero e do feminismo. Aprendi, por exemplo, que Jair Bolsonaro tem conhecimento profundo sobre a forma como se uiva de prazer entre quatro paredes em uma relação homossexual, além de estar bem informado sobre o quanto ganham as prostitutas. Se com conhecimento de causa ou não, fato é que sua pauta retrógrada triunfa no Congresso Nacional. Torço para que Jean Wyllys consiga combater o outro “BBB”, a famigerada bancada da Bíblia, da bala e do boi. Sua tarefa não é fácil.
ADILSON ROBERTO GONÇALVES_CAMPINAS/SP
Quando vi o anúncio dos diários de Fernando Henrique Cardoso na capa da revista (“Dentro do poder”, piauí_109, outubro), achei que iria me deparar com algo grandioso, eloquente e arrebatador. Mas no fim das contas já não sabia diferenciar o que lia do diário da minha sobrinha Isabella, de 18 anos, ou mesmo do Diário da Dilma, que vinha logo em seguida. O que encontrei ali foi um amontoado de futricas, como nos piores roteiros de Malhação. Como se perde tempo e dinheiro do contribuinte com essa trupe rasa que domina a política de nosso país! Não é à toa que temos esse Estado. A bem da verdade, não havia nada ali que qualquer um que acompanhe o noticiário de política já não soubesse. Imagino a árdua tarefa que terá pela frente quem quiser ler todos os tomos desse diário. Acho que prefiro atravessar o Ulisses de Joyce, obra que jaz incólume na minha mesinha de cabeceira há algum tempo. Será mais fácil.
LEONARDO PÁDUA_SÃO PAULO/SP
ANIMAIS
Sou moço crescido no interior, lugar em que a feira agropecuária é o maior evento da cidade – e não fiquei satisfeito com a matéria “No país dos caubóis” (piauí_109, outubro). Em particular com o uso de superlativos – dos quais se abusa no texto, sem que a revista chegue a justificá-los. O que faz a piauí afirmar que Cuiabanno Lima é o “mais requisitado locutor de rodeios do país”? A repórter que assina o texto teve acesso aos dados de todas as requisições de locutores de rodeios? A festa de Barretos é de fato conhecida por ser a principal do Brasil, como está escrito na reportagem. Mas entre ser “conhecida” assim e a repórter afirmar que é “a principal arena do país”, onde estão “os melhores animais” e “os melhores caubóis”, existe uma grande diferença. Que critérios vocês usaram para hierarquizar a importância das festas de peões? Mesmo que se possa afirmar que a competição de Barretos tenha o maior público, não se pode inferir daí que ela seja a mais importante.
As festas, os rodeios e seus protagonistas são complexos demais para que possam ser hierarquizados assim. Há ocasiões em que o locutor é a estrela, noutras é o peão, ou mesmo o animal. Talvez seja a visão carioca-comedora-de-orgânicos da repórter e dos editores da piauí que os fez escrever esses superlativos como se fossem objetivos. Além disso, não compreendi por que a matéria foi anunciada como sendo sobre “a força dos rodeios”, quando na verdade é um perfil do locutor Cuiabanno Lima. Os leitores da revista adoram perfis. Vocês não precisam fazer títulos e chamadas grandiloquentes. O sensacionalismo afugenta os leitores piauienses. Sempre que uma matéria se vende pelo que não é, nós – eu e meus amigos fãs da piauí – ficamos ressentidos com o fato de nos terem feito de bobos.
Se vocês quisessem realmente fazer uma matéria sobre rodeios, caberia dar a devida atenção a questões essenciais, como o trato aos animais. Mas vocês fizeram pior: trataram de assuntos complexos em pouquíssimas linhas, como se apenas quisessem cumprir uma obrigação, e só para poder dizer: “Feito, próximo!”
IURI BAPTISTA_PORTO ALEGRE/RS
Imagino que o público desta revista, ao ler textos sobre rodeios e touradas publicados nas duas últimas edições (“No país dos caubóis”, piauí_109, outubro, e a Despedida “Não matarás”, piauí_110, novembro), possa ter sido seduzido pela “coragem” dos peões e dos matadores, ou talvez pelo argumento de como é importante manter antigas tradições, ou ainda pelo glamour social e econômico que envolve tais eventos. Por outro lado, aqueles que se opõem aos maus-tratos de animais aparecem nessas matérias como ingênuos defensores de uma causa sem importância. Uma sociedade que deseje sair da barbárie, e considere o combate à prática da crueldade em todas as suas formas como uma escolha ética, precisa repensar a maneira como lida com os seus bichos. Desafio, portanto, a revista piauí a publicar uma reportagem sobre o modo como são tratados os animais em apenas três atividades econômicas totalmente legalizadas e amplamente financiadas com dinheiro público: agronegócio, indústria farmacêutica e indústria do “entretenimento”. Espero que ao conhecer os bastidores dessas atividades os leitores possam refletir melhor sobre a causa dos direitos dos animais.
GABRIELLA RINALDI_SÃO PAULO/SP
CARTUNS E QUADRINHOS
Estou absolutamente desolado. Juro que mantive a fé o quanto pude, mas desisti de procurar a graça nos cartuns do Hubert. Pelo contrário: fiquei meio deprimido com o nível de comicidade do “Casseta”. A piada sobre os aliens no Rio Grande do Sul é o suprassumo de todo humor brejeiro já publicado nesta revista.
FELIPE RODRIGUES_SÃO PAULO/SP
Tenho uma história de ódio e amor com a revista piauí. Quando meu pai começou a comprá-la, eu não a suportava: cheia de textos longos, matérias de coisas que eu não compreendia e de que nem tinha ouvido falar. Mas então descobri que a piauí tinha também quadrinhos – e que eles eram engraçados. Comecei a ler os quadrinhos. A tristeza era quando eles não vinham. Descobri então os cartuns, e um pouco mais tarde o Diário da Dilma. Quando vi, já estava perdidamente apaixonada pela revista – e por suas longas matérias, muitas vezes de assuntos desconhecidos. Parabéns.
Agora, uma pergunta: se eu passar no vestibular, posso ganhar um pinguim?
ANNA R. Á. SCHUNEMANN_SÃO PAULO/SP
NOTA DA REDAÇÃO: Finalmente alguém que gosta da gente. Nem precisa passar no vestibular, Anna. Tem jogo se você passar no Yázigi, na aula de capoeira, no curso de tricô, de datilografia, de flauta boliviana, na seletiva de concurso de ioiô. Aliás, dane-se: pinguim a caminho. Pode vagabundear.
PUM VAGINAL
Já não me encaixo na faixa etária das caravanas que vão ao programa Altas Horas, da TV Globo. Lá, talvez, a sexóloga Laura Muller pudesse tirar essa minha dúvida. Por que algumas mulheres, durante o sexo, soltam gás “por lá”? Quero, afinal, saber. Eu vivia tranquilo sem essa dúvida. Foram vocês que me apresentaram essa questão (Esquina, “Cárie e pum vaginal”, piauí_109, outubro). Quero respostas – que não aparecem no belo texto de Luiza Miguez. Decerto a repórter terá que visitar Laura mais uma vez para, finalmente, nos dar a resposta. Admito até um esclarecimento na seção de cartas. Mas, que eu quero, eu quero. Sei que não me negarão isso.
RAIMUNDO RODRIGUES_NATAL/RN
NOTA DO DEPARTAMENTO DE ETIQUETA: Não somos especialistas, Raimundo, e a bem da verdade o tema nos constrange um pouco. O máximo que podemos recomendar é que não namore depois de um leitão à pururuca.
SITE
Está linda a nova página da revista na internet. Parabéns pelo bom gosto.
MARISA NOVAES DE ASSIS_RIO DE JANEIRO/RJ
DE OLHOS BEM ABERTOS
A edição de novembro da piauí traz todos os ingredientes que costumam mexer com o ânimo dos leitores: cartuns de qualidade duvidosa, como esses do Hubert; merchandisings do Instituto Moreira Salles (acompanhado de um insossa resenha de Rodrigo Naves) e da Companhia das Letras (com o saboroso trecho do livro de James Kaplan sobre Frank Sinatra e suas relações com a máfia); além de reportagens e perfis que não nos deixam largar a revista antes de chegarmos à estrelinha do Botafogo. Mas foi uma novidade o que realmente me intrigou: as ilustrações de Andrés Sandoval abriram os olhos! Sempre fiquei encucado com o fato de as excelentes figuras do artista chileno estarem, invariavelmente, de pálpebras cerradas – o que acaba criando um ambiente de sonambulismo e fantasia para os textos das Esquinas, de que tanto gosto. E agora? Confesso que fiquei meio desconcertado ao mirar José Roberto Arruda e John Nash nos olhos.
JOÃO MARCOS VEIGA_BELO HORIZONTE/MG