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    CRÉDITO: ANDRÉS SANDOVAL_2023

esquina

Xou da caricata

O youtuber que ganhou fama imitando Xuxa

Thallys Braga | Edição 204, Setembro 2023

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Toda segunda-feira estreia no YouTube um episódio novo do programa favorito de Rodrigo Pereira. A atração é produzida, roteirizada, dirigida e apresentada por ele mesmo. E o tema central quase sempre é esse homem com cabelos descoloridos que se descreve como “afeminado, subversivo, à frente do seu tempo, com uma cabeça a mil por hora” – enfim, “um artista não compreendido”.

No Google, pesquisas com o nome “Rodrigo Pereira” não trazem nada sobre ele. Já “Rodrigo Xuxa” leva a fotos e vídeos da década que passou se apresentando pelo Brasil como cover da apresentadora de tevê. Nas redes sociais, “Rodrigo Apresentador” remete ao perfil do entertainer de 34 anos que hoje leva a vida sendo a estrela de si mesmo.

A história de Rodrigo, contada pelo próprio, faz dele uma espécie de artista maldito. “Minha cabeça não era bem compreendida na infância”, diz. Ele foi levado pelos pais ao psicólogo porque não queria ser médico ou engenheiro. Queria ser como as mulheres loiras e ricas da tevê: Hebe Camargo, Eliana, Angélica e, acima de tudo, Xuxa.

Nos corredores do Centro Educacional Tomaz Francisco Garcia, em Balneário Camboriú, Santa Catarina, os interesses do menino causavam estranheza. Num certo Dia da Criança, ele virou o jogo. Levou a coleção de CDs Xuxa Só para Baixinhos e, vestido de palhaço, armou um show para os colegas. As professoras gostaram tanto que recomendaram o aluno de 13 anos para as festas de outros colégios.

Nos anos seguintes, Rodrigo passou a viver em função da Xuxa e de nada mais. Ganhava dinheiro dublando as músicas da apresentadora em eventos infantis e nas praças de alimentação dos shoppings de Santa Catarina. O cabelo, loiro e cortado no estilo Joãozinho, virou a sua marca. Em 2012, a internet o descobriu. Ele fez participações em programas da RedeTV!, da Record, do SBT e caiu nas graças daqueles que seriam os seus maiores incentivadores e piores inimigos: os usuários do Twitter.

 

“Se você entrar no Twitter hoje e jogar na barra de pesquisa ‘Rodrigo Xuxa’ ou ‘Rodrigo Apresentador’, vai encontrar um meme meu lá. É a receita do sucesso”, diz ele. Os cortes dos vídeos de Rodrigo são replicados sem parar pela mesma turma que é fã de Gret­chen, Nicole Bahls e Inês Brasil – a santa trindade dos memes. Um dos memes mais populares é aquele em que ele chora ao ver Xuxa cantando Doce Mel ao vivo.

A fantasia de Xuxa serviu bem à personalidade extrovertida de Rodrigo. Mas chegou um tempo, pelos idos de 2014, em que ele sentiu que estava na hora de investir em projetos autorais. “Tive aborrecimentos no show business. Chegaram umas coisas ao meu ouvido que… Enfim, hoje em dia eu relevo.” Disseram que a apresentadora estava incomodada com o trabalho de Rodrigo. Ele, então, decidiu tirar um ano para se desintoxicar de Xuxa. “Diante da câmera, eu virava a Xuxa. Olhava igual, falava igual, me mexia igual. Quando ela foi trabalhar na Record, eu não assisti nada. Precisava criar uma nova persona para mim.”

Com um topete à la Hebe Camargo, Rodrigo Apresentador estreou o seu programa no YouTube em 2016, com dicas de maquiagem, estilo e culinária e um quadro dedicado às “divas que inspiram”. Para celebrar o aniversário de 30 anos, reconstituiu a sua vida em um documentário, com a modéstia que lhe é própria. A cena inicial elenca importantes acontecimentos de 1989: a primeira eleição presidencial democrática depois da ditadura no Brasil, a queda do Muro de Berlim, a morte de Raul Seixas, a estreia do programa Domingão do Faustão. Então aparece a foto de um bebê. “Como se não bastasse”, diz o narrador, “às 14h50 de uma tarde de outono do movimentado 19 de abril de 1989 nascia, entre as serras frias de Santa Catarina, um garotinho chamado Rodrigo”.

O catarinense tem a esperança de que uma grande emissora reconheça seu talento e o convide para fazer o programa Rodrigo Show na tevê aberta. Acredita que isso só não aconteceu ainda por causa da homofobia. “A televisão não se abriu totalmente para os LGBTs”, diz. “Já tivemos homens gays apresentadores, é claro: o Clodovil, por exemplo. O Gugu, que era enrustido. Mas você nunca vê a gay caricata apresentando programas matinais e vespertinos. Eu acho que isso vai demorar para acontecer, mas eu vou conseguir.”

 

Uma década de trabalho na internet valeu a Rodrigo um fã-clube que nem sempre é carinhoso. Certa vez, alguém solicitou os serviços de um garoto de programa em nome dele. Rodrigo dispensou o profissional. Vira e mexe fazem comentários depreciativos sobre a sua aparência. “Uma piada só vira meme quando eu posso rir junto. Fazer chacota dos outros é outra coisa”, reclama. Pouco lhe importa saber o número de haters que tem. “E também não quero saber o número de fãs. Acho que isso envaidece demais as pessoas.” No final de agosto, seu canal no YouTube tinha 16,2 mil inscritos.

O que importa para Rodrigo é que existem pessoas que compram não só as suas ideias, mas também os seus produtos. Ele já lançou uma linha de acessórios, cadernos, canecas, livro de fotos, álbum de figurinhas – tudo se esgotou, segundo ele. Quando lançou um boneco com o seu rosto, em 2020, teve de sortear os compradores do produto. Ele tinha produzido vinte unidades, mas apareceram pedidos de sessenta fãs. Rodrigo conseguiu certa segurança financeira com o que ganha na internet, mas ainda recorre à ajuda de familiares.

A biografia dele é cheia de contradições e polêmicas, como a das estrelas que tenta emular. Uma delas envolve outro personagem do entretenimento. Em novembro de 2019, Rodrigo viajou de Balneário Camboriú, onde mora, a São Paulo para ir ao velório de Gugu Liberato. Uma fotografia do youtuber na cerimônia – meio posada, na verdade – circulou pelas redes sociais, como se ele tivesse sido flagrado por um pa­parazzo, à maneira do que ocorre com ce­lebridades. Então os fãs descobriram que foi o próprio Rodrigo quem distribuiu a imagem para as páginas de fofoca. O youtuber não demonstrou nenhum remorso e ainda ficou chocado com os fãs que não entenderam sua sagacidade: “Eu espalhei a foto porque era um furo jornalístico. E as pessoas me massacram por isso.”