Marina Dias (Washington Post), Camila Mattoso (Folha de S.Paulo), Basília Rodrigues (CNN Brasil) e Catarina Alencastro (YouTube) (imagem: Marcelo Saraiva)
“Muitas vezes as jornalistas mulheres ocupam espaço, mas não têm poder”
Basília Rodrigues, Camila Mattoso e Marina Dias debateram com Catarina Alencastro violência de gênero e outras questões na cobertura política
Apesar de antigo, o diagnóstico se mantém o mesmo: ser mulher na cobertura política de Brasília é difícil. A rotina das jornalistas que cobrem o poder é recheada de insultos e outras violências, veladas ou não. Para ilustrar esse cenário, a repórter do Washington Post Marina Dias contou um caso particular.
Em 2015, depois de um jantar profissional com um ministro do governo Dilma, ela recebeu uma mensagem do político com uma série de informações importantes que complementavam as conversas – e um “pedido de desculpas” por “não ter podido beijar sua boca”. Ela tinha a opção de ignorar a frase e usar as informações, mas escolheu outro caminho: pediu que o ministro nunca mais falasse com ela. “Chega uma hora que você precisa traçar um limite”, disse Dias durante a participação na mesa “Mulheres na cobertura política”, que aconteceu neste sábado (10) no Encontros piauí, em São Paulo.
Esta é a segunda edição do evento realizado no auditório do Instituto Moreira Salles – IMS Paulista, com o tema “O que está em jogo: democracia, voto e eleições”, para convidados e assinantes.
Além de Marina Dias, participaram da discussão as jornalistas Basília Rodrigues, que é analista de política na CNN Brasil desde 2020 e Camila Mattoso, diretora da sucursal de Brasília do jornal Folha de S.Paulo. Na conversa, mediada pela gerente de parcerias estratégicas do Youtube, Catarina Alencastro, as jornalistas compartilharam as principais dificuldades da carreira no jornalismo político.
Para Camila Mattoso, primeira mulher a ocupar o cargo de direção na sucursal da Folha em Brasília, não há outra solução além do aumento do número de mulheres nesses ambientes. Mas isso também não significa que a transformação desse cenário será rápida. “A polarização torna o ambiente mais competitivo e mais delicado para essas mudanças”, disse ela.
“Assim como acontece com as congressistas, muitas vezes as jornalistas mulheres estão lá ocupando espaço, mas não têm poder”, avaliou Basília. Dona de uma carreira sólida no rádio, ao ir para a tevê ela conheceu comentários racistas e incômodos, às vezes desacreditando que tinha realmente fontes no governo.
Em 2023, até novembro, a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) contabilizou 71 ataques a jornalistas mulheres. A maior parte deles estavam relacionados à reputação e à moral e usavam a aparência, a sexualidade ou traços de personalidade das jornalistas para agredi-las. De acordo com a instituição, 4 em cada 10 profissionais atacadas cobriam temas políticos.
Em alguns casos, as agressões foram além do discurso: segundo o levantamento, cerca de 17% das ocorrências no ano passado foram de agressão física. Isso aconteceu com Marina Dias. Na cobertura do 8 de janeiro, quando bolsonaristas invadiram o Palácio do Planalto, ela foi cercada e agredida pelos manifestantes. “No governo Bolsonaro, a agressão contra jornalistas e especialmente jornalistas mulheres era uma política de governo era um jeito de eles trabalharem”, disse Dias.
A violência é pior durante as eleições. No último ano eleitoral, em 2022, a Abraji contabilizou um recorde de ataque a jornalistas mulheres. Só em setembro daquele ano, foram registrados pelo menos um ataque por dia a jornalistas mulheres. De acordo com a Abraji, 64,3% dos casos de agressão aos profissionais de imprensa estavam diretamente relacionados à cobertura eleitoral e 50% das agressões tiveram a atuação de agentes políticos e estatais.
Mais cedo, nos Encontros piauí, a presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Cármen Lúcia, conversou com o diretor André Petry e a repórter Consuelo Dieguez sobre os desafios das eleições deste ano; a líder de políticas públicas do YouTube no Brasil, Alana Rizzo, e o secretário de políticas digitais da governo, João Brant, falaram com o editor Guilherme Henrique sobre a confiança no processo eleitoral; o cientista político André Singer avaliou o momento eleitoral em um painel mediado pelos jornalistas Luigi Mazza, editor da piauí, e Flávia Lima, secretária assistente de Redação para diversidade no jornal Folha de S.Paulo; e os apresentadores do Foro de Teresina debateram as eleições em uma versão ao vivo do podcast.
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