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Ônus e bônus em Belém com a COP30

    Vila da Barca: obras de saneamento e macrodrenagem, um grande problema em Belém, foram realizadas para a COP, mas “vários dos projetos são de qualidade ruim”, diz o urbanista Lucas Nassar CRÉDITO: DANIEL KONDO_2025

questões ambientais

Ônus e bônus em Belém com a COP30

A marca da desigualdade nas intervenções urbanas para a conferência do clima

| 28 nov 2025_13h58
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A Vila da Barca é uma ocupação popular no bairro do Telégrafo, em Belém, que remonta ao início do século XX, quando a migração vinda do campo se intensificou com a crise da borracha. Sobre palafitas, as suas casas avançaram pelo terreno pantanoso às margens da Baía do Guajará. A maior parte do bairro nunca teve tratamento de esgoto.

Em março deste ano, quando faltavam oito meses para a Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática, a COP30, brotaram tapumes perto da vila. Uma placa nos tapumes indicava que seria construída ali uma estação elevatória – um sistema que bombeia o esgoto interceptado para a estação de tratamento a um nível altimétrico superior. Seria o tão sonhado saneamento básico chegando à Vila da Barca?

Não era. Nas plotagens que envelopavam os tapumes estava escrito: “Sistema de Esgotamento Sanitário da Doca.”

A Doca é um igarapé que divide os bairros Reduto e Umarizal, onde os preços dos imóveis estão entre os mais altos da cidade. O Canal da Doca foi revitalizado pelo governo do estado para a COP. Mas o sistema de esgoto do Canal da Doca não iria incorporar estação elevatória na própria região – que foi transferida para a entrada da Vila da Barca, a 1,5 km de distância. Ou seja, o cocô dos ricos faria um pit stop no coração do bairro dos pobres antes de ser enviado à estação de tratamento, conta Roberto Andrés na edição deste mês da piauí. Ou, como disse uma moradora numa postagem que viralizou nas redes, a Vila da Barca estava sendo usada como vaso sanitário da Doca.

A grita dos moradores da vila contra a estação elevatória acabou surtindo efeito. Constrangido pela crítica, que ganhou a mídia, o governo do Pará passou a investir na região. A companhia de saneamento, privatizada recentemente, iniciou um projeto de renovação da infraestrutura de fornecimento de água. A promessa é de que toda a comunidade terá água tratada até este mês de novembro e que o tratamento do esgoto será implantado no ano que vem. Essas melhorias são relevantes. São direitos elementares, que muitos bairros de moradores abastados possuem desde sempre.

Nas intervenções urbanas em Belém para a COP, é visível a distribuição desigual de ônus e bônus, como ocorreu com a Vila da Barca. Mas seria incorreto reduzir as intervenções a casos como esse. Há também investimentos em obras que tendem a ser benéficas para a população – espaços públicos, restauração de patrimônio, saneamento e transporte.

A principal obra da COP em Belém é o Parque da Cidade, uma área de 50 hectares que será a sede do evento internacional. Depois, seguirá aberto como um parque público, em uma cidade com poucas áreas verdes de uso coletivo. A grande adesão da população no período experimental de abertura mostra que o projeto supre uma carência importante. Além dos espaços abertos, o parque contará com edifícios para atividades culturais, esportivas e de eventos. Outra obra com avaliação positiva é o Porto Futuro II – a restauração de cinco galpões na Região Portuária para abrigar empreendimentos de cultura, gastronomia e bioeconomia.

Ainda falta um balanço detalhado de todas essas obras, sobretudo no que diz respeito à adequação do gasto público aos escopos dos projetos. Certo é que muitas intervenções foram realizadas de forma acelerada. O mecanismo gerou maior agilidade, mas à custa de alterar os processos convencionais de licitação, fiscalização e controle. E não faltaram os escândalos. Em agosto, o ministro Flávio Dino autorizou a abertura de um inquérito para investigar supostas fraudes em licitações de obras para a COP.

Assinantes da revista podem ler a íntegra da reportagem neste link.

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