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    Mais de 200 estudantes fizeram uma simulação da COP21 propondo um novo modelo de negociações que incluía porta-vozes de empresas, ONGs, povos indígenas, oceanos, solos, espécies ameaçadas e outras entidades FOTO: PARIS CLIMAT 2015 - MAKE IT WORK

Questões da Ciência

Por uma negociação ampliada

A costura de um acordo climático não deveria se limitar aos Estados nacionais, defende pensador francês

Bernardo Esteves | 08 dez 2015_16h33
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A Conferência do Clima de Paris, a COP-21, entrou na reta final em sua segunda semana, com o início do chamado segmento de alto nível. Delegações de quase 200 países, agora chefiadas por seus ministros, estão reunidas num grande centro de convenções em Le Bourget, subúrbio ao norte da capital francesa, tentando costurar um acordo climático que contenha o aquecimento global ora em curso abaixo de um patamar de 2ºC, supostamente seguro para a humanidade.

As negociações envolvem os países signatários da Convenção do Clima da ONU, mas o problema da mudança do clima está longe de implicar apenas os Estados nacionais. Um acordo efetivamente capaz de limitar os impactos das alterações climáticas deveria incluir compromissos assumidos também pelas grandes empresas (principalmente dos setores responsáveis pelas maiores emissões de gases do efeito estufa), mas também por setores variados da sociedade civil. Alguns desses segmentos estão representados na COP por lobistas e ONGs que integram as delegações nacionais, circulam nos corredores do centro de convenções e promovem uma série de eventos, mas não têm direito a voto na elaboração do acordo.

Como construir um novo modelo de negociações que possa incluir esses agentes? Para o filósofo e antropólogo Bruno Latour, é preciso reinventar o processo de negociação para que todos eles sejam representados. Num evento paralelo à COP21 realizado na noite do dia 7 em Paris, o pensador francês defendeu um modelo de negociações ampliado, que inclua até representantes daqueles que não têm voz. “Precisamos incluir entidades soberanas que não são países ou territórios”, explicou à plateia. “Precisamos dos Estados nacionais, mas é necessário que haja também representantes dos oceanos, da atmosfera, das espécies ameaçadas de extinção.” A ideia é um desdobramento de conceitos que o francês vem discutindo há anos em sua obra – ele já apontava a necessidade de um “parlamento das coisas” num livro de 1999 que discutia a conciliação da política com a ciência.

Uma tentativa de colocar em prática esse tipo de negociação expandida foi realizada no fim de maio em Paris sob a coordenação de Latour e de Laurence Tubiana, negociadora-chefe da França na COP21 (ambos são professores de Sciences Po, o Instituto de Estudos Políticos, em Paris). Durante três dias, mais de 200 estudantes vindos de vários países fizeram uma simulação da conferência do clima num teatro em Nanterre.

 

No evento realizado durante a COP21, a socióloga Alice Maréchal, que faz mestrado em Sciences Po e participou da simulação promovida em maio, explicou que os estudantes foram divididos em delegações que representariam as ONGs, a juventude, os povos indígenas, mas também os solos, as florestas, a internet e uma série de outras entidades humanas e não humanas. “Não discutimos as emissões de gases-estufa, mas pedimos às delegações que chegassem a um consenso quanto à visão de um futuro comum, uma trajetória que permitisse que chegássemos a um acordo”, disse Maréchal.

Os participantes da simulação viraram a noite na busca de um consenso, como acontece frequentemente com os negociadores das COPs. Latour contou que, a partir dessa experiência, Laurence Tubiana concluiu que era preciso rever o modelo das negociações multilaterais nas Nações Unidas. Para o pensador francês, a simulação deixou claro que é preciso se adaptar à nova realidade em que o sistema planetário se impôs na vida dos humanos. “Essa mudança de poder ainda não foi registrada pelos Estados”, disse o filósofo. “Precisamos encontrar um meio de traduzi-la nas leis internacionais.”

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