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Recomendando Truman Capote

O documento de 1965, reproduzido nesta página, data da época em que Capote, aos 41 anos, terminava A Sangue Frio. É especialmente curioso, pois provém do arquivo de um dos principais agentes imobiliários de Nova York, Douglas Elliman. Trata-se da proposta de Capote para a compra de um apartamento na Praça das Nações Unidas, região valorizada de Nova York, pelo preço de cinquenta mil dólares.

| 04 ago 2015_16h01
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O grande evento literário dos Estados Unidos em 1966 foi o romance (In Cold Blood), de Truman Capote, que tornou-se imediatamente um best-seller e foi aclamado como obra-prima pela crítica, um sucesso como há muito não se via no cenário da literatura americana. O relato realista de um crime bárbaro no Kansas e de sua investigação é hoje um clássico.

Capote era também conhecido como uma figura da dita “alta sociedade” ou “jet-set”. Fascinado por celebridades desde a infância, tudo fez para aproximar-se dos milionários, do mundo do glamour e de Hollywood. Não se incomodava em ser visto como uma espécie de bobo da corte, que divertia e lisonjeava os ricos e famosos.

Homossexual assumido, obcecado por socialites magras e elegantes, (que apelidava de seus “cisnes”), Capote tinha de fato uma agenda de contatos invejável. Mas todos sabiam que seu talento era inegável e a repercussão de sua obra não se devera apenas ao bom trânsito com a imprensa e os poderosos. Seu sucesso consolidara-se a partir de 1958 com a publicação de Bonequinha de Luxo (Breakfast at Tiffany’s) e só fizera crescer.

Em 1966, no ano da extraordinária acolhida a seu segundo romance, Capote quis provar sua nova riqueza e seu peso social ao juntar no Hotel Plaza de Nova York 400 das figuras mais ilustres dos Estados Unidos e do mundo, num baile black-tie, batizado de “Baile Preto e Branco”, noite lendária que ainda mantém a fama de evento social americano mais marcante do século XX.

O documento de 1965, reproduzido nesta página, data da época em que Capote, aos 41 anos, terminava . É especialmente curioso, pois provém do arquivo de um dos principais agentes imobiliários de Nova York, Douglas Elliman. Trata-se da proposta de Capote para a compra de um apartamento na Praça das Nações Unidas, região valorizada de Nova York, pelo preço de cinquenta mil dólares.

O documento é preenchido a mão por um funcionário e assinado duas vezes por Capote. O escritor indica quatro amigos que podem fornecer referências pessoais, entre os quais Jacqueline Kennedy, viúva havia pouco mais de um ano do Presidente assassinado (e aureolada do incomparável prestigio de grande sofredora da América). Menciona também seu editor, o famoso Bennet Cerf, da Random House e o poderosíssimo Bill Paley, Presidente da CBS (cuja mulher Babe era talvez a mais diáfana dos seus “cisnes”).

 

Algum dirigente da Douglas Elliman deve ter guardado o formulário, juntamente com as cartas de recomendação das duas primeiras pessoas que Capote indicava para reforçar sua credibilidade, Paley e Cerf.

Em sua carta, Paley diz do escritor que dificilmente poderia haver um candidato mais “desejável e responsável” para a compra de um apartamento, mas é Cerf, seu editor, o mais entusiasta: “O Sr. Capote é um dos escritores mais importantes da editora Random House. Na verdade é hoje um dos escritores mais importantes do mundo. Acredito que tenha mais amigos nos altos círculos sociais, literários e de governo que qualquer outra pessoa que conheço.”

Documentos que se complementam como a proposta de contrato de Capote e as cartas de recomendação ligadas à transação raramente andam juntos e, quando isso ocorre, tornam-se especialmente desejáveis para estudiosos e para colecionadores.

 

Apesar de serem apenas nota de rodapé na biografia de Capote, os documentos são muito representativos de uma faceta do escritor que eventualmente levou a seu declinio: o profundo envolvimento com a alta sociedade americana. Sua imagem pública de borboleta social não condizia (e acabava prejudicando) sua reputação de “grande escritor”. Por outro lado, Capote cometeu, em 1975, o erro imperdoável de retratar seus amigos ricos num romance à clef. Não se deu ao trabalho de disfarçar suficientemente os personagens e desagradou profundamente a todos os amigos que os haviam inspirados, que sentiram-se traídos e não hesitaram em abandoná-lo da noite para o dia. Seu “suicídio social” agravou seus problemas com o álcool e drogas e sua última década foi de marcada decadência pessoal e artística.

Capote morreu só e amargurado em 1984, pouco antes de completar 60 anos.

Sua reputação literária continua sólida.

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