Mark Ruffalo e Michael Rezendes, repórter investigativo, integrante senior da equipe Spotlight do Boston Globe
“Spotlight” – entretenimento e responsabilidade
O título completo de Spotlight, no Brasil, é Spotlight – segredos revelados. Seria possível opção pior? Difícil, muito difícil. O adendo ao original deve ter intenção de atiçar a bisbilhotice do público e refletir no resultado de bilheteria. Sendo esse o propósito, não passa de oportunismo barato e vulgariza o filme dirigido por Thomas McCarthy. Um filme interessante, bem intencionado, narrado de forma convencional mas eficiente e com um bom elenco.
Por que não manter apenas o título em inglês, como já se tornou prática corrente no Brasil? Ou, talvez, acrescentar ‘interesse público’ a Spotlight. Ou traduzir Spotlight por ‘em foco’. Não teria o mesmo apelo comercial? Talvez, não. Mas ao menos deixaria de banalizar o filme por antecipação.
A relevância de Spotlight, que deriva da gravidade dos fatos relatados no filme – abusos sexuais de crianças cometidos de modo recorrente por padres e encobertos pela Igreja Católica – é prejudicada, à primeira vista, pela sensação de que o assunto demorou demais para chegar às telas. Afinal, 13 anos se passaram desde que matéria publicada em janeiro de 2002 no Boston Globe tornou os crimes cometidos de conhecimento público.
Significativa também é a demora do próprio jornalismo, apenas parcialmente redimido pelas reportagens de 2002, considerando que um jornalista do próprio Globe recebeu informações sobre o que vinha ocorrendo quase uma década antes.
Se o cinema, nesse aspecto, reproduz o padrão de comportamento recorrente, deixando de tratar no calor da hora de fatos que importam, por outro lado, introduz no debate, em casos como Spotlight, questões inesperadas – Oscars, pipoca e refrigerante.
Na recente entrevista a Christiane Amanpour, McCarthy, diretor de Spotlight, foi claro. Para ele, é uma “história atraente, muito divertida (entertaining), que pode realmente ter um grande impacto”. Aí está, com limpidez, o paradoxo do cinema. É possível conciliar entretenimento com as expectativas de Mark Ruffalo, declaradas na mesma entrevista a Amanpour, de que o filme tenha “efeito e responsabilize os culpados”?
Ruffalo é quem faz o papel de Michael Rezendes, repórter investigativo, integrante senior da equipe Spotlight do Globe, e redator das matérias que trouxeram a público o acobertamento dos abusos sexuais. Entre o pragmatismo de McCarthy e o idealismo de quem, como Ruffalo, acredita no poder do cinema, não haveria um abismo intransponível? No filme, Rezendes grita: “Está na hora, está na hora. Eles deixaram acontecer. Ninguém pode escapar disso.”
Como uma legenda informa no final de Spotlight, o cardeal Bernard Francis Law, responsável por acobertar os abusos cometidos em Boston, renunciou à Arquidiocese depois das reportagens do Globe serem publicadas, em 2002. Como consolo foi nomeado pelo Papa João Paulo II, em 2004, arcebispo emérito da Arquidiocese de Santa Maria Maior, em Roma.
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